terça-feira, 12 de março de 2013

Aluísio Azevedo (O Esqueleto) Parte VIII – O Grito Auriverde

Naquele tempo fazia-se a viagem de Santos a S. Paulo, através do mato virgem. A serra que a Estrada Inglesa hoje corta, e por onde sobem os vagões bufando, só podia ser galgada a cavalo, dificilmente, penosamente. A jornada de d. Pedro fez-se por um dia magnífico. A serra inundada de sol encrespava a sua vegetação prodigiosa, de um lado e de outro do estreito caminho, aberto na mata, por onde os cavalos trotavam enchendo as grotas de ecos prolongados.

A frente da comitiva, o príncipe cravava de instante a instante as esporas no animal. Ao seu lado, seguia o comandante do regimento. O Satanás vinha mais para trás, com a capa voando ao vento, na impetuosidade do galope. Depois, atropelado e veloz, - num grande estrupido, o regimento de cavalaria abalava a serra, voando.

Ninguém falava. O príncipe seguia preocupado, por aquele novo aspecto que tomavam as cousas, impondo-lhe agora um procedimento cujas conseqüências ainda não se podiam prever. Esquecera-se já dos tristes sucessos da casa da rua do Conde. A princípio, o remorso lhe apuara o coração, vendo-se o causador daquela grande desgraça. Branca resistira com uma tenacidade, que ofendera a sua vaidade de conquistador irresistível. Era a primeira mulher que opunha um obstáculo à satisfação de um desejo seu. Ferido no amor próprio, não recuou diante de uma violência. Nenhuma das outras recusara aquela honra, nenhuma! - estas, por amor, cedendo-se com paixão àquele belo fidalgo que governava o maior país da terra, e cujos lábios e cujas mãos tinham carícias tão novas, afagos tão doces; aquelas, por vaidade, amando-o por luxo, dando-se a ele pela satisfação de se sentirem princesas no breve espaço de um espasmo de gozo; outras, por imposição de maridos e pais ambiciosos, fazendo do corpo de uma esposa ou do corpo de uma filha sólidos degraus para a subida gloriosa do poder... Nenhuma das outras recusara aquela honra, nenhuma!

E era aquela criança tímida e fraca, era aquele pedacinho de gente, que lhe vinha cravar os olhos na face, atrevidamente, corajosamente, e dizer-lhe sem tremer: - Não te quero, não te desejo, não serei tua, porque não te amo, porque amo um outro que é mais belo, que é mais amante, que é mais forte do que tu!
Depois, quando vira entrar no quarto Paulo de Andrade quando compreendera que era aquele o seu rival, o príncipe esperara-o a pé firme, olhando-o face a face, num ímpeto daquele seu belo temperamento, tão seu e tão nobre, que o faria afrontar todos os perigos, que o fez uma vez, mais tarde, sozinho, em S. Cristóvão, esperar na rua um homem que o ofendera, e retalhar-lhe o rosto a chicote.

Mas, Paulo recusara, preferindo matar-se a erguer a mão contra ele.

E vendo-o morto, o príncipe, compreendendo que ia haver um escândalo, saiu daquela casa, fugindo do lugar onde fora procurar um gozo passageiro e onde ganhara um remorso terrível.

Agora, porém, essa preocupação fora sufocada por outras mais sérias. O homem desaparecera. Em seu lugar ficava apenas o príncipe, com toda a grave responsabilidade de uma conspiração política.

Era possível recuar? A guerra estava declarada. A tropa portuguesa capitulara no Rio e não tardava muito que capitulasse também em todo o resto do Brasil. O senado conferira ao príncipe o título de Defensor Perpétuo do Brasil; não lhe impunha esse titulo o dever de resistir a tudo e a sacudir de uma vez o jugo da metrópole? Não era defender o Brasil e, mais do que isso, salvá-lo, fazer com que ele se constituísse nação independente?

Quanto ao Satanás, a sua preocupação era de outra natureza; o desgraçado pensava na filha, de quem não sabia, de quem já não queria saber, atolada na desonra, roubada ao seu afeto.

O desejo de vingança enchia-lhe a alma de rancor; poderia numa hora de júbilo supremo, roubar a vida a quem lhe roubara a felicidade? conseguiria enfim satisfazer a sua única preocupação de agora, deitando a mão ao verdadeiro culpado?

D. Pedro interrompeu-lhe a meditação, chamando-o para junto de si.

- Dize cá, Satanás! tens confiança no futuro?

- Por que não? é tão bom esperar, mesmo quando só há motivo para desespero!...

- Duvidas então do êxito da minha última aventura?

- Não! não duvido... Era do meu futuro que falava e não do seu. O seu futuro é garantido: que motivo teria eu para duvidar dele?

- Também me parece isso. Demais não foi só a minha ambição que trouxe os acontecimentos ao pé em que estão: foi também a fatalidade que preparou tudo, dando-me este papel, que não posso recusar, porque há muito tempo que o desejava e pedia a Deus. Agora é caminhar.

D. Pedro alongou a vista pelo horizonte. Agora, galgada a serra, rasgavam-se as planícies verdes, cheias de tufos de árvores, arrepiadas de outeiros, circuladas de montanhas.

- Será talvez o primeiro do mundo, este país que Deus me quis dar, na sua justiça infinita. Desgraçado de quem, chegado ao meio do caminho, tem medo do desconhecido e dá as costas ao que tem de vir. Eu já não posso parar. Vencerei o futuro, ou serei vencido por ele. Mas serás meu, país abençoado...

E, parado, sofreando a carreira ao cavalo, de cabeça erguida, belo e transfigurado, o príncipe teve um largo gesto que varreu todo o horizonte.

E abalou de novo, ato do galope, pela planície afora, como se quisesse chegar mais depressa a esse futuro que lhe sorria e que o chamava, acenando-lhe com uma coroa e com a glória da fundação de uma grande nacionalidade.

Depois de um longo silêncio, foi o Satanás o primeiro a falar.

- E já não é possível reprimir o ódio entre brasileiros e portugueses, senhor. São conflitos constantes, rixas de todos os dias. E só o que se deve recear. Se a população portuguesa reagir? se mesmo a população brasileira recuar?

- Não recuará. Pois não foi o próprio povo quem me pediu que ficasse, exigindo que eu rompesse com meu pai?

- Não há que fiar no povo, senhor. O povo quer uma cousa hoje e outra amanhã. De mais, mesmo confiando no povo, não se devem recear as alternativas da guerra?

- Mas as últimas noticias são boas. Labatut, na Baía, caminha de vitória em vitória. Venceremos.

E não falou mais, senão quando, no vale do Ipiranga, às margens do rio que se acachoeirava, espumando, entre ribas de verdura, ordenou que se fizesse um pequena parada de descanso, antes de entrar na cidade.

Todos se apearam.

Na serenidade da tarde, as palmeiras bracejavam no ar. Havia uma grande suavidade no céu muito azul, limpo de nuvens, cortado de asas. Os cavalos saíram pelo campo, a pastar. Os soldados estenderam-se na relva, prostrados por aquela caminhada longa, ao sol forte de setembro. Abriram-se as garrafas de cana, acenderam-se os cigarros.

D. Pedro e Satanás falavam de Marta, da peixada de escabeche, da beleza de Maria.

- Homem, por falar em peixada... fez d. Pedro, e disse uma cousa que fez o outro rir muito.

O príncipe riu também, e levantando-se, entrou numa moita.

Mais longe, na entrada do vale, levantou-se uma nuvem de poeira. Ouvia-se um galope. E, em breve, um cavaleiro apareceu. Ao chegar perto da comitiva, apeou-se, e deixou-se cair no chão, sem fala, coberto de pó, extenuado.

Tinham chegado a Santos, logo depois da partida do príncipe, novas notícias, ainda mais graves, ainda mais aterradoras.

Era ele quem as vinha trazer. Tinha viajado sem parar um instante, num galope louco pela serra acima.

O comandante do regimento foi procurar o príncipe. Encontrou apenas o Satanás, sentado numa pedra, cotovelos sobre os joelhos, face sobre os punhos, pensando.

- Onde está o príncipe?

O Satanás levantou os olhos e disse gravemente:

- Espere um pouco. Está ocupado. Foi apanhar uma parasita.

Quando o príncipe veio, não o surpreenderam as notícias. Confirmava-se o consta de terem sido os deputados brasileiros obrigados a fugir de Lisboa. Esses deputados eram Antônio Carlos de Andrade e Silva, Cipriano Barata, Lino Coutinho e Diogo Feijó. Antônio Carlos, em plena sessão das cortes interrompido num discurso, bradara num belo assomo de indignação: - Silêncio, canalha! Quando fala um brasileiro ninguém o interrompe!

O governo português, diziam mais as notícias, dispunha-se a mandar uma esquadra para o Brasil, para reprimir a revolução. Era preciso agir, com a máxima urgência.

D. Pedro não pestanejou. Chamou o comandante.

- A cavalo! forme o regimento!

E arrancou do chapéu o pendão azul e branco. Depois, tirou de uma árvore uma folha verde, listrada de amarelo, e, substituindo-a ao pendão, montou também a cavalo.

O regimento esperava, em linha, a voz de marchar. O príncipe estendeu o braço:

- A caminho!

E, com uma voz que ecoou longamente, na tarde radiante, pelas quebradas da serrania, soltou o seu grito de guerra - Independência ou morte!
–––––––––––-
continua

Cassiano Ricardo (Desejo)


Machado de Assis (O Rei dos Caiporas)

Publicado originalmente em Jornal das Famílias, 1870.

Os acontecimentos humanos são regidos por um destino cego e caprichoso? Há estrelas propícias e estrelas funestas? Tem fundamento a crença popular de que certas criaturas são felizes porque choraram no ventre materno, e outras desgraçadas porque não choraram nem riram? Questão é esta que não me atrevo a deslindar. A filosofia diz que os homens dependem de si; o vulgo aponta mil casos em que todos os esforços de um homem vão esbarrar diante de uma força invisível que o não deixa dar um passo adiante. A filosofia é uma boa senhora, e o vulgo é um sujeito prático; seria parcialidade inclinar-me a qualquer deles. Atento-me a ambos.

O que vou contar alude a esta questão de fatalidade e destino. O vulgo inventou uma palavra para indicar a fatalidade de um homem; chama-lhe Caiporismo. Os dicionários ainda não trazem o termo, mas ele corre já pelas salas e ruas e adquiriu direito de cidade.

João das Mercês era o tipo do homem caipora. O destino com todas as suas legiões de auxiliares tinha tomado a pessoa de João das Mercês por alvo de seus tiros. João das Mercês se caísse de costas tinha toda a certeza de quebrar o nariz.

Choveram-lhe desde o berço as contrariedades. Entrou no mundo com o pé esquerdo. É mister ler esta expressão com a sua significação literal e real. A mãe de João das Mercês não resistiu aos trabalhos cirúrgicos e faleceu horas depois de vir à luz o filho.

Foi-se buscar à pressa uma ama. Encontrou-se ao cabo de algumas horas uma preta que alimentou o pequeno durante cinco dias, e morreu de erisipela em um joelho. A segunda ama era uma mulher livre que tinha a mania de jogar na loteria, e que ao fim de um mês tirou a sorte grande: saiu da casa para ir abrir uma loja de costuras. A terceira entrou a amar o irmão mais velho do pequeno, com violência tal, que o pai julgou acertado mandá-la embora. Veio quarta ama que era dorminhoca e deixava o pequeno berrar toda a santa noite; a quinta ama era respondona; a sexta dividia os afetos entre o menino e um permanente; a sétima foi aturada até o fim do tempo da amamentação, a despeito de uma voz de soprano que irritava os nervos do dono da casa, cantando modinhas do Norte todo o santíssimo dia.

Parece que esta variedade de leite e de amas influiu poderosamente em João das Mercês. Logo nos primeiros anos verificou-se nele uma tendência pronunciada para o sono, influxo da quarta ama. Aos cinco anos nada o alegrava mais que ver passar a tropa na rua, gosto que lhe ficou naturalmente do leite que bebeu à namorada do permanente. Aos sete anos cantava sofrivelmente, aos oito teve uma erisipela, aos doze furtou ao pai cinco mil-réis para comprar um quarto de loteria; aos quinze começou a namorar uma prima e aos dezesseis foi posto fora de casa por seus atrevimentos.

Aqui temos nós João das Mercês na rua, com dezesseis anos, sem vintém na algibeira, nem pouso certo. Felizmente a prima que ele namorava ainda tinha mãe e pai, que eram muito amigos de João das Mercês e haviam até brigado com o pai dele a propósito de umas palmatoadas que este aplicara no filho. João encaminhou-se para lá.

— Meu pai deitou-me fora de casa, disse ele a D. Angélica; venho ver se me dão pouso e mesa, porque não tenho outro recurso.

— Fica João, respondeu a senhora dona Angélica; fizeste bem em te lembrares que ainda tens uma tia; aqui não te há de faltar nada, ao menos enquanto eu e o Gaspar vivermos.

Marianinha apareceu na sala e soube das desgraças do jovem primo. Ao mesmo tempo teve notícia de que ele ia morar lá. Marianinha, que era o tipo da inocência, bateu palmas e apertou a mão do primo, com uma efusão tal que não escapou à perspicácia da senhora dona Angélica. D. Angélica tinha muitas razões para patrocinar os amores da filha e do sobrinho. Bem sabia ela que João das Mercês não tinha herança nem emprego; mas em compensação Marianinha tinha uma perna mais curta que a outra. Arranjado o rapaz, bem se lhe podia dar a pequena e tudo ficava em casa.

Gaspar aprovou todas as decisões da mulher, com tanta maior benevolência, quanto que, se as não aprovasse, seria a mesma coisa. Durante vinte anos de casamento, não constava que Gaspar tivesse jamais iniciado alguma coisa em casa, nem sequer desaprovado a mulher. D. Angélica teve sempre o comando do exército doméstico, e devo acrescentar com a fidelidade de um romancista sincero que D. Angélica exercia esse comando com uma severidade digna de um general.

A boa velha era caprichosa; o marido era o tipo da obediência. Um dia acordou D. Angélica com a idéia de que o esposo devia usar suíças. Gaspar, que trazia a barba toda, desde que ela achou que era a única moda respeitável, ia ao barbeiro e punha abaixo metade do pêlo. Dois meses depois, Angélica adotava o sistema dos bigodes, por se ter namorado de um retrato de Napoleão III. O marido voltava para casa com uma faixa de soldado francês. Suspeitava-se que o corte das calças inexplicáveis de Gaspar era produção de D. Angélica.

Aqui temos, em duas palavras, a nova família de João das Mercês. Sabendo com que amor o tratavam, o nosso João imaginou que ia levar uma vida regalada. Infelizmente foi ilusão que durou pouco. D. Angélica disse um dia à mesa que era preciso arranjar algum emprego para o sobrinho. Gaspar não se fez esperar. Foi dali a um cavalheiro com que andara na escola e que ocupava então o lugar de ministro da Guerra. Pediu-lhe um emprego. Gaspar foi notável durante toda a sua vida pelo aferro com que sempre acompanhara o ministério atual. Obteve o emprego.

João das Mercês obedeceu à intimação da sua tia e foi ocupar o lugar no Arsenal de Guerra, tendo obtido antes consentimento do pai. Marianinha amava o primo, com toda a força de seus quinze anos. Era uma rapariga assaz bonita, assaz faceira, dotada de um excelente coração. João das Mercês, que era estouvado e mal educado, não deixava de ter igualmente um coração digno de apreço. Amavam-se estas duas criaturas com o aferro de um primeiro amor. D. Angélica alimentava esta chama que, segundo ela, devia ser legitimada na igreja.

João das Mercês também nutria essas esperanças; e tratava de as comunicar à prima.

— Quando formos casados, dizia ele, havemos de ser felizes.

— Casados?

— Sim.

— Quando há de ser?

— Um dia, quando eu tiver mais idade.

— Ah! se fosse já!...

Gaspar ouviu um dia esta conversa, e não se pôde ter de furor.

— Casar! exclamou ele; pois vocês já falam em casar? Onde é que se viu isto? Que diria tua mãe, quando souber que já a minha filha fala em casamento? E tu, meu pirralho, que idéias andas metendo na cabeça de tua prima? Ora esperem! Marianinha tremia; João murmurava uma resposta ao tio, quando este chegando-se à porta gritou para dentro:

— Oh! senhora dona Angélica!

— Que temos? gritou de dentro a esposa de Gaspar.

— Queira vir ate cá, respondeu o marido com voz macia.

— Não me faltava mais nada! venha cá você.

Gaspar fez um gesto de ameaça aos pequenos e foi ter com a mulher a que expôs o que acabava de ouvir.

— E que tem você com isso? disse-lhe a mulher. Se os pequenos gostam um do outro, fazem muito bem; e eu até estimo isso, porque já andava com idéias de os unir. Você veio atrapalhar tudo; ora vai, vai tranqüilizar os pequenos.

Gaspar engoliu dificilmente a pílula. Atravessou o corredor como se passasse pelas forcas caudinas; e voltou à sala onde os namorados tremiam pelo desfecho da cena.

— O amor, meus filhos, disse ele, é uma coisa santa, se vocês se amam com seriedade, sou o primeiro a aprovar esse sentimento que nos eleva aos nossos próprios olhos; o que eu combato, e que todos os bons pais devem combater, é o namoro sem fim, o passatempo indigno de jovens bem formados. Quando eu e a respeitável D. Angélica (aqui levantou muito a voz) nos amamos foi...

— Deixe-se de estar contando essas coisas aos pequenos, clamou de dentro a senhora dona Angélica.

— Foi seriamente, continuou Gaspar em voz baixa.

Tudo favorecia os amores de João das Mercês; mas ele não contava com o destino.

André das Mercês, pai do nosso João, arrependeu-se um dia de ter posto o filho fora de casa, e foi ter com a irmã para obter a volta de João das Mercês. D. Angélica opôs-se vivamente à saída do sobrinho. Disse francamente ao irmão que o seu projeto era insensato; que, já que tinha praticado um erro, devia agüentar com todas as conseqüências dele.

André era tão esturrado como a irmã; respondeu-lhe rispidamente; ela insistiu; insistiu; e depois de uma longa discussão em que ambos mostraram toda a solidez da respectiva língua, saiu André disposto a proceder violentamente. Em caminho refletiu que não era conveniente dar um escândalo, e que podia alcançar tudo por bons modos.

— Talvez ela hoje estivesse de mau humor, pensou ele.

Encontrou o cunhado e expôs-lhe a questão.

— Meu amigo, disse-lhe Gaspar, eu aprovo o procedimento de minha mulher, sem deixar de aprovar as suas louváveis intenções...

— Louváveis, tem razão, acudiu André; o que eu quero é receber meu filho em casa. Assiste-me o direito...

— Não contesto.

— A mana está teimosa; mas se você intervier, pode ser que eu consiga alguma coisa...

— Acha então que eu...

— Sem dúvida, venha comigo.

— Vamos. Minha mulher atende muito ao que eu digo. Com duas palavras minhas estou que arranjarei tudo. O caso é que o senhor não estrague tudo com as suas insistências... Deixe-me falar só.

— Estou por tudo; eu não desejo brigar com ela.

— Está visto. O que se quer é fazer-lhe ouvir a razão. Sabe o que são senhoras; caprichosas, intolerantes; mas deixe-me, eu farei tudo... Espere-me aqui um bocadinho, que eu vou ali à esquina comprar rapé, que tenho a caixa vazia.

— Eu vou também.

— Não; deixe-me ir só; o homem não gosta de vender rapé à vista de gente. São três minutos.

Gaspar voltou à esquina e meteu-se em um corredor. André, depois de passear perto de um quarto de hora, foi à esquina e perguntou no armarinho pelo cunhado.

— Aqui só veio um preto comprar uma vela de cera, respondeu o caixeiro.

André ficou furioso, mas compreendeu tudo. Sabia que a irmã dominava o marido, mas não calculava que chegasse a tanto. Resolveu, portanto, fazer as coisas por si.

No dia seguinte apareceu em casa de Angélica (não ouso dizer em casa de Gaspar) e de novo insistiu na entrega do pequeno; a missão não teve nenhum efeito. André resolveu ir esperar à porta do Arsenal de Guerra que o pequeno saísse e deitar-lhe a mão em cima.

João das Mercês não escapou ao laço.

Nesse mesmo dia foi morar para casa do pai com ordem de não sair nem para o emprego nem para casa da tia. Imaginem o furor de D. Angélica e a dor de Marianinha. Gaspar fez cem projetos de vingança, sem que a mulher lhe aceitasse nenhum.

Separado da jovem namorada, João das Mercês ficou entregue ao mais profundo desespero. Correram os meses sem que se avistassem os dois. Ao cabo de um ano, André arranjou para o filho um emprego, e foi a primeira vez que o mísero pôde pisar a rua. Seu primeiro cuidado foi ir à casa da tia.

Achou-se na sala toda a família e mais um rapaz de casaca e luvas brancas. Marianinha empalideceu um pouco, mas logo lhe passou essa manifestação de remorso. Remorso digo, porque o sujeito de luvas brancas e casaca, como o leitor há de ter percebido, vinha pedir a moça em casamento.

D. Angélica acabava um discurso acerca dos deveres do casamento e do amor das mães aos filhos, discurso que Gaspar ouvia com aprovação de cabeça, e o noivo com abrimentos de boca.

João das Mercês não resistiu à dor. Saiu furioso acusando os céus e a terra das suas desgraças. Complicaram-se estas com a morte do pai. João das Mercês ficou no mundo sozinho. Era preciso trabalhar; o rapaz entrou a trabalhar como um mouro.

Houve entretanto não sei que pretendente ao lugar dele; parece que o pretendente tinha jus ao lugar, porque um dia de manhã o chefe da repartição mandou chamar João das Mercês e deu-lhe a triste notícia de que estava demitido.

Nessa triste posição esteve João das Mercês uns quinze dias que foi quanto lhe durou o resto do ordenado. Ao fim desse tempo não tinha que comer. O estômago é engenhoso e tem boa memória. João lembrou-se que havia, em uma casa de pasto do seu conhecimento, um caixeiro a quem emprestara dez mil-réis em ocasião em que se achava desempregado. Correu para lá.

O caixeiro conheceu o credor, e acudiu a servi-lo. João das Mercês pediu alguma coisa para almoçar, e fingindo ler a lista declarou ao caixeiro que não tinha dinheiro naquela ocasião.

O caixeiro era bom rapaz e não deixou de o servir. Foi pelo mesmo teor o jantar e a ceia. No dia seguinte não havendo outra vela no horizonte culinário, João das Mercês recorreu ainda ao caixeiro, que não deixou de lhe fiar o comer; mas pensando que a penúria de João das Mercês era temporária, limitou-se a afiançar ao dono da casa a capacidade do freguês.

Ao fim de duas semanas, quando João das Mercês se assentava para comer o seu décimo-quinto almoço, o dono da casa foi-lhe levar uma conta que fez empalidecer o pobre rapaz.

— Amanhã lhe pago isto, respondeu ele pondo a conta no bolso, e com tanta confiança que parecia estar à espera de algum legado. Ignora-se como comeu ele no dia seguinte e nos outros. Um mês depois achamo-lo empregado em copiar certidões e outros papéis em casa de um tabelião. Era ativo no trabalho e sério no procedimento; infelizmente o tabelião padecia de moléstias que o enchiam de mau humor certas manhãs, mormente se comia na véspera carne cozida. Um dia em que o tabelião entrou no cartório afinadíssimo, João das Mercês teve a desgraça de copiar mal um papel. O tabelião revoltou-se contra o escrevente, e mandou fazer outra cópia, a qual, não saindo capaz, levou o tabelião às nuvens.

Por desgraça, João das Mercês abalroou na mesa e entornou-lhe o tinteiro sobre uma procuração.

Foi demitido.

Tentou João das Mercês entrar no comércio, e alcançou ser admitido como sócio de indústria em um armarinho. O armarinho era afreguesado e João das Mercês julgou ter enfim dado o último golpe no caiporismo. Daí a um ano reconheceu que andava iludido com a aparente vitória.

O caiporismo é a hidra de Lerna.

O sócio disse-lhe um dia de manhã que ia buscar um primo em Sapopemba e partiu acompanhado de uma pequena mala.

João das Mercês ficou em casa só.

Mas os dias correram sem que o sócio voltasse; até que João fosse surpreendido com uma letra de quinhentos mil-réis. Recorreu à burra e não achou vintém. Deu parte à polícia; mas nem por isso escapou da correção.

Foi solto depois de um laborioso processo em que ficou provada a sua completa inocência. Os credores tomaram conta dos bens, e João das Mercês ficou no meio da rua com as algibeiras vazias e nenhuma esperança de melhora.

Não tinha as algibeiras vazias de todo; depois de as revolver muito achou seis mil-réis.

— Que tempo me durará isto? perguntou ele a si mesmo. Nem três dias; é preciso comer e dormir. Acabado este dinheiro estou como antes. Que farei? Aqui teve uma dessas inspirações que salvam impérios.

— Gasto dez tostões em alguma coisa, e com os cinco mil-réis de resto compro um quarto de loteria.

Já sabemos que ele tinha esta mania que lhe deixara uma das sete amas.

Assim fez.

Depois de comer tranqüilamente um almoço sucinto e modesto, encaminhou-se para a Rua da Quitanda e comprou o bilhete.

— 1441, disse ele, bom número; tenho fé.

Tinha uma esperança mas não tinha jantar nem cama. Felizmente a roda corria no dia seguinte. João das Mercês entrou a passear pelas ruas, disposto a sofrer filosoficamente a fome e o mais na esperança dos vinte contos.

Casualmente encontrou o tio Gaspar.

— Como estás? perguntou-lhe o tio.

— Bom.

— Já te livraste do processo?

— Já.

— Tão depressa?

— Acha que foi depressa?

— Sim, essas coisas costumam a ser mais longas. Eu quis fazer alguma coisa por ti; mas tua tia, que é uma senhora de muito bem pensar, disse: “— Era bom ir socorrer o Joãozinho; mas o crime é tão feio que não é bom a gente meter-se nisto; que pensas tu, Gaspar?” “— Que hei de pensar, mulher? Penso que o rapaz é inocente e que foi atraiçoado; mas as aparências enganam... e nesse caso é minha vontade que não nos metamos nisto”.

— Faz bem.

— Onde estás agora?

— Aqui na rua.

— Mas qual é o teu emprego?

— Passear.

— Que dizes?

— A verdade.

Gaspar, que não era mau homem, ficou penalizado com a situação do sobrinho. Quis fazer alguma coisa por ele; mas não ousava.

— Já comeste?

— Hoje comi; amanhã não sei.

— Olha, disse Gaspar com um belo movimento de generosidade, toma lá; eu fui agora mesmo receber um dinheiro; toma dez mil-réis.

João das Mercês aceitou os dez mil-réis e abraçou o tio.

— Bem! disse ele, a sorte começa a ceder. Já tenho com que dormir hoje e comer amanhã.

Era não contar com o caiporismo e D. Angélica. Esta senhora pediu ao marido contas do dinheiro que fora cobrar. Gaspar contou-lhe francamente o estado em que achara João das Mercês e o procedimento que tivera. D. Angélica irritou-se contra o marido e o sobrinho e exigiu a imediata entrega do dinheiro. Por honra dela, devo dizer que a sua intenção era simplesmente mortificar o marido. Mas este, acostumado a obedecer-lhe, tomou à letra a ordem e saiu desesperado em busca de alguém que lhe emprestasse dez mil-réis.

Esse alguém foi o sobrinho.

João das Mercês viu de longe o tio e aproximou-se dele. Achou-o triste e taciturno, perguntou-lhe o que tinha.

— Nada, disse Gaspar.

— Alguma coisa tem meu tio; vamos, diga o que é.

Gaspar não disse palavra.

Então lembrou-se João das Mercês do domínio que a tia exercia no ânimo do marido, e calculou que a tristeza de Gaspar se prendesse ao generoso presente dos dez mil-réis.

— Qual! disse Gaspar, quando João das Mercês lhe comunicou a suspeita; Angélica não era capaz de semelhante coisa; estima-te e respeita-te. A verdadeira causa de minha tristeza é que esse dinheiro não era meu, e eu dei-te os dez mil-réis por engano.

João das Mercês entregou o dinheiro ao tio.

Gaspar sentiu-lhe borbulhar-lhe uma lágrima nos olhos. Apertou a mão ao sobrinho e foi para casa. Entrava triunfante com os dez mil-réis, quando D. Angélica, franzindo o sobrolho, perguntou-lhe de onde os houvera. Gaspar confessou-lhe a verdade.

— Que! exclamou a esposa; pois tu tiveste ânimo de ir tirar estes pobres dez milréis ao rapaz que nem comer tinha?

— Mas tu...

— Eu, o quê? Eu disse aquilo por dizer. Vai, vai entregar este dinheiro ao pobre rapaz.

— Onde o encontrarei agora?

Gaspar saiu e não achou o sobrinho. Às ave-marias voltou para casa, mas receando que a mulher lhe revistasse as algibeiras, coisa que nunca deixava de fazer todas as noites, tratou de gastar os dez mil-réis como pôde.

João das Mercês passou a noite na rua; no dia seguinte almoçou com um outro companheiro do cartório; e à hora do costume foi para a Misericórdia ver correr a roda.

— Tenho um pressentimento, disse ele consigo, de que hoje venço o destino.

Chegou; dez minutos depois o nº 1441 era aclamado como tendo obtido os vinte contos de réis.

João das Mercês desmaiou.

Deram-lhe os prontos socorros. Tornou a si, apalpou as algibeiras; e achou o abençoado bilhete. Graças a este recurso inesperado foi à antiga casa de pasto, cuja dívida estava paga, e apresentou o bilhete.

— Tenho aqui a sorte grande; dê-me de jantar que eu depois de amanhã lhe satisfaço a conta do que for.

Foi prontamente obedecido. Jantou como um príncipe. No fim pediu ao caixeiro conhecido, sempre sobre a base do bilhete, alguns charutos que só tinham o defeito de não serem de Havana; no mais não prestavam para nada. Mas naquela situação tudo o que se fuma é bom. Qualquer homem fumará alegremente couro de boi, se tiver a certeza de que no dia seguinte lhe metem na algibeira vinte contos de réis.

Acabava ele de acender um charuto, quando um sujeito que lhe ficara fronteiro, e tinha ouvido a conversa com o dono da casa, lhe disse com familiaridade:

— Com que então tirou a sorte grande?

— É verdade, respondeu João das Mercês, com a indiscrição de um homem feliz após tantas desgraças. Tirei a sorte grande e ainda estou admirado disso.

— Por quê? disse o sujeito, levantando-se com a xícara de café na mão e indo assentar-se à mesa do rapaz.

— Porque fui sempre muito caipora. Nunca comprei bilhete que me saísse sequer o mesmo dinheiro. Desta vez porém acertei...

— Homem, eu também fui sempre caipora. Joguei dois anos com o mesmo número e nunca tirei mais de 40$000. Um dia porém, saiu o diabo detrás da porta e caiu-me a bicha em casa.

— Sim? Quando foi isso?

— Foi há seis meses.

— Um quarto ou bilhete inteiro?

— Meio bilhete. Recebi dez contos.

— Talvez não precisasse deles...

— Quase que lhe posso dizer isso. Graças a Deus ainda que não viessem os dez contos, tinha com que passar. Acontece-lhe o mesmo?

— Infelizmente não, disse João das Mercês seduzido com a maneira e a confiança do interlocutor.

— Mais uma razão para que eu o felicite.

O desconhecido apertou a mão a João das Mercês e ofereceu-lhe um charuto.

— Estes charutos daqui não prestam, tome este.

João das Mercês acendeu o charuto depois de pôr o seu fora, e reclinou-se sobre a mesa a conversar com o desconhecido.

Ao fim de uma hora saíram de braço dado. O desconhecido disse chamar-se Viana; João das Mercês deu também o seu nome. Saíram como dois amigos velhos. Passearam todo o tempo; Viana levou a benevolência ao ponto de o convidar a tomar um sorvete no Carceller.

Perto da noite, disse Viana para João das Mercês:

— Vou levá-lo até à sua casa.

João das Mercês fez uma careta.

— Isso agora há de ser mais difícil, disse ele depois de alguns instantes.

— Por quê?

— Porque...

— Seja franco.

— Pois bem, meu caro, eu não tenho casa!

— Não tem casa?

João das Mercês contou fielmente ao amigo a sua posição. Viana ouviu a narração com visíveis sinais de simpatia.

— Pois se isto o não incomoda nem ofende, ofereço-lhe por hoje um hospício. Amanhã já não será preciso porque receberá o dinheiro.

— Aceito.

Dirigiram-se para a Rua da Misericórdia. Viana morava ali em um primeiro andar mobiliado com algum asseio.

— A casa não está arranjada, disse ele, mas é porque eu mais me entendo com a desordem que com a ordem.

— Está excelente, disse João das Mercês. Ah! meu caro senhor Viana, creio que sou agora verdadeiramente feliz. No dia em que me entra o dinheiro pela porta, entra-me um amigo pelo coração. Pela porta é metáfora, acrescentou ele rindo.

Viana apertou-lhe a mão comovido.

— Tive um amigo da sua idade; era a mesma alma franca e aberta aos sentimentos generosos; permita-me a ilusão de que o encontrei agora...

— Espero que não seja ilusão, exclamou João das Mercês.

Conversaram até alta noite. À uma hora João das Mercês disse que estava com sono.

— Eu também, disse Viana. Vamos dormir. Tenho sempre esta outra cama pronta para o que der e vier. Olhe, gosto de acordar cedo.

— Homem, nestas alturas não se me dera acordar mais tarde, respondeu João das Mercês que, como sabemos, adquirira de uma das suas amas o modo de dormir demais.

— É que eu tenho de sair cedo, para levar um papel à estrada de ferro. Às nove horas estarei de volta.

— A minha madrugada será às nove horas.

— Veja lá se perdeu o bilhete.

— Nada, cá está no bolso do colete.

Dormiram.

No dia seguinte, seriam onze horas quando João das Mercês abriu os olhos. Viana ainda não tinha voltado. O rapaz costumava estar na cama acordado ainda um quarto de hora. Ao fim desse tempo levantou-se, lavou-se e vestiu-se. Não tendo relógio não sabia que horas eram. O sol estava encoberto. João das Mercês chegou à janela a ver se via o dono da casa. Não viu ninguém.

Pouco depois deram os sinos meio-dia.

— Meio-dia, disse ele. Onde estará este homem.

Começou a sentir fome e a arrepelar-se com a demora, quando instintivamente levou a mão ao bolso do colete. Não achou o bilhete!...

— Roubado! exclamou ele com desespero.

Chegou à janela, gritou, acudiu gente à porta que o deram por maluco. Do segundo andar desceram algumas pessoas, e depois de ouvirem as queixas do mísero rapaz, foram chamar a autoridade.

Quando o rapaz conseguiu achar-se na rua eram já duas horas. Seu primeiro pensamento foi ir à casa de loteria. Correu para lá.

Ó desgraça! todos os quartos da sorte grande estavam pagos. Deu os sinais de Viana e eram os mesmos de um sujeito que lá fora cobrar um quarto. Não se pode descrever o desespero de João das Mercês. Faltava-lhe aquele golpe mais terrível que todos, o de ter a fortuna na mão e senti-la voar como um pássaro esquivo.

Não hesitou; a idéia de morrer entrou-lhe na cabeça como uma solução às suas desgraças. No fundo do bolso ainda achou um cartão de barca. Dirigiu-se à ponte e tomou passagem para S. Domingos. No meio da viagem, aproveitou o descuido das pessoas que se achavam perto dele e atirou-se ao mar.

Houve logo a bordo o rebuliço que um caso destes produz. A barca parou e a bordo se empregaram todos os esforços para salvar o infeliz. João das Mercês veio à tona d’água quando lhe atiraram uma corda; ele repeliu-a com energia.

Seu pensamento era morrer.

Não contava com o caiporismo.

Os esforços empregados em favor de uma criatura que não queria nada da vida, foram coroados de sucesso, João das Mercês foi salvo.

Passado esse triste acontecimento, João das Mercês dispôs a lutar violentamente com a sorte; pareceu-lhe esta sorrir. Alcançou o rapaz um emprego que lhe dera com que viver pobremente. Alugou uma casinha na Cidade Nova, e assim passou alguns meses.

Um dia reparou que havia defronte uma velha que não deixava de sorrir quando ele entrava ou saía de casa. João das Mercês cumprimentava-a cortesmente, mas não julgava que o riso fosse com ele. A casa da velha era a melhor casa da rua, e a moradora passava por ser rica.

Quando João das Mercês descobriu que o riso era com ele, começou a prestar maior atenção à vizinha. Esta redobrou de demonstrações e seria enfadonho contar aqui miudamente os acontecimentos que se deram depois. Basta saber que João das Mercês entrou a freqüentar a casa da vizinha, e esta declarou-lhe francamente o amor que o moço lhe havia inspirado.

Não devendo esperar que a própria velha oferecesse aquilo que era um favor para ele, João das Mercês exclamou um dia:

— E se nós nos casássemos?

— Essa é a minha intenção, disse Margarida, se acha que eu o posso fazer feliz.

— Oh! mais que feliz!

A velha tinha duzentos contos.

Era mais que a sorte grande.

Marcou-se o dia do casamento, correram os pregões, João das Mercês mandou fazer a roupa nova e convidou Gaspar para ser padrinho.

— Sem dúvida, meu rapaz, respondeu o tio, mas quem é a madrinha?

— Eu tinha-me lembrado de minha tia...

— Conta com ela; vou agora mesmo avisá-la.

Margarida não cabia em si de contente; dizia que apesar da idade que tinha, sentia em si mais amor do que nunca tivera ao defunto marido.

João das Mercês disse a mesma coisa. Amara muitas vezes, mas nunca com tanta força.

— Sei o que é, acrescentava ele, é que eu amei sempre a umas deslambidas sem gravidade nem as graças que só se podem ter em certa idade.

Margarida não tinha parente nenhum com exceção de um primo remoto, que fez todos os esforços para impedir o casamento, e que nada tendo alcançado, resolvera aceitar o convite para ser padrinho, não podendo brigar com a parenta rica.

Raiou enfim a véspera do casamento.

Por conselho da noiva, João das Mercês tinha desistido do emprego, aliás com repugnância, porque não queria parecer que ia viver às sopas da mulher. A coisa era isso mesmo, mas ele não queria a aparência da coisa.

Terníssimos foram os adeuses dos noivos na véspera do casamento. João das Mercês já tinha fechado a porta, e Margarida ainda acenava com o lenço. Alta noite foi João das Mercês acordado por violentas pancadas na porta.

Levantou-se sobressaltado e foi ver o que era. Era um escravo de Margarida. Vinha dizer que a senhora estava mal; e que o mandava chamar.

A primeira frase de dor do rapaz foi toda egoísta: Ah! meu caiporismo! exclamou ele enfiando as calças.

Margarida estava realmente às portas da morte. Quis ver o noivo; este chegou; ela apertou-lhe a mão com ternura. Depois chamando o primo declarou que desejava fazer o seu testamento, mas ainda não tinha acabado de falar que expirou.

João das Mercês teve um ataque.

Quando voltou a si, o pobre rapaz lembrou-se outra vez de morrer. Mas tantos sucessos lhe tinham embotado a energia.

Nunca raiou dia de felicidade para este infeliz. Tem sido sucessivamente agente de procurador, copista de advogado, porteiro de teatro, vendedor de bilhetes de loteria, negociante de charutos, sempre perseguido pela fatalidade.

Ele mesmo diz com resignação evangélica:

— Sou o rei dos caiporas!

Fonte:
http://www2.uol.com.br/machadodeassis/

3º Concurso Literário Internacional Castro Alves (Resultado Final)

Internacional
POESIAS

1° lugar:
VESTIMENTA
Maria Cristina Drese -Buenos Aires/ARGENTINA

2° lugar:
POEMETO A CASTRO ALVES
Edweine Loureiro da Silva - Saitama/ JAPÃO

3° lugar:
O MEU SORRISO
Neila Maria de Aguiar Wilson – Durban/ ÁFRICA DO SUL

Internacional
CONTOS

1° lugar:
O SERVENTE DE DEUS
Maria Cristina Drese – Buenos Aires/ARGENTINA

2° lugar:
AS INSONIAS
Victor Manuel Capela Batista - Barreiro/PORTUGAL

3° lugar:
A CONFISSÃO DE GREGÓRIO MATOS AO PADRE ANTÔNIO VIEIRA
Edweine Loureiro da Silva – Saitama/JAPÃO

Membros Correspondentes
POESIAS

1° lugar:
NOITE ENLUARADA
António José Barradas Barroso – Parede/ PORTUGAL

2° lugar:
NOVO DIA
Maria Romana da Costa Lopes Rosa – Faro/Algarve/PORTUGAL

3° lugar :
UM MOMENTO
Irenilda Paranhos de Castro – São José do Norte/RS

Membros Correspondentes 
CONTOS

1° lugar:
FLOR NO CABELO
António José Barradas Barroso – Parede/ PORTUGAL.

Nacional
POESIAS

1° lugar:
PINTAR, TECER E BORDAR
Eloisa Antunes Maciel – Santa Maria/ RS

2° lugar:
MEU LAMENTO
Deise Brandão Torres Leal – Rio Branco/AC

3° lugar:
MINHA ALMA
Maria Apparecida S. Coquemala – Itararé /SP

Nacional
CONTOS

1° lugar:
A FACE DOS MORTOS
Maria Apparecida S. Coquemala - Itararé /SP

2° lugar:
A PERGUNTA
Gustavo Barbosa Rossato - Jundiaí /SP

3° lugar:
O FANTASMA DO RIO CAMAQUÃ
Maria Islair Duarte Lages - Rio Grande/RS

Municipal
POESIAS

1° lugar:
NA ESTRADA
Héctor Mário Vasques de Almeida. - Rio Grande/RS

2° lugar:
DE SANTA FÉ E TORRÃO
Gargione Ávila - Rio Grande/RS

3° lugar:
POEMA CIBERNÉTICO
Almira Lima – Rio Grande/RS

Municipal
CONTOS

1° lugar:
A FLOR DAS RUAS
Maria Lucilene Zafalem Garcia – Rio Grande/RS

2° lugar:
A CHANCE
Elaine Maria Goulart Nunes – Rio Grande/RS

3° lugar:
UMA HISTÓRIA DE SOLIDÃO
Maria Helena Rodrigues Fuão – Rio Grande/RS

Solenidade de premiação do 3° Concurso Literário Castro Alves, que fará parte das comemorações do seu 32º aniversário de sua fundação
 
dia 23 de março do ano em curso, às 16:00 h, no Sobrado dos Azulejos, sede da Secretaria de Município de Cultura da cidade do Rio Grande. (rua Marechal Floriano Peixoto).

Dalva Leal Martins - Presidente
Marcos Costa Filho - Coordenador

domingo, 10 de março de 2013

Nemésio Prata (Uma Poesia (bem) Feminina!)

Desenho a carvão, por J. B. Xavier/SP
Nemésio é de Fortaleza/CE
–––––––––––––––––––––-
De tudo que Deus criou
nada se iguala em beleza
ao par que a Adão doou:
a Mulher; tenham certeza!

De tudo que Deus criou
nada se iguala em ternura
ao par que a Adão doou:
a Mulher; cria mais pura!

De tudo que Deus criou
nada se iguala em amor
ao par que a Adão doou:
a Mulher; que pare em dor!

Beleza, ternura e amor
traz, dentro do coração,
a Mulher; do Criador
Sua maior criação!

Fonte:
O Autor

Olivaldo Junior (Um trovador)

Todas as horas são horas extremas!
Mário Quintana, in Pequeno Poema Didático
 

            Era uma vez um trovador que se perdeu quando tentou atravessar a própria sombra. Não sabia (coitado) que os trovadores não tem que perguntar, nem se indagar, mas, simplesmente, retratar o que eles veem pelo caminho. O caminho de um trovador não é mais o mesmo de antigamente. E mente quem diz outra coisa. Salvem Jorge, mas também os trovadores, que um trovador tem trovas onde antes não havia quase nada.

            Um trovador, distraído de tudo e de todos, perdeu-se quando foi atravessar a própria sombra e nunca mais voltou de lá. Lá é onde se perdem os que se põem a querer testarem o sim e o não de Deus. Deus não é de brincadeira, embora tenha muito senso de humor. Basta olhar o que Ele cria, sim, pois que o mundo não foi criado, o mundo é criado. Esse trovador sabia disso, e é por isso que ele ia ter com Deus assim que tudo ficasse mesmo insuportável. Leve, como se flutuasse, um trovador, sem cavalo, nem magrela, mesmo sendo gordo, flutuava pelo céu da consciência e não achava quem o trouxesse de volta: Deus. Se bem que teve aquela vez... Não, melhor que isso fique em segredo. O segredo é a alma do negócio, e o negócio é mesmo a alma. Um trovador, voando atrás de Deus, pensava que, finalmente, houvesse ganhado as asas que queria!

            Passado um tempo, depois de muito voar e de mais um tanto pensar sobre o que havia feito ao se atrever a ver além da própria sombra, um trovador resignou-se e pôs-se, enfim, a fazer trovas. Tem uma que ele fez que é bem assim, eu bem me lembro:

Ao perder a minha sombra,
me perdi na minha vida,
pois a morte só me assombra
quando a vida é dividida.

Pondo-se a escrever, ele esquecia um pouco de toda a dor que acumulara. Porém, como tudo tem fim (em todos os casos e sentidos), um trovador, tão jovem quanto um sonho não vivido, ao ver o reflexo dele nas águas de um lago (eram seis horas da tarde) tal e qual Narciso, pulou no sonho que teve, pois vira a sombra, a sombra dele ali. Lírios brancos, indicando a paz sem a virem, soluçaram baixo. E uma libélula, tarde, pousou.





Fonte:
O Autor
Sombra criada por J. Feldman a partir de imagem (colorida) obtida na internet

Fernando Pessoa (Caravela da Poesia XV)

Primeiro Fausto

Dois Diálogos

I
— Febre! Febre! Estou trêmulo de febre
E de delírio...]
Ancião, não podes tu
Arranjar-me um remédio para a vida?
Quero vivê-la sem saber que a vivo
Como tu vives.
Atordoar-me-á isto a alma toda,
Toda, até dentro, muito dentro, velho?
— Não teentendo], mas se é esquecer
Que queres, bebe...
— Quero, quero, vamos....
Esqueçamos-nos. Tens algo de mais forte
P'ra] mais do que esquecer? depressa, diz...
— Mal te compreendo, mas não tenho.
(FAUSTO bebe sofregamente)
Estranha e horrível criatura!
Não é vício
Nem crime, nem tristeza, nem pavor
Propriamente pavor, o que obscurece
Como uma escuridão de dentro d'alma
Toda a vida e expressão de sua face.
E essas palavras de que usou — "esquecer
A vida"; "mais do que esquecer"; "em mim
Acabará então parte de mim" —
Que significam?
Não sei, mas sinto
Que condizem, secreta e intimamente,
Com esse íntimo ser que eu não conheço;
Qualquer que seja essa desgraça, estranho,
Dorme e ou esquece ou aconteça em ti
Isso que semelhante ao esquecer
Desordenadamente me disseste
Desejar no teu íntimo...
Dorme, e que o filtro opere no silêncio
Da tua alma obra interior de paz
E ao descerrares para mim os olhos
Eu lhes veja a expressão já transmudada
Para compreensível e humana
Expressão de um humano sentimento.
Te adormeça a existência intimamente
E ao escuro desejo que tu tens.
(Vai para o levantar mais retrai-se)
Não; dorme onde caíste
Eu sou outro que os homens, ó ancião,
O teu filtro de paz e esquecimento
Não me faz esquecer e só a sombra
De uma possível paz me entrou na alma.
Para a paz que eu queria, isto que tenho
É como archote para a luz do sol.
Intimamente nada se passou.
Paralisaste em mim a engrenagem
Do pensamento e sentimento antigos
Não tornaria, eu sinto-o, a sentir
O que sentia antigamente. Foi-se
Não sei como o interior do meu ser
Com suas intuições, mas não se foi
A memória terrível do horror
Da minha vida antiga...]
Não fales mais. Eu vou...
(pondo-se em pé)
Eu vou, não sei aonde ... Como...] treme,
Com que debilidade e sentimento
De estarmudado] o corpo todo. Velho,
Adeus; quisera ter achado em ti
podia ter achado. nada valem. Eu
Deveria ao pedir tê-lo sabido;
Mas... Não tens outro, diz-me... Tu que filtras
venenos mais subtis
Para a existência?
— Há um filtro
Diferente daquele que tomaste;
Diverso na intenção com que obra n'alma,
Mas parecido no fazer esquecer.
— Como diverso na intenção?
— Em vez
De apagar extinguir], adormecer,
Faz — com terrível excitar de vida —
Nascer n'alma um conflito de desejos
Um desejo de tudo possuir,
De tudo ser, de tudo ver, amar,
Gozar, odiar, querer e não querer,
Reunir vícios e virtudes — tudo
Como que na ânsia férvida dum trago
Da taça do existir.
— Tu vendes-mo... Ah! não, que eu nada tenho
Nem sei se tive ou poderia ter.
Tu dás-mo, velho. Não te servirá
De nada ...]
Quem o fez?
Por que o fez? Onde o tens? Repete mesmo
O que de seus efeitos me disseste...
Que me decida ou não a beber dele,
Esse filtroque a ti] de nada serve
Dá-mo, pois.
— Não to dou.
— O filtro, velho.
Não me enfureças, vá; o filtro!
— Não to dou.
— O filtro!
— Não to posso dar.
— O filtro...
— Para que avanças? Eu que mal te fiz?
— O filtro; dá-me o filtro.
— Mas não posso
— Velho, repara em mim. Há na minh'alma
Uma ira calma e fria! Foge que ela
Na ação te mostre o que é.
— Não posso dar-te.
Em verdade to digo, o filtro. Eu
Fiz-te o bem que pude; porque então
Avançando assim calmo para mim
No horror de qualquer outra intenção
Te vejo o mesmo sempre. Poupa-me isso
Terrível que há em ti e que não trais
Em movimento ou vaga intimidade
Do olhar... Piedade, piedade...
Piedade, senhor!, Eu dou-te o filtro,
Eu dou-te o filtro. Piedade, eu dou...
(FAUSTO estrangula-o ...])
(após matar)
Nem sinto horror, nem medo, ou dor, ou ânsia,
Nem qualquerforma] de estranheza sinto
Pelo que fiz por mais que tente querer
Sentir ...]
É uma alma morta ante um corpo morto
Compreendo bem o que sentir eu devo
Mas não consigo mesmo imaginar-me
Sentindo-o ...]
quanto é de horror
A morte, um ente morto, e o mistério
Disto tudo. Sim, sinto-lhe o mistério...
Mas este sentimento de mistério
Não se me liga a um sentimento
Queuna] esse corpo a mim, que fiz
O que de misterioso está ali.
Tremo ao sentir quanto é mistério a morte...
Procuremos o filtro...]

II

Reza por mim, Maria, e eu sentirei
Uma calma d'amor...] sobre o meu ser,
Como o luar sobre um lago estagnado...
Dize: Fazei feliz a quem eu amo,
Cujos olhos não choram por não ter
Na alma já lágrimas para chorar;
Que tendo erguido o seu pensar ao cume
Do humano pensar.... Não, não importa,
Não digas nada, reza e que a tua alma,
Compadecendo-se de mim, encontre
Os termos, as palavras que na prece
Murmurará... Choras? Fiz-te chorar?
— Sim... Não... Eu choro apenas de te ver
Triste ...], sem que eu compreenda
Tua tristeza, meu amor. Vem ela
De alguma dor — oh, dize-me! partilha
Comigo a tua dor, que eu te darei
O meu carinho, porque te amo tanto...
— Tu amas-me, tu amas-me, Maria?
— Ah, tu duvidas? Meu amor, duvidas?
Se te amo, por que hás de
Tu duvidar de mim? Ah, se palavras
Podem levar a alma nelas, Fausto;
Se o amor, este amor como eu o sinto
Pode dizer-se sem o duvidar;
Se o que eu sinto em minh'alma se] te vejo,
Se sinto o teu pavor, quando penso
Em ti, amor, em ti; se olhares, beijos,
Podem mostrar o amor, todo o amor —
Crê, que as minhas palavras, os meus beijos,
O meu olhar têm esse amor.
Eu não sei dizer mais; não aprendi
Como o amor falar, não ...] aprendi
Porque o amor não fala e] não pode
Dizer-se todo, senão não seria
Amor...]
Mas eu amo-te, Fausto! Ah, como te amo!
(à parte)
— Aquilo é amor... eu, pois, nunca amarei
Não posso
Fazer erguer em mim um sentimento
Que dê as mãos àquele. E, de o não poder,
Eu mais frio me sinto, mais pesado
N'alma, na minha desconsolarão.
Como me sinto falso, falso a mim...]
Falso à existência, falso à vida, ao amor!
(alto)
Perdoa, amor...
(à parte)
Amor! Como me amarga
De vazia em meu ser esta palavra
Como de isso assim ser me encolerizo!
(alto)
Perdoa, meu amor!
Cedo aprendi a duvidar de tudo
Por duvidar e mim, sem o querer,
Sem razão de o querer ou de o pensar
Mas eu creio em ti, Maria,
Eu creio em ti... Como és bela!
Não, não chores
Quero falar ternura e não o sei.

Fonte:
Fernando Pessoa . Primeiro Fausto. http://www.cfh.ufsc.br/~magno/fausto.htm

Antonio Brás Constante (Tá Com Pressa? Então Se Vira e Come Cru)

A pressa move o mundo moderno. Move tão rápido que as vinte e quatro horas do dia já não são suficientes para que possamos cumprir com todas as nossas obrigações. Logo teremos um projeto no senado propondo que os dias passem a ter trinta horas. Afinal, se políticos já quiseram mudar o curso dos rios, porque não alterar o tempo também?

Claro que para mudar o calendário dessa forma haveria a necessidade de se suprimir o sábado. Em compensação o domingo passaria a ter trinta horas, e com um pouco de ajuda do marketing moderno (e com muita maionese) a população acabaria acreditando e engolindo que isso seria algo bom. Os dias ficariam estranhos, a noite invadiria o dia e vice-versa, mas o poder de adaptação do brasileiro (quem sabe se a ideia pega, vire até algo mundial) é incrível e deve se ajustar a este inconveniente fuso horário caótico.

Mas a pressa não mexe apenas com a criatividade de nossos políticos e escritores. Cada vez mais vivemos envolvidos em uma correria louca, e é por causa dessa correria que se criaram os lanches rápidos, as fotos instantâneas, as comidas prontas, as vias de trânsito rápido e (principalmente entre os famosos) os tais casamentos rápidos.

Fulano, astro do futebol, contrai núpcias com Beltrana (expressão estranha, parecida com “contrai doenças”). Passam a compartilhar de todas as alegrias e dissabores da vida de casados (com um mundo voyeur a observá-los). Ao final de poucos meses se separam (em determinados casos, em apenas poucos dias), sem maiores explicações.

Alguns podem achar que isto acontece porque as raízes religiosas dos noivos lhes impedem de simplesmente ficarem juntos sem um cerimonial milionário para sacramentar e divulgar essa união, pois eles encarariam a união sem o ato de se casar como uma obra pecaminosa, pesando em suas consciências. Após o casamento e toda superexposição ocasionada por ele, percebem então o erro que cometeram e resolvem desfazer a união. Isso em alguns casos acontece repetidas e repetidas vezes, em um eterno ciclo de tentativas e erros matrimoniais, que já há muito tempo alimentam a indústria de fuxicos e suas incontáveis mídias e revistas caras.

Para outros, o que existe é a necessidade do casamento como um compromisso, que mesmo não sendo muito duradouro, ao menos servirá para que no momento da perda, haja também os “ganhos”, oriundos da aquisição de parte do patrimônio de seu “ex” cônjuge, e assim os patos de nosso mundo são feitos de patos e acabam pagando o pato, fazendo-nos pensar que para alguns o matrimônio pode fortalecer o patrimônio.

O que assistimos com cada vez mais frequência, são “casamentos” alardeados aos quatro ventos por celebridades, que juram terem encontrado suas almas gêmeas. Dizem que sua união é fruto de um amor lindo como cristal e forte como uma rocha.

Na realidade essas metáforas acabam sendo divulgadas de forma errônea (talvez pela embriaguez causada pela paixão e toda aquela bebida servida nas festas de casamento). O certo seria dizer que essas relações são lindas como uma pedra e fortes como cristal. Ao primeiro choque se quebram em mil pedaços, restando apenas cacos, varridos para baixo da tal pedra que é colocada sobre o assunto.

Realmente estamos em uma época de pessoas apressadas. Mas principalmente agora, uma frase antiga se faz valer como verdade (com um pequeno adendo): “O apressado come cru... Mas paga o preço do assado”.

Fonte:
O Autor

Ditados Populares do Brasil (Letra D)

DÁ com a mão direita, que a esquerda não saiba.
DÁ o dito por não dito.
DAR a César o que é de César..
DAR A MÃO à palmatória.
DAR A VOLTA por cima.
DAR COM LUVA de pelica.
DAR NÓ em pingo de água.
DAR O GOLPE do baú.
DAR TRATOS à bola.
DAR UM BOI pra não entrar na briga, e uma boiada para não sair.
DE CAVALO dado, não se olham os dentes.
DE DENTE no coradouro.
DE GRÃO em grão a galinha enche o papo.
DE HORA em hora, Deus melhora.
DE NOITE todos os gatos são pardos.
DE ONDE se tira e não bota, um dia fica com nada.
DE PENSAR, morreu um burro.
DEITAR nos louros da vitória.
DEIXE como estar para ver como é que fica.
DEPOIS da tempestade, vem a bonança.
DEPOIS de mim virá quem bem me fará.
DESGRAÇA pouca é tiquinho.
DESMANCHAR o nó.
DEUS criou, o vento espalhou e o diabo ajuntou.
DEUS dá a canga conforme o pescoço.
DEUS dá o frio conforme a roupa.
DEUS escreve certo por linhas tortas.
DEUS proteja este carro.
DIRIGIDO por mim e guiado por Deus.
DEUS é a luz do meu caminho.
DAQUI até onde Deus quiser.
DEUS proteja este carro.
DESCULPE a poeira.
DE LONGE também se ama.
DENTRE elas prefiro todas.
DE MULHER de burguês ninguém queira ser freguês.
DEPOIS da batalha, aparecem os valentes.
DESANIMAR, nunca. O desengano deve ser o começo de outra esperança.
DETESTADO pelos homens, querido pelas mulheres.
DEUS guia e eu dirijo.
DEUS lhe dê o dobro do que voce me deseja.
DEVAGAR chego depressa.
DEVAGAR se vai ao longe.
DINHEIRO de trouxa é farra de sabido.
DINHEIRO e mulher bonita é que governam o mundo.
DINHEIRO não traz felicidade, mas ajuda a sofrer em Paris.
DIRIGIDO por mim e guiado por Deus.
DIVÓRCIO é o sacramento do adultério.
DUAS coisas que gosto: cerveja gelada e mulher quente.
DURMA no volante e acorde no céu.
DEUS querendo, água fria é remédio.
DEVAGAR com o andor que o santo é de barro.
DEVAGAR se vai ao longe.
DEVO, não nego, pagar, não posso.
DIA de muito, véspera de pouco.
DINHEIRO, na mão, escorrega que nem sabão.
DIZE-ME com quem andas, e te direi quem és.
DIZER o que sente, fazer o que não sente.
DO BOLSO que enfia a mão, o pobre só tira dedos.
DO PASSADO, não remexer na ferida.
DOIS narigudos não se beijam.
DORMIR na estação e perder o trem.
DOS MALES o menor.
DURMA com um barulho desse, e acorde da boa cara.
DURO com duro não faz bom muro.
DURO, como boca de sino.

Soares de Passos (Desalento)

Cansado, ai! já cansado, quando a vida
Em flor nascente desabrocha ao mundo!
Quando a esperança, d'ilusões vestida,
Sorri a todos num porvir jucundo!

Alma que gemes em letal quebranto,
Desprende as asas nos vergéis celestes!
Amor, glória, prazer, dai-me inda o encanto
Que nos dias passados já me destes!

Mas que é o amor da terra? luz divina
Que mal desce do céu logo se apaga;
Cândida rosa que o tufão inclina,
Que o tempo e a morte desfolhando esmaga.

Doces imagens que em ditoso enleio
Cerquei outrora d'ilusão infinda,
D que é feito de vós? ai! neste seio
Viveis apenas, se viveis ainda.

E tu, que és tu, ó glória? um som que passa,
E de século em século retumba,
Mas que a frígida lousa não traspassa
De quem já dorme na calada tumba.

Astro que brilha e queima, espectro ovante
Que a desgraça acompanha, e o génio ilude:
Vós o sabeis, Camões, e Tasso, e Dante,
Vós que gemeis ainda no ataúde.

Que é o gozo, o prazer? fumo d'incenso
Que embriaga um momento, e se evapora;
Que é o saber, a ciência? espaço imenso
Em que a verdade mal reluz na aurora.

Que é este mundo, que eu sonhei tão belo?
Profundo abismo de tormenta escura;
Que é pois a vida? um fadigoso anelo
Que levamos do berço à sepultura.

A morte! oh! se além dela o porto amigo
Nos surgisse afinal ledo e formoso!
Se nesses mundos da esperança abrigo
Despontasse outro sol mais bonançoso!

Mas quem sabe da morte? o ouvido atento
No silêncio das campas nada escuta;
E Sócrates não diz se um novo alento
Achou, bebendo a gélida cicuta.

Senhor, Senhor, por que vim eu ao mundo,
E qual é sobre a terra o meu destino,
De mim que homem geraste, e que fundo
Deste vale d'angústia erro sem tino?

Infeliz de quem nasce! a ave que gira,
A fera, o tronco, o verme que rasteja
Também nasceu, mas esse nada aspira,
Ou se aspirou alcança o que deseja.

E o homem nasce, pensa, e aspira ansioso
Às ilusões que a mente lhe depara,
E a cada passo lhe esmorece o gozo,
E acha só trevas onde luz sonhara.

E caminha, e caminha, e sem alento
Cai abismado no seu térreo leito,
Onde após a fadiga e o sofrimento
A lousa sepulcral lhe esmaga o peito.

Aqui, de dor um pélago profundo;
Além, os vermes da feral jazida;
Senhor, Senhor, por que vim eu ao mundo?
Por que do nada me chamaste à vida?

Fonte:
Poesias de Soares de Passos. 1858 (1ª ed. em 1856). http://groups.google.com/group/digitalsource

Amadeu Amaral (Memorial de Um Passageiro de Bonde) 18. Sanfona

Tivemos hoje concerto de sanfona durante a viagem da tarde. O homem tocava bem, e tocava de tudo.

Amo de coração estes artistas humildes, que têm a paixão da arte, com o mínimo possível de cálculo, ou sem nenhum. São, na sua imperfeição, mais artistas do que muitos outros mais hábeis, mais cultos, mais refinados: não procuram na arte senão o seu prazer -sem pensar em proveitos; e exercem-na com a simplicidade e a inocência de quem pratica os atos mais ordinários da vida. Dão generosamente e anonimamente o que têm, o bom e o mau, o certo e o errado, sem presunção e sem torturas, e vão seguindo o seu caminho. Quem gostar, goste à vontade; quem não gostar, perdoe; e, se não quiser perdoar, é o mesmo. Que boa, alegre e higiênica maneira de ser artista! Durante vinte minutos, o homenzinho da sanfona foi o único que veio deitar um pouco de alegria purificadora na alma fechada e amarrotada de quarenta e tantos passageiros.

Pela minha parte, Deus lhe pague, frater desconhecido!

Fonte:
Domínio Público

Aluísio Azevedo (O Esqueleto) Parte VII – D. Bias Carcereiro

Feitas as revelações e escorropichado o primeiro pichel ali na bodega do Trancoso, d. Bias pôs-se a refletir sobre o caso.

- O Satanás tinha partido na direção da rua do Conde. Lá chegando ele deveria necessariamente intrometer-se naquele drama tenebroso, cujos pormenores, ele, d. Bias, não conhecia, e cujo desenlace ficava para além, misterioso e vago como uma ameaça constante. E o Satanás, que não devia morrer, porque os homens daquela têmpera nunca morrem a botes de espada, o Satanás viria tomar-lhe contas, pedir-lhe satisfações do auxílio que prestara ao príncipe para que este lhe roubasse sua amante. E d. Bias esbugalhou os olhos em derredor, assustado e trêmulo. Sentiu a espada do escultor prancheando-lhe o costado manejada pelo pulso valente de Pallingrini. Supôs até o aço frio e cortante a entrar-lhe pelas carnes adentro. Teve medo, muito medo. E apalpou os ossos para saber se eles ainda estavam inteiros e bons, se não se tinham já esmigalhado com esta perspectiva infalível de uma vindita do Satanás.

- Também, quem lhe encomendara o sermão? quem lhe mandara meter-se nessas cousas e intrigas amorosas do príncipe? Já quando promovera a entrevista com Zabanila, a esperança dos lucros fabulosos que fizera, empanara-se com a expectativa da rivalidade com o mestre d'armas. Este pespegara-lhe uns cachações. E bastava. Pela primeira vez não tinha apetite de repetir.

E d. Bias reconheceu a necessidade de fugir; de esconder-se, fosse lá onde fosse.

Saiu.

Na rua teve uma idéia, idéia luminosa, dessas que só aparecem uma vez na vida de um homem.

Mau grado a sua nenhuma vocação para semelhantes empresas, atravessou o campo da Alampadosa todo inteiro, enveredou pela rua da Cadeia, e veio andando, pé aqui, pé ali, evitando as poças de água, aproveitando as pedras mais altas, às vezes esgueirando-se rente às paredes.

Chegou ao convento do Carmo e bateu, de espaços em espaços, compassadamente, numa porta baixa e estreita que dava para o largo. Abriram-na. Ele entrou.

- Então?

- Novidades.

- Mas ela está dormindo.

- Bem. Eu durmo aqui para esperar. Mas que ninguém saiba de minha presença nestes lugares.

E dormiu por sobre um caixote oblongo, desses que então serviam para guardar roupas de mulher.

No dia seguinte, pelo meio-dia, mandaram-no chamar.

D. Bias foi introduzido num vasto aposento luxuoso, onde morava ostensivamente a amante ostensiva de d. Pedro. Aposento de amores, onde a fantasia da mulher pusera alguma cousa de asiático, ele era suntuoso de comodidades, cheio de coxins forrado a pano da Pérsia com tachas de ouro e prata.

Ela, a quase rainha, esperava-o, molemente reclinada sobre o leito, com as grandes carnações leitosas e fortes de mulher sadia, apenas envoltas em uma vasta túnica de cachemira branca, bordada a ouro. Uma dama penteava-lhe com pente de ouro os longos cabelos castanhos e sedosos. E a Domitila sorria, triunfalmente bela.

D. Bias ajoelhou-se.

- Senhora! disse. - Senhora, eu tenho vigiado.

- E já descobriste porventura alguma cousa, oh! tu! meu belo fidalgo das Espanhas.

- Já, minha senhora.

- Pois conta-me lá a tua espionagem, fez a régia amante com um grande sossego de indiferenças.

Ela estava agora tranqüila de sua vida. Tinha conseguido do príncipe a promessa de um título, cuja coroa, reluzente de ouro e pedrarias, viesse lhe adornar os altos penteados à Maria Antonieta, de que tanto gostava. E essa viagem a Santos, que acabava de se efetuar naquela madrugada, fora ela quem a exigira, desejosa de converter esta cidade no feudo de seus amores.

Já não lhe vinham mais os ciúmes primitivos, que tanto acidentaram o primeiro período de suas ligações. Sentia-se feliz, forte e soberana, dominando o coração de d. Pedro e podendo permitir-lhe as pequenas escapadas das aventuras noturnas. E esquecia-se até de que encarregara d. Bias de vigiar os passos do seu régio amante.

D. Bias, porém, perorou longamente, espanholamente.

Contou o caso da rua do Conde, fazendo-o tenebroso, cavalgando a rédeas soltas no Rocinante das suas fantasias - d. Quixote dos ideais, ele mesmo, magro e esgalgado, lutador impertérrito de longa durindana para a batalha solene dos moinhos de vento.

- Fora o Satanás que fizera tudo. O Satanás! - a negra alma vagabunda da perversão e maldade! Fora ele quem, sem mais barregãs nem rameiras para oferecer ao seu régio discípulo de esgrima, quisera dar-lhe até a própria amante. Bem lhe conhecia os planos. Satanás queria dominar inteiramente o príncipe, dominá-lo pela amizade e dominá-lo pelo coração, para ficar o senhor absoluto dessa terra dos Brasis. Conspirava. Conspirava até contra ela - a bela nina formosa!

- É preciso matá-lo! Consiga ao menos que o deportem! Nada vos é impossível, a vós que fizestes deportar o conde d'Arcos.

A Domitila fez-se apreensiva. Ela não gostava do Satanás. E vinham-lhe agora receios de ver a fortuna esboroar-se-lhe no momento mesmo que supunha alcançá-la.

- Em todo caso, disse como que meditando, em todo caso agora não pode ser, porque o príncipe e o Satanás partiram esta madrugada para Santos.

- Caramba! resfolegou d. Bias com a notícia de estar longe o homem de quem tinha medo. - Caramba! porque se aqui estivesse, era eu quem o ia matar!

Ela nem sorriu dessa fanfarronada. Mas gritou-lhe imperiosamente:

- Quero essa mulher! Quero a amante de Satanás! Dou-te mil cruzados, se a trouxeres!

E, de pé, ofegante, com um gesto de rainha:

- Vá!

D. Bias saiu.

Caminhou pelas ruas, altivo e malcriado, retinindo a durindana pelas pedras, cofiando o bigode provocadoramente.

Estava longe o Satanás, e ele não tinha medo.

Por isso andou e correu a cidade inteira. Soube logo notícias do drama da rua do Conde. Vieram-lhe calafrios com a noção completa do perigo que correra. Mas dominava-lhe dentro da cabeça a idéia dos mil cruzados que lhe haviam sido prometidos, para o caso de descobrir a amante do escultor-espadachim. E tratou de encontrá-la.

Poucas esperanças tinha a este respeito. Não a conhecia. E as informações dos alguazis amigos, que andavam empenhados em desvendar o mistério da morte de Paulo de Andrade, falavam apenas em suspeitas de que naquela casa residisse uma moça, que devia ter fugido.

Fugido com quem?

Levá-la-ia d. Pedro para algum misterioso antro de amores?

Ou o Satanás tê-la-ia posto a seguro, em algum esconderijo desses que só ele conhecia?

D. Bias estava na incerteza. Não sabia que partido tomar. E pensava até em aproveitar a filha do carpinteiro Custódio, que lhe residia em casa, para fazê-la passar como amante do italiano.

O ponto para ele era receber o dinheiro da Domitila e passar-se imediatamente para qualquer terra longínqua, onde não chegasse o braço vingativo do seu ex-companheiro das bodegas do Mansanares.

Quando seguia, porém, já quase ao anoitecer, pela rua da Vala, chamaram-no de dentro da prisão provisória que ai havia, e onde eram recolhidos os vagabundos notívagos.

Era um alguazil, que ele pusera em meia confidência do negócio, e que lhe mostrou Branca, seminua, com as roupas sangrentas.

A filha de Pallingrini, logo após a brusca partida do pai, precipitara-se sobre o cadáver de Paulo de Andrade. Abraçara-o, beijara-o sofregamente, loucamente, na febre amorosa dessa loucura, que para sempre lhe entenebrecera o cérebro, triturando-lhe o coração.

Depois tivera medo, sentindo rijo e frio, sem aconchegos de abraços e quenturas de beijos, o pálido capitão formoso dos seus amores juvenis.

Teve medo e fugiu.

Perambulou pelas ruas, inconscientemente de si murmurando carícias e meiguices e gritando de repente um grito de horrores.

Prenderam-na.

D. Bias adivinhou-a. Não podia ser outra. Aquele sangue, as palavras incertas que pronunciava, e que podiam todas articular-se ao drama indecifrável da rua do Conde, revelavam-na, garantiam-lhe a autenticidade da descoberta.

E o fidalgo espanhol, aproveitando o alguazil seu amigo, e mais ainda o segredo da noite, que tem sempre um manto escuro para esconder esses mistérios, levou-a para os fundos do convento do Carmo, onde já estavam dadas ordens de recebê-la.

A Domitila nem quis ver a rival que o Satanás lhe pretendia impor. Mas não quis também contar logo o dinheiro que prometera, e ordenou que d. Bias ficasse de guarda a prisioneira.

E a porta pesada de um quarto térreo e sem janelas aferrolhou-se sobre Branca - a pobre criança louca, para quem a sorte se mostrava tão áspera, e que cantava entretanto um alegre bolero espanhol saltitante e amoroso como o pé das sevilhanas.
–––––––––––-
continua

Aleilton Fonseca (Francisco Mangabeira e o Lirismo Trágico de Canudos)

Por que só é profunda e ilimitada
A noite que há no coração dos homens?
(Francisco Mangabeira)

O poema Tragédia épica (Guerra de Canudos), do poeta baiano Francisco Mangabeira, editado pela primeira vez em 1900, reaparece em 2010, na prestigiosa Coleção Austregésilo de Athayde da Academia Brasileira de Letras, como uma verdadeira relíquia literária. Nada justifica ter permanecido essa obra em inexplicável ostracismo durante tantas décadas. Trata-se de uma obra que, dada a sua singularidade, ocupa lugar de relevo no ciclo literário de Canudos, em cujo centro impera até hoje o livro Os sertões, de Euclides da Cunha, publicado em 1902.

O poema de Mangabeira não é uma simples curiosidade literária. Seus versos narrativos e eloquentes certamente despertarão o interesse dos leitores e estudiosos contemporâneos, uma vez que emanam de uma voz lírica, piedosa e indignada, para denunciar o trágico episódio da história brasileira. O poeta pensou em dedicar o livro à memória das vítimas ou aos companheiros de expedição, registrando que esta seria: “uma boa maneira de exprimir a minha repulsa àquele monstruoso pesadelo da Pátria”. Publicado no calor das reverberações da fatídica campanha militar de Canudos, seus relatos da guerra, convertidos em vinte cantos marcados por um lirismo de acento trágico, surpreendem e instigam o leitor a refletir e a fazer comparações acerca do tema do consagrado livro de Euclides da Cunha e de tantas outras obras.

O médico Francisco Cavalcanti Mangabeira nasceu em Salvador, em 8 de fevereiro de 1879, filho de uma ilustre família baiana, irmão do político e acadêmico da ABL e da Academia de Letras da Bahia, Octavio Mangabeira, que foi inclusive governador do estado.[1] Como poeta, Francisco Mangabeira estreou com o livro de poemas simbolistas Hostiário (Salvador, 1898) ao qual se seguiram Tragédia épica (Salvador, 1900), Visões de Santa Teresa, em Prosa, (Porto, Portugal, 1896), e, já em edições póstumas, Últimas poesias (Salvador, 1906) e Poesias (Rio de Janeiro, 1928), reunindo seus três livros do gênero.

Mangabeira, ainda estudante da famosa Faculdade de Medicina da Bahia, contava18 anos quando se alistou como voluntário e seguiu viagem, em 27 de julho de 1897, para prestar serviços médicos, nas fileiras da Quarta Expedição militar contra Canudos. Após a penosa jornada da guerra, o poeta retorna a Salvador, em 23 de outubro, e conclui os seus estudos, diplomando-se em 18 de dezembro do mesmo ano. Três meses depois seguiu para o Maranhão, para trabalhar como médico na Companhia Maranhense, daí seguindo para o Amazonas em missão oficial. Fez breve retorno a Salvador em 1902, voltando ao Norte 4 meses depois, para outra jornada na selva. Idealista, engaja-se em novas ações patrióticas viajando ao Acre, onde participa da revolução de Plácido de Castro, que teve o objetivo de incorporar aquele território ao Brasil. De saúde frágil, acaba contraindo a malária e uma rara enfermidade de pele. Debilitado pelas doenças, é levado para Manaus em busca de tratamento. Ao sentir a extrema gravidade de seu estado, resolve retornar à terra natal. Entretanto, em 27 de janeiro de 1904, o poeta falece, a bordo do vapor S. Salvador, na rota situada entre Belém e S. Luis, sendo sepultado no cemitério da capital maranhense.

Ao desaparecer, com apenas 25 anos de idade, longe dos centros literários, Mangabeira foi imediata e injustamente esquecido. Sua obra não teve voga suficiente para afirmar seu nome de forma mais ampla. De fato, ele não poderia tornar-se um simbolista de referência, porque, embora essencialmente lírico, era de certa forma um poeta híbrido. Convertido aos protocolos correntes do Simbolismo de então, era ainda assente aos fortes resquícios românticos, tão caros aos poetas baianos surgidos após Castro Alves, a grande referência dos novos. 

 O poeta teve, no entanto, uma boa acolhida por parte de críticos importantes. Brito Broca[2] registra-o como um dos poetas simbolistas da revista baiana Nova Cruzada, ao lado de Pedro Kilkerry e Carlos Chiachio, este último figura de proa do modernismo baiano e mentor da revista Arco & Flexa (1928/29). De acordo com Raimundo de Menezes, “sua poesia revela nitidamente influência simbolista”, mais precisamente em Hostiário. Já em Tragédia épica o acento íntimo é romântico, no tom de um romantismo às vezes devoto e, sobretudo, social, ao estilo castroalvino, quando se lança a descrever e a lamentar os sofrimentos dantescos dos soldados e dos canudenses, em versos retóricos e altissonantes.

O crítico Andrade Muricy destaca-o no Panorama do movimento simbolista brasileiro[3], considerando-o, em sua época, “o poeta do Norte de mais alevantado e vigoroso estro, depois de Castro Alves”. Segundo Muricy, “nenhum dos poetas simbolistas brasileiros teve existência tão agitada e heróica. Aos 25 anos já vivera intensa e gloriosamente”, o que faz lembrar a curta e agitada trajetória do autor de “Vozes d’África” e “Navio negreiro”. Aponta ainda Muricy, nos versos de Hostiário, a “fulgurante virtuosidade e uma movimentação brilhante, saudável, um pouco exterior, pouco frequente em nosso simbolismo.” O crítico destaca alguns poemas memoráveis do autor baiano, confirmando “o mérito desse notável poeta, de expressão clara, luminosa e viril”.

O historiador e acadêmico da ABL, Pedro Calmon, registra em sua História da literatura baiana que o poeta era detentor de “poderoso talento trabalhado por duas profundas emoções cívicas, a guerra de Canudos, a que assistiu como estudante de medicina, e a campanha do Acre, seu derradeiro sacrifício”. O historiador destaca ainda a sua “esplêndida espontaneidade”, que o tornava comparável aos maiores poetas. E assim conclui Calmon: “Sacudia-lhe o verso uma surpreendente energia, entre pessimista e heróica, num conjunto impressionante de amargura e força que lembravam as decepções da juventude tocada pelo infortúnio, das cenas e das almas do seu convívio, e o destino adverso, com que lutava.[4] Nesse aspecto, Mangabeira, jovem poeta e acadêmico, de curta e agitada trajetória de vida, também guarda certa semelhança com Castro Alves, uma forte influência quanto ao acento retórico de uma poesia afeita à declamação e à tribuna.

Numa avaliação recente, Massaud Moisés afirma que o poeta baiano “perfilhou o Simbolismo movido por uma espécie de identificação substancial. Soube, contudo, enriquecer os impulsos de temperamento com um caráter heróico, que a sua existência testemunha criando uma poesia vigorosa, de imagens surpreendentes, insólitas, onde repercute o exemplo baudelairiano e se notam traços antecipadores de Augusto dos Anjos”. Considera ainda que “a Tragédia épica, sua obra-prima em torno da guerra de Canudos, parece simbolizar, a partir do título, a dicotomia lírico-épica que lhe sustentava a cosmovisão.”[5]

Com efeito, são apreciações críticas muito positivas, que demonstram a necessidade de se fazer emergir a obra do poeta para que seja avaliada em seu conjunto, de modo a se definir melhor o seu lugar no panorama geral da poesia brasileira.

Ao engajar-se nas fileiras do Exército republicano, Francisco Mangabeira marchou para Canudos, numa missão paradoxal aos objetivos das tropas. Ele tinha consciência dessa condição, ao registrar, na abertura do seu livro, que o grupo de jovens voluntários cumpria, segundo suas palavras, uma “missão da Paz, da Caridade e do Amor”. Ao prestar serviço médico nos hospitais de sangue improvisados, estava empenhado em salvar vidas e minorar os sofrimentos dos homens grave ou mortalmente feridos. Como tal, foi um espectador angustiado das batalhas, vendo de perto a agonia dos moribundos. De longe, era um observador consternado com o massacre que se abatia sobre o arraial de Belo Monte. Seus poemas incorporam situações, vivências e sentimentos semelhantes aos que se observam na escrita de outros autores da época, como Manuel Benício e o próprio Euclides da Cunha. De olhos sensíveis, eles testemunharam os fatos e reagiram conforme suas convicções e percepções particulares, mas sempre com a consciência de que estavam diante de uma grande tragédia.

Em sua missão voluntária, Mangabeira seguiu sertão adentro, ao lado de seus colegas acadêmicos de medicina, entre os quais o seu grande amigo Joaquim Pedreira. Acometido de enfermidades, Pedreira veio a falecer antes do final do conflito, aos 18 anos de idade. Esse fato marcou profundamente o poeta, motivando-o a escrever uma espécie de nênia ao amigo, que constitui o canto IX, intitulado “Dolor”. Pelo mesmo motivo, Mangabeira resolveu iniciar o livro com a “Carta a um morto”. A carta registra, em tom elegíaco, sua comoção diante da morte de Joaquim Pedreira, durante aquela “assombrosa epopeia de valor que se desenrolou no sertão de nossa terra”. O seu enternecimento permeia todo o texto, acentuando-se, com uma ironia doída, em algumas das passagens em que dialoga com o amigo desaparecido, lamentando sua má sorte e o rápido esquecimento que então já recobria a carnificina de Canudos. O poeta declara, irônico e angustiado: “Se converso com um morto sobre uma desgraça da nossa Pátria, é porque os vivos parecem não ligar importância a essas futilidades”.

Os vinte cantos que compõem a Tragédia épica se seguem num movimento de contraponto, em que ora os soldados ora os sertanejos assomam à ribalta da arena poética, numa espécie de concerto de vozes e perspectivas díspares, – desiguais, em luta encarniçada –, mas consoantes, na partitura da trama – como se fossem atores de uma peça trágica.  No poema de abertura, intitulado “Adeus”, o poeta realça o sentimento e o moral dos soldados, no momento do embarque para o sertão, quando deixam a cidade, os lares, os amores e as famílias, despedindo-se “...desta querida terra/ para onde talvez não voltem nunca mais”. O canto delineia-se como um ritual de despedida, à vista da luta sangrenta que iam travar contra os canudenses. A exaltação ao heroísmo dos soldados reverbera nos versos. Eles são vistos de forma idealizada, não como um exército armado, mas como homens destemidos que desafiam a morte por força do destino. Afirma o poeta que: Vão em busca da glória ou, então, da sepultura / Este bando de herois, homens feitos leões”. Trata-se de um lamento perpassado de langor, pois não é o triunfo, mas sobretudo a morte que os espreita no sertão inóspito. Na partida, a bandeira, ao tremular: “Parece abençoar os bravos e ir lançando / Um adeus prolongado à triste multidão”.

Todos os vinte cantos suscitam interesse para um estudo de composição, pois podem ser analisados como partes que constituem o poema como um todo, fixando sua unidade de tema e de tonalidade. Os cantos obedecem a uma lógica narrativa que seleciona os pontos cruciais do assunto, confrontando posições, circunstâncias, diferenças e vicissitudes da guerra, ao tempo em que vai revelando os sentimentos e as angústias dos atores em luta. Há um canto que encerra uma curiosidade, aliás, revelada pelo próprio Mangabeira, em nota explicativa, ao final do livro. Trata-se do poema “Assalto à artilharia”, que o poeta define como “uma espécie de tradução de uma belíssima carta que o Dr. Euclides da Cunha escreveu de Canudos para o Estado de S. Paulo, onde este meu saudoso amigo derramou tanta luz em belíssimas e magistrais correspondências, que, publicadas em livro, lhe garantiriam um triunfo literário”. Dessa forma, Mangabeira já vaticinava a glória do livro vingador que Euclides lançaria dois anos mais tarde.

Ao longo da Tragédia épica, a maior focalização recai nos soldados, atores às vezes individualizados, como se observa nos cantos “Os três oficiais”, “A carta do soldado” e “A agonia do ferido”, por exemplo. A perspectiva do eu lírico narrador, como não poderia deixar de ser, traduz um ângulo de visão litorâneo, ponto de onde Mangabeira parte, engajado na campanha, à retaguarda das fileiras militares. Por outro lado, o olhar que lança sobre os canudenses é agudo ao demonstrar as dimensões desumanas da tragédia. Os sertanejos são vistos sempre como o outro, o adversário “sempre raivoso, impávido e insubmisso”. Eram eles “aquela gente bruta” que assombra o poeta pela capacidade de resistência e pelos horrores que sofre e enfrenta a cada ataque das tropas. Assim, o que mais aproxima o eu lírico dos sertanejos é a compaixão de seu olhar, ao descrever e lamentar a desgraça de crianças, mulheres e homens cruelmente dizimados pelos ataques dos soldados.

No canto IV, “A reza”, o eu lírico realça o contraste entre a paz do reduto, no momento da prece, em que “casa-se a voz dos sinos à voz das ladainhas”, em face do fogo da artilharia contra a igreja do arraial. Neste momento, os sertanejos: “Recordam os cristãos das mais antigas eras / Que, ao fogo sideral de crença verdadeira, / Afrontavam com calma os ímpetos das feras / Ou morriam a rir dentro de uma fogueira”.  Nesse diapasão, o canto XII, “O combate”, descreve os horrores da batalha final, em que dor e morte se tornam imagens dominantes. O poeta alinha os lances da luta sangrenta e desigual, em proveito de sua retórica descritiva, cujo efeito é a visão infernal da crueldade. O termo da luta é um quadro da natureza desolada: “O combate acabou, quando na imensidade / A lua apareceu triste como a orfandade”. Seguem-se não menos comiserativos os cantos intitulados “Os prisioneiros”, O incêndio, “Crianças prisioneiras” e “A caravana maldita”, acentuando o drama dos sertanejos vencidos, nos seus derradeiros estertores, e, finalmente, como séquito de prisioneiros que: “Sofrem penas, que só o inferno há de contê-las / Atravessam o céu, claro como um sorriso, / Era um cortejo louro, / Demandando o caminho azul do paraíso...”.

Os leitores e estudiosos acostumaram-se a ler e a sentir a tragédia canudense, encenada às margens do rio Vaza-Barris, através do admirável estilo euclidiano, com sua retórica retumbante, sua precisão de detalhes, sua análise incisiva, sua denúncia mordaz. Os sertões, em sua feição de documento, análise e monumento literário, ocupa o centro das atenções há mais de um século, deixando à sombra as demais obras que percorreram, cada qual à sua maneira, as mesmas trilhas esturricadas do sertão baiano. De fato, ao longo de quase onze décadas, o tratado euclidiano é o grande marco, em torno do qual continuam emergindo livros antigos e novos, para orbitar em sua auréola, como partes do grande arquitexto da Guerra de Canudos, que se compõe e recompõe, a cada texto novo que se escreve e a cada obra antiga que se reedita.

O livro de Mangabeira faz parte dessa enciclopédia canudense, ocupando um lugar relevante na coleção de registros e representações dos dramas pessoais e coletivos, das circunstâncias e vicissitudes da guerra. No seu poema, manifesta-se a voz enternecida de um homem que testemunhou a guerra e viveu na pele as motivações que o levaram a escrever sua denúncia. Sua poesia é vazada numa linguagem peculiar, viva e acessível, que demonstra seus traços de época e inscreve-se também como um estilo híbrido, entre o simbolismo da concepção formal e o desenho retórico dos quadros, de feição romântica. Capta-se na leitura a voz embargada do jovem poeta marcado pela vida, que empunha a pena para um acerto de contas com a história na qual se envolveu. Do alto das fileiras do Exército, o médico Mangabeira não enxergou simplesmente o inimigo a aniquilar, mas teve mira mais ampla, assinalando uma percepção lírica e agônica da condição humana dos sertanejos, vistos como sujeitos de uma saga, em defesa da sobrevivência, em sua espantosa resistência à destruição militar.

Em alguns pontos, a trajetória de Francisco Mangabeira se assemelha muito à de Euclides da Cunha. Ambos viveram intensamente o drama de Canudos, pisando no solo ensaguentado dos sertões baianos. Ali estiveram, em missões diferentes, porém intrínsecas à guerra. Perplexos, em meio aos tiroteios, um médico e o outro jornalista, ambos testemunharam diversos lances da tragédia. E logo assumiram o espírito de um dever social a cumprir, denunciando a guerra como um crime. Idealistas, mais tarde rumaram para as regiões inóspitas do Norte do país, engajados em ações de interesse político e social. Ambos caíram gravemente enfermos. E faleceram precocemente. Mangabeira, em plena juventude, aos 25 anos; Euclides, aos 43 anos, mal transposto o portal da maturidade. Morreram em circunstâncias diferentes, é certo; mas igualmente trágicas.

De certa maneira, pode-se considerar que a Tragédia épica representa na poesia aquilo que Os sertões representam na prosa brasileira. O poeta baiano, tal como Euclides da Cunha, caracteriza os sertanejos como jagunços ferozes, fanáticos, em situação de atraso e pobreza. Em contrapartida, também como o ensaísta fluminense, faz em seu poema elegíaco uma denúncia veemente contra a guerra, que considera fruto da inépcia do governo republicano, “onde todos, soldados e fanáticos, foram igualmente vítimas do mais lamentável erro político”.

Francisco Mangabeira teve o destino dos grandes. Como Gregório de Mattos, cantou sua terra e morreu longe dela, acometido de febre terçã. Como Castro Alves, extraiu o lirismo das próprias vivências e feneceu na flor da idade. Como Euclides da Cunha, percorreu os sertões e o Norte do país em missões de interesse público. Tal como eles, Mangabeira marcou sua escrita com uma profunda sensibilidade social, fazendo-a instrumento de ideias, sem com isso perder a grandeza. Como o autor de Os sertões, horrorizou-se e encantou-se com a epopeia de Canudos, legando à posteridade um protesto sincero, em vinte cantos líricos que ecoam a forte impressão de uma experiência real. Que os leitores de hoje, oxalá despojados de incertos ismos e preconceitos do passado, reabilitem e apreciem sua poesia, devolvendo-a à luz dos dias atuais.

(Apresentação do livro Tragédia épica (Guerra de Canudos), de Francisco Mangabeira.
Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Letras, 2010.
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Aleilton Fonseca é escritor, Doutor em Letras (USP), professor titular pleno da Universidade Estadual de Feira de Santana, membro da Academia de Letras da Bahia, da UBE-SP e do PEN Clube do Brasil.

Notas
[1] BRASIL, Assis (org., int.e no.). A poesia baiana no século XX - Antologia. Rio de Janeiro: Imago, 1999, p. 41.
[2] BROCA, Brito. A vida literária no Brasil. 1900. 3.ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1975.
[3] MURICY, Andrade. Panorama do movimento simbolista brasileiro. 3.ed. ver e au. São Paulo: Perspectiva, 1987. p. 769-777.
[4] CALMON, Pedro. História da literatura baiana. Coleção Documentos Brasileiros, v. 62. São Paulo: José Olympio, 1949, p.212.
[5] MOISÉS, Massaud.  História da literatura brasileira. 3 v., vol. II-Realismo e Simbolismo. São Paulo: Cultrix, 2006, p. 307.

Fonte:
http://www.academiadeletrasdabahia.org.br/Artigos/mangabeira.html

Tertúlia Literária Instituto Memória (26 de Março, em Curitiba)

O Instituto Memória Editora, a Juruá Editora e o BRDE – Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo-Sul convidam para mais um evento cultural que visa dar vez e voz à cultura nacional. Serão mais 12 obras literárias que teremos a honra e o orgulho de entregar à sociedade. Esta cumplicidade autor-editora que materializou este projeto em forma de livro tem como destino único o LEITOR.

Durante o evento serão sorteados DVDs do filme “O PREÇO DA PAZ”, livros PEDAÇOS DE MUITA VIDA – HISTÓRIA DOS 122 ANOS DA ASSOCIAÇÃO COMERCIAL DO PARANÁ, livros ACERVO ARTÍSTICO DA ASSOCIAÇÃO COMERCIAL DO PARANÁ, ivros CURITIBA NAS CURVAS DO TEMPO e livros O RÁDIO DO PARANÁ – FRAGMENTOS DE SUA HISTÓRIA.

Lançamento Nacional e Noite de Autógrafos das Obras:
E AGORA? – CRÔNICAS DE VIAGEM – COLEÇÃO RUMOS

Álvaro Dias (Senador) - Lígia Guerra (Psicologa, Escritora e Consultora da RPC/Rede Globo) - Marcos Meier (Educador, Escritor e Consultor da RPC/Rede Globo) - Marcos Cordiolli (Escritor, Presidente da Fundação Cultural de Curitiba) - Anthony Leahy (Escritor, Palestrante e Editor) - Eloi Zanetti (Escritor e Publicitário) – Helio de Freitas Puglielli (Jornalista e Professor UFPR) - Jocelino Freitas (Escritor e Advogado) - Neyd Montingelli (Escritora e Palestrante) - Willy Schumann (Escritor, Jornalista e Cineasta) - Carlos Fernando Mazza (Ator e Jornalista) – Adauto Suannes (Escritor e Desembargador/SP) – Sérgio Luiz Sottomaior Arzua Pereira (Escritor e Palestrante) – Inara Francisco (Psicológa e Palestrante).

A DOR DE JOANA
de Carolina Vila Nova

NOSSO ENCONTRO COM UBIRATAN LUSTOSA
Crônicas selecionadas de Ubiratan Lustosa

CRIANÇAS ROUBADAS
de Neyd Montingelli

VISLUMBRE: A HISTÓRIA DE ELIZABETH
de Rosalina Cândida Carvalho

CIDADE DOS MONGES
de Willy Schumann

VERDADE DIREITO E PODER SOB A ÓTICA DE NIETZSCHE
de RUI CARLOS SLOBODA BITTENCOURT

DANO MORAL E DIREITOS FUNDAMENTAIS
de Luiz Eduardo Gunther e Maria Francisca Carneiro

CONFLITOS COLETIVOS DE TRABALHO
de Maria Cecilia W.L. de Freitas Ahrens

ECONOMIA SOLIDÁRIA
de Marilene Zazula Beatriz

ADOÇÃO: O AMOR FAZ O MUNDO GIRAR MAIS RÁPIDO
de Hália Pauliv de Souza e Renata Pauliv de Souza Casanova

UMA ODISSEIA NO PANTANAL
de Miguel Teixeira de Oliveira


SERVIÇO:

I TERTÚLIA LITERÁRIA INSTITUTO MEMÓRIA

Data: 26 de Março de 2013

Horário: das 19h às 22h

Local: Palacete dos Leões - Av. João Gualberto, 530, Alto da Glória.

# Estacionamento interno gratuito #

Anthony Leahy – Editor
Conselheiro da Academia Brasileira de Arte, Cultura e História - SP
Membro do Instituto Histórico e Geográfico do Paraná e da Academia de Cultura de Curitiba

Site e Livraria Virtual:
http://www.institutomemoria.com.br/

Blog do Editor
http://teiadehistorias.blogspot.com.br/

Fonte:
Anthony Leahy