domingo, 3 de junho de 2012

Gonçalves Dias (Marabá)


Eu vivo sozinha, ninguém me procura!
Acaso feitura
Não sou de Tupá!
Se algum dentre os homens de mim não se esconde:
— "Tu és", me responde,
"Tu és Marabá!"

Meus olhos são garços, são cor das safiras,
Têm luz das estrelas, têm meigo brilhar;
Imitam as nuvens de um céu anilado,
As cores imitam das vagas do mar!

Se algum dos guerreiros não foge a meus passos:
"Teus olhos são garços",
Responde anojado, "mas és Marabá:
"Quero antes uns olhos bem pretos, luzentes,
"Uns olhos fulgentes,
"Bem pretos, retintos, não cor d'anajá!"

É alvo meu rosto da alvura dos lírios,
Da cor das areias batidas do mar;
As aves mais brancas, as conchas mais puras
Não têm mais alvura, não têm mais brilhar.

Se ainda me escuta meus agros delírios:
— "És alva de lírios",
Sorrindo responde, "mas és Marabá:
"Quero antes um rosto de jambo corado,
"Um rosto crestado
"Do sol do deserto, não flor de cajá."

Meu colo de leve se encurva engraçado,
Como hástea pendente do cáctus em flor;
Mimosa, indolente, resvalo no prado,
Como um soluçado suspiro de amor! —

"Eu amo a estatura flexível, ligeira,
Qual duma palmeira",
Então me respondem; "tu és Marabá:
"Quero antes o colo da ema orgulhosa,
Que pisa vaidosa,
"Que as flóreas campinas governa, onde está."


eus loiros cabelos em ondas se anelam,
O oiro mais puro não tem seu fulgor;
As brisas nos bosques de os ver se enamoram
De os ver tão formosos como um beija-flor!

Mas eles respondem: "Teus longos cabelos,
"São loiros, são belos,
"Mas são anelados; tu és Marabá:
"Quero antes cabelos, bem lisos, corridos,
"Cabelos compridos,
"Não cor d'oiro fino, nem cor d'anajá,"

E as doces palavras que eu tinha cá dentro
A quem nas direi?
O ramo d'acácia na fronte de um homem
Jamais cingirei:

Jamais um guerreiro da minha arazóia
Me desprenderá:
Eu vivo sozinha, chorando mesquinha,
Que sou Marabá!

Fonte:
BARBOSA, Fernando (seleção). Clássicos da Poesia Brasileira. SP: Klick Editora.

Casimiro de Abreu (Carolina) VII - A Última Hora


Um mês depois, nos últimos dias de agosto, Carolina gemia agonizante em Setúbal.

Que coração de mulher resistiria a tantas comoções?

Com a cabeça formosa recostada no travesseiro, firme e resignada, ouvia ela da boca do sacerdote as doces e consoladoras palavras do Evangelho.

Sobre uma pequena mesa via-se um crucifixo entre duas velas acesas, que espalhavam pelo quarto a sua claridade mortuária.

Oh! triste e solene hora do passamento! Como se patenteia então eloqüente o nada das grandezas humanas!...

— Filha, dizia-lhe o padre, com sua voz suave; lembrai-vos só de Deus, diante do Qual ides em breve comparecer. Arrependei-vos, filha, e Ele que é um Deus de bondade e misericórdia há-de perdoar-vos.

— Deus perdoa-me, padre?

— Perdoa-vos, sim, filha.

— Então morro contente; mas eu também queria levar outro perdão da terra.

— Dizei, filha.

— É o de meus pais, que eu abandonei, padre; mas eu amava-os muito.

— Também te devem perdoar, filha, porque Deus manda que se perdoe.

— Ainda falta outro, padre.

— Dizei, filha.

— É um homem que eu amei muito, padre, e que ainda amo.

— Fizestes-lhe mal, filha?

— Traí-o, padre, disse ela chorando.

— Descansa, filha, ele também te há-de perdoar.

— Meu padre, queria pedir-vos um favor.

— Falai, filha.

— É de enviardes para Lisboa a carta que está sobre aquela mesa; é o último adeus que eu digo àquele homem.

— Eu enviarei a carta, filha. Mas por que chorais? são ainda lembranças deste mundo, que vos pungem? Já vos arrependestes sinceramente de tudo: pois bem; desligai o pensamento de tudo que é terrestre, mesquinho e pequeno, e pensai em Deus, sublime e grande.

— Padre, padre, eu vou morrer! repeti-me que Deus me perdoa.

O padre aproximou-se e curvado sobre o leito dizia-lhe:

— Minha filha, Deus é bom, Deus perdoa quando Seus filhos se arrependem como vós vos arrependestes.

— Minha pobre mãe, adeus! murmurava a agonizante, perdoa a tua filha, meu pai!

Depois um tremor percorreu-lhe os membros, um soluço saiu de seu peito e fazendo um último esforço disse: adeus... Au... gus... e a voz expirou-lhe nos lábios e a cabeça pendeu para o lado, sem um gemido.

Estava morta.

O padre contemplou-a um instante, mudo e enternecido.

— Morreu! disse ele enxugando uma lágrima, ainda tão jovem! Foi o mundo que a matou.

EPÍLOGO

Alguns dias depois, Augusto, trêmulo, abria uma carta fechada com obreia preta, e lia:

Adeus, Augusto: quando leres esta carta já estarei morta. Consola meu pai e minha mãe, se os vires. Não amaldiçoes a minha memória! Morro beijando o teu retrato, que levo comigo ao túmulo. Adeus! ora por mim!

CAROLINA”.

— Sim, sim, disse o mancebo, caindo de joelhos e juntando as mãos, eu oro por ti. Que Deus te perdoe como eu te perdoei.

FIM

( O Progresso, números 351 e 352, respectivamente
de Lisboa, 12 e 13 de março de 1856).

Fonte:
ABREU, Casimiro de. Carolina. in SILVEIRA, Sousa da (org.). Obras de Casimiro de Abreu. 2ª ed. Rio de Janeiro: Ministério da Educação e Cultura -MEC, 1955. Texto-base digitalizado por: Fernanda Duarte, Rio de Janeiro – RJ

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 567)


Uma Trova de Ademar

Se o livre-arbítrio é uma escolha,
eu não vendo outra saída,
alterei folha por folha
do livro da minha vida.
ADEMAR MACEDO/RN

Uma Trova Nacional
Nunca supus que a saudade
tivesse um tiro certeiro!
Em vez de matar metade,
me matou foi por inteiro.
ANTONIO COLAVITE FILHO/SP

Uma Trova Potiguar

Meus sonhos não morrerão,
pois não são de fantasia,
são sonhos “tipo padrão”
com selo de garantia.
JOÃO MEDEIROS/RN

Uma Trova Premiada

1990 > Fortaleza/CE
Tema > CASCALHO > M/H.

Teu amor – lamento agora,
ante a bateia perdida,
foi ouro que eu joguei fora
entre os cascalhos da vida!
ARLINDO TADEU HAGEN/MG

...E Suas Trovas Ficaram

Vejo o mundo, hoje, um complexo
de dor e angústias sem nome,
dominado pelo sexo;
torturado pela fome!

WALDIR NEVES/RJ

Uma Poesia

Eu queria vencer esta corrida
sem estresse e passando pelos flancos,
mas o tempo é carrasco e não perdoa
bate duro, me dando solavancos;
todo dia provoca o meu desgosto,
costurando outra ruga no meu rosto
e aumentando estes meus cabelos brancos.
PROF. GARCIA/RN

Soneto do Dia

"A Um Amor Impossível"
TÊULA ATHAIDE/MG

Ah! meu amor quem dera eu te esquecesse
Se nunca mais pudesse me lembrar!
Talvez, quem sabe, eu hoje não sofresse
toda essa imensa angústia de te amar.

Se nossas vidas fossem uma vida,
nossos destinos fossem dois num só,
não estaria assim, tão ressentida,
por ver meu sonho reduzido a pó.

Mas, se minha alma a tua for buscar
noutra existência então, hás de notar
até que ponto a vida me magoou.

Mas, perdoar-te, meu amor não posso
porquanto o erro não foi teu - foi nosso
e do destino que nos separou ...

4º Concurso de Contos Ler&Cia - Grupo Livrarias Curitiba - Revista ler&Cia (Resultado Final)


O IV Concurso de Contos ler&Cia recebeu 865 inscrições entre os meses de Março e Abril de 2012.

A seleção foi realizada por 3 jurados e foram selecionados os seguintes contos:

Nilton Silveira - Pois é, comadre... (Porto Alegre-RS)

Luís Roberto de Souza - Sobre o não-dito (Porto Alegre-RS)

Franco Caldas Fuchs - Casca Grossa (Curitiba-PR)

Sérgio Bernardo - Fora de concentração (Nova Friburgo – RJ)

Rafael Budni - A condição humana (Curitiba-PR)

Murilo Bevervanso Lense – Dórian (Curitiba-PR)

Cada autor receberá o prêmio de R$ 500,00 em vale-compras e terá o seu conto publicado em uma edição da revista ler&Cia entre de Julho de 2012 a Maio de 2013.

Agradecemos a todos que participaram e parabenizamos os autores dos seis contos selecionados.

Parabéns!

Grupo Livrarias Curitiba

Fontes:
http://www.livrariascuritiba.com.br/content.aspx?idChannelType=3&idChannel=22 
http://concursos-literarios.blogspot.com  

sábado, 2 de junho de 2012

Millôr Fernandes/ RJ (Poesia Matemática)


Às folhas tantas
Do livro matemático
Um Quociente apaixonou-se
Um dia
Doidamente
Por uma Incógnita.
Olhou-a com seu olhar inumerável
E viu-a, do Ápice à Base,
Uma Figura Ímpar;
Olhos rombóides, boca trapezóide,
Corpo otogonal, seios esferóides.
Fez da sua
Uma vida
Paralela a dela
Até que se encontraram 
No Infinito.
"Quem és tu?"indagou ele
Com ânsia radical.
"Sou a soma dos quadrados dos catetos.
Mas pode me chamar de Hipotenusa."
E de falarem descobriram que eram
- O que, em aritmética, corresponde
A almas irmãs -
Primos-entre-si.
E assim se amaram
Ao quadrado da velocidade da luz
Numa sexta potenciação
Traçando
Ao sabor do momento
E da paixão
Retas, curvas, círculos e linhas sinoidais.
Escandalizaram os ortodoxos das fórmulas euclideanas
E os exegetas do Universo Finito.
Romperam convenções newtonianas e pitagóricas.
E, enfim, resolveram se casar
Constituir um lar.
Mais que um lar,
Uma perpendicular.

Convidaram para padrinhos 
O Poliedro e a Bissetriz.
E fizeram planos, equações e diagramas para o futuro
Sonhando com uma felicidade
Integral
E diferencial.
E se casaram e tiveram uma secante e três cones
Muito engraçadinhos
E foram felizes
Até aquele dia
Em que tudo, afinal,
Vira monotonia.
Foi então que surgiu
O Máximo Divisor Comum
Freqüentador de Círculos Concêntricos.
Viciosos.
Ofereceu-lhe, a ela,
Uma Grandeza Absoluta,
E reduziu-a a um Denominador Comum.
Ele, Quociente, percebeu
Que com ela não formava mais Um Todo,
Uma Unidade. Era o Triângulo,
Tanto chamado amoroso.
Desse problema ela era a fração
Mais ordinária.
Mas foi então que o Einstein descobriu a Relatividade
E tudo que era expúrio passou a ser
Moralidade
Como, aliás, em qualquer 
Sociedade.


Fonte:
Jornal de Poesia

Alexandre Drayton (Domingo de chuva)


 Domingo, mais um dia como tantos outros, no frio janeiro da Cidade Luz. Dia de lavar a roupa suja, de tentar arrumar a bagunça (permanente!) da casa, de passar o pano no chão, de pensar na semana que começa. Um momento de reflexão desleixada, de estudar o atrasado, dia diferente talvez. 

É pena que a meteorologia não ajudou, empurrando todo mundo algumas horas a mais na cama. Vento, chuva, frio e tempo cinzento podem vencer a idéia de visitar um museu gratuitamente, como é o caso do primeiro domingo de cada mês. E sou capaz de apostar que muitos cederam à tentação da preguiça e, absortos neste clima envolvente, em pouco ou quase nada pensaram.

 E comigo não foi diferente. Até que a físico-química dependência de “checar“ o e-mail, fez-me vir ao tal computador. Eis-me aqui, sem sono e com o estoque de sites a visitar esgotado, tentando escrever algo que tenha sentido ao fim.

 Experimento dar uma sacudida e animada no espírito, saindo um pouco para espiar o tempo. Teve jeito não: as amigas ventania e temperatura baixa me receberam com pompa e circunstância. Sem outra opção entrei, e teimoso como sou, recomecei a teclar.

 Foi difícil não sentir o que se tenta afastar num dia como esse: a tal da cruel saudade. Palavra impar, que dizem só existir em português, chegou sem pedir licença. Entrou, puxou a cadeira e, saboreando um café amargo com Malboro ligths, pôs-se a me incomodar. Esboçando uma resistência esqueço-me dela por longos segundos, ao fim dos quais recebo um direto de direita, perdendo por nocaute.

 Numa ultima tentativa, ensaio comparar àquela do inicio, quando cheguei, essa de hoje. Queria ver se tinha amadurecido, se era mais forte, se podia vir a ser exemplo para os amigos recém-desembarcados. Uma vez mais, o gongo deu-lhe ganho de causa. Houvera de fato apenas uma mudança de nomes, pois a antiga Senhora Saudade hoje se chamava La Madame Nostalgie.

 E assim continuei a senti-la, na certeza de que uma vez mais um mundo de lembranças viria-me à mente. Pensei na família distante, nos amigos que ha’ muito não vejo, em praia, na comidinha gostosa do fundo da panela. Imaginei coisas simples, lugares comuns, mentiras infantis e os tempos de infância. Em verdade, senti-me só.

 Vi, portanto, que solidão e saudade são almas gêmeas. Velhas conhecidas de outrora, promovem incômodos e aleatórios encontros, onde tentam desafiar o sorriso e a alegria, banindo-os para longe algumas vezes. E foi justamente num desses rendez-vous casuais em que vi-me metido. Pensei poder sair de fininho, mas ao final do corredor encontrei porta fechada.

 Não existia outra alternativa, a não ser mascar feito chiclete e digerir sozinho minha angústia. Injusto seria fazer conjecturas, pois tristeza que se preze não se explica, sente-se. E caminhando por essa mesma estrada, imaginei os milhares de solitários mundo afora: habitantes de um mesmo universo, do grande consciente coletivo poeticamente chamado “la solitude”.

 Mas percebi que esta mesma solidão, inenarrável, dura e difícil, tinha outras facetas. Não era a maior de todas, pois conseguia guardar traços de beleza dentro de si. A maior solidão, na verdade, é dos quem não amam e fecham-se no absoluto vazio do nada. Solitários são aqueles que temem a ajuda mútua e que não partilham com o próximo os pequenos segundos da vida. Triste e mísero é o homem que evita sentir suas emoções, permutando solidariedade com egoísmo. A maior solidão é a dos que não acreditam e fazem de seus sentimentos algo torpe, que reflete o amargo e apaga a luz do bem-viver. Solidão real é aquela do infeliz que perdeu suas esperanças, vivendo um pesadelo constante, permeado de pseudo-angústias e cego em relação ao belo mundo ao seu redor.

 Eu, do alto dessas tolas idéias, acreditando na vida e num mundo melhor, vi-me um feliz e pequeno solitário, nada mais. Pois, como bem disse o poetinha:

 — “A fé desentope as artérias; a descrença é que dá câncer“.
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Alexandre Drayton, nascido em Fortaleza (CE),  enquanto se especializava na área médica na França, encontrava tempo, em “domingos de chuva”, para escrever crônicas sobre os acontecimentos cotidianos e, sobretudo, a saudade que se abate sobre os que vivem longe de sua pátria.

Fonte:

Sotero Silveira de Souza (O Trovador da Lira Triste) 2


É triste sentir saudade,
De você que amo tanto,
E passar a mocidade,
Sem gozar de seu encanto!

Eu quero a minha cova,
Se de mim lembrar alguém,
Que coloquem esta trova;
Morreu só sem ter um bem!

Meu barquinho pequenino,
Que perdeu-se no alto do mar,
E encontrou o seu destino,
No farol do teu olhar!

O seu braço pequenino,
Com pulseira de brilhantes,
Tem guiado o meu destino,
Por caminhos tão distantes!

Ribeirão que vi correndo,
Para as bandas do sertão,
Diga-lhe que estou morrendo,
E suplico o seu perdão!

Dizem que o amor é um hino,
No conceito universal;
Sempre houve desafino,
Neste hino nacional!

Se acabassem os abrolhos,
E os abismos do mar,
Restariam só  teus olhos,
Tão difíceis de sondar!

Sob a sombra do arvoredo,
Te veijei na noite calma;
Não te aflijas é segredo,
Já aguardei aqui na alma!

Ah! Se Deus me desse sorte,
De seguir todos os teus passos,
Eu quisera ter a morte,
No madeiro dos teus braços!

Meu bem por caridade,
Não me deixes por favor,
Como pode haver maldade,
Na corola de uma flor!

Saudade levo da vida,
Que junto a ti vivi,
Saudade minha querida,
Dos beijos que eu dei em ti!

Beijo poema encantado,
Doce, tão cheio de ardor,
Por isso és consagrado,
O áureo selo do amor!

Lábios, refúgio de amor,
Bálsamo para apaixão,
Delicados como a flor,
Em forma de coração!

Lábios fonte de carinho,
Vermelhos, cor de coral,
Sois igual a um quente ninho,
Entre as rosas de um rosal!

Ao criar Deus a mulher,
De uma costela de Adão,
Pôs uma pedra qualquer,
Em lugar do coração!

Não vou àquele dentista,
Nem que Deus do céu me mate,
Ele é muito saudosista,
Só extrai com alicate!

MInha vida de solteiro,
Foi de fato acidentada;
Trabalhava o ano inteiro,
E no fim nada tinha!

Encontrei um vagabundo,
Soluçando sem cessar,
Porque soube que o mundo,
Estava prestes a acabar!

Ganho bem no meu trabalho,
Que é útil e vital,
Sou um bamba no baralho,
Jogador profissional!

Há homens como gilete,
Que tem cortes dos dois lados;
De noite pintam o sete,
E de dia comportados!

Um médico inteligente,
Como aquele eu nunca vi,
Tem matado muita gente,
Na ponta do bisturi!

No dia em que casei,
Alguém me disse a meio tom;
Custou mas eu te enforquei;
Tu vais ver o que é bom!

Quando Deus criou o mundo,
Descansou como um qualquer;
O homem em um segundo,
Reclamou pela mulher!

Cai a chuva promissora,
Corre forte a enxurrada,
Vou casar com professora,
Para ter a vida folgada!

A crise ninguém resiste,
Do povo ninguém tem dó;
Este dito já existe,
No tempo da minha avó!

Minha vida é uma novela,
De dor e sofrimento,
Desde o dia que com ela,
Me uni no casamento!

Se porventura eu crescer,
E conseguir posição,
Voltarei para agradecer,
Quem me faz perseguição!

Vi muita gente viver,
Com orgulho e aparatos,
E que no dia de morrer,
Não levou nem sapatos!

Uma coisa que redime,
O réu dando-lhe perdão,
É quando ele faz o crime,
Defendendo o seu irmão!

Não é fácil fazer trovas,
Ainda mais ser trovador,
Descobri idéias novas,
É difícil meu senhor!

O que mais quero no mundo,
Os meus mais loucos anseios,
É repousar um segundo,
Na almofada dos teus anseios!

Vem matar a minha mágoa,
Não precisa ter vexame;
Vem aqui, meu pingo d'água,
Na verde folha de inhame!

Os teus lábios vermelinhos,
Que beijo com adoração,
Às vezes, são como espinhos,
No meu pobre coração!

Meus primeiros desenganos,
Feriram-me o coração,
Quando eu vi, aos cinco anos,
O meu pai em um caixão!

O sofrimento não basta,
Para um ser tão pobrezinho;
Oh! Como a vida é madrasta,
Para aquele orfãozinho!

Corre o rio docemente,
No seu líquido caminho,
Dentro dele, indolente,
Vai gozando o meu barquinho!

Sim, tolo é o mortal,
Que confia na mulher,
Seu veneno é fatal,
Igual a uma cobra qualquer!

É doce sentir saudades,
Das serestas madrigais,
Da infância, da mocidade,
Que não volta, nunca mais!

A farmácia, hoje em dia,
É a melhor das profissões;
Basta açúcar e água fria,
E um bocado de limões!

Relógio, meu companheiro,
Que faz tic-tac sem parar,
Paralisa o teu ponteiro,
Pro meu bem não acordar!

O trabalho, meu amigo,
Dizem que é oração,
Conversa, é um castigo,
Pelo pecado de Adão!

No jogo, como no amor,
Existe o perde e ganha;
Em um, perde-se o valor,
No outro, só vergonha!

A saudade e a tristeza,,
Andam juntas pela vida;
Uma, trazendo a incerteza,
A outra, fazendo ferida!

O trabalho é um dever,
E não quero discordar;
Porém melhor seria ser,
Passarinho pra voar!

A violeta perfumada,
Vive oculta e triste assim,
Porque é apaixonada,
Pelo cravo e o jasmim!

A flor saudade é linda,
Tão meiga de roxa cor,
Mas triste se torna ainda,
Quando é a saudade de amor!

Para uns, o amor é aventura,
Para outros, é loteria,
Para muitos é loucura,
Para mim, é grande alegria!

O amor é tão complicado,
Malicioso e enganador,
Como um espinho aguçado,
Na haste de alguma flor!

Saudade, ninguém resiste,
O seu travo de amargador!
Adeus, que palavra triste,
Para quem ama com fervor!

O homem mau, avarento,
Explora até os seus;
Por isso, que eu contento,
Com a vontade de Deus!

Meu amor, sou marinheiro,
Vivo longe, em alto mar;
No meu peito aventureiro,
O teu nome eu vou gravar!

Violão, meu companheiro,
Meu amigo sem igual,
Quem cortou meu cajueiro,
Lá no fundo do quintal!

Na hora em que me casei,
Despedi-me dos meus pais;
Do caminho acenei,
Adeus, pra nunca mais!

Por que cantas à tardinha,
Meu querido sabiá? 
Ao ouvir tua modinha,
Que saudade me dá!

Para que temer a morte,
Se ninguém pode escapar,
Talvez a gente tem sorte,
De ir para um bom lugar!

As coisas mais belas do mundo,
É o amor e a saudade;
O que marca mais profundo,
É o dom da caridade!

Tive muitos amores,
Vividos na vida ao léu,
Uns sepultados com flores,
Será que os verei no céu!

Eu vi os pombos risonhos,
Que fugiram dos pombais,
Iguais os meus lindos sonhos,
Que não voltaram jamais!