segunda-feira, 26 de agosto de 2024

Vereda da Poesia = 95 =

 

Trova de Brusque/SC

MARIA LUIZA WALENDOWSKY

Fecho os meus olhos e sinto
a alma inundada de luz.
É Deus presente ao destino
nessa fé que me conduz!
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Poema de Vila Velha/ES

APARECIDO RAIMUNDO DE SOUZA

Prisioneiro

Você me seduz à liberdade.
A liberdade
é o remédio da alma,
a felicidade
que acalma...
Cada momento
é um querer novo,
um sentir diferente,
um eterno
encantamento.
Estar com você
é rodopiar
no carrossel da vida,
fugindo do presente
em desabalada
corrida.

Você me seduz
à saudade.
A saudade
é o bálsamo
do coração,
o remédio
que cura
a solidão...
Por isso,
estar com você
é como despencar
de uma montanha russa,
em extremo gesto
de loucura
e incontrolável sensação.

Você me seduz
ao amor...
O amor é
o bem mais perfeito
que o Criador concebeu
e colocou
aqui no meu peito...
Assim,
estar com você
é como se jogar
de um prédio alto,
sem medo,
sem amarras,
num voo cego:
a verdadeira
viagem sem fim...
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Trova de São José dos Campos/SP

NADIR GIOVANELLI

Eu vejo o tempo passar, 
recordo os anos dourados, 
mil bailes para dançar, 
e os sonhos realizados! 
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Soneto Inglês de Curitiba/PR

MÁRIO A. J. ZAMATARO

Depois de tudo

Depois do verso, o reverso.
Depois do amor, essa dor.
Depois do imerso, o disperso.
Mas tenho a flor de compor!

E do reverso, outro verso.
E dessa dor, meu amor.
Disperso o resto onde imerso
usei compor desta flor.

Reviravoltas em série
hão de cumprir o destino;
hão de espalhar desatino,
em pleno sol de intempérie.

E só depois disso tudo
hei de saber se me iludo.
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Trova Premiada em São Paulo/SP, 2003

ARITA DAMASCENO PETTENÁ 
Campinas/SP

Esta lágrima que brota
dentro da alma tão ferida,
é pingo de água sem rota,
perdido no chão da vida.
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Poema do Rio de Janeiro/RJ

CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE
Itabira do Mato Dentro/MG (1902 – 1987) Rio de Janeiro/RJ

Aula de Português

A linguagem
na ponta da língua
tão fácil de falar
e de entender. A linguagem
na superfície estrelada de letras,
sabe lá o que ela quer dizer?
Professor Carlos Góis, ele é quem sabe,
e vai desmatando
o amazonas de minha ignorância.
Figuras de gramática, equipáticas,
atropelam-me, aturdem-me, sequestram-me.
Já esqueci a língua em que comia,
em que pedia para ir lá fora,
em que levava e dava pontapé,
a língua, breve língua entrecortada
do namoro com a prima.
O português são dois; o outro, mistério.
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Trova Popular

Triste durmo, triste acordo,
triste torno a amanhecer.
Pra mim tudo é tristeza,
serei triste até morrer.
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Soneto do Rio de Janeiro/RJ

LUIZ POETA
(Luiz Gilberto de Barros)

Olhos infantis

Quando o olhar de uma criança denuncia 
O abandono, a solidão e o sofrimento, 
Torna-se inútil transformar esse momento
Num sentimento que alguém chame de poesia.

Quando o amor passa a ser só filosofia, 
À revelia do que sinta um coração,
Por ironia, há quem nem dê muita atenção
A esse olhar que tem a dor por moradia.

Mas no instante em que eu me torno esse menino
Há nos meus olhos, esse olhar tão pequenino,
Que apesar da dor, conserva a esperança

De que o mundo tenha olhos infantis
E que se alguém pensa em tornar alguém feliz,
Veja o que diz o coração de uma criança.
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Trova de Santos/SP

NAIR LOPES RODRIGUES

Nunca deixe que a fumaça
cubra o sol da sua vida,
ria sempre e faça graça
torne a lida divertida!...
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Poema de Belo Horizonte/MG

CLEVANE PESSOA

Fogo e serragem

Às vezes, sinto-me sem vontade
de tudo e de nada.
Amorfa,
moldo-me aos moldes
dos desejos alheios.
A dor, camuflada.
Os gemidos, sufocados.
Agonizo, molhada:
serragem
Às vezes,
embaixo de cinzas,
crepito, aqueço-me,
e em labaredas, refaço a luz
antiga,
subitamente.
Ardo,
em cadeia,
acendo tudo mais
que há por perto.
Incendeio, fogo em jogo
lúdico, atroz... 
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Trova Humorística de São Paulo/SP

THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA

Se alguém de "menina" o chama,
se ofende o nenê Raul
que, tirando o seu pijama,
mostra o... sapatinho azul!
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Soneto do Rio de Janeiro/RJ

MANUEL BANDEIRA
Recife/PE (1886 – 1968) Rio de Janeiro/RJ

Voz de fora

    Como da copa verde uma folha caída
    Treme e deriva à flor do arroio fugidio,
    Deixa-te assim também derivar pela vida,
    Que é como um largo, ondeante e misterioso rio...

    Até que te surpreenda a carne dolorida
    Aquela sensação final de eterno frio,
    Abre-te à luz do sol que à alegria convida,
    E enche-te de canções, ó coração vazio!

    A asa do vento esflora as camélias e as rosas.
    Toda a paisagem canta. E das moitas cheirosas
    O aroma dos mirtais sobe nos céus escampos.

    Vai beber o pleno ar... E enquanto lá repousas,
    Esquece as mágoas vãs na poesia dos campos
    E deixa transfundir-te, alma, na alma das cousas... 
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Trova de Nova Friburgo/RJ

JOANA D’ARC DA VEIGA

Brilha o sol, depois de posto,
  se os dedos de uma criança,
  vão reacendendo o meu rosto
  com afagos de esperança.
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Poema de Curitiba/PR

PAULO WALBACH PRESTES
1945 – 2021

A Ampulheta 

O hoje é o agora presente no tempo... 
Que escorre fatal entre os dedos da vida.
É sutil como a alma, fugaz como o vento,
E veloz e lento como a triste partida...

O amanhã; esperança e futuro do tempo,
que demora ou apressa a sua chegada;
Transparente ou difuso no encadeamento,
Auspicioso ou negro, tal a luz apagada...

O sino que toca, afugenta o dia...
Levando-o do ontem à posteridade
Pela noite que invade na pura magia,
deixando pra gente a doída saudade...

Funde-se tudo na eternidade,
e não apenas na onírica poesia...
A fina areia silenciosa invade
Na cápsula inversa: eterna liturgia.
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Trova de Campo Mourão/PR

JOSÉ FELDMAN

Saudade... é igual à tristeza
 de quem,  ao partir num trem,
na estação deixa a incerteza
e, no lenço...o amor de alguém!
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Dobradinha Poética (trova e soneto) de Bandeirantes/PR

LUCÍLIA ALZIRA TRINDADE DECARLI

Se nada ganhas...

Não deves desanimar
ante uma escura jornada,
pois poderás vislumbrar
uma luz no fim da estrada!…

Se a trajetória é feita só de espera,
se recusaste a dor da despedida,
se o despontar do inverno te exaspera,
se a primavera não é mais florida...

Se o vendaval, cortante, ainda impera,
se a tempestade insiste, intrometida,
se sob teus pés abriu-se uma cratera,
se a solidão marcou a tua vida...

Se o céu, acima, está sempre nublado,
se a terra, em volta, é o caos indesejado,
se o sofrimento veio a ti, desnudo...

Caminha firme, sem desesperança,
vai renovando em ti calma e confiança.
— Se o ganho é nada, teu querer é tudo!...
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Trova Premiada em São Paulo/SP, 2003

REINALDO STERCKELE 
Santo André/SP

Absorto, na noite calma,
envolto em leve torpor,
sinto irrequieta minha alma
vagando em sonhos de amor.
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Poema de Catanduva/SP

ÓGUI LOURENÇO MAURI

A voz do vento

Nesta solidão, pude enfim perceber
Que a distância alimenta meu pensamento.
Sei também que é ela que dá voz ao vento
Quando ele vem forte em meu rosto bater.
Eu sei que é tua voz que o vento conduz,
Traz teu perfume e, de teus olhos, a luz;
Eólica injeção de amor pro meu ser.

Esta brisa sonora que tem teu cheiro,
Toque afrodisíaco, que revigora;
Teu calor chega e a meu tato se incorpora,
Eu sinto ao vento teu corpo por inteiro...
Quando o sopro soa forte em meus ouvidos,
Mais o amor por ti desperta em meus sentidos,
Num quadro de excitação já rotineiro.

Um amor aerívoro, de abstinência,
Em que procuro teus olhos mas não vejo,
Não posso te abraçar no auge do desejo,
Preciso de uma reversão de emergência...
Apesar do vento que me liga a ti,
Pede meu coração tua presença aqui...
E que seja para sempre, com urgência!
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Trova de Maringá/PR

A. A. DE ASSIS

Ah, quantos lindos castelos 
põe a vida em nossa mão, 
lembrando os sonhos mais belos 
que temos no coração! 
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Soneto de Ilhavo/Portugal

DOMINGOS FREIRE CARDOSO

Tudo o que sou é como se nada fosse
(Maria da Glória Oliveira Cardoso in "O Meu Vestido Cor de Rosa", p. 68)

“Tudo o que sou é como se nada fosse”
Neste eterno correr de tantos anos
E com ritos banais, de tão profanos
Cremos fazer da vida um limão doce.

Uma vontade louca é que nos trouxe
Fome de sermos mais do que uns humanos
Mas por serem mortais e tão mundanos
A glória desses sonhos acabou-se.

Mergulho na insondável vacuidade
Que me esvai como atroz enfermidade
E eu sofro-a, venenosa como cobra.

É tão pequeno e pobre o meu viver
Que no dia final, quando eu morrer
Tudo de mim se acaba e nada sobra.
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Trova Humorística de Belo Horizonte/MG

PAULO EMÍLIO PINTO
Conselheiro Lafaiete, 1906 – ????, Belo Horizonte/MG

Sempre que o Dr. Clemente
fazia uma operação,
o coveiro, previdente,
ficava de prontidão!
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Hino de Campina Grande/PB

Venturosa Campina querida,
Ó cidade que amo e venero!
O teu povo o progresso expande,
És na terra o bem que mais quero!
O teu céu sempre azul cor de anil,
Tuas serras de verde vestidas
Salpicadas com o ouro do sol,
Ou com a hóstia dos brancos luares!

Eterno poema
De amor à beleza,
Ó recanto abençoado do Brasil!
Onde o Cruzeiro do Sul resplandece.
Capital do trabalho e da paz!

Oficina de ilustres varões,
Canaã de leais forasteiros,
És memória de índios valentes.
E singelos e alegres tropeiros!
Tua glória revive, Campina,
Na imagem dos homens audazes,
Aguerridos heróis de legendas
Que marcaram as tuas fronteiras!

Eterno poema
De amor à beleza,
Ó recanto abençoado do Brasil!
Onde o Cruzeiro do Sul resplandece,
Capital do trabalho e da paz!
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Trova de São Paulo/SP

SARA MARIANI KANTER

Saudade, circo às escuras,
onde um palhaço, a ilusão,
faz trejeitos e mesuras
para o nada e a solidão.
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Poema de Cachoeira do Sul/RS

JAQUELINE MACHADO

Anjo de uma asa só

Amor próprio é mais do que importante, 
é essencial.
Só não podemos confundir amor próprio 
com total autossuficiência. 
Ninguém é autossuficiente. 
Acreditar nisso 
é acreditar na maior mentira da vida.
Somos todos anjos de uma asa só. 
E precisamos do outro para poder voar...
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Trova de Paraisópolis/MG

SÔNIA MARIA DE FARIA

Invejo, querida, a lua
que invade a tua janela
e te beija quase nua...
Ah! Morro de ciúmes dela.
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Fábula em Versos da França

JEAN DE LA FONTAINE
Château-Thierry, 1621 – 1695, Paris


O Sol e as rãs

Do rei dos astros proteção, socorros
Tinham do lodo as filhas.
Nem guerras, nem pobreza,
Nem mil outros desastres
Perto nem longe à tal nação chegavam;
Nação, que em mil lameiros,
Seus poderes blasona*.
As rainhas dos charcos... (Das rãs falo;
Que custa às coisas dar honroso nome?)
Contra o seu benfeitor conluios tramam,
Fazem-se insuportáveis.
A imprudência, com o orgulho, e o esquecimento
Dos benefícios — filhos da aura próspera —
Impeliram os brados
Desse bando importuno.
Ninguém dormia em paz. Se dessem crédito
Ao que elas murmuravam, já teriam
Aos grandes, aos pequenos rebelado,
Com os seus gritos, contra o olho do universo.
O Sol, ao que diziam,
Ia dar cabo de tudo;
«Importa armar-se, e presto
Levantar grosso exército.»
Mal dava um passo o Sol, já despediam
Grasnantes embaixadas.
A crê-las, todo o mundo
E a máquina redonda
Rodam sobre interesses
De quatro pífios charcos.
Dura ainda hoje essa queixa temerária.
Calar-se as rãs, não murmurarem tanto,
Contudo, lhes cumpria:
Que lhe fará sentir o Sol, se ele se agasta:
E mui bem poderia arrepender-se
A aquática república.
==========================
* blasona = ostenta.

O nosso português de cada dia (Expressões) = 2

COMER O FÍGADO DE ALGUÉM

Punir severamente alguém por algo que não deveria ter sido feito.

A expressão tem origem mitológica na punição de Prometeu. Diz a lenda que Prometeu, filho do titã Jápeto, era primo de Zeus, o mais importante deus do Panteão helénico, que, por sua vez, era filho de Cronos.

Zeus era rei dos homens e dos deuses, um deus que reinava nas alturas luminosas do céu e foi aviltado e enganado por Prometeu duas vezes: a primeira, quando dividiu um boi dando carnes e vísceras para os homens e ossos e banha ao deus supremo; a segunda, quando roubou sementes de fogo do sol ou da forja de Héfesto e deu de presente aos humanos. O pai dos deuses resolveu se vingar dele e dos homens, que eram seus protegidos: para os homens enviou Pandora com seus vícios (vide caixa de Pandora); Prometeu, por sua vez, foi acorrentado no alto do Cáucaso e tinha seu fígado devorado por uma águia durante o dia, porém, à noite a víscera se refazia para ser novamente devorada pelo pássaro no dia seguinte.

COMER GRAMA PELA RAIZ

Morrer, falecer.

A expressão jocosa para significar pessoa morta nasceu da observação da posição em que o morto se encontra embaixo da terra, com a boca voltada para cima e, portanto, teoricamente, de encontro às raízes da grama que cresceria por cima de seu túmulo.

COMPLICAÇÃO

A palavra que todos conhecemos tem a mesma origem de explicação, duplicação, etc.

Plicas, em latim quer dizer dobras, portanto quem está complicando, está colocando dobras em alguma coisa. Ao contrário se estiver explicando, estará retirando as tais dobras e facilitando a vida de quem, porventura, entrar em contato com o objeto sem as dobras.

Por isso, chamamos também as saias ou blusas que possuem pequenas dobras em sequência, de plissadas.

CÂNONE

Modelo, maneira de agir, padrão. É comum ouvir as pessoas dizerem que algo serve de cânone.

A expressão é muito antiga e surgiu ao acaso. O escultor Polyclitus, por volta do ano 450 a. C, esculpiu a estátua de um homem com uma lança e uma amazona ferida, suas proporções eram tão perfeitas e simétricas, que seu autor a chamou de cânone, e assim permaneceu influenciando a arte até o nascimento das vanguardas.

CANTEIRO DE OBRAS

Hoje o termo é empregado para designar qualquer espaço definido para a realização de trabalhos manuais, mais associados, evidentemente, à construção civil.

Muitos pensam que a expressão deriva do ato de cantar enquanto se trabalha. O termo, no entanto, é mais preciso, quer dizer pedreiro: de canto [pedra] + o sufixo -eiro. Canteiro, portanto, diria respeito ao operário que trabalha em cantaria, isto é, com pedras, à época da criação do termo, quebrando-as. Canteiro, portanto, seria sinônimo de pedreiro, na sua origem.

Fonte: Nailor Marques Jr. Será o Benedito?: Dicionário de origens de expressões. Maringá/PR: Liceu, 2002.

Recordando Velhas Canções (Caminhemos)


(samba-canção, 1948)

Compositor: Herivelto Martins

Não, eu não posso lembrar que te amei
Não, eu preciso esquecer que sofri
Faça de conta que o tempo passou
E que tudo entre nós terminou
E que a vida não continuou pra nós dois
Caminhemos, talvez nos vejamos depois

Vida comprida, estrada alongada
Parto à procura de alguém
Ou à procura de nada...
Vou indo, caminhando
Sem saber onde chegar
Quem sabe na volta
Te encontre no mesmo lugar
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Caminhos Separados: A Dor e a Esperança em 'Caminhemos'
A música 'Caminhemos', de Herivelto Martins, é uma obra que aborda a dor da separação e a necessidade de seguir em frente, mesmo diante do sofrimento. A letra começa com uma negação enfática: 'Não, eu não posso lembrar que te amei / Não, eu preciso esquecer que sofri'. Essa negação reflete a luta interna do eu lírico para superar um amor passado e a dor associada a ele. A repetição do 'não' enfatiza a dificuldade de esquecer e a necessidade de se distanciar emocionalmente.

A canção segue com uma tentativa de racionalização: 'Faça de conta que o tempo passou / E que tudo entre nós terminou'. Aqui, o eu lírico sugere uma espécie de autoengano como mecanismo de defesa, fingindo que o tempo curou todas as feridas e que a relação chegou ao fim de forma natural. No entanto, a melancolia persiste, evidenciada pela frase 'E que a vida não continuou pra nós dois', indicando que, apesar dos esforços, a vida sem o outro ainda parece incompleta.

O refrão 'Caminhemos, talvez nos vejamos depois' traz uma mistura de resignação e esperança. A ideia de caminhar simboliza a jornada da vida, cheia de incertezas e possibilidades. A estrada longa e a busca por algo ou alguém ('Parto à procura de alguém / Ou à procura de nada...') refletem a incerteza do futuro e a necessidade de seguir em frente, mesmo sem um destino claro. A última estrofe, 'Quem sabe na volta / Te encontre no mesmo lugar', sugere uma esperança tênue de reencontro, mas também a aceitação de que a vida pode seguir caminhos diferentes.

"Caminhemos não tem história", declara Herivelto Martins, "é o reflexo de mil histórias, de um estado de espírito que eu vivia e o público desconhecia". Na realidade, atravessando na época um período conturbado de sua vida sentimental, o compositor extravasava em sua música os problemas que o afligiam.

Assim, não foi por acaso que saíram em sequência "Segredo", "Caminhemos", "Cabelos brancos" e, por fim, as composições que marcaram a polêmica de sua separação da mulher, Dalva de Oliveira. Lançado em novembro de 47, "Caminhemos" firmou-se na preferência popular após o carnaval do ano seguinte.
Fontes: 

domingo, 25 de agosto de 2024

Therezinha Dieguez Brisolla (Trov’ Humor) 37

 

Trovador Homenageado do Dia: Professor Garcia (Trovas em preto e branco)

                                   

1
A dor que se intensifica
e amedronta os dias meus,
é pensar na dor que fica
depois da palavra adeus!
2
A liberdade do poeta,
está num verso... Num grito...
No equilíbrio se completa,
vencendo o próprio infinito!
3
A musa chega e me inspira,
num delírio encantador...
Afina as cordas da lira
e enche o meu mundo de amor!
4
A solidão me angustia
e à noite aumenta o meu drama,
vendo a cadeira vazia
que a tua ausência reclama!
5
Cada tropeço me ensina
que a vida é eterno sonhar.
Na vida nada termina,
muda de forma e lugar.
6
Cadeira velha!...Esquecida,
sem dono e sem mais ninguém...
Só a saudade atrevida
reclama a ausência de alguém!
7
Dai-nos ó, Pai, a razão,
desta santa imagem tua…
e que eu reparta o meu pão,
com quem não tem pão na rua!!!
8
Esta aliança que um dia,
já guardou nossos segredos;
hoje guarda a nostalgia
das digitais de outros dedos!
9
Já pronta e de vela içada
tremulando de ansiedade,
vai para o mar a jangada
carregada de saudade!
10
Morre a flor na flor da idade,
padece a planta de dor;
a ausência deixa saudade,
até na morte da flor!
11
Ninguém é pedra polida,
se não mudar de conduta;
pois, a pedreira da vida
é feita de pedra bruta!
12
O mundo é roda gigante,
girando sempre a girar,
e eu sou passageiro errante
procurando meu lugar!
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

SOBRE AS TROVAS DO PROFESSOR GARCIA
por José Feldman

As "Trovas do Professor Garcia" revelam uma rica reflexão sobre sentimentos universais, como a dor, a saudade, a liberdade e a busca por significado na vida. Cada estrofe aborda temas profundos e humanos, utilizando imagens poéticas para transmitir emoções.

TEMAS PRINCIPAIS

Saudade e Ausência: Muitas trovas expressam a dor da ausência, seja de uma pessoa amada ou de momentos passados, como na cadeira vazia e na aliança que guarda nostalgia.

Liberdade e Criatividade: A liberdade do poeta é um tema recorrente, mostrando como a arte e a expressão criativa são formas de superar limites e encontrar significado.

Reflexão sobre a Vida: Há uma contemplação sobre o aprendizado que vem com as dificuldades e a transitoriedade da vida, sugerindo que nada é permanente.

Solidão e Conexão: A solidão é uma constante, mas também é um espaço onde a conexão com a própria essência e com a arte pode florescer.

AS TROVAS, UMA A UMA

1. A dor que se intensifica
Reflete a dor emocional que acompanha a despedida. A repetição da palavra "dor" enfatiza a profundidade do sofrimento. A ideia de que a dor persiste após o adeus sugere que as memórias são difíceis de esquecer.

2. A liberdade do poeta
Esta trova destaca a relação entre a criação poética e a liberdade. O verso e o grito representam a expressão autêntica. A conclusão sobre vencer o infinito sugere que a arte transcende limitações.

3. A musa chega e me inspira
A musa é uma figura clássica que simboliza a inspiração. A metáfora da lira afina as emoções, indicando que a arte é um meio de conectar-se ao amor e à beleza.

4. A solidão me angustia
A solidão é personificada através da cadeira vazia, simbolizando a presença da ausência. Essa imagem é poderosa, evocando tristeza e uma forte conexão emocional com quem foi perdido.

5. Cada tropeço me ensina
Reflete a ideia de que cada dificuldade é uma oportunidade de aprendizado. A vida como um eterno sonhar sugere que as transformações são constantes e necessárias.

6. Cadeira velha!... Esquecida
A cadeira representa a solidão e a saudade. A descrição de uma cadeira sem dono evoca a perda e a nostalgia, mostrando como objetos podem carregar memórias.

7. Dai-nos ó, Pai, a razão
Uma invocação à divindade, pedindo compreensão e compaixão. A imagem de repartir o pão enfatiza a importância da solidariedade e da empatia em tempos de necessidade.

8. Esta aliança que um dia
A aliança simboliza promessas e segredos compartilhados. A mudança de quem toca a aliança indica a passagem do tempo e o que foi perdido, trazendo um tom melancólico.

9. Já pronta e de vela içada
A jangada simboliza a jornada emocional. Carregada de saudade, sugere que as lembranças e sentimentos ainda influenciam o presente, mesmo em novos começos.

10. Morre a flor na flor da idade
A morte da flor na juventude é uma metáfora para a efemeridade da vida. A ausência deixa saudade, mostrando que até a beleza tem um fim, mas deixa lembranças.

11. Ninguém é pedra polida
A metáfora da pedra sugere que o crescimento pessoal exige mudança e adaptação. A "pedreira da vida" simboliza os desafios que moldam quem somos.

12. O mundo é roda gigante
A roda gigante representa a ciclicalidade da vida e a busca incessante por um lugar no mundo. O "passageiro errante" reflete a incerteza e a busca por identidade e pertencimento.

ESTRUTURA POÉTICA
Rimas e Ritmo: As trovas possuem uma musicalidade que facilita a leitura e a memorização. Isso é típico da poesia popular, tornando-as acessíveis a um público amplo.

Imagens Visuais: As metáforas e imagens, como a cadeira vazia e a jangada, criam cenários que evocam emoções profundas. Essas imagens tornam as experiências universais e relatáveis.

IMPACTO 
As trovas têm um poder emocional significativo. Ao abordar temas como dor, saudade e liberdade, elas podem tocar o coração dos leitores, provocando reflexão e empatia. A simplicidade das palavras contrasta com a profundidade dos sentimentos, permitindo uma conexão imediata.

CONCLUSÃO
As trovas se destacam pela sua simplicidade, musicalidade e conexão emocional. Elas servem como uma ponte entre a tradição poética e a experiência cotidiana, fazendo com que sentimentos universais sejam facilmente compartilhados e apreciados. Enquanto outros estilos podem exigir uma leitura mais atenta ou interpretação, as trovas convidam à reflexão de maneira direta e acessível.

O uso de trovas é comum em várias culturas, onde a poesia é utilizada para expressar sentimentos e contar histórias de forma concisa e impactante.

As "Trovas do Professor Garcia" não são apenas poemas; são reflexões sobre a condição humana. Elas capturam a essência da vida, com suas dores e alegrias, e convidam o leitor a se conectar com suas próprias experiências.

Fonte: José Feldman. 50 Trovadores e suas Trovas em preto e branco. IA Open. vol.1. Maringá/PR: Biblioteca Voo da Gralha Azul. 2024.