segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Andrey do Amaral (Lançamento do Livro Mercado Editorial – Guia para Autores)

Depois de terminar o original é que o escritor se dá conta das dificuldades da publicação. Entrar no mercado editorial é possível! Basta conhecer os segredos deste universo. Neste livro, o escritor diminuirá os caminhos da tão sonhada publicação. Descrevemos os erros mais comuns e a forma correta de enviar sua obra para a editora certa. Há ainda os endereços das principais agências literárias do Brasil e do exterior, além das melhores editoras com a linha editorial definida. Facilitar é a nossa proposta. Este manual é bastante eficaz para quem deseja se destacar no concorrido mundo dos livros.

O autor dá o passo a passo para se ter êxito com uma editora comercial; indica onde, como e para quem vender seu original; nomeia quem são os principais agentes; quais as melhores editoras para seu livro etc.

Sumário: Capítulo 1 O produto livro – 3; Capítulo 2 Quem é o agente literário? – 1; Capítulo 3 Quem precisa de um agente literário? – 15; Capítulo 4 O que o agente pode fazer pelo escritor? – 19; Capítulo 5 O que o escritor pode fazer pelo agente ou pela editora? – 29; Capítulo 6 Originais (manuscrito) – 43; Capítulo 7 Agências brasileiras – 57; Capítulo 8 Editoras brasileiras – 63; Capítulo 9 Agentes literários dos Estados Unidos da América – 105; Capítulo 10 Editoras americanas – 141; Capítulo 11 Editoras canadenses – 179; Capítulo 12 Editoras portuguesas – 187; Capítulo 13 Divulgação – 205; Capítulo 14 Principais erros do escritor – 217; Capítulo 15 Perguntas – 225

Editora Ciencia Moderna
Páginas: 248. Peso 359,5 gramas
ISBN: 978-85-7393-760-2

Sobre o autor:



Fonte:
Colaboração do autor

Sinclair Pozza Casemiro (Peregrinando em trovas pela região da COMCAM)


COMCAM*

Coração do Paraná,
do Ivaí ao Piquiri,
há canções, e “causos” há,
que lembram gês, guarani.

Caminhos de Peabiru**

Como rendadas toalhas,
fez-se o nosso Peabiru,
tecido de extensas malhas,
do Paraguai ao Peru.

Terra Sem Mal***

Em migração permanente,
tendo o Sol como fanal,
o guarani segue em frente,
buscando a Terra Sem Mal.

Itararé

A convite de Altoé,
o arqueólogo foi a campo.
descobriu que o Itararé
do Peabiru fez seu canto.

Polêmicas

Aonde vai o Peabiru?
E quem foi que o construiu?
Mesmo não fosse ao Peru,
na COMCAM ele existiu!

Peregrinações

COMCAM da Rota da Fé,
Caminhos de Peabiru,
Terra Sem Mal, São Tomé,
Quão bela canção és tu!

Cavalgadas na COMCAM

Relembrando pioneiros
no chão de tuas estradas
te fazem, os cavaleiros,
a região das cavalgadas.

Gastronomia

Na COMCAM, gastronomia
tempera os bons corações
trazendo paz e alegria
juntando em festa as nações.

João Maria d’Agostini

O beato João Maria
diz que esteve na região
atendendo ao que sofria,
trazendo consolação.

Campo Mourão

Camorão, Campo Mourão,
filha e mãe tão orquestradas.
Pra nossa bela COMCAM,
fez-se a história nas estradas.

Corumbataí do Sul

Corumbataí do Sul
tem no seu alvorecer,
além do céu muito azul,
trilhas de índios para ver.

Peabiru

A Peabiru coube a glória
de o seu nome registrar
o fato vivo da história
do Caminho milenar.

Barbosa Ferraz

Barbosa em seu chão guardou
tesouro em pedra e sinais,
que o Peabiru registrou
para não perder jamais.

Bourbônia

Bourbônia, palco da história
do índio, branco e tropeiro.
Nas trilhas da sua glória
peregrinou-se primeiro.

Quinta do Sol

Quinta do Sol tem encantos,
verde e punjante visão.
Terra de paz, onde há tantos
motivos para a emoção.

Fênix

Fênix chamou-se um dia
Vila Rica, em plena glória.
Da Missão que ali existia
guarda viva hoje a memória.

Engenheiro Beltrão

Em Engenheiro Beltrão
há ruínas escondidas,
pois uma nobre Missão
em seu chão ficou perdida.

Terra Boa

Terra Boa, gente boa
escreveu nos seus anais
tanta história que povoa
velhos tempos coloniais.

Araruna

Bela Araruna, nascida
na moldura do Caminho.
Por Peabiru conhecida,
tem de nós todo o carinho.

Mamborê

Mamborê tem seus segredos,
misteriosos sinais.
São curiosos enredos
herdados dos ancestrais.

Farol

No Farol inda há quem conte
que o beato João Maria
batizou a Água da Fonte
e fez muita profecia.

Ubiratã

Ubiratã, você traz
entre as suas tradições,
a vocação para a paz
vinda de antigas nações.

Juranda

Oh, Juranda, Jurandah,
no teu nome, tão sonoro,
sempre a graça se achará,
qual um pássaro canoro.

Janiópolis

Foi Janiópolis caminho
e palco de tanta saga.
Hoje é o rico e alegre ninho
de um povo que a paz afaga.

Campina da Lagoa

Campina, orgulhosa, ostenta
pesquisas da arqueologia,
provando, já nos setenta,
que o Peabiru existia!

Nova Cantu

Teu rio, Nova Cantu,
teu tambo, a vila espanhola,
índio, Missão, Peabiru,
tudo em ti é pura escola.

Roncador

Nas trilhas de Roncador
João Maria fez história,
nos “causos” do sofredor
e em coletiva memória.

Luiziana

Luiziana das cachoeiras,
dos caminhos sempre em flor,
das muitas sagas pioneiras
de que herdaste o teu vigor.

Altamira do Paraná

Altamira da COMCAM,
tens beleza singular.
Dos teus rios és guardiã
e orgulho do Paraná.

Goioerê

Goioerê, muitos povos
já trilharam o teu chão
deixando aos teus filhos novos
mui valiosa lição.

Moreira Sales

Moreira és jovem agora
mas tens tão rico passado
muitas nações já outrora
nos teus campos têm lavrado.

Rancho Alegre

O rancho de tantos causos
alegres, sempre bravios
desperta muitos aplausos
e afasta os dias sombrios.

IV Centenário

Barro branco, Gato Preto
hoje Quarto Centenário
eu canto neste poemeto
teu passado legendário.
–––––––––––-

Notas:
*COMCAM =Comunidade dos Municípios da Região de Campo Mourão
**Caminho do Peabiru =
http://singrandohorizontes.blogspot.com/2009/11/o-caminho-de-peabiru.html
***Terra Sem Mal =
http://singrandohorizontes.blogspot.com/2008/04/lenda-indgena-em-busca-da-terra-sem-mal.html

Fonte:
Colaboração da autora

domingo, 10 de janeiro de 2010

Trova 104 - Elischa Dewes (Rio de Janeiro/RJ)

Diálogo Culinário


Eu adoro mocotó
caldo de carne e farinha
mas vou provar teu jiló,
co´essa pimenta e galinha.
Ana Maria Gazzaneo (Bragança Paulista/SP)

Sendo tão boa de prato,
dou-te uma vaca atolada.
Mas, sei que tu queres de fato,
Uma saborosa favada.
Carlos Soares (Natal/RN)

Já perdí o apetite
a favada me assustou
agora sem um palpite
vou jantar ovo... Se vou!
Ana Maria Gazzaneo (Bragança Paulista/SP)

Estás fazendo dieta?
Proponho então... uma seleta!
Nem feijoada completa,
nem ovo na omeleta...
Carlos Soares (Natal/RN)

A receita se completa
se delícia de compota
no dizer do meu esteta
me deixar aquém da cota.
Ana Maria Gazzaneo (Bragança Paulista/SP)

Rezando pelo esteta,
compota de esturjão!
Ova do peixe, completa,
à preservar teu corpão.
Carlos Soares (Natal/RN)

Uma torta de palmito
acompanha esse menu
delícia que eu repito
com salada de chuchu.
Ana Maria Gazzaneo (Bragança Paulista/SP)

Feijão verde com nata
e uma boa farofa,
a carne assada na brasa
o cabra come que "gofa".
Carlos Soares (Natal/RN)

Quibe ou mesmo um vatapá
regado ao sol do Brasil,
tem sabor do ar de cá,
liberdade... Humor febril!
Ana Maria Gazzaneo (Bragança Paulista/SP)

Dó, ré, mi, fá, si bemol,
assim me ponho a cantar,
se me dão carne de sol
e um bom arroz de cuxá.
Carlos Soares (Natal/RN)

Hoje a dieta é magrinha
num calorão de matar
só suco e uma polentinha
depois sorvete e nadar...
Ana Maria Gazzaneo (Bragança Paulista/SP)

Num dia quente, exaurido,
refresco de maracujá
ou de limão espremido
pras forças recuperar.
Carlos Soares (Natal/RN)

Sopa cremosa de ervilha
e gostoso pão torrado
deliciosa maravilha,
não se deixa ali de lado.
Ana Maria Gazzaneo (Bragança Paulista/SP)

Depois dessa guloseima
Um bom licor de cacau
Pois nos ajuda na queima
e assim ninguém fica mal.
Carlos Soares (Natal/RN)

Um salgadinho, coxinha
e um suquinho gelado,
matou a fome que eu tinha
me deixou alimentado.
Augustus Vinicius (São Luís/MA)


Esse frango à passarinho
com salada de tomate,
regado ao copo de vinho...
Ah, delícia, me arrebate!
Ana Maria Gazzaneo (Bragança Paulista/SP)

Lembraste bem!
A passarinho!
Será que tem
arroz soltinho?
Carlos Soares (Natal/RN)

Arroz soltinho tem não,
mas tem um baião de dois,
tão gostoso, meu irmão,
dá certinho pra nós dois...
Edir Pina de Barros (Cuiabá/MT)

Nem um cuscus com jabá?
Um café preto torrado?
Um queijo assado, quiça!
Banana maçã com melado?
Carlos Soares (Natal/RN)

Comi uma caranguejada
bem lá no bar da Lenoca,
juntinho com a namorada
que pra beber pediu coca.
Augustus Vinicius (São Luís/MA)

Sem coca, como a paçoca
sem amor janto a desdita
se a saudade me empipoca
até rejeito a marmita.
Ana Maria Gazzaneo (Bragança Paulista/SP)

E faço greve de fome
e dispenso esse banquete
minha dor nem tem um nome...
... mas um porco no rolete...
Ana Maria Gazzaneo (Bragança Paulista/SP)

Na venda do seu Joaquim
Nas quintas, estou por lá,
Um bom bolo de aipim,
um prato com munguzá.
Carlos Soares (Natal/RN)

Testando ou gerundiando,
caio com gosto no prato,
degusto apimentando,
a dobradinha de fato!
Carlos Soares (Natal/RN)

Dobradinha já não gosto,
pra mim parece borracha,
mas tem quem ame, aposto,
então meu gosto esculacha...
Augustus Vinicius (São Luís/MA)

Ao menos nesta cozinha
fique certo, tudo pode.
Vem e dá u´a provadinha
nesta buchada de bode...
Ana Maria Gazzaneo (Bragança Paulista/SP)

Se for mal a gente alinha
num menú menos profano
uma canja à mineirinha,
ou um caldo lusitano.
Ana Maria Gazzaneo (Bragança Paulista/SP)
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Observação: A União Brasileira dos Trovadores tem por norma versos setesilabicos com as rimas entre o 1o. e 3o. Verso, 2o. e 4o. Versos. No caso de tal não ocorrer, geralmente são denominadas quadras.

Fonte:
http://recantodasletras.uol.com.br/forum/

Secretaria da Cultura de Maringá (Programação de janeiro/2010)



CLUBETEEN (entrada franca)

Dia 21/01 – Livro: “Eclipse”, de Stephenie Meyer. Biblioteca Mandacaru, às 14h00.

CLUBINHO DE LEITURA (entrada franca)

Dia 09/01 – Livro: “Félix e seu fole fedem”, de Elias José. Biblioteca Centro, às 10h00.

Dia 13/01 – Livro: “A casa sonolenta”, de Audrey Wood. Biblioteca Jardim Alvorada, às 14h00.

Dia 13/01 – Livro: “FLICTZ”, de Ziraldo. Biblioteca Palmeiras, às 10h00.

Dia 14/01 – Livro: “O Homenzinho do queijo fedorento”, de Jon Scieszka. Biblioteca Mandacaru, às 14h00.

Dia 29/01 – Livro: “Rosa Flor e a Moura Torta”, de Pedro Bandeira. Biblioteca Operária, às 14h00.

CONVITE AO TEATRO (sempre no Teatro Barracão, às 21h00, entrada franca)

Dias 08, 22 e 29/01 – “Barricada” – Cia Teatro & Ponto – Grupo de Teatro Câmera, direção de Paulo Campagnolo.

Dia 15/01 – “Exercícios para a desordem” – Cia Teatro & Ponto – Grupo de Teatro Câmera, direção de Paulo Campagnolo.

PROJETO “UM OUTRO OLHAR” (coordenação de Paulo Campagnolo, sempre no Auditório Hélio Moreira, às 20h00, entrada franca. Censura: 16 anos)

Dia 09/01 – “Vagas Estrelas da Ursa” (Itália, 1965), direção de Luchino Visconti, com Claudia Cardinale e Jean Sorel.

Dia 16/01 – “Uma mulher sob influência” (EUA, 1974), direção de John Cassavetes, com Gena Rowlands e Peter Falk.

Dia 23/01 – “A garota da fábrica de caixas de fósforos” (Finlândia, 1990), direção de Aki Kaurismäki, com Kati Outinem e Elina Salo.

Dia 30/01 – “DIABEL” (Polônia, 1972), direção de Andrzej Zulawski, com Malgorzata Braunek e Michael Gruddzinski.

HORA DA HISTÓRIA (entrada franca)

Dia 20/01 – “Vovô aranha vai à festa” (conto africano), de Raquel Barcha. Contação: Cristina Begnossi. Música e atividade: Fantoche de Luvinha. Biblioteca Palmeiras, às 10h00 + OFICINA, às 14h00, para crianças acima de sete anos: Tecendo pulseiras e colares.

Dia 22/01 – “O Menino Maluquinho”, de Ziraldo (30 anos do lançamento do livro). Contação: Ricardo D. Amaral + Atividade: Conhecendo o site do Ziraldo. Biblioteca Palmeiras. Informações: 3901-1792

CIRCO TEATRO SEM LONA (sempre no Teatro Calil Haddad. Ingressos: R$5,00. Informações: 9133-1630 – Marcos)

Espetáculo: “As aventuras do lobo mau”. Dias 09 e 10/01, às 16h00.

Espetáculo: “A Divorciada”. Dia 09/01, às 21h00. Dia 10/01, às 20h30.

Espetáculo: “Peripécias circenses”. Dias 16 e 17/01, às 16h00.

Espetáculo: “Máscaras”. Dia 16/01, às 21h00. Dia 17/01, às 20h30.

Espetáculo: “Enguiçou”. Dias 23 e 24/01, às 16h00.

Espetáculo: “Salomé” (Convidado). Dia 23/01, às 21h00. Dia 24/01, às 20h30.

Espetáculo: “O Guarani – O Amor de Peri e Ceci”. Dia 30/01, às 16h00 e 21h00. Dia 31/01, às 16h00 e 20h30.

PROJETO FÉRIAS CULTURAIS / Oficina de Poesias (entrada franca)

Dias 18, 20 e 22/01 – Biblioteca da Vila Operária, às 16h00.

Dias 18, 20 e 22/01 – Biblioteca Jardim Alvorada, às 10h00.

Dias 19, 21 e 23 /01 – Biblioteca da Vila Operária, às 10h00.

Dia 27 e 29/01 – Biblioteca Mandacaru, às 10h00.

PROJETO FÉRIAS CULTURAIS / Oficina de Poesias para adolescentes de 11 a 17 anos (entrada franca)

Dias 18 e 20/01 – Biblioteca Centro, das 13h30 às 15h30.

Dias 25, 27 e 29/01 – Biblioteca Palmeiras, das 13h30 às 15h30.

Dias 25, 27 e 29/01 – Biblioteca Jardim Alvorada, das 16h00 às 18h00.

PROJETO FÉRIAS CULTURAIS / Oficina de Poesias para crianças (entrada franca)

Dia 25/01 – Biblioteca Mandacaru, das 10h00 às 12h00. Ministrante: Professor e ator Joaquim. Informações: 3901-1763

Fontes:
Colaboração da Academia de Letras de Maringá
Imagem = http://deq.uem.br

Autran Dourado (Confissões de Narciso)

(artigo publicado pelo professor Wagner Lemos)

Um camafeu, dez mulheres, encontros e desencontros compõem Confissões de Narciso.

O protagonista Tomás de Sousa Albuquerque deixa como legado confissões sobre as mulheres que amou, reunidas num caderno, na forma de dossiê.

Sofia, sua viúva, leva os originais para apreciação do escritor João da Fonseca Nogueira, que resolve procurar um editor e publicá-los.

As confissões explicam o destino de Tomás, que, influenciado pela leitura de notórios escritores, dentre os quais Stendhal, autor de De l’amour, e Goethe, criador de Werther, discorre sobre o desafio de entender as paixões que o motivaram, os desafetos e desilusões que enfrentou na busca pela felicidade.

A primeira paixão foi Amélia, sua prima, quando viveu o dilema de amar plenamente ou fazer explodir seu ciúme doentio. Comparando-se à mitológica figura de Narciso — encantado pela própria imagem refletida ele cai num lago e morre — e ao trágico Werther — que comete suicídio por causa de uma mulher —, Tomás fica dividido: continuar acreditando no amor ou sucumbir à rejeição?

Alma, colega da faculdade de Direito, foi a segunda escolhida. Seguiram-se Teresa, irmã de um amigo, e Beatrice, dona da livraria que freqüentava. Para Tomás, não importava tanto a beleza das amadas, mas sim a semelhança física com a imagem eternizada no camafeu de sua adorada mãe, objeto que usa para inspirá-lo nas memórias.

Com Beatriz, uma prostituta, Tomás viveu o radicalismo de adotar o sexo como solução para seus impasses afetivos, o que apenas lhe proporcionou mais ressentimento. Izabel, uma cliente que queria se divorciar do marido, colocou-o novamente numa situação de adultério. Margarida, amiga da mulher do melhor amigo, Carolina, casada com um antigo colega da faculdade, e a jovem Angélica também ajudaram o protagonista a fazer uma reflexão a respeito das dificuldades de relacionamento entre homens e mulheres.

Tomás foi um homem de muitos amores frustrados, sua própria vida foi uma frustração. Infeliz e mal sucedido no emprego, corno (como se refere a si mesmo) dez vezes por todos os tipos de mulheres: Amélia, sua prima, que o traiu com Alberto; Alma, colega do curso de Direito; Tereza Perez, Beatrice, Margarida, Carolina e Izabel, todas mulheres casadas que o traíram voltando para os seus maridos; Beatriz, uma prostituta, que o usa e volta para o marido; Angélica e Sofia, as únicas com quem casou e que o traíram, respectivamente com um amigo de trabalho e com um médico. Entretanto, o problema não estava exatamente nessas mulheres.

Tomás era um idealista que achava que a mulher perfeita seria à sua feição ou de sua falecida mãe. Tal fato jamais ocorreria, o que explica os fracassos de sua vida, até chegar ao suicídio. Suicidou-se porque não conseguia ver que ele era o responsável também pelas traições das quais fora vítima.

Deve-se lembrar que o narcisista não é só aquele se apaixona por si mesmo, mais: é aquele que não se reconhece, portanto, não vê os próprios defeitos, nem se conscientiza de suas deficiências. Em Tomás, isso gerou as traições que sofreu, afinal para ele era muito difícil relacionar-se.

Autran Dourado usa a narração em primeira pessoa para construir um personagem angustiado, que representa a utopia amorosa: um caminho a ser percorrido com alegria e tristeza, prazer e dor.
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O camafeu – De fato as mulheres pareciam com o camafeu ou Tomás fazia tal idealização? A segunda hipótese é mais provável.

Tomás buscava nas mulheres semelhanças com a figura feminina presente no objeto, isso para ele chegava ao ponto de ser um fetiche. Outrossim, o camafeu simboliza um vínculo com sua mãe, já falecida, a quem o camafeu pertencera. Tal coisa reforça ainda mais a idéia do Complexo de Édipo.

Para ele, Tomás, é importante estabelecer com as mulheres com quem se relacionou a ligação com a figura do camafeu, pois isso é tentativa de “concretizar” seu complexo de Édipo.

Fonte:
http://www.wagnerlemos.com.br/

Autran Dourado (1926)


Waldomiro Freitas Autran Dourado, filho de um juiz, nasceu em Patos de Minas (MG), em 1926.

Passou sua infância em Monte Sião e São Sebastião do Paraíso, no mesmo estado. Aos 17 anos foi para Belo Horizonte, onde passou a participar da vida literária da cidade. Cursou direito, enquanto trabalhava como taquígrafo e jornalista. Recebeu seu primeiro prêmio literário em 1942 com o conto "O Canivete de Cabo de Madrepérola". Sua primeira novela publicada foi A teia (1947), sobre o início de um ciclo sobre a decadência do interior de Minas.

Em 1949, formou-se bacharel em Direito e casou-se com Maria Lúcia Compus Christo, com quem teve quatro filhos.

Ganhou o Prêmio Mário Sette do Jornal de Letras com Sombra e exílio (1950). Mudou-se (1954) para o Río de Janeiro, onde foi secretário de imprensa da República (1955-1960) no governo de Juscelino Kubitschek.

Em seguida mudou-se no Rio de Janeiro, publicou Tempo de amar (1952), Nove histórias em grupos de três (1957) com o qual ganhou o Prêmio Artur Azevedo, do Instituto Nacional do Livro, A barca dos homens (1961), considerado o melhor livro do ano pela União Brasileira de Escritores, Ópera dos mortos (1967), O risco do bordado (1970), Solidão Solitude (1972), Os sinos da agonia (1974), O Novelário de Donga Novais (1976) e Armas & corações (1978). Recentemente ganhou o Prêmio Camões (2000), cerca de 100 mil dólares, pelo importância de sua obra em português.

Há vários livros seus traduzidos e trinta teses de mestrado e doutorado sobre sua obra. Seu romance “Ópera dos mortos” foi escolhido pela Unesco para integrar a sua Coleção de Obras Representativas da Literatura Universal e Os sinos da agonia, adotado para os exames de Agregação das Universidades Francesas.

O Risco do Bordado foi escolhido o melhor romance do ano pelo Pen Club do Brasil. Com As Imaginações Pecaminosas, além do Prêmio Jabuti de 1982, recebeu do governo alemão o Prêmio Goethe de Literatura.

É autor de vários romances, livros de contos, novelas e ensaios sobre teoria literária, como O Meu Mestre Imaginário, muitos deles traduzidos para vários idiomas. Em 1999, a Editora Rocco deu início à reedição de sua obra.

Em 2000, Autran Dourado foi o vencedor do Prêmio Luís de Camões, maior premiação para escritores de língua portuguesa.
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Um dos grandes ficcionistas brasileiros dos anos de 1960 e 70, é autor de um estimado livro de contos, Solidão, solitude (1972) e de vários romances importantes como Uma vida em segredo, 1964, A barca dos homens (1961), Ópera dos mortos (1967), O risco do bordado (1970) e Os sinos da agonia (1974). A obra de Autran Dourado se caracteriza – na feliz expressão de um crítico – por sua “intrínseca mineiridade, isto é, por uma tendência introspectiva, em que os seres se debatem sem encontrar saída, “enjaulados em atmosferas cinzentas, acossados pelo desentendimento, pela decadência e pelo estigma da morte” (Massaud Moisés).

Dois destes romances (Ópera dos mortos e Os sinos da agonia) situam-se em um patamar de realização superior, seja pela linguagem obsessivamente trabalhada, seja pela revelação de mundos espectrais e doentios nos quais os indivíduos são arrastados pela forças dos instintos rumo à destruição. Em Ópera dos mortos, no sobrado decadente da família Honório Cota, vive Rosalina, a última remanescente de uma estirpe em extinção, acompanhada apenas de uma empregada muda, Quiquina, e de um agregado, Juca Passarinho. A paixão erótica que a patroa nutre por Juca Passarinho é proporcional ao desprezo que ela vota a esse subalterno social. Todavia a gravidez da orgulhosa Rosalina surge como um golpe terrível na vida das três habitantes do casarão, desencadeando o crime e a loucura.

Em Os sinos da agonia, a ação transcorre na Vila Rica do século XVIII, mas a circunstância histórica (a decadência da sociedade aurífera) é meramente circunstancial. Não se trata de um romance histórico e sim de uma narrativa voltada para a análise e o contraste dos caracteres individuais, especialmente os de Malvina e os de Gaspar. Segundo um crítico, em Os sinos da agonia “a vida das criaturas está cifrada numa sucessão labiríntica que vai do adultério ao assassinato, da ambição dissimulada à loucura e ao suicídio, das secretas intrigas familiares à delação pública. Autran Dourado escreveu o romance da traição” (Flávio L. Chaves)

Fontes:
http://educaterra.terra.com.br/literatura/temadomes/2005/01/14/000.htm
http://www.netsaber.com.br/biografias/ver_biografia_c_3306.html
http://www.vagnerlemos.com.br/

Genolino Amado (O Reino Perdido)


E eu era feliz? Não sei...
Fui-o outrora agora
(Cancioneiro FERNANDO PESSOA)

Em março, alegria, e alegria nova, me acolheu no sobradinho. Que alvoroço, que rumor, naquela manhã, diferente de quantas eu conhecera até então, manhã inaugural, dia com as alunas de volta ao fim das férias, e dia de outras, as calourazinhas, as mais recentes infantas do meu reino. O professor que fui renascia naquela hora, na corte das meninas, que, no portão, no jardim, na escadinha da frente e nas laterais, no corredor, na saleta de Josefa, me reapareciam de uniforme.

Tão iguais, e tão diferentes. Cresceram, mudaram, talvez já houvessem crescido e mudado no curso do ano anterior, com o dia-a-dia a me esconder a transformação. Vi garotas nas gurias da 11 e da 12, afinal minhas alunas. Vi meninotas nas meninas da 21 e da 22, que conduzi do Egito à Guerra dos Cem Anos. Observei um desabrochar de moças nas mocinhas da 31 e da 32, alunas que perdi na derradeira lição dos Tempos Modernos.

Dei com os olhos em Marina e Beatriz. A mesma semelhança; porém não as mesmas Beatriz e Marina. Só permaneciam iguais porque mudaram juntas. Agora bem diversas das que foram na primeira manhã do professor. E Luísa já não se parecia tanto com Dudu, a sobrinha do Major Zé Joaquim, ou talvez já não me impressionasse muito a presença das duas. Vi de cabelos soltos a de tranças, vi esguia a atarracadinha, vi maciez de curvas nas arestas da angulosa.

Diferentes, quase todas. E as da 32, como as da 31, mais do que diferentes. Indiferentes. Ainda no portão, aquela voz:

Bom-dia, Professor.

Bom-dia. respondi com automatismo. Virei-me, olhei. Já se afastava a figura. Reconhecendo-a, ergui o tom: Ângela, bom-dia.
Não se voltou, não me escutou a doce irmã de Neusa. E aquilo me doeu. Ângela, da terceira série, agora da quarta, Ângela ex-aluna, ex-Ângela minha, das minhas lições, que iria estudar com outros, Ângela que já aprendera História e pelo professor de História já passava ligeirinha, num cumprimento curto, Ângela tão perto e já longínqua. Doeu.

Professor, bom-dia.

Bom-dia, Isabel. Tudo bem, garota?

Isabel, da 31, a interrogativa por excelência, a que me perguntou o que queria dizer shakespeariano, a do álacre ou alacre. E, ao entrar, aquele bom-dia também ligeirinho. Não parou um momento não me indagou se gostei das férias. Outros, daí por diante, ouviriam suas perguntas caprichosas e imprevistas. Isabel, presente e em começo de ausência, Isabel que passou de série, Isabel que perdi. E tantas mais, da 32, da querida 31, tantas que reencontrei e não achei, ainda pequenas da Escola e não mais pequenas de aulas minhas. Só ao entrar e ao sair é que eu as veria, breves aparições no jardim, no pátio de recreio, nos corredores, fugitivas, desatentas ao professor de velhas manhãs, velozes no passar, velozes no dizer: "Bom-dia".

E por isso não foi melhor o primeiro dia de março, no sobradinho cinzento.
Mesmo assim, foi bom. Se alunas perdi, alunas ganhei. Enchiam as salas da 21 e da 22 figurinhas que antes me pareceram esquivas também, mas esquivas somente porque esperavam a hora de chegar, não porque viera a hora de partir. Outros nomes, outras vozes que respondiam à chamada, outras feições oferecendo-se ao meu olhar: Foi um encontro alegre que compensou a melancolia de uma despedida.

Das oito às nove, das nove às dez, esqueci o que onze meses me roubaram, porque o recomeçar das lições me levou a um outrora de quarenta séculos. Renasceu na Amaro o Egito dos faraós e das pirâmides. E iriam reflorescer os jardins de Babilônia, com as verdes criaturas que iniciavam comigo a peregrinação histórica.

Terminei o dia com pequenas que foram minhas e a mim voltavam, as da velha 22, as da nova 32. Deixei-as no fim da escuridão medieval, que já se fazia penumbra no madrugar do Renascimento; reencontrei-as na Europa que principiava a ser moderna. Alguém demorou a chegar, Hilda Schultz, a gorda. E já sem desconhecer a gordura, foi sentar-se na fileira da frente. Não mais se apertaria. E a que chorou na lição de Joana d’Arc brindou-me com o etéreo sorriso, sua única leveza.

Sucediam-se as manhãs. Lá se foi março e o Gama lá se foi. A nova terceira série o acompanhou até às Índias. Com as novas garotas da segunda, visitamos Atenas. E na volta à Grécia, reaprendi a lição que as alunas anteriores já me haviam ensinado. A lição do adolescente em face do heroísmo.

Contei a história daquele dia que jamais anoiteceu na História, o dia de Maratona. Cinqüenta mil invasores persas, dez mil defensores da liberdade grega. E a bravura, que a liberdade inspirou, é vitoriosa.

Que palpitação a das que me ouviam. Naquela manhã, as carioquinhas do Catete foram atenienses.

Mais uma aula, mais uma invasão dos medos-persas. No desfiladeiro das Termópilas, resistem os últimos defensores, com a maior das valentias, a dos que não esperam vencer. E caem, morrem, os trezentos guerreiros de Esparta.

Tal qual no ano anterior, a palpitação das meninas foi menor. As atenienses da véspera não se tornaram espartanas. Devia faltar alguma coisa.

Outra manhã e a guerra continua. Batalha naval de Salamina. Trezentas embarcações na frota dos gregos. Na dos persas, oitocentas. E os gregos vencedores.

A Escola vibrou. Era a segunda vez que vibrava assim com Salamina, tal qual com Maratona. E pela segunda vez não houvera vibração com a suprema valentia das Termópilas.

Por quê? O mesmo heroísmo, sob a mesma inspiração de liberdade, o mesmo desafio do pigmeu ao gigante, o débil no destemor de enfrentar o inimigo poderoso: Que diferença havia então? Uma só vitória.
Decerto, vitória dos fracos, dos pequenos e dos livres, porém vitória. Aquelas almas imaturas, com o otimismo da inexperiência, no calor e na confiança de viver, uniam à idéia do herói a idéia do êxito. Os adultos conhecem que Davi foi bravo porque lutou com o enorme filisteu, não só porque o derrotou. Mas um Davi vencido surpreenderia tanto as garotas da Amaro quanto as entristeceria.

Recordo-me do prazer com que, lá por novembro, as alunas da 31 e da 32 me ouviram contar, na Revolução Francesa, o doido frêmito dos esfarrapados sans-culottes assaltando a colina de Valmy e alcançando um triunfo que parecia impossível. Ignoravam as pequenas quem foi Goethe, mas todas o aplaudiram quando citei o alemão: "Neste lugar e neste dia começa uma época nova na história do mundo."

E em risonho dia de maio a Escola acreditou no alvorecer de um novo tempo, de um mundo novo. A minha primeira lição aproximava-se do fim, mas ao fim não chegou. Porque, de súbito, o soar das sirenas, o buzinar dos automóveis, o troar das fortalezas, maluquice de alegria na rua, no céu os aviões em vertiginoso carnaval de fluidas serpentinas brancas: O Dia da Vitória, o Dia da Paz.

A exemplo dos outros mestres, suspendi as aulas. Eu, com maior razão. Seria ridículo ensinar o passado naquele instante denso de futuro. Um instante miraculoso, que nos prometia redimir séculos e séculos de opressão e de injustiça, milênios e milênios de miséria e horror. O mundo fraterno, que nem a morte de um deus conseguiu criar, acolheria os que sobreviveram a um dilúvio de sangue.

As meninas que riam, que se abraçavam e me abraçavam, convenceram-me, por um minuto, do amanhã nascente naquela manhã. Deixando-as, compareci à assembléia-geral dos professores, em sessão extraordinaríssima no gabinete de Eugênia. Havia um orador, o Feitosa. Não mais o misterioso Feitosa das conversas em surdina a um canto, um Feitosa inaugurado com a Paz, facundo, ruibarbosesco, potente na voz, convincente nos gestos. Dizia:

Hoje estou seguro, seguríssimo, de que se acabaram as guerras. Sim, acabaram de vez. Depois de tanto que sofreram e aprenderam, os povos viverão em harmonia, as superpotências não abusarão da sua força, desaparecerão as ditaduras, nenhum poder ameaçará os direitos humanos, e os pobres da terra serão menos pobres.

Falou, falou. E ouvimos. Muitos, com a mesma convicção de Feitosa, outros só com esperança, mas nenhum descrente de todo. E aplaudimos o primeiro dos futurólogos.

Aquela manhã de maio, com a paz na Europa, foi das últimas que passei no sobradinho. Em agosto, ali já não me encontrou a manhã, da bomba atômica na Ásia. É que, surpreendentemente, ao fim de junho, o pérfido governo resolveu encerrar a sua perseguição. Fui transferido para o turno da noite e, depois, enviado de volta à emissora educativa.

Sofri. Sofri de verdade. Bem me lembro de quanto me doeu abraçar as alegres alunas, então alunas de olhos umedecidos, que se despediam do professor com quem aprenderam tão pouco e a quem ensinaram tanto.

Foi um adeus em silêncio. Falar o quê?

Hoje, abençôo aquela hora que me amargurou. Deixei o reino encantado quando ainda havia encantamento. E os encantamentos que perduram são os que nos fogem depressa. Perder é às vezes ganhar. Pássaro esquivo, que voa na luz, a poesia das coisas não se prende ao ninho escuro do cotidiano. Porque saí da Escola, preservei-a na festa da manhã inicial.

E as manhãs, continuadas, já não me pareciam festivas. De tanto que o vi, o Botafogo das sete e meia acabou desaparecendo ao meu olhar de transeunte acostumado a Botafogo. Via e ao mesmo tempo não via o vôo bailarino das gaivotas, as velas errantes, a nuvem que se enroscava imprudentemente no Pão de Açúcar. No abril da iniciação, a atmosfera dos sonhos, a meninice de um mundo sorridente. E o mundo envelhecera. Ou envelheceu a visão do mundo infantil. Com tanto sol, a neblina do tédio o cobria.

Chilreavam os pardais nos oitizeiros? Não os ouvia, semi-surdo o professor semicego. No Jardim-Leblon, ia lendo o jornal, sem o namoro secreto de antes com as caixeirinhas das lojas e a velhinha da missa. Ir à Escola deixou de ser um passeio.

Até a Escola ficou diferente, porque não mudava. O encontro com Josefa, o soar do bem-lem-bem, as conversinhas de corredor e de saleta, as vozes das garotas com os "Presente" e os "Pronto" da chamada, tudo se repetia. Também eu repeti, com satisfação, o que, no ano anterior, ouvira de outro, com tristeza. Já nas vésperas da transferência, comentei:

Estão chegando as primeiras provas parciais. Depois, um mês de férias. Que bom, hein?

As mesmas palavras de Adelino, que estranhas e absurdas pareciam ao professor em lua-de-mel com o magistério. Ao me escutar, compreendi que a graça de conviver com as meninotas já não tinha tanta graça, que o brinquedo se fizera a obrigação. Reaparecia o adulto no que, aos quarenta, principiou a lecionar com o prazer de um guri vadiando. Ao mestre, que se cansava e se enjoava, já acontecia em junho o que ao mestre ainda novo só acontecera em dezembro.

E mais um dezembro com as meninas seria dezembro de perder meninas. Muitas e muitas vezes, nas lições à 31 e à 32, ouvi de mim: "Em março vindouro, estas passarão por você, num bom dia curto, fugitivas, apressadinhas."

E passariam outras, mais outras, na sucessão dos anos. O professor parado, à beira do rio adolescente. E o rio seguindo, a levar blusas brancas e saias azuis, as mesmas saias, as mesmas blusas, porém não as mesmas náiades na veloz torrente. Por fim, o professor se aborreceria de mirar as ninfas que viessem na correnteza e a correnteza fosse levando.

Porque parti, o rio adolescente deixou de correr. Transformou-se num lago cristalino, sobre o qual me debruço quando quero rever as de cova no queixo, as de pintas no rosto, as de olhar sonso, as de feições abertas, as estabanadas e as manhosas, as baixotinhas de busto erguido, as esguias ainda sem ondulação de seio, a de franja na testa, a de tranças, as de cabelos revoltos, a com pelúcia de pêssego no antebraço, as meninas sempre meninas da Escola, as meninas que me reaparecem na ingênua ilusão de um abril que se foi, as reencontradas infantas do meu reino perdido.

Rio, agosto-outubro, 1970.

Fontes:
http://www.wagnerlemos.com.br/genolinoamado.htm
Imagem = http://medievallegends.blogspot.com

Cruz e Sousa (Poemas Humorísticos e Irônicos)



PARANAGUADAS

Que importa que tu fales
Que importa que tu files
Que importa que não cales,
Que importa que tu fales
Que importa que te rales,
Que importa-me essa bílis
Que importa que tu fales
Que importa que tu files.

QUESTÃO BROCARDO

— Pife, pufe, pafe, pefe
Pafe, pefe, pife, pufe —
A cacholeta no chefe —
— Pife, pufe, pafe, pefe
Estoure como um tabefe
E o ventre de raiva entufe —

— Pife, pufe, pafe, pefe
Pafe, pefe, pife, pufe!
SEMPRE

Se é certo que o amor é um bem profundo
Se é certo que o amor é um sol ardente,
Eu hei de amar-te sempre neste mundo
E sempre, sempre, sempre — eternamente.

BEIJOS

Nesta Tebaida infinita
Da vida, na sombra oculto,
Eu gosto de olhar o vulto
De uma criança bonita.

Porque afinal as crianças,
Como eu deslumbro-me ao vê-las,
Cintilam como as estrelas,
Florescem como esperanças.

Dentro de mim se projeta
A luz cambiante dos prismas
E batem asas as cismas
Qual passarada irrequieta.

E batem asas e ruflam,
Pelas artísticas plagas,
As auras que as grandes vagas
Dos fundos mares insuflam.

E digo, ó mães, se uma aurora
Fosse a minh’alma sincera,
Os clarões todos eu dera
A uma criança que chora.

Porque se a luz fortalece
Arbustos e as andorinhas,
Também por certo às criancinhas
Conforta, avigora, aquece.

E eu que aplaudo e que rimo
Tudo isso que à luz se regre,
Na vibração mais alegre
As criancinhas estimo.

Portanto, assim, sem refolhos
Beijando a Olga, beijando
Meus sonhos vão, irradiando,
Se derramar em seus olhos!

QUESTÃO BROCARDO

Triolé fura essa pança
Do Delegado — és um russo,
Revolução n’esta dança...
Triolé fura essa pança,
Fura, fura como a lança
Ou como no boi um chuço;
Triolé fura essa panca
Do Delegado — és um russo.

AS DEVOTAS

I

Enquanto o sino bimbalha,
Bimbalha, bimbalha e tine,
Lançai do olhar a migalha
— Enquanto o sino bimbalha —
À raça que se amortalha
No horror que não se define...
Enquanto o sino bimbalha
Bimbalha, bimbalha e tine.

II

Perto da Igreja a senzala,
O Cristo junto aos escravos
E, pois, deveis visitá-la,
Perto da Igreja, a senzala
E procurar transformá-la
Da luz às palmas, aos bravos!...
Perto da Igreja a senzala,
O Cristo junto aos escravos.

III

E tão-somente por isto
Enquanto o sino bimbalha,
Bem antes de terdes visto
— E tão-somente por isto —
Todo o martírio do Cristo,
O vosso amor que lhes valha,
E tão-somente por isto,
Enquanto o sino bimbalha.

[DE CLAQUE, CASACA E LUVA]

De claque, casaca e luva,
De luva, casaca e claque
Ao rendezvous da viúva,
De claque, casaca e luva,
Tu vais — arrostas a chuva
No macadam — plaque, plaque...
De claque, casaca e luva,
De luva, casaca e claque.

[MEUS ESPLÊNDIDOS DESEJOS]

Meus esplêndidos desejos
Emigram, como beijos,
Pelo azul espaço, em curvas,
Rasgando essas brumas turvas;
Pelo sol das primaveras,
Batendo as asas brancas,
Como, batem, quimeras...
.........................
Voai, andorinhas francas!

[NUNCA SE CALA O CALLADO]

Nunca se cala o Callado
E sempre o Callado, fala
Callado que não se cala,
Nunca se cala o Callado,
Callado sem ser calado,
Callado que é tão falado...
Nunca se cala o Callado
E sempre o Callado, fala.

[ESTOURE COMO O CHAMPAGNE]

Estoure como o champagne
O triolé — pule e salte
E como os gatos arranhe,
Estoure como o champagne
E a cara dos erros lanhe
E como o sol nunca falte...
Estoure como o champagne
O triolé — pule e salte.

[PARECE UM CÉU ESTRELADO]

Parece um céu estrelado
Esta vida de nós dois
Depois d’aquele passado...
Parece um céu estrelado

Largo, puro, undiflavado
Depois do pesar, depois,
Parece um céu estrelado
Esta vida de nós dois.

[LEVANTEM ESTA BANDEIRA]

Levantem esta bandeira
Da posição de farrapo;
Da terra azul brasileira
Levantem esta bandeira
Que sente o horror da esterqueira
Da escravidão — negro sapo.
Levantem esta bandeira
Da posição de farrapo.

OLHARES

Teus traquinantes olhinhos
Continhas, Ziza, parecem;
Zigzagam sempre, tontinhos
Teus traquinantes olhinhos;
Tão pretos, tão redondinhos
Olhinhos que me embevecem,
Teus traquinantes olhinhos
Continhas, Ziza, parecem.

[NAS EXPLOSÕES DE BONS RISOS]

Nas explosões de bons risos
Os triolés petulantes
Chocalhem, tinam, precisos
Nas explosões de bons risos,
Tilintem como mil guisos
Sonoros, raros, vibrantes
Nas explosões de bons risos,
Os triolés petulantes.

[PRESO AO TRAPÉZIO DA RIMA]

Preso ao trapézio da rima
Triolé — pega estes zotes
E dá-lhes de baixo acima
Preso ao trapézio da rima
Na mais artística esgrima
D’estouros e piparotes,
Preso, ao trapézio da rima
Triolé — pega estes zotes.

GRITO DE GUERRA

Aos senhores que libertam escravos

Bem! A palavra dentro em vós escrita
Em colossais e rubros caracteres,
É valorosa, pródiga, infinita,
Tem proporções de claros rosicleres.

Como uma chuva olímpica de estrelas
Todas as vidas livres, fulgurosas,
Resplandecendo, — vós tereis de vê-las
Rolar, rolar nas vastidões gloriosas.

Basta do escravo, ao suplicante rogo,
Subindo acima das etéreas gazas,
Do sol da idéia no escaldante fogo,
Queimar, queimar as rutilantes asas.

Queimar nas chamas luminosas, francas
Embora o grito da matéria apague-as;
Porque afinal as consciências brancas
São imponentes como as grandes águias.

Basta na forja, no arsenal da idéia,
Fundir a idéia que mais bela achardes,
Como uma enorme e fúlgida Odisséia
Da humanidade aos imortais alardes.

Quem como vós principiou na festa
Da liberdade vitoriosa e grande,
Há de sentir no coração a orquestra
Do amor que como um bom luar se expande.

Vamos! São horas de rasgar das frontes
Os véus sangrentos das fatais desgraças
E encher da luz dos vastos horizontes
Todos os tristes corações das raças...

A mocidade é uma falena de ouro,
Dela é que irrompe o sol do bem mais puro:
Vamos! Erguei vosso ideal tão louro
Para remir o universal futuro...

O pensamento é como o mar — rebenta,
Ferve, combate — herculeamente enorme
E como o mar na maior febre aumenta,
Trabalha, luta com furor — não dorme.

Abri portanto a agigantada leiva,
Quebrando a fundo os espectrais embargos,
Pois que entrareis, numa explosão de seiva,
Muito melhor nos panteões mais largos.

Vão desfilando como azuis coortes
De aves alegres nas esferas calmas,
Na atmosfera espiritual dos fortes,
Os aguerridos batalhões das almas.

Quem vai da sombra para a luz partindo
Quanta amargura foi talvez deixando
Pelas estradas da existência — rindo
Fora — mas dentro, que ilusões chorando.

Da treva o escuro e aprofundado abismo
Enchei, fartai de essenciais auroras,
E o americano e fértil organismo
De retumbantes vibrações sonoras.

Fecundos germens racionais produzam
Nessas cabeças, claridões de maios...
Cruzem-se em vós — como também se cruzam
Raios e raios na amplidão dos raios.

Os britadores sociais e rudes
Da luz vital às bélicas trombetas,
Hão de formar de todas as virtudes
As seculares, brônzeas picaretas.

Para que o mal nos antros se contorça
Ante o pensar que o sangue vos abala,
Para subir — é necessário — é força
Descer primeiro a noite da senzala.

[DA LUA AOS RAIOS PRATEADOS]

Da Lua aos raios prateados
Que no horizonte se espargem,
Como fulguram os prados
Da lua aos raios prateados,
Há vagos silfos alados
Do rio azul pela margem
Da lua aos raios prateados
Que no horizonte se espargem.

[TEUS OLHOS BELOS POR DENTRO]

Teus olhos belos por dentro
De grandes colorações,
Parecem ter pelo centro
Teus olhos belos por dentro
A luz vital onde eu entro
E saio imerso em clarões...
Teus olhos belos, por dentro
De grandes colorações.

[TEUS OLHOS — ESSES CARINHOS]

Teus olhos — esses carinhos,
Esse casal de ilusões
Tão doces como os arminhos,
Teus olhos — esses carinhos
Parecem ser os dois ninhos
Das minhas consolações,
Teus olhos — esses carinhos
Esse casal de ilusões!...

[ENQUANTO ESTE SANGUE FERVE]

Enquanto este sangue ferve
Com força, com toda a força,
Palpite a fibra da verve
Enquanto este sangue ferve
Esmague-se o que não serve
Na treva o Mal se contorça,
Enquanto este sangue ferve,
Com força, com toda a força.

[MERECE O BOM DO VIDAL]

Merece o bom do Vidal
Que é mesmo um Joca de truz,
Ter também com o seu Fiscal,
Merece o bom do Vidal
Um banquete bambual,
De cem milhões de bambus
Merece o bom do Vidal
Que é mesmo um Joca de truz!

[QUANDO ELA ESTÁ DE COLETE]

Quando ela está de colete,
Espartilhada, irradiante
Vestida de azul-ferrete
Quando ela está de colete
Em mim cruzando o florete
Do seu olhar — que elegante
Quando ela está de colete,
Espartilhada, irradiante.

[EMBORA EU NÃO TENHA LOUROS]

Embora eu não tenha louros
Como esses grandes heróis
E nem da idéia os tesouros,
Embora eu não tenha louros,
Talvez nos tempos vindouros
Traduza o poema dos sóis,
Embora eu não tenha louros
Como esses grandes heróis.
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Fonte:
Ministério da Cultura. Fundação Biblioteca Nacional.

Projeto Pioneiro de Literatura no Litoral Brasileiro


Ir à praia e encontrar em plena areia o poeta Carlos Drummond de Andrade, o escritor Gabriel Garcia Marquez e o paranaense Dalton Trevisan. É esse encontro literário que a Secretaria de Estado da Cultura promove, pela segunda vez, durante o Viva o Verão no litoral paranaense com o projeto Biblioteca na Areia. As bibliotecas estarão na Ilha dos Valadares, em Paranaguá, em Guaratuba, Praia de Leste e Caiobá, que contam com um acervo de cerca mil e duzentos livros para empréstimo gratuito. O projeto, cuja inauguração estava prevista para os dias 07 e 08 de janeiro, foi prorrogado para os dias 14 e 15, permanecendo até 21 de fevereiro de 2010.

Na primeira temporada a Biblioteca na Areia foi bem assimilada pela população do litoral e pelos turistas de férias. O movimento nas unidades foi permanente durante todo o dia, com uma média de público de 200 pessoas por dia – em cada biblioteca – e com o empréstimo de 100 livros em cada uma diariamente. Um sucesso que promete se repetir no próximo Viva o Verão pois o veranista aproveita o período de descanso para colocar a leitura em dia.

A Biblioteca na Areia é inspirada num dos principais projeto do Governo do Estado: a Biblioteca Cidadã. Por isso, o acervo de livros contempla todos os gêneros literários. O sistema de empréstimo é bastante simples: basta o interessado apresentar a carteira identidade e passar o endereço e o telefone para fazer um cadastro. Os empréstimos são gratuitos. Cada biblioteca recebe cerca de mil e duzentos volumes que contemplam os grandes autores da literatura nacional e internacional.

O projeto Biblioteca na Areia promove uma importante parceria entre a Secretaria de Cultura e as prefeituras do litoral que ajudam a escolher os melhores pontos para as instalações da bibliotecas. Nesse locais, a SEEC além de estimular o saudável hábito da leitura com um atendimento especializado e personalizado, também proporciona para os veranistas e habitantes do litoral, atividades lúdicas para desenvolvimento da criatividade.

De fato, na temporada de 2010, aos Sábado e domingos, em dois horários – às 11 e 17 horas – acontece o programa Ligado na Cultura com performances de artistas com temática na literatura e contação de história para crianças.

Serviço:

Biblioteca na Areia 2010.
Praias: Guaratuba, Ilha dos Valadares (Paranaguá), Praia de Leste e Caiobá.
Empréstimo de livros gratuitos.
Horário de funcionamento: de 14 de janeiro a 21 de fevereiro, diariamente, das 10 às 19 horas. Sábados e domingos, às 11 e 17 horas – acontece o programa Ligado na Cultura: performances de artistas com temática na literatura e contação de história para crianças.

Fonte:
Secretaria da Cultura de Estado do Paraná

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Trova 103 - José Tavares de Lima (Juiz de Fora/MG)

Trova montada sobre desenho de Pedro Emmanuel

Pedro Lessa (A História antes de Buckle)



Na Grécia e em Roma, consistia a missão do historiador em narrar os acontecimentos memoráveis. Obra de arte, e não de ciência, a história se escrevia geralmente para perpetuar, encarecendo, os feitos militares, ou políticos; e seu principal merecimento estava em reproduzir tradições e crônicas, muitas vezes infiéis, sob os primores literários do estilo descritivo. Dionísio de Halicarnasso nota uma certa semelhança entre a forma animada e pitoresca da História de Heródoto e a dos poemas de Homero. A profunda concisão de Tucídides e a perfeição ática de Xenofonte fizeram da História da guerra do Peloponeso e da Retirada dos dez mil, inimitáveis modelos de narração. Salústio, de quem dizia o poeta Marcial primus romana Crispus in historia, exige do historiador, como primeira condição de sucesso, "uma linguagem à altura dos acontecimentos".

Sem embargo das suas qualidades de homem de ação, dos seus dotes de incomparável cabo de guerra, César foi exímio na gramática e na retórica; e tão rigoroso era o seu classicismo, que aconselhava a evitar as expressões novas ou incorretas, com a mesma solicitude com que o marinheiro deve fugir das penedias. É por isso que Cícero, segundo o testemunho do Suetônio, admirava o estilo puro dos Commentarios, ao ponto de recomendar que ninguém "bordasse sobre essa talagarça". Tito Lívio é a eloqüência romana: tendo vindo já muito tarde quando a liberdade era apenas uma tradição para exercitar os seus talentos oratórios, e achando interdita a tribuna das arengas forenses, transportou o rosto para as Decadas, e, no dizer de Taine, "il fut historien pour rester orateur". Quinto Cúrcio, um simples teórico, a nenhum escritor cede na descrição das batalhas. A energia, a profundeza e o brilho do estilo de Tácito, que "a poesia, o ódio e o estudo inflamaram e sombrearam", só se encontram uma vez na história.

Mas, sob as formas atraentes, ou empolgantes, dessa consumada arte de descrever, não se procure, pois freqüentemente seria vão esforço, apurar a fidelidade das informações, inquirir a verdade dos fatos. Não se observavam, porque se ainda não conheciam, os cânones da heurística, da diplomática e da crítica de interpretação, sem os quais ninguém hoje se aventura à árdua tarefa da historiografia. Raros historiadores, ao reconstruírem os fatos políticos e militares da vida de um personagem, de uma família ilustre, ou de um povo, em determinado período (e cifrava-se nisso a história), procediam a um escrupuloso exame das provas, ou se davam ao ímprobo labor de cirandar meticulosamente os documentos. Quão poucos poderiam repetir, convencidos, as palavras de Tucídides: "No que toca à verdade dos fatos, diz o autor da História da guerra do Peloponeso, não dei crédito às primeiras pessoas que encontrei, nem às minhas impressões pessoais; narrei somente os acontecimentos de que fui espectador, ou sobre os quais adquiri informações precisas e de certeza absoluta."

Na Anabase, Xenofonte descreve fatos de que foi testemunha, porquanto fez parte da expedição de Ciro, o moço, a qual comandou depois da morte de Clearco, e por isso a sua narrativa se aceita como verdadeira; mas, na Ciropedia, tanto desdenhou a verdade, que é hoje opinião unânime não passar a História de Ciro de um romance moral. Em verdade, aquele jovem príncipe, dotado pela natureza de todos os encantos imagináveis do espírito e do corpo, educado no seio de um povo singular, que a tudo antepunha a utilidade pública, e de tal arte formava o coração de seus filhos, que estes não cometiam jamais atos censuráveis, nem tinham nunca motivo para corar; aqueles bárbaros, tão zelosos cultores da justiça, que nas escolas só ensinavam as normas do direito, tão imbuídos dos preceitos da mais pura ética, que escrupulosamente praticavam todas as virtudes mais tarde preconizadas pelo cristianismo; aquele perfeito e elevadíssimo estoicismo, que nos faz antever em cada persa, sectário da religião mazdeísta, o mais bem acabado protótipo do místico medieval; tudo isso por certo pode constituir o ornato e o ensinamento moral de um livro destinado à educação da juventude, mas destoa profundamente da severidade do historiador.

Se, para escrever a Retirada dos dez mil, Xenofonte fez de Tucídies o seu modelo, quanto à fidelidade da exposição, na Ciropedia imitou o pai da história, o qual com fábulas e lendas, entretecidas nos fatos, compôs os seus nove livros, consagrados às nove musas, e que mais se assemelham aos cantos de uma epopéia do que aos capítulos de uma história.

Não obstante o manifesto desdém de Quintiliano, ao aludir às histórias gregas, os historiadores romanos não foram menos descaroáveis para com a verdade. Dificilmente compreendemos hoje o modo como Tito Lívio se preparou para escrever a história, a sua absoluta ausência de curiosidade quanto aos documentos e testemunhos com que devia cimentar as suas narrativas.

Era-lhe fácil ir ao tesouro público e ao templo das Ninfas, para ler sobre as tábuas de bronze as leis régias e tribunícias, os antigos tratados celebrados com as nações vencidas pelo povo romano, os decretos do senado e os plebiscitos; cumpria-lhe, ao menos, recorrer aos anais preparados pelos pontífices, que minuciosamente foram anotando todos os acontecimentos merecedores de transcrição na história romana; mas Tito Lívio teve por indigno de si proceder a essas pesquisas, aliás tão fáceis a um cidadão romano; nem sequer visitou os lugares onde se passaram muitos dos feitos militares, por ele descritos. Daí os equívocos, os erros, as falsidades, que abundam nas Decadas. Salústio escreveu somente para revelar a admirável perfeição do seu estilo, e por isso "explorou a história, como se fora a sua província de África, como egoísta e artista de gênio", tratando apenas dos fatos susceptíveis de descrições brilhantes pela forma.

A história, para os gregos e romanos, é um gênero literário. A amplificação oratória, as ficções, o maravilhoso épico, içam as narrativas, desfigurando os fatos, e subtraindo-os à justa apreciação dos mais claros e seguros entendimentos. O que constitui a sedução da história na antigüidade é a língua, o estilo, a arte da composição, a movimentação dramática, fonte inesgotável de emoções e de prazer, a nos mostrar, em quadros animados da mais vívida eloqüência, as grandes e fortes virtudes do heroísmo e do patriotismo.

Alguns historiadores desse período alimentavam a pretensão de fazer da história um vasto repositório de lições políticas e morais, a "mestra da vida". Políbio e Plutarco foram insignes no gênero. Já Xenofonte tinha sido um iniciador, e Salústio fez preceder a cada uma de suas obras (Catilina, seu bellum catilinarium, e Jugurtha, seu bellum jugurthinum) um discurso da mais enaltecida moral, tão destoante da vida de quem foi expulso do senado por suas escandalosas imoralidades.

A antiguidade clássica não fez da história uma ciência. Nem quanto a essa doutrina que, muitos séculos depois, se chamou a filosofia da história, conseguiu mais do que rudimentar e grosseiro esboço. Apenas o gênio profundo de Tucídides teve uma percepção fugaz das leis a que estão sujeitos os fenômenos sociais: acreditava o autor da História da Guerra do Peloponeso que seu estudo seria útil a todos que quisessem, partindo do conhecimento dos fatos passados, compreender os fatos futuros, que, "segundo as leis humanas serão semelhantes, ou análogos". Mas, lançadas acidentalmente essa e outras observações de admirável justeza, o historiador grego prossegue em sua narrativa, sem induções, sem sistematizar os fatos, explicando, quando muito, os acontecimentos como um político, pela natureza das instituições, pelo papel desempenhado pelos partidos, pelo conflito dos interesses, pelo jogo das paixões, pela eloqüência dos homens de Estado e pela tática dos homens de guerra.

Ainda é a personalidade humana, a vontade individual ou coletiva, que ocupa a cena da história, como em Heródoto. Não se nota mais a sensibilidade ingênua, a imaginação juvenil de Heródoto, para quem a queda de um raio sobre os bárbaros reunidos junto aos muros do templo de Minerva Pronéia, e o despenharem-se com fracasso dois rochedos do cume do monte Parnaso, são os maiores prodígios, os mais portentosos acontecimentos que pode narrar um historiador. O autor da História da guerra do Peloponeso não se eleva às causas naturais dos fatos, nem nos dá as leis a que aludiu no começo de sua crônica, em um rasgo assombroso do gênio. Continuador do método histórico de Tucídides é Políbio, que procura explicar a superioridade política e militar de Roma, comparando-lhe as instituições com as dos outros povos. Mas, toda a filosofia de Políbio está condensada nesta fórmula: "Cumpre estudar a constituição de um Estado, como a causa primordial dos bons e maus sucessos em tudo. É dessa constituição, como de uma fonte, que derivam as empresas e seus efeitos."

Salústio, Tito Lívio, Tácito, todos os historiadores romanos, nos dão uma única explicação da grandeza e da decadência de Roma: a cidade cresceu, elevou-se, dominou, em conseqüência de suas virtudes e por uma predestinação divina; decaiu, perdeu a liberdade e o império do mundo, em conseqüência da dissolução dos costumes, produzida pelo luxo. Não passa dessa rudimentar consideração a filosofia da história em Roma.

Não se pretenda tampouco descobrir, nos historiadores gregos e romanos, a coordenação metódica dos fatos, a sistematização científica dos elementos preparados pelo historiador, para as generalizações das ciências sociais. Taine caracterizou bem a história, tal como foi compreendida pela antiguidade clássica, dizendo que ela nos oferece unicamente uma sucessão de acontecimentos, e não classes de fatos. Preocupados com os feitos bélicos e as ações dos políticos, os historiadores do período greco-romano poucas ou nenhumas informações nos ministram sobre a indústria, o comércio, os costumes domésticos, a religião, a ciência, as letras, as artes liberais e mecânicas, sobre todos aqueles fatos estudados hoje pelos historiadores, como o conteúdo principal da história. [...]

(É a história uma ciência?, 1900.)

Fonte:
Academia Brasileira de Letras

Pedro Lessa (1859 – 1921)


Pedro Augusto Carneiro Lessa, jurista, magistrado, político e professor, nasceu em Serro, MG, em 25 de setembro de 1859, e faleceu, no Rio de Janeiro, RJ, em 25 de julho de 1921.

Era filho do coronel José Pedro Lessa e de Francisca Amélia Carneiro Lessa e sobrinho do poeta Aureliano Lessa, colega de turma e amigo de Álvares de Azevedo e Bernardo Guimarães, com os quais planejou publicar, quando estudantes em São Paulo, um livro de colaboração, que se intitularia Três liras, e que jamais foi escrito. Fez os estudos primários e secundários em sua província. Em 1876 partiu para São Paulo, onde se matriculou na Faculdade de Direito. Formou-se em 1883, tendo pertencido a uma turma de nomes brilhantes, na qual se destacavam os de David Campista, Bueno de Paiva, Martim Francisco Sobrinho e Júlio de Mesquita.

Em 1885, iniciou a sua vida pública, com a nomeação para o cargo de secretário da Relação de São Paulo. Dois anos depois, em 1887, inscreveu-se em concurso na Faculdade de Direito de São Paulo, tendo obtido o primeiro lugar. Não conseguiu, porém, a nomeação. Em 1888, prestou outro concurso, em que também obteve a melhor classificação, sendo nomeado, logo a seguir, como professor catedrático.

Em 1891, foi nomeado chefe de polícia do Estado de São Paulo e eleito deputado à Assembléia Constituinte de São Paulo, tomando parte dos trabalhos de elaboração da Constituição estadual. Em breve se retirava da ação pública, dedicando-se exclusivamente ao magistério e à advocacia. Em outubro de 1907 foi nomeado ministro do Supremo Tribunal Federal, na aposentadoria de Lúcio de Mendonça.

O livro Do Poder Judiciário (1915) é um clássico na matéria e publicou também várias outras obras: Estudos de Filosofia do Direito (1912), Dissertações e Polêmicas – Estudos jurídicos (1909), Discursos e Conferências (1916) e É a História uma Ciência? - Introdução à História da Civilização de Buckle.

Pedro Lessa foi um modelo de juiz, no tribunal em que teve assento, e o foi pelo saber profundo, pela coragem das atitudes e pela determinação. Na atuação destacada que teve no Supremo Tribunal Federal foi responsável pela ampliação no Instituto Hábeas-Corpus a outros casos não previstos na Constituição. No magistério, na advocacia e na magistratura, norteou sua atividade pelo amor ao Brasil. Foi também esse amor que o levou a ser um dos elementos de maior assiduidade e trabalho na Liga da Defesa Nacional. Pertenceu a várias instituições culturais, entre as quais o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.

Segundo ocupante da Cadeira 11, da Academia Brasileira de Letras, eleito em 7 de maio de 1910, na sucessão a Lúcio de Mendonça e recebido pelo Acadêmico Clóvis Beviláqua em 6 de setembro de 1910. recebeu o Acadêmico Alfredo Pujol.

Obras: Interpretação dos Arts. 23, 34, 63 e 65 da Constituição Federal (1899); É a história uma ciência?, ensaio (1900); Dissertações e polêmicas - Estudos jurídicos (1909); Estudos de filosofia do direito (1912); O determinismo psíquico e a imputabilidade e responsabilidade criminais (1915); Do Poder Judiciário (1915); Discursos e conferências (1916).

Fontes:
Academia Brasileira de Letras
wikipedia

Moacyr Scliar (Na Noite do Ventre, o diamante)


Na pequena aldeia judaica no sul da Rússia, a cada sexta-feira, na festa do Shabat, a cena se repetia na casa de Itzik Nussembaum. Esther, sua mulher, apresentava ao marido e aos dois filhos o dedo anular – segundo ela, apenas um dedo feio e maltratado em mãos feias e matratadas – e, num gesto reverente, solene, orgulhoso, coloca nele o velho anel da família. Que tem um belíssimo diamante engastado.

É este diamante o centro de uma história fascinante que começa em 1662 numa vila escondida de Minas Gerais, onde é encontrado. Do século XVII, o diamante é levado do Arraial da Cabra Branca por um cristão-novo que foge da Inquisição para a Holanda. Na Europa, a pedra é lapidada por um discípulo do Spinoza - numa das mais belas passagens do livro, em que se associam as idéias geniais do filósofo ao valor de mercadorias e ao sentido da própria vida.

Roubada por outro discípulo de Spinoza, o diamante chega à Rússia, onde se torna herança de família e passar a ser usado por Esther Nussembaum. Quando esta família decide fugir da Rússia, já no começo do século XX, para tentar vida nova no Brasil, se dão conta de que a única coisa valiosa que possuem é o diamante. Com medo dos bandidos na fronteira, fazem com que um dos filhos engula o aro do anel e, o outro, a pedra preciosa. Este último, Gregório, fica com o diamante preso no intestino, o que gera terríveis dramas familiares.

Numa narrativa engenhosa, Moacyr Scliar traz à cena figuras como o padre Antonio Vieira e o filósofo Spinoza, tornando o leitor cúmplice de um saboroso jogo entre realidade e ficção e conduzindo-o a um final absolutamente inesperado.

Há muitos anos Scliar tinha em mente a história de um diamante viajando no tempo e no mundo. O convite para que assinasse o livro inspirado no dedo anular caiu, literal e metaforicamente, como luva - e assim Na Noite do Ventre, o diamante encerra de forma brilhante a coleção Cinco Dedos de Prosa.

Moacyr Scliar é também médico, membro da Academia Brasileira de Letras, autor de 73 livros, bem como professor na área de saúde pública no Rio Grande do Sul, seu estado natal.

Fonte:
Editora Objetiva

Poesia Concreta


Ao trabalhar de forma integrada o som, a visualidade e o sentido das palavras, a poesia concreta propõe novos modos de fazer poesia, visando a uma ‘arte geral da palavra’. A expressão joyceana verbivocovisual sintetiza essa proposta que, desde os anos 1950, foi colocada em prática pelos poetas Augusto de Campos, Décio Pignatari, Haroldo de Campos, José Lino Grünewald e Ronaldo Azeredo, desdobrando-se até hoje, ao longo de mais de cinco décadas de produção em suportes e meios técnicos diversos – livro, revista, jornal, cartaz, objeto, lp, cd, videotexto, holografia, vídeo, internet.

Concebida no calor do empreendimento mais geral de construção de um Brasil moderno, como um projeto em desenvolvimento, esta poesia coloca em jogo formas renovadas de sensibilidade e de experiência. Alarga, ao mesmo tempo, os parâmetros de discussão de poesia, ultrapassando o âmbito literário.

Os poetas concretos estabeleceram, desde o início, ligações entre a sua produção, a música contemporânea, as artes visuais e o design de linhagem construtivista. Reprocessaram elementos dessas artes em seus poemas e mantiveram extensa colaboração com artistas e designers, compositores e intérpretes, seja na esfera da música erudita, seja na da música popular, sem falar de outros poetas e críticos, tanto do Brasil quanto do exterior.

Além de sua própria produção e da atividade teórica, empenharam-se ainda na constituição de um amplo repertório de formas poéticas, por meio da revisão crítica de autores e da tradução de uma grande variedade de obras de outros idiomas para o português, sob o parâmetro da invenção estética.

Características

A poesia concreta surgiu com o Concretismo, fase literária voltada para a valorização e incorporação dos aspectos geométricos à arte (música, poesia, artes pláticas).

Em 1952, a poesia concreta tem seu marco inicial através da publicação da revista “Noigrandes”, fundada por três poetas: Décio Pignatari, Haroldo de Campos e Augusto de Campos.

Contudo, é em 1956, com a Exposição Nacional de Arte Concreta em São Paulo, que a poesia concreta se consolida como uma nova e inusitada vertente da literatura brasileira.

O poema do Concretismo tem como característica primordial o uso das disponibilidades gráficas que as palavras possuem sem preocupações com a estética tradicional de começo, meio e fim e, por este motivo, é chamado de poema-objeto.

Outros atributos que podemos apontar deste tipo de poesia são:

- a eliminação do verso;
- o aproveitamento do espaço em branco da página para disposição das palavras;
- a exploração dos aspectos sonoros, visuais e semânticos dos vocábulos;
- o uso de neologismos e termos estrangeiros;
- decomposição das palavras;
- possibilidades de múltiplas leituras.

A comunicação através do visual era a forma de expressão de todas as poesias concretas. No entanto, houve particularidades que diferenciavam os poemas deste período em tipos de poesias. Vejamos:

● Poesia-Práxis: movimento liderado por Mário Chamie, que a partir de 1961 começou a adotar a palavra como organismo vivo gerador de novos organismos vivos, ou seja, de novas palavras.

● Poesia social: movimento de reação contra os formalismos da poesia concreta, os quais eram considerados exagerados por um grupo de artistas. Estes lutavam para o retorno e a inclusão de uma linguagem simples e de temas direcionados à realidade social. Artistas como Ferreira Gullar e Thiago de Mello foram adeptos dessa visão.

● Tropicalismo: movimento advindo do universo musical dos anos 67 e 68, que retomava as propostas de Oswald de Andrade com o Manifesto Antropófago e adotou o pensamento de aproveitar qualquer cultura, independente de onde viesse.

● Poesia Marginal: surgiu na década de 70 e é chamada de “marginal” porque não possuía vínculos com editoras ou distribuidoras para edição e/ou publicação, ou seja, era produção independente.

Fontes:
http://www.mundoeducacao.com.br/literatura/poesia-concreta.htm
http://pt.wikipedia.org/wiki/Poesia_concreta
http://www.poesiaconcreta.com.br/

Augusto de Campos (Poesia Concreta: um manifesto)



- a poesia concreta começa por assumir uma responsabilidade total perante a linguagem: aceitando o pressuposto do idioma histórico como núcleo indispensável de comunicação, recusa-se a absorver as palavras com meros veículos indiferentes, sem vida sem personalidade sem história - túmulos-tabu com que a convenção insiste em sepultar a idéia.

- o poeta concreto não volta a face às palavras, não lhes lança olhares oblíquos: vai direto ao seu centro, para viver e vivificar a sua facticidade.

- o poeta concreto vê a palavra em si mesma - campo magnético de possibilidades - como um objeto dinâmico, uma célula viva, um organismo completo, com propriedades psicofisicoquímicas tacto antenas circulação coraação: viva.

- longe de procurar evadir-se da realidade ou iludí-la, pretende a poesia concreta, contra a introspecção autodebilitante e contra o realismo simplista e simplório, situar-se de frente para as coisas, aberta, em posição de realismo absoluto.

- o velho alicerce formal e silogístico-discursivo, fortemente abalado no começo do século, voltou a servir de escora às ruínas de uma poética comprometida, híbrido anacrônico de coração atômico e couraça medieval.

- contra a organização sintática perspectivista, onde as palavras vêm sentar-se como "cadáveres em banquete", a poesia concreta opõe um novo sentido de estrutura, capaz de, no momento histórico, captar, sem desgaste ou regressão, o cerne da experiência humana poetizável.

- mallarmé (un coup de dés-1897), joyce (finnegans wake), pound (cantos-ideograma), cummings e, num segundo plano, apollinaire (calligrammes) e as tentativas experimentais futuristasdadaistas estão na raíz do novo procedimento poético, que tende a imporse à organização convencional cuja unidade formal é o verso (livre inclusive).

- o poema concreto ou ideograma passa a ser um campo relacional de funções.
o núcleo poético é posto em evidencia não mais pelo encadeamento sucessivo e linear de versos, mas por um sistema de relações e equilíbrios entre quaisquer parses do poema.

- funções-relações gráfico-fonéticas ("fatores de proximidade e semelhança") e o uso substantivo do espaço como elemento de composição entretêm uma dialética simultânea de olho e fôlego, que, aliada à síntese ideogrâmica do significado, cria uma totalidade sensível "verbivocovisual", de modo a justapor palavras e experiência num estreito colamento fenomenológico, antes impossível.

- POESIA-CONCRETA: TENSÃO DE PALAVRAS-COISAS NO ESPAÇO-TEMPO.

Fonte:
Revista A&D - Arquitetura e Decoração, n.20. São Paulo, novembro/dezembro de 1956

Augusto de Campos (Poemas)


Ferida

fer
ida
sem
ferida
tudo
começa
de novo
a cor
cora
a flor
o ir
vai
o rir
rói
o amor
mói
o céu
cai
a dor
dói
–––––––––––––––––––––––



TENSÃO

Este poema é, como afirma Charles Perrone, “uma teia de elos sonoros e semânticos meticulosamente construída” (*)”Ten-são” é o tema que se expande. “Tem” em forma de cruz para cima (“tem”), para um lado (“tem”), para o outro (“tam”) e para baixo (“tom”). “São” o faz em diagonal “som” e “sem som” . Os elementos que sobram formam um triângulo: “con”, ”com” e “can”- e uma diagonal: “bem”, “bem”. Todos estão a uma mesma distância do centro que é um nó em tensão. Segundo os princípios das palavras, há quatro grupos (“t”, “s”, “k” e “b”, mas há somente um se considerarmos as letras finais (todas estão enlaçadas pela nasalização). Assim como Augusto de Campos extrai quantidade de possibilidades do visual das palavras, também aproveita sua sonoridade, indo do “com som” ao “sem som” e extraindo valor onomatopaico das sílabas. Ao fazer um percurso clássico do olhar – da direita à esquerda -, vê-se que o poema é a tensão entre o silêncio: do “com som” ao “sem som”.

O texto original explica que o poema foi composto por Augusto de Campos em sua fase “matemática” em que há o uso intencional das leis gestálticas, “segundo o modelo regular que dispõe os signos em uma quadrícula”.

––––––––––-

“sol de maiakovski”, uma “intradução” de Augusto de Campos, termo usado pelo poeta-tradutor para uma criação a partir da tradução... [“A palavra joga com “tradução”, “introdução”, o prefixo “in” (este “in”, que se opõe ao “ex”, é a interioridade do poema, de todos os poemas inventivos ou radicais com os quais os poetas concretos se sentem identificados a partir dos critérios de inovação), e também o termo “intra”, que marca o caráter textual e autonomaizador da operação”. Gonzalo Aguilar, op. cit. p. 282

O poema em questão recoloca o verso na criação do poeta, embora mantenha a idéia da quadrícula, da geometrização do poema. Aguilar informa, acredito que equivocadamente, que “Os versos de Maiakóvski combinam-se aqui com versos de canções de Caetano Veloso (“gente é pra briilhar”) e de Roberto Carlos (“que tudo mais vá pro inferno”). Em verdade, “gente é pra brilhar,/ que tudo mais vá pro inferno” são versos do próprio Maiakóvski, de 1920, do longo e famoso poema “ A Extraordinária Aventura Vivida Por Vladmir Maiakóvski no Verão na Datcha”, em tradução feita pelo próprio Augusto de Campo; não são versos de Caetano e Roberto Carlos, que simplesmente teriam se apropriado dos mesmos, “intertextualmente” em suas famosas canções. De tão difundidas, passaram a ser atribuídas a eles e não ao verdadeiro autor e tradutor...

Vale ainda ressaltar que a palavra “tudo” aparece em realce, no centro da composição. (Antonio Miranda)

Fonte:
http://www.antoniomiranda.com.br/

Augusto de Campos (1931)


Augusto Luís Browne de Campos nasceu em São Paulo, em 1931, poeta, tradutor, ensaísta, crítico de literatura e música.

Em 1951, publicou o seu primeiro livro de poemas, O REI MENOS O REINO. Em 1952, com seu irmão Haroldo de Campos e Décio Pignatari, lançou a revista literária "Noigandres", origem do Grupo Noigandres que iniciou o movimento internacional da Poesia Concreta no Brasil. O segundo número da revista (1955) continha sua série de poemas em cores POETAMENOS, escritos em 1953, considerados os primeiros exemplos consistentes de poesia concreta no Brasil. O verso e a sintaxe convencional eram abandonados e as palavras rearranjadas em estruturas gráfico-espaciais, algumas vezes impressas em até seis cores diferentes, sob inspiração da Klangbarbenmelodie (melodia de timbres) de Webern.



Em 1956 participou da organização da Primeira Exposição Nacional de Arte Concreta (Artes Plásticas e Poesia), no Museu de Arte Moderna de São Paulo. Sua obra veio a ser incluída, posteriormente, em muitas mostras, bem como em antologias internacionais como as históricas publicações Concrete Poetry: an International Anthology, organizada por Stephen Bann (London, 1967), Concrete Poetry: a World View, por Mary Ellen Solt (University of Bloomington, Indiana, 1968), Anthology of Concrete Poetry, por Emmet Williams (NY, 1968).

A maioria dos seus poemas acha-se reunida em VIVA VAIA, 1979, DESPOESIA (1994) e NÃO (com um CDR de seus Clip-Poemas), (2003). Outras obras importantes são POEMÓBILES (1974 e CAIXA PRETA (1975), coleções de poemas-objetos em colaboração com o artista plástico e designer Julio Plaza.

Como tradutor de poesia, Augusto especializou­se em recriar a obra de autores de vanguarda como Pound (Mauberley, The Cantos), Joyce (Finnegans Wake), Gertrude Stein e Cummings, ou os russos Maiakóvski e Khliébnikov, Traduziu também alguns dos grandes "inventores" do passado: Arnaut Daniel e os trovadores provençais, Donne e os "poetas metafíscos", Mallarmé e os Simbolistas franceses.

Uma primeira antologia de sua obra tradutória, expandida depois em diversas monografias, é VERSO REVERSO CONTROVERSO (1978). Algumas de suas últimas publicações nesse campo: RIMBAUD LIVRE (1992), HOPKINS: A BELEZA DIFÍCIL (1997) e COISAS E ANJOS DE RILKE (2001).

Como ensaísta é co­autor de TEORIA DA POESIA CONCRETA, com Haroldo de Campos e Decio Pignatari, 1965, and autor de outros livros tratando de poesia de vanguarda e de invenção, como POESIA ANTIPOESIA ANTROPOFAGIA, 1978, O ANTICRÍTICO, 1986, LINGUAVIAGEM, 1987, À MARGEM DA MARGEM, 1989. Com Haroldo e Pignatari lutou pela revalorização da obra de Oswald de Andrade, e também redescobriu a obra olvidada do poeta maranhense Sousândrade (1832-1902), um precursor da poesia moderna com seu "Inferno de Wall Street" (1877) em RE­VISÃO DE SOUSANDRADE,1964).

BALANÇO DA BOSSA (E OUTRAS BOSSAS), 1968-1974, reuniu seus estudos pioneiros sobre o Tropicalismo e a MPB assim como as suas intervenções no campo da música contemporânea tratando de Charles Ives, Webern, Schoenberg e os compositores brasileiros do grupo "Musica Nova". Ensaios posteriores enfocando a música e a poesia de Cage e as obra radicais de Varèse, Antheil, Cowell, Nancarrow, Scelsi, Nono, Ustvólskaia, entre outros, foram recolhidos no livro MÚSICA DE INVENÇÃO (1998).

A partir de 1980, intensificou os experimentos com as novas mídias, apresentando seus poemas em luminosos, videotextos, neon, hologramas e laser, animações computadorizadas e eventos multimídia, abrangendo som e música, como a leitura plurivocal de CIDADECITYCITÉ (com Cid Campos),1987/ 1991. Seus poemas holográficos (em cooperação com Moyses Baumstein) foram incluídos nas exposições TRILUZ (1986) e IDEHOLOGIA (1987).

Um videoclip do poema PULSAR, com música de Caetano Veloso, foi produzido por ele em 1984, numa estação Intergraph, com a colaboração do grupo Olhar Eletrônico. POEMA BOMBA e SOS, com música de seu filho, Cid Campos, foram animados numa estação computadorizada Silicon Graphics da Universidade de São Paulo, 1992-3. Sua cooperação com Cid, iniciada em 1987, ficou registrada em POESIA É RISCO (CD editado em 1995 pela PolyGram) e se desenvolveu no espetáculo de mesmo nome, uma performance "verbivocovisual" de poesia/música/imagem com edição de vídeo de Walter Silveira, apresentada em diversas cidades do Brasil e no exterior. Suas animações digitais - os CLIP­POEMAS - foram exibidas em 1997 numa instalação que fez parte da exposição Arte Suporte Computador, na Casa das Rosas, em São Paulo.

Fonte
http://www2.uol.com.br/augustodecampos/biografia.htm