terça-feira, 25 de março de 2025

José Feldman (1954) Biografia atualizada

  

José Feldman nasceu na cidade de São Paulo, no dia 27 de setembro de 1954. Aos 6 anos de idade aprendeu a jogar xadrez com seu pai. Desde os 10 anos mostra aptidão para a escrita, ao escrever pequenos contos baseados em personagens de história em quadrinhos. Com cerca de 13 anos de idade, escreve as suas primeiras poesias. Na época já lia muitos livros e revistas.

Primeiros livros foram a coleção de Monteiro Lobato dada por seu pai. Aos 12 anos se apaixonou por paleontologia e arqueologia ao ler o livro Romance da Terra, de Rudolf Thiel. Com cerca de 15 anos de idade participou de concursos de poesia sem sucesso. Desde 1973, com uma fome enorme de conhecimento, realizou vários cursos, como Filosofia no Instituto Palas Athena, Italiano na Associação de Cultura Afro-Brasileira, Inglês no Instituto Roosevelt e Instituto Norte Americano, Leitura Dinâmica e Desinibição e Criatividade, no Instituto Dynamics Cymel, Arte Dramática no Instituto Macunaíma, Filosofia no Centro de Estudos Filosóficos Pró-Vida, além de diversas palestras e encontros de literatura.

Em 1975, devido a enfermidade de seu pai, auxilia-o na direção de clube de xadrez no Instituto Cultural Israelita Brasileiro (ICIB), assumindo definitivamente a diretoria em 1978, sendo reeleito sucessivamente até o ano de 1996. Neste período, foi também auxiliar de diretoria, arbitro e professor de xadrez no Xadrez Clube Sorocaba e no Clube de Regatas Tietê. Foi jogador no 3. tabuleiro pelo ICIB em Torneios Interclubes a nível regional e nacional e 1. Tabuleiro pelo Xadrez Club Sorocaba na Categoria Especial.

Também, no ICIB, pertenceu à diretoria cultural, promovendo diversos eventos musicais, revelando talentos musicais dos jogadores do departamento de xadrez. Neste período começa a dar maior ênfase também à literatura, ao fazer, na Casa Mário de Andrade (Oficina da Palavra) o curso de Poesia Viva, com a poetisa Eunice Arruda, curso de literatura com Mario Amato, Ficção Cientifica na literatura e no cinema com o escritor de renome internacional, André G. Carneiro, além da Oficina de trovas com Izo Goldman.

No xadrez, como organizador, diretor, arbitro, granjeou a admiração e o respeito de grandes jogadores, o que o fez elevar o clube da 3ª categoria para a categoria especial. Criou também um boletim enxadrístico denominado “J’Adoube” (eu arrumo), direcionado a todos os níveis de jogadores, com partidas, notícias, estudos, piadas enxadrísticas, etc., e com tempo obteve a adesão de colaboradores com desenhos artísticos, poemas, etc. (na época não havia computador, era tudo na máquina de escrever e mimeógrafo).

Entregue de corpo e alma à literatura, continuou tentando ainda concursos de poesia na Livraria Freitas Bastos e Scortecci, mas ainda sem sucesso. 

Casou-se em 1995 com a poetisa, escritora e tradutora paranaense Alba Krishna Topan, a qual conhecera no curso de Ficção Científica, na Casa Mario de Andrade. Foi em 1999 para Curitiba, onde ficou longe da literatura e do xadrez. Não conseguindo se adaptar ao clima, mudou-se para a cidade de Ubiratã, a cerca de 70 km de Cascavel (PR).

Em Ubiratã, começou a se firmar ao ser eleito em 2001 como vice presidente da diretoria provisória, da Associação dos Literatos de Ubiratã (ALIUBI), tendo contato com poetas da região. Foi um dos fundadores da Associação de Cinema Amador na cidade.

Em 2003, começou a se dedicar ao estudo de Administração de Empresas, realizando cursos no SEBRAE, SENAI, Universidade de Viçosa e vários outros, tendo sido diplomado em dezenas de cursos na área administrativa e participado de palestras até os dias atuais.

Participou de concursos de contos em Portugal e França. Também participou de torneios de xadrez regionais, sagrando-se campeão, terceiro e segundo lugares, respectivamente, em 3 torneios em três anos consecutivos.

Criou o Blog Pavilhão Literário Cultural Singrando Horizontes (http://singrandohorizontes.blogspot.com/) seguindo os mesmos moldes do boletim, com muito mais conteúdo, postados diariamente, iniciado ao final de dezembro de 2007.

Com isto, começou a ficar mais conhecido devido a sua divulgação dos escritores, sendo convidado no mês de junho de 2008 a efetuar uma palestra na Academia de Letras de Maringá, onde discursou sobre o Panorama da Literatura no Brasil. Muitos escritores começaram a enviar seus textos e livros para apreciação crítica. 

Em novembro de 2008, a convite do escritor Sorocabano Douglas Lara, passou a ser membro da ONE (Ordem Nacional dos Escritores), recebendo juntamente com sua esposa, o medalhão das mãos do presidente da ONE, José Verdasca, em 2008, em Sorocaba.

Nas palavras de Vãnia Ennes, de Curitiba/PR: "É com grata emoção que a diretoria Estadual do Paraná vem acompanhando seu magnífico trabalho, há mais de 1 ano. Dia após dia, Feldman, você se supera na arte de produzir, criar e disseminar a cultura poética e literária no âmbito nacional e internacional. Cada vez mais, podemos observar a sua sensibilidade que está exposta, claramente, no Pavilhão Literário Cultural Singrando Horizontes, desde dezembro de 2007 a março de 2009 e que muito orgulha o nosso Paraná. É um belíssimo desempenho cultural!!! A oportunidade de poder apreciar seu site, ler, reler, participar, aprender com ele, são atitudes que nos induzem seguir adiante e, nos fazem muito bem. Portanto, receba nossos mais calorosos aplausos ."

Em 2011 mudou-se definitivamente em Maringá/PR, com sua esposa Alba Krishna, gatos e cadelas. 

Foi Consultor Educacional atuando junto a alunos e professores de cursos de bacharelado, mestrado e doutorado de diversas universidades do Paraná e São Paulo.

Em 2015, a convite do Conde Carlos Ventura passou a pertencer como Imortal Correspondente na Academia de Letras Brasil-Suiça, cadeira n. 145, escolhendo o patrono: Mário Quintana. Ocasião em que foi agraciado com a Medalha de Mérito Cultural Euclides da Cunha desta academia.

Em 2017, a convite do presidente Luís Antonio Cardoso, da Academia Rotary de Letras, Artes e Cultura (ARLAC) de Taubaté/SP, tornou-se Acadêmico Correspondente no Grau de Oficial (1. Grau), quando lhe foi conferido também o Prêmio "Mahatma Gandhi" de Liderança pela Paz, da Academia Rotary de Letras, Artes e Cultura de Taubaté/SP

A. A. de Assis, de Maringá/PR diz:
“Há uma palavra moderninha – bookaholic, que na verdade nem é tão moderninha assim, porém me pareceu com jeito de chique e vem aqui a calhar. Foi a melhor maneira que achei para definir o escritor, pesquisador e animador cultural José Feldman, paulistano radicado há alguns anos em Maringá. Bookaholic é a pessoa excessivamente apaixonada por livros. Em português, um sinônimo próximo seria bibliófilo. Feldman é assim: gosta de cães e gatos, mas sua paixão enormemente maior é pelos livros. Lê tudo, em todos os momentos disponíveis. E quase tudo que lê ele transcreve em seus vários blogues, para alegria de milhares de leitores. Ele é o maior divulgador de textos alheios via internet. O maior propagador da arte literária no país.”

Em 2021, o presidente Luiz Antonio Cardoso, da Academia Internacional da União Cultural, o empossa como acadêmico.
 
Ainda neste ano funda a Confraria Brasileira de Letras junto com um artista plástico de Curitiba, que falece neste mesmo ano, uma academia virtual, assumindo então a Presidência desta entidade.

Participou da Comissão Julgadora de diversos Concursos de Poesias.

Assina seus escritos/versos pela cidade de Floresta, vizinha de Maringá..

Quando não está imerso na literatura, tem por hobby tocar Saxofone, Clarinete e Flautas barroca, germânica, contralto e celta.

Nas palavras de Carolina Ramos, de Santos/SP: 
”Quando se tem um ideal na vida, tudo parece mais fácil de ser realizado. Só assim, é possível explicar a capacidade ímpar de José Feldman em levar avante a tarefa espontânea à qual, há tanto tempo, se entrega, na missão auto imposta de espalhar poesias e textos de seus amigos e irmãos de jornada, por este Brasil afora. É isto o que Feldman faz, passando por cima de seus próprios problemas e cansaços, fazendo, do bondoso coração, um ninho de afetos que a todos acolhe com fraternal carinho, estendendo ainda sua ternura aos cães e gatos que lhe servem de companhia através da vida. 

Em audaciosa imagem, José Feldman é uma espécie de “gralha azul” que, em vez de semear pinhões, semeia letras e versos, reflorestando o Brasil com esse viço poético que desperta a sensibilidade - em tempos atuais, sob constante ameaça de ser sufocada pelo árido e pesado concreto do dia-a-dia. 

Sensível, sofrido, faz ele de sua vida um barco que enfrenta tempestades e mares revoltos, com o estoicismo de poucos, e, sem esmorecer, digita, altas horas, as páginas que cria, repletas de obra alheia e, nas quais, quem menos aparece é seu próprio nome. 

Difícil enumerar, sem pecado de omissão, os inúmeros blogs e jornais virtuais por ele criados e alimentados com dedicação digna de ressalto. Entre eles: - Pavilhão Literário Singrando Horizontes, O Voo da Gralha Azul, Coleção Memória Viva, Paraná Poético, Almanaque Paraná, Chuva de Versos, etc. 

Afetivo e impulsivo, por vezes, Feldman não hesita em dar um passo atrás para desfazer mal entendidos, ciente de que, o caminhar por esta vida, não nos isenta de tropeços que uma amizade sincera não possa suplantar. Este é José Feldman, cujo coração fraterno bate mais forte pelos que o cercam, do que, na verdade, em proveito próprio.” 

Algumas Premiações Literárias:

Poesias:

- III Prêmio Literário Gonzaga de Carvalho. ALTO (Academia de Letras de Teófilo Otoni). 10. Lugar. 2018.
- IV Prêmio Literário Gonzaga de Carvalho. ALTO (Academia de Letras de Teófilo Otoni). 12. lugar. 2019.
- 30. Concurso Internacional de Poesias, Contos e Crônicas da ALPAS (Academia Internacional de Artes, Letras e Ciências "A Palavra do Século XXI"). 2019.
- Concurso Literário Virtual da ALAP, Academia de Letras e Artes de Paranapuã/RJ. 1. lugar. 2020.

Entidades as quais pertence:

- Confraria Brasileira de Letras (CBL) Cadeira n. 1 - Patrono: André Carneiro - Presidente Nacional.
- Academia de Letras de Teófilo Otoni/MG (ALTO) - Acadêmico correspondente
- Academia Rotary de Letras, Artes e Cultura (ARLAC) de Taubaté/SP - Acadêmico Correspondente no Grau de Oficial (1. Grau)
– Academia Internacional da União Cultural – Acadêmico titular
- Movimento União Cultural - Conselheiro Internacional
- Academia Virtual Brasileira de Trovadores – Acadêmico titular
- Confraria Luso-Brasileira de Trovadores – Acadêmico titular
- Associação dos Literatos de Ubiratã (ALIUBI) (vice-presidente 2001 - 2003).
- Academia de Letras Brasil-Suiça . Cadeira n. 145 - Patrono: Mário Quintana
- Ordem Nacional dos Escritores (ONE).
- União Hispanomundial de Escritores (UHE).
- Casa do Poeta Lampião de Gaz, de São Paulo.
- Sociedade Mundial dos Poetas.
- Ordem dos Cavaleiros Templários (OCT).
- Ordem Sagrada do Templo e do Graal (OSTG).
- Antiga e Mistíca Ordem Rosae Crucis (AMORC).

Honrarias:

- Medalha de Mérito Cultural "Euclides da Cunha" da Academia de Letras Brasil-Suiça, em Berna/Suiça. 2015;
- Comenda por Mérito Cultural da Academia Pan Americana de Letras e Artes. 2016;
– Mérito Cultural da Academia Brasileira de Trovas. 2016;
- Prêmio "Mahatma Gandhi" de Liderança pela Paz, da Academia Rotary de Letras, Artes e Cultura de Taubaté/SP. 2017;
- Prêmio "Monteiro Lobato" do Movimento União Cultural. 2018.

E-books que organizou:

- Almanaque O Voo da Gralha Azul (16 números)
- Boletim Literário Singrando Horizontes (13 números)
- Almanaque Chuva de Versos (475 números)
- Almanaque Paraná (12 números)
- Folhetim Literário Desiderata (10 números)

Ebooks de sua autoria:
- Labirintos da vida.
- Peripécias de um jornalista de fofocas & outras histórias.
- Dissecando a magia dos textos: Contos e Crônicas.
- Devaneios poéticos.

Livros publicados:
– Guirlanda de Versos.
– Coleção Terra & Céu. José Feldman e Izo Goldman(organizada por Milton Souza)

Poesias em alguns livros de outras autorias:
- Revista Literária da Academia de Letras de Teófilo Otoni, Café com Letras (poesia). 2013.
- Edição comemorativa de 35 anos do Movimento Poético em São Paulo (poesia). 2016.
- Coletânea dos Poetas de Maringá - IV. (poesia). 2016.
- Luciano Dídimo (org.). 100 sonetos de 100 poetas. 2019.
- XV Coletânea de Poesias da ALIUBI (poesia). 2019.
- Sandra Veroneze (org.). Poetas pela paz (poesia). 2020.

Possui o blog http://singrandohorizontes.blogspot.com.br em atividades desde 2007, com cerca de 20.000 artigos e uma média de 7 mil leitores/mês, e mais de 3.500.000 leitores.

Contatos, colaborações pelo email: gralha1954@gmail.com

segunda-feira, 24 de março de 2025

José Feldman (Guirlanda de Versos) * 28 *

 

Mensagem na Garrafa = 138 = A Ilusão da Superioridade


AUTOR ANÔNIMO
A Ilusão da Superioridade

Dizem que a pedra é dura,
mais duro é o teu coração;
ela é dura, na verdade,
mas não faz ingratidão.
(Quadra anônima)
* * *

Na vastidão da criação literária, a poesia ocupa um espaço sagrado, onde a alma humana se expressa em versos, emoções e imagens. Contudo, quando a pessoa se vê como o centro do universo, sua visão pode se transformar em um espelho distorcido de sua própria prepotência. Essa figura, que se julga superior e detentora da verdade absoluta, é um exemplo perturbador das desvantagens de uma perspectiva egocêntrica.

Esta pessoa, envolta em suas convicções, acredita que suas palavras são verdadeiras epifanias, superiores a qualquer outra forma de expressão. Ela se coloca em um pedestal, onde a humildade e a vulnerabilidade são deixadas de lado em favor de uma autoconfiança exacerbada. Essa posição não apenas a aliena de suas contemporâneas, mas também a isola em um mundo onde a empatia e a compreensão são substituídas pela crítica e pelo desprezo.

Uma das desvantagens mais evidentes dessa postura é a tendência de julgar os outros com base em suposições e preconceitos. A pessoa, convencida de sua superioridade, se sente no direito de criticar e avaliar o trabalho alheio sem considerar o contexto e as experiências que moldaram cada autor, sem respeitar os sentimentos dos outros, atacando, julgando e condenando indiscriminadamente. Essa abordagem é, em essência, uma negação da complexidade da vida humana e da riqueza de suas narrativas. Ela ignora que cada um traz consigo um universo de vivências que influenciam sua vida.

Quando a pessoa se permite julgar, ela não apenas desmerece o trabalho dos outros, mas também fecha as portas para o diálogo e a troca de ideias. Assim, a pessoa se priva não apenas da sabedoria alheia, mas também da possibilidade de crescimento pessoal e artístico.

A crença de que se possui a verdade absoluta é uma armadilha perigosa. A pessoa prepotente, ao se colocar como a voz da razão, ignora a natureza multifacetada da verdade. A realidade é composta por uma infinidade de experiências subjetivas, e a arte é uma expressão dessas realidades. Quando ela se recusa a reconhecer isso, transforma suas palavras em um ato de arrogância em vez de um convite à reflexão.

Enquanto a pessoa se vê como superior, ela ignora que a verdadeira força reside na capacidade de tocar o coração das pessoas, de se conectar com elas em um nível profundo e significativo.

Ao criticar e afastar os outros, encontra-se cada vez mais isolada, e seu trabalho se torna um reflexo de sua própria alienação. A arte, que deveria ser uma forma de comunicação e de união, transforma-se em um grito solitário, ecoando em um espaço vazio. A falta de diálogo e de troca de experiências resulta em uma produção que, embora técnica e esteticamente correta, carece de profundidade emocional e de relevância.

A verdadeira grandeza não está em se colocar acima dos outros, mas em reconhecer a beleza e a complexidade da experiência humana. Quem abraça a humildade, que se permite ouvir e aprender, enriquece sua própria arte e se torna um canal mais profundo para a expressão de sentimentos universais.

A pessoa com esta visão de superioridade, embora possa ser tentadora como um escudo contra a vulnerabilidade, é uma armadilha que aprisiona a pessoa em um ciclo de solidão e superficialidade. Ao se julgar o centro do universo, ela se isola de um mundo rico e vibrante, repleto de experiências que poderiam enriquecer sua arte.

Esta pessoa não consegue enxergar além de seu nariz, e só consegue visualizar seu reflexo no espelho, ignorando um vasto mundo ao seu redor.

Eduardo Affonso (Conceição)

Tom Jobim era fã de Villa-Lobos, e um dia conseguiu ser apresentado ao seu ídolo.

— Villa, este é o Antônio Carlos Jobim, autor da música da peça “Orfeu da Conceição”.

— Ah, sim! – disse o maestro. E, querendo demonstrar que já tinha ouvido falar do moço, cantarolou “Conceição / eu me lembro / muito bem” — fazendo uma “pequena” confusão entre a obra de Tom e Vinícius e a canção de Dunga e Jair Amorim, imortalizada pelo Cauby Peixoto.

A gafe do maestro me faz pensar que não se fazem mais Conceições como antigamente.

Na lista dos cinquenta nomes femininos mais usados no Brasil, aparecem Agatha, Ayla, Gabrielly, Emily e Isabelly, mas não Conceição – que talvez não figure nem nos “Top Thousand”.

Nomes vêm e vão.

Conceição foi e não voltou.

Sumiu.

Ninguém sabe, ninguém viu.

Há muito uma Conceição não brinca de boneca, não usa o primeiro sutiã, não arruma o primeiro namorado.

Não parece mesmo adequado a uma menininha um nome tão aumentativo, tão encorpado.

Conceição é nome de mulher já adulta — “mulher feita”, como se dizia no tempo em que nasciam Conceições.

Porque Conceição (“aquela que concebe”) é nome de mãe.

É o nome da minha mãe.

Sempre me soou a nome de gente humilde, do tipo que batiza os filhos de acordo com o santo do dia (ela não nasceu no dia de Nossa Senhora da Conceição, mas foi nesse dia que deu à luz sua filha — o dia em que foi mais mãe).

O Orfeu negro de Tom e Vinícius poderia ter sido da Silva, dos Santos, mas foi “Orfeu da Conceição” o poeta cuja lira emudecia os pássaros e vivia no morro a sonhar com o amor eterno de Eurídice — coisa que o morro não tem.

Esse “da Conceição” o arrancava da mitologia grega e lhe punha os pés no chão, lhe conferia mais humanidade, o trazia para o Rio de Janeiro, e preparava as rimas que viriam das cordas do seu violão (numa manhã — tão bonita manhã – de Carnaval).

Talvez haja, no mais profundo Brasil – aquele onde ainda são geradas as marias das dores, do perpétuo socorro, da natividade, da agonia, da anunciação – uma ou outra pirralha adornada com esse nome.

Talvez não.

Conceição é um nome em extinção.
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EDUARDO AFFONSO, Arquiteto mineiro de Belo Horizonte, 1950. Colunista do jornal O Globo. Coordena a Oficina Literária Eduardo Affonso, voltada para cronistas. Participa do coletivo literário Flique Nenhum livro publicado.

Fontes:
Texto e imagem obtidos no blog de Eduardo Affonso. 30 janeiro 2025.
https://tianeysa.wordpress.com/2025/01/30/conceicao/

domingo, 23 de março de 2025

Adega de Versos 139: Amaury Nicolini

 

Antonio Juraci Siqueira (Carta/canção para adormecer os homens e despertar as crianças)

Em paz com Deus e com os homens, o peito pleno de amor e as mãos ornadas de ternura, escrevo esta carta em forma de canção que faça dormir os homens e despertar as crianças, que soe como o burburinho da água na ribanceira do rio, o farfalhar do vento nas  mangueiras, o trinar dos pássaros tecendo alvoradas ou o badalar de sinos na Hora do Ângelo. 

Uma canção para despertar a criança que trazemos dentro de nós: umas, adormecidas pelo cansaço causado por uma sociedade cada vez mais embrutecida pelo imperativo categórico produzir, consumir e consumir-se; outras, amordaçadas para que suas verdades não incomodem a mentira nossa de cada dia; outras, deixadas de lado por absoluta falta de tempo ou relegadas ao esquecimento para que seus sonhos de ser não venham se antepor às exigências do ter. 

Uma carta/canção que nos abra os olhos para um mundo mágico, belo e possível, presente em essência mas ausente de fato no mundo caótico em que vivemos, que nos faça compreender que o pequeno mundo que vemos de nossas janelas, não tão belo e colorido como os vistos através das janelas virtuais, é mais real, humano e possível de interferências e mudanças dentro das possibilidades de cada um. 

Um mundo feito de seres e coisas palpáveis onde um copo d’água possa fazer a diferença, um gesto de amor salvar uma vida e o pão da palavra saciar muitas almas famintas de afeto; onde o dinheiro não seja tudo, a tolerância seja substituída pela aceitação mútua das nossas diferenças e uma palavra possa abrir portas para mil possibilidades. Enfim, um mundo onde a paz deixe de ser três letras esquecidas nas páginas dos dicionários. 

Que esta carta/canção nos faça ver o mundo através dos olhos da inocência onde um pássaro seja tão somente um poema emplumado a cantar nos galhos da manhã e não um ítem no mercado negro de animais silvestres, uma árvore deixe de ser um verde pacote com os dólares da devastação ambiental e passe a ser vista como uma bandeira desfraldada sobre a esperança, um rio seja a líquida rua do poeta e do mururé e não uma fonte de energia a inundar belos montes de vida, cultura e poesia. 

Talvez alguns vejam nesta carta apenas um monte de palavras. Mas um monte de palavras que pode mudar você, que pode mudar o mundo em sua volta. E eu amo as palavras e nelas acredito. Por isso é que fabrico, com elas, quixotescamente, meu escudo e minha lança para investir contra os moinhos da insensibilidade humana, para arrancar viseiras, derrubar os muros do preconceito, da intolerância e da opressão; para abrir estradas, construir pontes e rasgar horizontes à demanda de um mundo mais justo, igualitário e fraterno. 

Eu acredito na palavra como ferramenta divina deixada por Deus para formar, informar e transformar o homem e o mundo. A pá para revolver a lavra revelando o tesouro escondido no garimpo da alma de cada ser humano. Um tesouro que o tempo não consome e os ladrões não roubam. 

Eu acredito, por exemplo, na palavra paz, na palavra amor, na palavra amizade, na palavra igualdade, na palavra união, na palavra justiça, na palavra esperança, na palavra sonho, na palavra alegria, na palavra fraternidade, na palavra fé, na palavra perseverança, na palavra felicidade, na palavra poesia, na palavra... Palavra!

E você, em que palavra acredita?
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Antônio Juraci Almeida Siqueira, nasceu em Afuá, no Pará, em 1948). Escreveu diversas obras literárias, entre elas merecem destaque, O Chapéu do Boto (2003), Paca, Tatu; Cutia não! (2008), e Aumentei, Mas Não Menti (2016). Seus poemas, contos e trovas são principalmente inspirados no folclore, nas crenças e saberes populares e pela natureza amazônica. Popularmente ele é conhecido como "o boto" ou o poeta "filho do boto". Em 1978, e foi morar em Belém. cursou Licenciatura em Filosofia pela Universidade Federal do Pará, atua como instrutor de oficinas literárias, artista performista, contador de histórias, e leciona filosofia na rede pública de educação paraense. É considerado um dos poetas mais prolíferos da região Norte do Brasil. Seus trabalhos variam entre publicações de livros de literatura infantojuvenil, literatura de cordel, livros de poesias, contos, crônicas e textos humorísticos. Todo esse trabalho rendeu-lhe cerca de 200 premiações em concursos literários de diversos gêneros, tanto no âmbito nacional, quanto no estadual.

Fontes:
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing  

Luís da Câmara Cascudo (O Marido da Mãe-D’Água)

Era uma vez um moço pescador muito destemido e bom que lutava com as maiores dificuldades para viver. Ultimamente o vento mudara e quase não havia peixe. Passava horas e horas na praia, com a pindaíba na mão e os peixes fugiam dele como o Diabo da cruz. O rapaz estava mesmo desanimado e dormia com fome muitas vezes.

Numa noite de luar estava ele querendo pescar e o peixe escapulindo depois de comer a isca. A noite foi avançando, avançando, o luar ficando alvo como a prata e caindo mesmo a friagem. O rapaz não queria voltar para sua casinha sem levar nem que fosse um peixinho para matar a fome.

Já ia ficando desanimado quando começou a ouvir umas vozes cantando tão bonito que era de encantar. As vozes foram chegando para mais perto, mais perto, e o rapaz principiou a olhar em redor para ver quem estava cantando daquele jeito. Numa ponta de pedra apareceu uma moça bonita como um anjo do céu, cabelo louro, olhos azuis e branca como uma estrangeira. Ficou com o corpo meio fora d’água cantando, cantando, os cabelos espalhados, brilhando como ouro.

O pescador ficou todo arrepiado mas criou coragem e disse:

– Que desejais de um cristão, alma penada?

A moça respondeu:

– Não sou alma penada, cristão! Sou a Mãe-d’Água! Nunca uma pessoa me perguntou alguma coisa e sempre eu dei, e jamais me ofereceram auxílio. Tens coragem?

– Tenho, declarou o rapaz.

– Queres pegar peixe?

– Quero!

– Pois sacode o anzol onde eu estou. Deves vir todas as noites até o quarto minguante e só pescar de meia-noite até o quebrar da barra.

Abanou a mão e mergulhou, sumindo-se.

O rapaz fez o que ela tinha aconselhado e pegou tanto peixe que amanheceu o dia e não pudera carregar tudo para casa.

Nunca mais viu a Mãe-d’Água mas, no tempo da lua, vinha pescar e foi ficando mais aliviado da pobreza. Os meses iam passando e ele ficando com saudade daquela formosura. 

Uma noite de luar, estando na pesca, ouviu o canto da Mãe-d’Água e, largando tudo, correu na confrontação da cantiga. Quando a Mãe-d’Água botou as mãos em cima da pedra o rapaz chegou para junto e, assim que ela se calou, o pescador agradeceu o benefício recebido e perguntou como pagaria tanta bondade.

– Quer casar comigo? – disse a Mãe-d’Água.

O rapaz nem titubeou:

– Quero muito!

A Mãe-d’Água deu uma risada e continuou:

– Então vamos casar. Na noite da quinta para sexta-feira, na outra lua, venha me buscar. Traga roupa para mim. Só traga roupa de cor branca, azul, ou verde. Veja que não venha alfinete, agulha ou coisa alguma que seja de ferro. Só tenho uma condição para fazer. Nunca arrenegue de mim nem dos entes que vivem no mar. Promete?

O rapaz, que estava enamorado por demais, prometeu tudo e deixou a Mãe-d’Água, que desapareceu nas ondas e cantou até sumir-se.

Na noite citada o pescador compareceu ao lugar, trazendo roupa branca, sem alfinete, agulha ou coisa que fosse ferro. Antes de o galo cantar, a Mãe-d’Água saiu do mar. O rapaz estava com um lençol bem grande, todo aberto. A Mãe-d’Água era uma moça tão bonita que os olhos do rapaz ficaram incendiados. Enrolou-a no lençol e foi para casa com ela.

Viveram como Deus com os Santos. A casa ficou uma beleza de arrumada, com roupa, mobília, dinheiro. Comida, água, nada faltava. O rapaz ficou rico da noite para o dia. O povo vivia assombrado com aquela felicidade que parecia milagre.

Passou-se um ano, dois anos, três anos. O rapaz gostava muito da Mãe-d’Água, mas de umas coisas ia se aborrecendo. A moça não tinha falta, mas, na noite da quinta para a sexta-feira, sendo luar, ficava até o quebrar da barra na janela, olhando o mar. Às vezes cantava baixinho que fazia saudade até às pedras e aos bichos do mato. Às vezes chorava devagarinho. O rapaz tratava de consolar a mulher, mas, com o correr dos tempos, acabou ficando enjoado daquela penitência e principiou a discutir com ela.

– Deixe essa janela, mulher! Venha dormir! Deixe de fazer assombração!

A Mãe-d’Água nem respondia, chorando, cantando ou suspirando na sina que Deus lhe dera.

Todo mês sucedia o mesmo. O rapaz ia ficando de mal a pior.

– Venha logo dormir, mulher presepeira! Que quisila idiota é essa? Largue essa mania de cantiga e choro virada para o mar! Você é gente ou é peixe?

E como o melhor já possuía em casa, deu para procurar vadiação do lado de fora, chegando tarde. A Mãe-d’Água recebia-o bem, não se queixando de nada e tudo ia correndo com satisfação e agrado da parte dela.

Numa noite o rapaz foi a um baile e ficou a noite inteira dançando, animado como se fosse solteiro. Nem se lembrava da beleza que esperava por ele em casa.

Só voltou de manhã e foi logo gritando pelo café, leite, bolos e mais coisas para comer. A Mãe-d’Água, com paciência, começou fazendo mais que depressa o que ele dissera, mas não vinha na rapidez do corisco.

O mal-agradecido, sentando-se numa cadeira, de cara franzida, não tendo o que dizer, começou a resmungar.

– Bem feito! Quem me mandou casar com mulher do mar em vez de gente da terra? Bem feito. É tudo misterioso, cheio de histórias. Coisas do mar... hi... eu te arrenego!

Logo que disse essas palavras, a Mãe-d’Água deu um gemido comprido e ficou da cor da cal da parede. Levantou as duas mãos e as águas do mar avançaram como um castigo, numa onda grande, coberta de espuma, roncando como um bicho feroz. 

O rapaz, morrendo de medo, deu uma carreira, subindo um monte perto da casa. Lá de cima se virou para ver. Casa, varanda, cercado, animais, tudo desaparecera. No lugar estava uma lagoa muito calma, pegada a um braço de mar. Ao longe ouviu uma cantiga triste, triste como quem está se despedindo do mundo.

Nunca mais viu a Mãe-d’Água.
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Fontes:
Luís da Câmara Cascudo. Contos Tradicionais do Brasil. Publicado originalmente em 1946. Disponível em Domínio Público.
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing

sábado, 22 de março de 2025

José Feldman (Guirlanda de Versos) * 27 *

 

ENCERRAMENTO DO BLOG DE TROVAS “O VOO DA GRALHA AZUL”


https://voogralhaazul.blogspot.com/
 

 Não vejo razão alguma em manter este blog em funcionamento. A manutenção de um blog como este exige muita pesquisa, muita organização, muita dedicação, revisão, etc., tanto trabalho por nada.  

Há 10 anos no ar, apenas dois seguidores, sendo um deles eu mesmo e um trovador da Itália, e apenas um comentário em mais de 4.500 publicações e dezenas de milhares de trovas. Lamentável que não saibam valorizar a divulgação de trovadores de diversas épocas, vivos ou falecidos.

Na data de hoje, 21 de março, cerca de 50 mil trovas e 1400 trovadores foram excluídas. O Blog deixa de existir.

Neste blog, Singrando Horizontes, estes dias excluí mais de 4 mil publicações e milhares de trovas vinculadas à UBT, entre resultados de concursos, artigos, trovadores, etc. Contudo continuarei divulgando a trova, mas apenas dos amigos, colaboradores, apoiadores e incentivadores, vivos ou falecidos.

Paulo Vinheiro (Uma Flor no Meio da Vida)

Paulo Vinheiro, nome artístico do escritor e poeta Paulo Vieira Pinheiro, é de Monteiro Lobato/SP. 
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“O que queres?” Perguntei-me!

Dia e outro, na procura dos sentidos, me perco nas palavras que brotam por todo lado com seu propósito de me confundir.

Jornais, revistas, livros... tantas letras que doem.

Já li de tudo, me arrebatam as bulas...

Machado, Alencar, Scliar, Saramago, Lobato, e tanta gente que depois de um tempo me cobra: – que dizes? Que me dizes?

Ousado, talvez com um pouco de medo, arrisquei umas pequenas linhas... pequeninas... pequenininhas.

Então escrevi.

Tive a sorte de aprender a letrar pensamentos e os letrei; então achei pouco.

Pensei: – Se posso descrever o que penso... porquê não posso escrever o que sinto?

Vi que existia uma ponte estreita, longa, perigosa e muita vez conflitiva, entre o que eu sentia e pensava.

Sofri, mas não desanimei, então me reescrevi.

Contei contos, desvelei novelas, trabalhei textos... passei a ler com mais cuidado, com mais rigor, com mais seleção.

Passei a ler como se eu tivesse escrito o texto que não escrevi. Busquei o sentimento que vale a pena (no estrito sentido da pena que escreve).

Antes disso, eu não respeitava os que escreveram tanto como mereciam.

Textos bons ou textos nem tanto como queríamos ler, servem para o que servem, para se qualificarem uns aos outros.

Quem sabe o que é bom?

Sempre gostei das coisas mais fáceis, e por isso busquei as mais difíceis, só para me contrariar... só eu sofri no caso das palavras que li.

Agora há pouco me perguntaram:  – E a flor, onde entra nisso que dizes?

Ora entendo que a flor é o produto da expressão do que se diz, do que se escreve, do que se pinta, do que se faz para a apreciação, como o trabalho, como o amor... como a expressão pura e simples da ação.

Existe no campo ou nos jardins, todo o tipo de expressão floral. Existe no jardim de nossos dias uma quantidade de obras a se admirar, umas com mais cuidado, outras com mais atenção, outras detalhadas, outras simples... cada qual com suas qualidades.

Para nós sobra entender o que fizemos ou faremos de nós.

Fontes:
Texto enviado pelo autor.
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Vereda da Poesia = Sophia de Mello Breyner Andressen (Portugal)



quinta-feira, 20 de março de 2025

Adega de Versos 138:

 

A. A. de Assis (Felicidade sem camisa)

A praia não é somente a praia: é um monte de outras alegrias

Coisa bonita é o povo curtindo férias na praia. Um lugar superdemocrático, aberto a todos os padrões. Um homem de calção e sem camisa, uma mulher de maiô ou de biquíni, você não sabe se é alguém que tem mais ou menos dinheiro, se tem mais ou menos cultura, se é mais ou menos importante lá no onde mora. E mais: a maioria nem tá aí para esses grilos de elegância e moda. Todo mundo igual. Todo mundo gente. Gente feliz, que trabalha o ano inteiro e agora está ali celebrando a vida.  

Primavera-verão em Balneário Camboriú. O sol do sul. Paranaenses, catarinenses, gaúchos. Mais banhistas à beça vindos de outros estados. Mais los hermanos argentinos, uruguaios, paraguaios, bolivianos, chilenos. Uns chegados de automóvel, outros de ônibus, de moto ou de avião, outros em grupos de excursão.

Todo mundo numa boa. Logo cedinho arrumando a tralha pra espetar barraca na areia e salgar o corpo no mar. O isopor com as bebidinhas, a cesta cheirosa recheada de comes-comes. As crianças se deliciando com o churro, o sorvete, o milho verde.

No meio dos de férias, também homens e mulheres aproveitando a temporada pra ganhar um dinheirinho vendendo chapéus, roupas, cerveja, algodão doce, cocada, pipoca, ou alugando cadeiras e barracas. Um velhinho oferecendo bilhetes de loteria. Duas moças cantando o pregão: “Salada de frutas, sanduíche natural…”

Mas a praia não é somente a praia: é um monte de outras alegrias. Se o dia acorda chuvinhoso, o pessoal aproveita pra passear no comércio. Esvazia a Avenida Atlântica, enche a Avenida Brasil – um comprido shopping a céu aberto, aquela enorme fileira de lojinhas com o de tudo que a moçada gosta. De noite tem os barzinhos, os restaurantes, as baladas, tem a noite toda pra paquerar, comer, dançar.

Tem também a opção de dar umas esticadas pela vizinhança: Itajaí, Itapema, Bombinhas, Cabeçudas, Beto Carrero, Brusque, Nova Trento, Pomerode…

Gente boa, gente muito gente. Que estuda, trabalha, produz.

Gente do batente, que realmente merece esses belos dias de recreio com a família na praia.

Fonte:
Texto enviado pelo autor. 
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing  

Silmar Bohrer (Croniquinha) 131

Como foi que tudo começou ? 

Diria que é difícil explicar. Mas os relatos históricos de estudiosos e  pesquisadores dizem (ou sugerem) que no princípio tudo era imensidão inócua e vazia. Até o Gênesis confirma. 

E um sopro deu início àquilo chamado vida, lá na frente, transformando tudo em civilização .  Passaram séculos desde as priscas Eras .

A evolução foi tanta, imensa, grandiosa. Para todo lado.  Para todos os seres. 

Chegamos ao ano 2025 e eis que surgem num canto quase esquecido, próximo às barrancas do planeta, dois animaizinhos de quatro pata carregados de energia solar. 

Dois pequenos puros de alegria, humor à beça, traquinagens muitas.  Arrebanhados, logo tomaram conta do ambiente e da empatia da casa. 

Assim é que nos primórdios do ano surgiu o TRIO DA BAGUNCINHA - Theo, Ísis e papai, desde a manhãzinha agitando, brincando, conversando, fazendo o pequeno circo dos cachorrinhos.

As afeições misturaram tanto que quando saio para a rua vejo carinhas de tristes, silentes, de abandono.  Na volta, já no portão encontro Dom Theo e Dona Ísis com os olhos sorrindo e rabos abanando para iniciar a baguncinha do momento.

Dois tesouros dando lições de cachorrismo e civilidade.

Fontes:
Texto enviado pelo autor.
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Vereda da Poesia = Bento Nascimento


Humberto de Campos (Melhoramentos...)

A grande preocupação nacional do momento, conforme é notório, é a visita de sua majestade o rei da Bélgica. Da Gávea à Tijuca, do Cais Faroux às águas paludosas do rio Pavuna, reinam uma febre, uma atividade, uma fúria de empreendimentos verdadeiramente assombrosa. Nunca se viu, no Rio, atacados de uma só vez, tão grande número de melhoramentos. A cidade modifica-se, rejuvenesce, transforma-se, das pedras das ruas à crista dos monumentos.

Aí estão, demonstrando a influencia benéfica dessa visita real, as notícias da imprensa, registrando essas alterações. Calça-se uma rua dos subúrbios? Para que? Para o rei Alberto ver... Modifica-se o palácio Guanabara? Reforma-se o jardim da praça Maná? Aumenta-se o edifício da Prefeitura? Com que intuito? Para o rei Alberto ver... Até a pintura das carroças de lixo, ordenada pela Limpeza Publica, já foi atribuída à próxima visita de sua majestade.

Isso, no que está patente, visível, positivo. Os melhoramentos privados, secretos, de iniciativa da população, estes ainda são mais numerosos, mais sérios, mais significativos do nosso entusiasmo. Dezenas de vestidos de baile, "para o rei Alberto ver", já foram encomendados aos grandes costureiros daqui, de Paris e de Londres. Há, mesmo, até, nas rodas elegantes, quem se esteja entregando, pessoalmente, na cidade, com o mesmo fim, a melhoramentos mais interessantes.

Um destes dias, entrava eu no Instituto de Beleza, onde ia comprar um vidro de tintura para o cabelo, quando encontrei, no salão de espera, a minha velha amiga D. Sofia Pedreira, que aguardava, ali, pacientemente, a lindíssima viúva Odete Aires, que se achava, no momento, no gabinete do cabeleireiro. Começávamos nós a conversar sobre coisas sem importância, quando a formosíssima senhora suspendeu o reposteiro, e apareceu à porta, radiando e cheirando, como uma grande rosa que desabrochasse num vaso.

- O senhor por aqui, conselheiro? - gritou a encantadora criatura, com alvoroço, e com todos os dentes, estendendo-me, de longe a sua mão rosada e fina, onde as unhas faiscavam, rubras, como corais.

- É verdade, - expliquei, titubeando.

- Vim comprar uma caixa de pó para dentes... E a senhora?

- Eu? - respondeu, rindo. - Eu... Olhe?

E, espiando para um lado e para outro, a ver se não nos observavam, suspendeu até o ombro deslumbrante a manga curta e larga do finíssimo vestido de seda, mostrando a parte inferior e extrema do lindo braço de mármore, fina, alva, lisa, como de uma criança.

- Veja! - ordenou-me.

E já no primeiro degrau da escada, por trás do leque, piscando-me um olho, com brejeirice:

- Para o rei Alberto ver.

Fontes:
Humberto de Campos. A Serpente de Bronze. Publicado originalmente em 1925. Disponível em Domínio Público.  
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing 

segunda-feira, 17 de março de 2025

Adega de Versos 137: Juan Ramón Jiménez

 

Figueiredo Pimentel (Os anões mágicos)

I
Custódio era sapateiro-remendão, vivendo exclusivamente do seu ofício.

Todavia, por mais que se esforçasse, por mais que trabalhasse, nunca recebia justa recompensa do seu insano labor. Por isso era pobre, paupérrimo.

Chegou uma ocasião em que se viu quase na miséria. Haviam-lhe encomendado um par de botas de verniz. Com o lucro desse trabalho, que ia ser muito bem pago, desde que ficasse bom e fosse entregue no dia marcado, sem falta, contava comprar mais cabedal, e, assim, aprontar alguns pares de botinas, que tencionava vender vantajosamente.

Contudo, no dia em que ia começar o serviço, adoeceu. Foi uma fatalidade, porque não podia dar as botas no dia designado, e, desse modo, ia perder o verniz, em que empatara o único dinheiro que lhe restava.

À noite deitou-se, devorado por violentíssima febre.

Pela manhã acordou ainda mais doente. Assim mesmo, febril, tiritando de frio, e com terrível enxaqueca, tentou trabalhar. Foi procurar o verniz, e soltou uma exclamação! Na véspera apenas havia cortado o couro, e, no entanto, já estava feito o par de botas de montar, um trabalho esplêndido, digno, de um hábil artista.

Foi grande a sua surpresa, e nem sabia como explicar fato tão extraordinário.

Apanhou os sapatos, examinado-os atentamente, virando-os de um lado e do outro; estavam muito bem-feitos, e não tinham nem um ponto sequer fechado, sendo obra de causar admiração.

Quando veio buscar a encomenda, o freguês pagou mais do que havia tratado, tão satisfeito ficou.

Com o dinheiro dessa venda, o sapateiro foi comprar couro para fazer dez pares de botinas.

Trouxe-o para casa, e à noite cortou-o, deixando-o para fazer a obra pela manhã.

Mas, ao outro dia, quando se dirigiu para a sua mesa de trabalho, encontrou tudo pronto, como na noite anterior.

Dessa vez também, não faltaram fregueses. Com o dinheiro que produziu a venda, ele pôde comprar couro para outros pares.

No terceiro dia as botinas estavam prontas. E assim sucedeu noites e noites seguidas, durante bastante tempo. Todo o couro que Custódio cortava de noite, aparecia pronto, transformado em pares de botinas, muito bem-feitas, de modo que o sapateiro foi melhorando, a ponto de ficar quase rico.

II
Uma noite, na véspera de Natal, quando acabava de cortar couro, indo deitar-se, voltou-se para Adelina, sua mulher, e disse-lhe:

– E se nós passássemos a noite em claro, para ver quem nos ajuda dessa maneira?

Adelina concordou no que lhe propunha o marido. Deixando uma lamparina acesa, ocultaram-se os dois dentro de um guarda-roupas, por trás da roupa, e esperaram.

Quando o relógio bateu meia-noite, dois anõezinhos, completamente nus, sentaram-se na mesa do sapateiro, e apanhando o couro cortado, com as suas mãozinhas começaram a coser, furar e bater com tanta ligeireza e cuidado que não se ouvia barulho algum.

Trabalharam sem cessar, até que a obra ficou pronta, desaparecendo então subitamente.

No dia seguinte, Adelina disse:

– Aqueles anõezinhos nos têm enriquecido: é preciso que nos mostremos reconhecidos. Eles devem sentir muito frio, andando assim nus, sem nada sobre o corpo. Sabes? Vou coser uma camisa para cada um, um paletó, uma calça e um colete, e lhes fazer um par de meias de tricô, e tu fazes para cada um, um par de botinas.

Custódio aprovou a ideia da mulher e, à noite, quando tudo estava pronto, colocaram os objetos sobre a mesa em vez do couro cortado para os sapatos, e ocultaram-se de novo, para ver de que modo os anões recebiam os presentes.

À meia-noite, os anões chegaram, e iam começar o trabalho, quando em lugar do couro encontraram as roupas. A princípio mostraram grande espanto, que depressa se transformou em grande alegria.

Vestiram imediatamente a roupinha, e começaram a cantar e saltar:

– Nós somos uns lindos rapazes!... Adeus, couro, sapatos e botinas!...

Depois começaram a dançar e saltar por cima das cadeiras e bancos, e sempre dançando, ganharam a porta e desapareceram.

Desde aquele momento ninguém tornou a vê-los. Custódio, porém, continuou a ser feliz o resto de seus dias, e tudo quanto empreendia saía conforme os seus desejos.

III
Havia numa casa uma pobre criada muito trabalhadora, chamada Isabel. Todos os dias ela varria a casa, e depois juntava o cisco, que colocava em frente à porta da rua.

Uma manhã, quando começava o trabalho, achou uma carta no chão. Como não sabia ler, pôs o caixão de cisco no chão, e foi levá-la aos patrões.

Era um convite da parte dos anões mágicos que lhe pediam para ser madrinha de um dos seus filhos.

Isabel não sabia que resolver, mas depois de muitas hesitações, como lhe disseram que era muito perigoso recusar, aceitou.

No dia marcado, três anões vieram buscá-la, e levaram-na para uma caverna, na montanha onde moravam.

A mãe do anãozinho que nascera, estava num leito de ébano incrustado de pérolas, com colchas bordadas a prata. O berço do recém-nascido era de marfim, e a bacia de banho, de ouro maciço.

Depois do batismo, a criada quis voltar imediatamente para casa. Os anões, porém, pediram-lhe muito para ficar mais três dias com eles. Ela anuiu ao pedido, e passou esse tempo em festas, porque os anõezinhos lhe faziam o mais agradável acolhimento.

No fim de três dias, como quisesse absolutamente regressar, os anões encheram-lhe os bolsos de ouro, e conduziram-na até à saída do subterrâneo.

Chegando à casa dos patrões, Isabel recomeçou o trabalho de todo dia, e apanhou o caixão do cisco, o qual ainda estava no mesmo lugar em que deixara, o que a admirou sobremaneira. Estava varrendo, quando saíram da casa uns homens desconhecidos para ela, que lhe perguntaram quem era e o que queria.

Foi só então que a criada soube que não estivera com os anõezinhos apenas três dias, como julgara, mas sete anos inteiros, e que durante esse tempo, seus patrões haviam morrido.

IV
Um dia os anões roubaram de uma mulher o filhinho, que estava no berço, e puseram em seu lugar um pequeno monstro, que tinha uma cabeça muito grande e dois grandes olhos fixos, e era insaciável, esfomeado, querendo comer e beber a todo o momento.

A pobre mãe foi pedir conselho a uma vizinha.

Esta aconselhou-a a levar o monstrengo para a cozinha, e colocá-lo em cima do fogão, acender o fogo ao lado dele, e ferver água em duas cascas de ovo. Isso faria rir o monstro, e se ele se risse uma vez, seria obrigado a partir.

A mulher fez o que a vizinha lhe tinha ensinado. Assim que viu as cascas de ovo cheias de água, sobre o fogo, o monstro exclamou:

– Nunca vi, se bem que não seja novo, ferver água em casca de ovo! 

E soltou uma gargalhada.

Apareceu imediatamente, um bando de anões, que trouxeram o verdadeiro filho, colocando-o no berço, e levando o monstrengo em sua companhia.
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ALBERTO FIGUEIREDO PIMENTEL nasceu e morreu em Macaé/RJ, 1869 — 1914 foi além de poeta, contista, cronista, autor de literatura infantil e tradutor. Manteve por muitos anos, desde 1907, uma seção chamada Binóculo na Gazeta de Notícias. Publicou novelas, poesia, histórias infantis e contos. Um de seus grandes êxitos foi o romance O Aborto, estudo naturalista, publicado em 1893, e por mais de um século completamente esgotado. Como poeta, participou da primeira geração simbolista chegando a se corresponder com os franceses. Era amigo de Aluísio Azevedo, com quem trocou cartas, enquanto o autor de O Cortiço estava fora do país como diplomata. Poeta, romancista, escritor de literatura infantil, ganhou destaque e se perpetuou nos compêndios da literatura brasileira. A coluna Binóculo, assinada pelo autor na Gazeta de Notícias do Rio de Janeiro, de 1907 até 1914, obteve grande sucesso entre leitores e leitoras, ditando moda, o que faz de Figueiredo Pimentel o primeiro cronista social da capital. Era ele quem tratava das novidades da moda, do bom gosto, do chique em voga em Paris e que deveria ser aqui aclimatado. Obras: Fototipias, poesia, 1893; Histórias da avozinha, conto - somente em 1952; Histórias da Carochinha; Livro mau, poesia, 1895; O aborto, 1893; O terror dos maridos, romance e novela, 1897; Suicida, romance e novela, 1895; Um canalha, romance e novela, 1895.

Fontes:
Alberto Figueiredo Pimentel. Histórias da Avozinha. Publicado originalmente em 1896. 
Disponível em Domínio Público. 
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