Aliança! algema divina,
a mais doce das prisões;
uma prisão pequenina
que encerra dois corações.
2
Ama a tua arte. Por ela
faze o bem: ama e perdoa.
A bondade é sempre bela,
a beleza é sempre boa.
3
AMBIÇÃO – De olhar agudo,
marcha, firme, aos seus ideais;
quer pouco, que mais, quer tudo;
se tem tudo ainda que mais.
4
Amizades são incertas.
Ao fazê-las, desconfia:
esta mão que agora apertas
bem pode espancar-te um dia.
5
Ao te ver fico mudo
mas mesmo assim, sou feliz.
Pois meu olhar te diz tudo
que a minha voz não te diz.
6
A Saudade é calculada
por algarismos também:
distância multiplicada
pelo fator “querer bem”.
7
Como infeliz é esta gente
que pensa que ser feliz
é não dizer o que sente
e não sentir o que diz!
8
Como será compreendida
a incongruência da sorte?
Pois há quem nasça sem vida
e ninguém morre sem morte.
9
Com tuas frias maneiras
eu não me incomodo, pois,
embora tu não me queiras,
meu amor vale por dois.
10
Cora a moral, fica rubra,
ante a imodéstia; pois, certo,
é feio que se descubra
o que deve ser coberto.
11
Da morte a sentença imprensa
trazemos desde o nascer:
assim que a vida começa
começa a gente a morrer.
12
Da vida o relógio rode
até que a corda se acabe…
Em moço, nada se sabe;
em velho, nada se pode…
13
Depois de uma vida airada,
ao céu quis ir sem licença.
São Pedro pede-lhe a entrada-
e o morto, arrogante: – Imprensa!
14
Dinheiro não há que abrande
a dor que um peito magoa:
uma sorte é ” sorte grande”
outra coisa é ” sorte boa “.
15
Dos versos os mais diversos
já fiz: muita gente os lê…
Mas “poesia” há nos versos
que eu fiz pensando em você.
16
Elo de ouro! És a esperança
de horas risonhas e calmas!
Felizes dos que, na aliança,
acham a aliança das almas.
17
Este velho batoteiro
quando a morte o trouxe cá,
ao ver a pá… do coveiro
foi dizendo: – bacará !
18
Eu, neste assunto de esmola
sem ambições me suponho:
estendo a minha sacola
peço um bocado de sonho…
19
Foi-me o amor, na mocidade,
um passatempo, comum:
tantas amei que, em verdade,
nunca tive amor nenhum.
20
Isto de amar considero
que ser amado requer.
E é por isso que eu não quero
querer a quem não me quer.
21
Jurar é falar a esmo,
é prometer sem pensar.
Juras não faças; nem mesmo
a jura de não jurar.
22
LIBERDADE – O cidadão
livre, tem todo o direito
de fazer o que o patrão
acha que deve ser feito.
23
Maldigo quem te ache feia,
quem te ache bela também.
Quero mal a quem te odeia
e odeio a quem te quer bem.
24
Mente o peito que suspira?
O beijo é só falsidade?
Bendigamos a mentira
se ela é melhor que a verdade.
25
Meu amor enche-me a vida
e eu vivo feliz assim.
Basta que gostes, querida,
de ser querida por mim.
26
Morena de olhos castanhos,
teu encanto é a minha pena;
quem dera que olhos estranhos
te achassem feia, morena!
27
Na minha face estás lendo
que a minha mágoa é sem fim;
mas sinto alívio, sabendo
que não sofres… nem por mim!
28
Namorados. Para ouvi-los
faço, ao lado esforços vãos,
Como dois mudos, tranquilos,
falam somente com as mãos.
29
Não te queixes! Sofrem quantos
vivem, na vida, a lutar;
se não secassem os prantos,
o mundo era todo um mar.
30
Neste mundo organizado
de encontro à lei natural,
tudo que é bom é pecado
e o que é gostoso faz mal.
31
No amor não há diferença:
nós mentimos, vós mentis...
E, se um diz o que não pensa,
outro o que pensa não diz.
32
“O cão que ladra não morde”.
Permitam que nesta quadra
eu do provérbio discorde:
sim, não morde… enquanto ladra.
33
Olhos tristes ou risonhos
vejo entre a gente do povo
dos restos dos velhos sonhos
fabricando um sonho novo…
34
O meu coração é o cofre
que as minhas dores contém
e as dores que você sofre
eu nele guardo-as também.
35
O poderoso ? Merece
pena, lamento, piedade!
Ah! se ele ao menos pudesse
mandar na própria vontade!
36
Os sonhos tem saúde, entendo,
nasceram com boa estrela.
Pena é viverem sofrendo
pelo medo de perdê-la.
37
Para se amar é preciso,
de todo, o juízo perder;
ter-se a um tempo, amor e juízo
isto é que não pode ser.
38
Ponhamos no calendário
mais um santo português
milagroso Santo Hilário,
que os fados mais belos fez.
39
Quando Deus fez Portugal
lá plantou com sua mão
na terra; vinha e trigal
e o fado no coração.
40
Quando em meus braços te aperto,
satisfaço o meu desejo:
de mim te sinto tão perto,
tão perto que não te vejo.
41
Quando nós, discretamente
ficamos conosco a sós,
é que ouvimos quanta gente
chora e ri dentro de nós.
42
Quanta palavra bonita!
Quanto perdido latim!
E quanta cera erudita
para defunto tão ruim!
43
Quem canta seu mal espanta,
diz o provérbio ilusório.
Você, rapaz, quando canta
espanta, sim… o auditório.
44
Quem só a verdade aspira
com certeza inda não viu
que a verdade é uma mentira
que inda não se desmentiu.
45
Saudade, meiga Saudade
filha do amor e da ausência,
és a nossa mocidade
durante toda a existência.
46
Saudade é um mal que consiste
em sofrer por vontade
mas na vida o quanto é triste
não ter de quem ter saudade!
47
Saudade, palavra doce,
que traduz tanto amargor!
Saudade é como se fosse
espinho cheirando a flor.
48
Saudade – um suspiro, uma ânsia,
uma vontade de ver
a quem nos vê à distância
com os olhos do bem-querer.
49
Se a mulher que está contigo
vive do “outro” a dizer mal,
tem cuidado, meu amigo,
ela inda ama o teu rival.
50
Se a mulher sincera fosse,
sincera como o homem quer,
era uma vez... acabou-se
todo o encanto da mulher.
51
Se estou, meu amor, contigo,
tão feliz me considero
que quero mas não consigo
dizer-te o bem que te quero.
52
Seguro porto, esperança,
dos que andam pelo alto mar!
É nas procelas – bonança,
farol… estrela polar…
53
Se te olho de quando em quando,
Por Deus, não é por mau fim;
é que estou verificando
se tu olhas para mim.
54
Seu dinheiro o homem, cioso,
não confia a qualquer,
mas a honra de esposo
deixa nas mãos da mulher.
55
Trocar ideias contigo?
É possível, mas escuta:
quero ver, primeiro, o artigo
que ofereces à permuta.
56
Tu com todo o teu ardor
não estarás enganada?
Talvez confundas amor
com o prazer de ser amada.
57
Um filósofo de peso
é desta sentença o autor:
o beijo é fósforo aceso
na palha seca do amor.
58
Um longo olhar que se lança
numa carta ou numa flor;
Saudade – irmã da Esperança,
Saudade – filha do Amor.
59
Um sonho é ter-te ao meu lado,
a te ver, ouvir, palpar…
Que bom sonhar acordado
sem perigo de acordar!
60
Vacinei-me contra o amor
mas não tive resultado…
Nas farmácias – é um horror!-
tudo é falsificado.
61
Você diz que é cego o amor…
Como se engana você!
Fecha os olhos o impostor
para fingir que não vê.
Fonte:
Luiz Otávio e J. G. de Araújo Jorge (organizadores). Cem Trovas de Bastos Tigre. Coleção “Trovadores Brasileiros”- Editora Vecchi – 1959
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