quarta-feira, 3 de julho de 2024

Vereda da Poesia = 51 =


Trova Humorística de Maringá/PR

A. A. DE ASSIS

Entre o passado e o futuro,
mudou o amor um bocado:
- o que o vovô fez no escuro,
faz o neto, escancarado!
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Poema de Vila Velha/ES

APARECIDO RAIMUNDO DE SOUZA

À espera...

Aqui me pego, à tua saudade, esperando
que venhas e traga ternura em teus traços...
Porém, passam-se as horas... E já desanimado
Cismo que não chegarás até meus braços

E meus anseios vão se arrastando
em tua ausência c’os meus embaraços...
Tão depressa as horas foram passando,
Que até ouço a saudade e seus tristes passos...

Perto de mim, uma pá de gente segue cruzando
indiferente ao anseio de que desejo ver-te
e que aos poucos estou me definhando...

Esgotou-se o tempo... Esperar-te foi em vão.
Mas a angústia louca de amanhã rever-te,
faz regressar feliz este meu coração!...
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Aldravia do Rio de Janeiro/RJ

ELVANDRO BURITY

tentando
ser
amado
cobiço
seu
coração
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Soneto de Leopoldina/MG

AUGUSTO DOS ANJOS
(Augusto de Carvalho Rodrigues dos Anjos)
Cruz do Espírito Santo/PB (1884 – 1914) Leopoldina/MG

Asa de Corvo

Asa de corvos carniceiros, asa
De mau agouro que, nos doze meses,
Cobre às vezes o espaço e cobre às vezes
O telhado de nossa própria casa...

Perseguido por todos os reveses,
É meu destino viver junto a essa asa,
Como a cinza que vive junto à brasa,
Como os Goncourts, como os irmãos siameses!

É com essa asa que eu faço este soneto
E a indústria humana faz o pano preto
Que as famílias de luto martiriza...

É ainda com essa asa extraordinária
Que a Morte — a costureira funerária —
Cose para o homem a última camisa!
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Trova Premiada  em Natal/RN, 2001

J. STAVOLA PORTO 
(Niterói/RJ)

Labaredas, nas queimadas
da floresta em combustão,
lembram mãos agoniadas,
rogando aos céus proteção.
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Poema de São Paulo/SP

FILEMON FRANCISCO MARTINS

O amor

É como a flor que nasce no jardim
e vai florindo com cuidado e zelo.
O amor também floresce e cresce assim
com carícia, paixão, amor, desvelo...

É preciso cuidar, plantando, enfim,
compreensão, carinho e defendê-lo
da praga do ciúme tão ruim
que teima em desfazer e ser, sem sê-lo.

Um grande amor toda a beleza exprime,
porque o amor faz a vida mais sublime
e exige inspiração de quem o quer.

A vida a dois há de ficar mais bela,
se houver no coração a flor singela
e um sorriso feliz de uma MULHER.
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Quadra Popular

Toda vez que considero
que tenho de te deixar,
me foge o sangue da veia,
e o coração do lugar.
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Soneto de São Paulo/SP

PEDRO XISTO
(Pedro Xisto Pereira de Carvalho)
Limoeiro/PE, 1901 – 1987, São Paulo/SP

Unidade

Do crepúsculo as faixas carregadas
eu desato, as primícias perseguindo
do sonho a que se volva o dia findo
(já não terá o rei suas espadas).

De toda diferença, ora, prescindo:
disputem outros sobre as bem-amadas
(ai! alma, em dúbio sangue sobrenadas...)
ou se é o rosto, sob os véus, mais lindo.

A pouco e pouco, afrouxaram-se estas malhas;
os olhos as trespassam, de tão falhas;
e um só, de volta em volta, o meu caminho.

As mãos, eu pouse — ó Vida! — em frescas toalhas
eu, contra o peito, quando me agasalhas
definitivamente, sou sozinho.
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Trova de Santos/SP

CAROLINA RAMOS

Ante o horror de uma queimada,
tenho a impressão verdadeira
de ver a Pátria enlutada,
sem mais verde na bandeira!
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Poema de Niterói/RJ

JACY PACHECO
Duas Barras/RJ, 1910 – 1989, Niterói/RJ

Primavera do Mundo 

Primavera do mundo, tu virás!
Talvez não venhas na tranquilidade
de um dia claro e musical.
Trarás as mãos ensanguentadas
e as rosas se abrirão todas vermelhas.

Mas chegarás!
E extirparás a tirania
e todos os princípios egoístas.
E as máquinas da paz
revolverão o solo redimido
pelo sangue de irmãos idealistas.

Primavera do mundo, eu te entrevejo
numa nesga de sol recém-nascido,
anunciando o bem dos homens livres,
a vitória do amor, do ideal fecundo!   

Aguardo o teu instante triunfal
primavera do mundo!
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Haicai de Caucaia/CE

JOÃO BATISTA SERRA

Azulão contempla
O firmamento azulado:
Deseja ser livre.
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Sextilha Agalopada de Natal/RN

JOSÉ LUCAS DE BARROS
Serra Negra do Norte/RN, 1934 – 2015, Natal/RN

Ontem vi, na internet, em lindas cores,
a beleza da aurora boreal...
Lembrei todas as flores do sertão
e os encantos do verde litoral
para expor, em palavras coloridas,
uma espécie de língua universal.
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Trova de Campinas/SP

ARTHUR THOMAZ

Poeta! Em que mundo vives?
Vais flanando, sonhador,
lapidando feito ourives
os versos de um grande amor…
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Glosa de Fortaleza/CE

NEMÉSIO PRATA

MOTE 
Caminhando pro horizonte 
quis a minha dor levar, 
lá eu encontrei uma fonte, 
sem água pra me aliviar! 
José Feldman 
(Campo Mourão/PR)

GLOSA
Caminhando pro horizonte, 
sedento, foi que eu dei fé 
que um rio, descendo um monte, 
corria até o seu sopé! 

A vida, já por um fio, 
quis a minha dor levar 
pra junto daquele rio 
pra minha sede passar! 

Dei a volta pelo monte 
mas cruel foi o destino; 
lá eu encontrei uma fonte, 
vazia..., que desatino! 

Qual foi a minha agonia 
quando pude constatar 
que a fonte estava vazia; 
sem água pra me aliviar!
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Aldravia de Itajaí/SC

ANNA RIBEIRO

nas
entrelinhas
em
busca
de
mim
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Soneto de Recife/PE

JORGE WANDERLEY
(Jorge Eduardo Figueiredo de Oliveira Wanderley)
1938 – 1999

Pátio secreto

Vejo-o talvez em sonho, quando nada
Parece mal: o mesmo pátio, as sombras,
O chafariz envelhecido, a pátina
Que a algum luar de mármore responde.

O muro, o musgo, a vinha, o abandono
Da pedra e a quase fria madrugada
Passada em névoa ao cinzento do outono,
O sono que flutua em tudo, em nada.

Tudo está morto e vivo pela imagem,
Recanto, quadro, música, memória
Que visito dormindo e sem matéria.

Outros o viram, também. De passagem
Deixaram algo oculto a sua história,
Marca secreta, assinatura etérea.
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Trova Premiada  em São Jerônimo da Serra/PR, 1992

ADELIR COELHO MACHADO 
São Gonçao/RJ, 1928 - 2003, Niterói/RJ

Nosso grisalho carinho
é bênção que Deus nos deu:
és presença em meu caminho,
eu sou presença no teu!
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Poema de Campinas/SP

NORTON CORDEIRO

Maria rainha

Maria rainha não minha
Maria de outro, seu dono,
Vigilante perspicaz e cruel
Que não lega a ninguém o direito
De usufruir, mesmo um pouco
Pequeno que seja,
Do toda daquela sensual nobreza.

Maria rainha não minha
vã esperança - mas viva -
deste plebeu sonhador que anseia,
num dia de sorte reversa,
despistar seu cruel ditador,
pra num rompante de pura ousadia
fazê-la aia do meu amor.
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Triverso de de Guarulhos/SP

JOÃO TOLOI

Silêncio na estação
Sobre o trem que parte
A chuva de outono.
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Setilha Sobre o Mar, de Dom Basílio/BA

CREUSA MEIRA 

Primeiro dia do ano
As flores eu vou levar
São as minhas oferendas
Para a rainha do mar
Jogo gotas de alfazema
Leio um belo poema
Nas ondas a caminhar
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Trova de Santos/SP

CLÁUDIO DE CÁPUA
São Paulo/SP, 1945 – 2021, Santos/SP

Em noite alta... madrugada,
contemplo a lua contrito:
- Barca de prata aportada
nos segredos do infinito.
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Hino de Limeira/SP

Música: Prof.ª Dyrcéia Ricci Ciarrochi
Letra: Dr. Guilherme Mallet Guimarães

Chão bendito de berços gloriosos
Tua origem uma linda limeira,
Fundada por labores ditosos
És cidade tão bela e faceira

Frutas doces, colhemos aos montes
Pomares verdejantes com flores
Laranjais circundam as fontes
Acariciando a vida de amores.
 
Tuas indústrias crescem e agigantam
As grandezas de nosso porvir
Jardins - Praças todos se encantam
Com músicas sonoras a ouvir.

Chão bendito de berços gloriosos
Tua origem uma linda limeira,
Fundada por labores ditosos
És cidade tão bela e faceira

Povo amigo de ação relevante
Nossas escolas padrões elevados
Nossa fé seguirá triunfante
Sendo os mestres heróis abençoados.

Chão bendito de berços gloriosos
Tua origem uma linda limeira,
Fundada por labores ditosos
És cidade tão bela e faceira

Limeira! Limeira!
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Hino de Limeira: Uma Ode à Terra de Frutas e Indústrias
O 'Hino de Limeira - SP' é uma celebração poética e musical da cidade de Limeira, localizada no interior do estado de São Paulo. A letra exalta as belezas naturais, a prosperidade econômica e o espírito comunitário da cidade. Desde o início, a música destaca a origem gloriosa de Limeira, referindo-se a ela como um 'chão bendito de berços gloriosos'. A palavra 'limeira' no contexto histórico remete à árvore de limão, simbolizando a fertilidade e a abundância da região.

O estribilho da música enfatiza a riqueza agrícola de Limeira, mencionando as frutas doces e os pomares verdejantes. A imagem dos laranjais circundando as fontes sugere uma paisagem idílica e fértil, onde a natureza e a vida humana coexistem em harmonia. Essa parte da letra não só celebra a produção agrícola, mas também evoca um sentimento de amor e carinho pela terra.

Além das belezas naturais, o hino também destaca o crescimento industrial da cidade, mencionando que as indústrias 'crescem e agigantam'. Isso reflete a modernização e o desenvolvimento econômico de Limeira, que se tornou um importante polo industrial. A letra também faz referência à educação e à fé, exaltando as escolas de padrões elevados e a fé triunfante do povo limeirense. A música termina com um chamado apaixonado à cidade, repetindo o nome 'Limeira' como um grito de orgulho e pertencimento.  https://www.letras.mus.br/hinos-de-cidades/564261/ 
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Poetrix de João Pessoa/PB

REGINA LYRA

Afinado

Nas cordas do violão
o músico faz de um chorinho
belo sorriso.
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Soneto do Rio de Janeiro/RJ

BASTOS TIGRE
(Manuel Bastos Tigre)
Recife/PE, 1882-1957, Rio de Janeiro/RJ

Amor de pronto

Suplicas que eu te escreva e que te diga
Se te não quero mais com o mesmo ardor.
Pedes "três linhas... uma frase amiga,
Um rápido bilhete... o quer que for."

Nada perdeu da intensidade antiga
Meu sempre novo e apaixonado amor;
O ofício de te amar não me fatiga
E além do mais eu sou conservador.

Dizes estar de tanta espera farta;
Que os homens, às amantes sempre infiéis,
Só merecem (que horror!) que um raio os parta.

Não! Meu silêncio tem razões bem cruéis:
Ando "por baixo" e custa cada carta
Tinta, papel e um selo de cem réis.
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Trova Humorística de São João de Meriti/RJ

CLEBER ROBERTO DE DE OLIVEIRA

Fiquei surpreso!... Foi chato,
com gente no "reservado",
ter de correr para o mato
e ler num galho: "OCUPADO"!
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Fábula em Versos da França

JEAN DE LA FONTAINE
Château-Thierry, 1621 – 1695, Paris

O lobo e o cordeiro

De ardente sede obrigados,
Foram ao mesmo ribeiro
A beber das frescas águas
Um lobo e mais um cordeiro.

O lobo pôs-se da parte
De onde o regato nascia;
O cordeiro, mais abaixo,
Na veia de água bebia.

A fera, que desavir-se
Com a mansa rês desejava,
Num tom severo e medonho,
Desta sorte lhe falava:

«Por que motivo me turvas
A água que estou bebendo?»
E o cordeirinho inocente
Assim respondeu, tremendo:

«Qual seja a razão que tenhas
De enfadar-te, não percebo!
Tu não vês que de ti corre
A mim esta água que bebo?»

Rebatida da verdade,
Tornou-lhe a fera cerval:
«Aqui haverá seis meses,
Sei de mim disseste mal.»

Respondeu-lhe o cordeirinho,
De frio medo oprimido:
«Nesse tempo, certamente,
Ainda eu não era nascido!

— Que importa? Se tu não foste,
Disse o lobo carniceiro,
Foi teu pai.» E, por aleives,
Lacera o pobre cordeiro!

Esta fábula dá brados
Contra aqueles insolentes
Que por delitos fingidos
Oprimem os inocentes.

(tradução: Malhão)
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Colaborações: gralha1954@gmail.com

Contos das Mil e Uma Noites (O falso cego e os cegos de nascença)

Meu irmão Kafat é cego de nascença e era um dos chefes da confraria dos mendigos em Bagdá. Um dia, Alá levou-o a uma mansão. Bateu com seu cajado na porta. Perguntaram do interior da casa: “Quem é?” Meu irmão não respondeu.

Devo dizer-lhe, ó Comandante dos Fiéis, que meu irmão Kafat, que era o mais astucioso dos mendigos, tinha um sistema. Batia na porta, mas nunca respondia a quem perguntasse: “Quem está aí”?” Ficava calado até que alguém abrisse a porta, sabendo que se dissesse: “É um mendigo pedindo esmola”, os moradores não abririam, mas gritariam: “Que Alá tenha pena de ti”, e o mandariam seguir seu caminho. 

Assim, quando, naquele dia, alguém perguntou: “Quem é?” meu irmão não respondeu. Após um momento, a porta foi aberta por um homem de cara tão amarrada que, se meu irmão a pudesse ter visto, com certeza teria ido embora sem nada pedir. Mas cada um carrega seu destino pendurado ao pescoço.

O homem perguntou: “Que queres?” 

Kafat respondeu: “Alguma esmola em nome do Compassivo.” 

– És cego? perguntou o homem.

- Sou cego e muito pobre.

- Dá-me a mão e conduzir-te-ei.

Meu irmão estendeu a mão, e o homem conduziu-o, uma escada após a outra, até um alto terraço. Kafat estava sem fôlego, mas animava-o a esperança de receber as sobras de um grande festim.

Finalmente, o dono da casa perguntou: “Que queres, ó cego? 

- Esmolas, pelo amor de Alá, respondeu meu irmão, surpreso.

- Possa Alá abrir outra porta para ti.

- Ó coisa, disse Kafat com indignação, não me podias ter dado essa resposta quando estávamos embaixo?

- Ó sujeira mais vil, retrucou o outro, não podias responder quando perguntei quem estava batendo na porta?

- Se não quiseres ser chutado como uma bola, trata de sair daqui por ti mesmo, ó desastrado conjunto de misérias.

Meu pobre irmão, cego como é, teve que descer as escadas sozinho. Quando faltavam vinte degraus, escorregou, rolou pelo restante da escada e bateu a cabeça no chão. Saiu pela rua, queixando-se amargamente. Breve, dois de seus companheiros juntaram-se a ele e perguntaram-lhe o que tinha. Contou-lhes, e acrescentou: “Agora, meus amigos, devo ir para casa apanhar algum dinheiro para comprar comida neste dia funesto. Terei que mexer em nossas economias, as quais já são bastante gordas, como sabeis, e foram colocadas sob minha guarda.”

Ora, durante todo esse tempo, o homem que havia tratado meu irmão com tanta vileza - e que era um grande bandido seguia-o pela rua sem ser visto nem por ele nem pelos dois amigos cegos que o acompanhavam. Continuou a segui-los até a casa de meu irmão; e quando os três entraram lá, insinuou-se atrás deles antes que fechassem a porta. Meu irmão retirou o dinheiro da confraria do esconderijo, e os três verificaram que já somava 10 mil dinares. Ficaram com algumas moedas e recolocaram o tesouro no seu esconderijo. Só então sentiram a presença do intruso. Pegaram-no e, mesmo cegos, conseguiram dominá-lo e começaram a gritar: “Ladrão! Ladrão! Socorro, ó muçulmanos, socorro!” 

Muitos vizinhos acorreram. Vendo isto, o bandido cerrou os olhos, fingindo ser cego também, e começou a gritar: “Por Alá, ó amigos, sou um mendigo cego, sócio destes três. Eles estiveram tentando matar-me para ficarem com minha parte nas economias que fizemos juntos e que já somam 10 mil dinares. Juro-o por Alá, pelo sultão, pelo emir! Levem-me, oh, levem-me ao uáli.”

Nesse ínterim, os guardas já haviam chegado e arrastaram os quatro querelantes até o palácio do uáli. “Quem são esses homens?” perguntou o uáli. 

O ladrão respondeu logo: “Justo e penetrante uáli, ouve-me e saberás a verdade. Contudo, como irias acreditar em mim antes de submeter-me à tortura? Manda bater em mim, primeiro, depois nestes três companheiros meus e então contar-te-emos toda a verdade.”

- Estendei este homem no chão e batei nele, já que o deseja tanto, ordenou o uáli.

Os guardas apanharam o homem, estenderam-no no chão e cobriram-lhe o corpo com chicotadas. Após um momento, o homem começou a gemer e abriu um olho. Após outros golpes, abriu deliberadamente o outro olho. 

Vendo isso, o uáli gritou furioso: “Que vergonha é essa!” 

O ladrão gemeu: “Parai de bater em mim, e contarei tudo.”

O uáli deu as ordens devidas, e o homem pôs-se de pé e disse:

“Somos quatro ladrões que fingimos ser cegos para extorquir esmolas e entrar nas casas e olhar as mulheres na intimidade. Então, corrompemo-las e agarramos elas. Depois, roubamo-las e preparamos planos para os assaltantes. Estivemos fazendo isso por muito tempo, e já juntamos 10 mil dinares. Hoje, pedi minha parte; mas eles se recusaram a entregá-la e teriam batido em mim até me matar se os guardas de nosso senhor uáli não me tivessem socorrido. Essa é toda a verdade que meus companheiros confirmarão quando forem submetidos à tortura. Eles são bastante duros e manterão os olhos fechados por muito tempo.”

Enganado pelo audacioso ladrão, o uáli mandou bater em meu irmão até que perdeu os sentidos. Quando voltou a si, recebeu mais trezentas chicotadas, não obstante seus gritos de que era cego de nascença. Seus dois companheiros foram submetidos ao mesmo tratamento, sem abrir, naturalmente, os olhos. Por excesso de perversidade, o ladrão exortava-os a abrir os olhos, repetindo:

“Respeitai nosso senhor uáli. Abri os olhos. Confessai a verdade.”

O uáli mandou apanhar o dinheiro da confraria na casa de Kafat, entregou a quarta parte, isto é, 2.500 dinares, ao bandido e ficou com o saldo.

Finalmente, dirigiu-se a meu irmão e a seus dois companheiros nestes termos:

“Miseráveis embusteiros, comeis o pão que é uma dádiva de Alá e cometeis os piores delitos em seu santo nome, fingindo ser cegos. Dai o fora daqui e não sejais mais vistos em qualquer parte de Bagdá.”

Fonte: As Mil e uma noites. (tradução de Mansour Chalita). Publicadas originalmente desde o século IX. Disponível em Domínio Público

Recordando Velhas Canções (Corcovado)

 
Compositor: Tom Jobim

Um cantinho e um violão
Este amor, uma canção
Pra fazer feliz a quem se ama
Muita calma pra pensar
E ter tempo pra sonhar
Da janela vê-se o Corcovado
O Redentor, que lindo

Quero a vida sempre assim
Com você perto de mim
Até o apagar da velha chama

E eu que era triste
Descrente deste mundo
Ao encontrar você, eu conheci
O que é felicidade, meu amor
O que é felicidade, o que é felicidade

E eu que era triste
Descrente deste mundo
Ao encontrar você, eu conheci
O que é felicidade, meu amor
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A Serenidade do Amor em 'Corcovado’

Provedor de melodias para versos alheios, Tom Jobim é também o autor das letras de alguns de seus maiores sucessos. Este é o caso do samba “Corcovado, um cartão postal do Rio de Janeiro, poética e musicalmente impregnado pelo espírito da bossa nova: “Um cantinho, um violão /esse amor, uma canção / pra fazer feliz a quem se ama / muita calma pra pensar / e ter tempo pra sonhar / da janela vê-se o Corcovado / o Redentor, que lindo.”

Sobre esta letra há duas curiosidades a assinalar: originalmente o primeiro verso dizia: “um cigarro, um violão.” Nos ensaios para a gravação, João Gilberto convenceu Tom Jobim a mudá-lo para “um cantinho, um violão”. Já os versos “da janela vê-se o Corcovado / o Redentor, que lindo”, foram inspirados pela paisagem vista das janelas do apartamento em que o autor morava na ocasião. “Pouco depois, a construção de um edifício em frente acabou com a paisagem”, comenta Paulo Jobim, filho de Tom. Por sua vez, esse apartamento, situado na Rua Nascimento Silva, 107, em Ipanema, acabou entrando para a letra do samba “Carta ao Tom 74”, de Toquinho e Vinícius de Moraes.

Começando com uma introdução que o identifica de imediato e é parte integrante da composição — um desenvolvimento melódico sobre a harmonia dos compassos iniciais do tema principal — , “Corcovado” encantou dezenas de músicos e cantores no Brasil e no exterior. Daí a sua vasta discografia, que o faz figurar entre as canções mais conhecidas de Antônio Carlos Jobim, destacando-se entre os seus intérpretes João Gilberto (o primeiro), o próprio Tom (em quatro versões, uma delas com a participação de Elis Regina) e, com o título de “Quiet Nights of Quiet Stars”, um vasto elenco de cantores (Sinatra, Ella Fitzgerald) e músicos de jazz (Stan Getz, Miles Davis, Teddy Wilson).

Em 1987, num levantamento realizado por Jairo Severiano e Vera de Alencar, “Corcovado” ostentava a terceira colocação entre as canções mais gravadas de Jobim, superado apenas por “Garota de Ipanema” e “Samba de uma Nota Só” (A Canção no Tempo - Vol. 2 - Jairo Severiano e Zuza Homem de Mello- Ed. 34).

A música 'Corcovado', composta por Tom Jobim, é uma das pérolas da Bossa Nova, gênero musical que surgiu no final dos anos 50 e início dos anos 60 no Brasil. A letra da canção reflete uma simplicidade serena e um contentamento profundo com as coisas simples da vida, como um cantinho, um violão e a companhia de alguém amado. A referência ao Corcovado, com a estátua do Cristo Redentor no Rio de Janeiro, evoca uma imagem icônica de beleza e tranquilidade, que se alinha ao estado de espírito proposto pela canção.

A música também aborda a transformação pessoal do eu lírico, que de uma condição de tristeza e descrença no mundo, passa a conhecer a felicidade ao encontrar o amor. Essa mudança é um testemunho do poder do amor de transformar a visão de mundo de uma pessoa, trazendo um novo significado à existência. A repetição da pergunta 'O que é felicidade?' sugere uma reflexão sobre a natureza da verdadeira felicidade, que, na perspectiva da música, parece estar nas pequenas coisas e momentos compartilhados com quem se ama.

A canção é um convite à apreciação dos momentos de calma e contemplação, longe da agitação do dia a dia. A imagem do 'apagar da velha chama' pode ser interpretada como o fim de um período de vida menos feliz, que se encerra com a chegada do amor. 'Corcovado' é uma ode à beleza da vida cotidiana e ao amor como fonte de alegria e significado, encapsulando a essência da Bossa Nova com sua melodia suave e poesia lírica.

Fontes:

segunda-feira, 1 de julho de 2024

Daniel Maurício (Poética) 70

 

Humberto de Campos (A derradeira "morada")

O administrador do cemitério de São Geraldo, Alfredo Costa Ximenes, residia há anos, na rua Real Grandeza, quando, em março último, forçado a mudar de casa, foi alugar um prédio de segunda ordem, de que era proprietário o Comendador Augusto Gonçalves Teixeira, que lhe foi dizendo logo, sem circunlóquios:

— O aluguel da casa é quinhentos e vinte mil réis, fora a pena d'água e a taxa sanitária. Além disso para que eu lhe dê a chave, o senhor terá de pagar-me seis contos de réis, de "luvas".

Debalde o honrado funcionário da Morte chorou, suplicou, implorou; o Comendador mostrou-se inabalável na sua exigência, e ele teve de arranjar, mesmo, as "luvas", para não se ver de uma hora para outra, lançado à rua com a família.

Dois meses depois desse episódio, estava o administrador, uma tarde, no seu posto, na secretaria da necrópole, quando parou ao portão, buzinando e rolando, um cortejo funerário. Levada às suas mãos a papeleta fúnebre, o funcionário viu pelo nome, que o morto era, nada mais, nada menos, do que o seu senhorio, o Comendador Gonçalves Teixeira e teve, de repente, a ideia de uma represália: chegou ao portão, onde o esquife já repousava, agaloado, na carreta do cemitério, e recebendo da família a chave do caixão, mandou rodar o ataúde no rumo da sepultura.

Terminadas, ali, entre lágrimas e vertigens, as angustiosas despedidas da praxe, um filho do defunto mandou chamar o administrador, a quem havia dado a chave do esquife, para que fosse identificar o morto, e fechar o caixão.

— Pronto! — apresentou-se Ximenes, apertado na sua sobrecasaca preta. — Que desejam?

— A chave! — explicou um parente do defunto.

— Suspendam a tampa do esquife! — ordenou o administrador.

Um amigo abriu o caixão funerário, onde jazia, inteiriçado, vestido de preto o corpo do desventurado capitalista.

Ximenes passou, meticuloso, a vista sobre o cadáver, e, vendo-lhe as mãos nuas, cruzadas sobre o peito bojudo, reclamou, severo:

— E as "luvas"? Querem, então, que ele desça à derradeira "morada" sem as "luvas"?

E não entregou a chave!

Humberto de Campos. A Serpente de Bronze. Publicado originalmente em 1925. Disponível em Domínio Público.  

Vereda da Poesia = 50 =


Trova Humorística de São Paulo/SP

THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA

Diz, já caduco: - Que tédio!...
E a esposa, sempre calminha:
“- Quer jogar dama?” E, do prédio,
ele jogou a velhinha!
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Soneto Do Rio de Janeiro/RJ

MANUEL BANDEIRA
(Manuel Carneiro de Souza Bandeira Filho)
Recife/PE, 1886 – 1968, Rio de Janeiro/RJ

Desencanto

Eu faço versos como quem chora
De desalento , de desencanto
Fecha meu livro se por agora
Não tens motivo algum de pranto

Meu verso é sangue , volúpia ardente
Tristeza esparsa , remorso vão
Dói-me nas veias amargo e quente
Cai gota à gota do coração.

E nesses versos de angústia rouca
Assim dos lábios a vida corre
Deixando um acre sabor na boca

Eu faço versos como quem morre.
Qualquer forma de amor vale a pena!!
Qualquer forma de amor vale amar!
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Aldravia de Ponte Nova/MG

MARIZA DE CASTRO GODOY

água
parada
aedes
faz
a
festa
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Soneto do Rio de Janeiro/RJ

SÔNIA SOBREIRA

A Semente

Não vou plantar semente que me afaste
da luz perene e clara do luar,
nem vou deixar que a mágoa me desgaste,
ou que me faça em pedras tropeçar.

Não vou deixar que a solidão me arraste
nas tramas de uma história secular,
nem que uma dor no coração se engaste
e esta semente venha a germinar.

Eu vou plantar sementes de alegria
flores vermelhas, rimas de poesia
colher nas mãos um sonho que brotou.

Vou ser poeta e em minha estrada infinda,
mostrar que posso ser feliz ainda
e nunca mais serei o que hoje sou!
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Trova Premiada  em Cantagalo/RJ, 2012

ÉLBEA PRISCILA DE SOUZA E SILVA
Piquete/SP, 1942 – 2023, Caçapava/SP

A maquiagem pesada, 
diante do espelho, desfaço
e em minha cara lavada
rugas brigam por espaço…
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Poema de Curitiba/PR

CELITO MEDEIROS
(Celito Freitas de Medeiros)

Eu juro

Que importam os riscos que vou correr
Afinal sabemos que não vamos morrer
Mas é melhor riscos se poder arriscar
Do que riscar a morte sem poder amar.

Se de risadas é parecer um tolo
Se chorar parecer sentimental
Estendo minha mão e me envolvo
Vou mostrar que sou muito real.

Minhas ideias defendo sempre
Pois eu sei que atrás vem gente
Mesmo incompreendido vou amar
Ainda é tempo de também inovar.

Morrer um corpo não é mistério
Viver como espírito é o importante
Um corpo pode ir para o cemitério
Um espírito é o meu comprovante.

Se arriscar pode gerar um fracasso
Não me importo sou mesmo de aço
Estou aqui é para as experiências
Buscar as mais novas tendências.

Busquei a liberdade e já era tempo
Tudo do passado fazer na soma
Opressão que não mais aguento
Meu determinismo que assoma.

Importante é lutar, vencer nem tanto,
Encontrei há tempo meu porto seguro
Juntos seremos cobertos pelo manto
Daqueles que nos esperam..., eu juro!
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Quadra Popular

Sete e sete são quatorze,
com mais sete vinte e um;
ainda ontem eu tinha sete,
hoje não tenho nenhum.
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Soneto do Rio de Janeiro

OLAVO BILAC
(Olavo Brás Martins dos Guimarães Bilac)
Rio de Janeiro/RJ, 1865 – 1918

Língua Portuguesa

Última flor do Lácio, inculta e bela,
És a um tempo, esplendor e sepultura:
Ouro nativo, que na ganga impura
A bruta mina entre os cascalhos vela...

Amo-te assim, desconhecida e obscura,
Tuba de alto clangor, lira singela,
Que tens o tom e o silvo da procela,
E o arrolo da saudade e da ternura!

Amo o teu viço agreste e o teu aroma
De virgens selvas e de oceano largo!
Amo-te, ó rude e doloroso idioma,

Em que da voz materna ouvi: "meu filho"!
E em que Camões chorou, exílio amargo,
O gênio sem ventura e o amor sem brilho!
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Trova de Corumbá/MT

LÍCIO GOMES DE SOUZA

Na História o fato maior
está por vir, aliás:
- Vir num mundo melhor,
em pacto eterno de paz.
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Poema de Belo Horizonte/MG

CLEVANE PESSOA

Arrependimento

Mais que amei, amei errado
ou amei sem saber de limites
e de impossibilidades...

Amei com a fúria dos ventos
e a ternura das brisas
nos rostos das flores:
esta, insuficiente  para a sanha dos desejos,
aquela rasgou pétalas e sépalas
e abriu cálices...

Queria ter amado menos que o demais
E muito mais que o possibilitado...
Queria que os excessos de busca,
Perfumassem, de repente,
Todos os ares da angústia incandescente...
Nas grutas do desconhecido,
As estalagmites ,
Tão fantásticas ao primeiro olhar,
São de tal forma frágeis
Que se tornam poeira e barro
Para não mais voltar...
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Haicai do Rio de Janeiro/RJ

MARIA NASCIMENTO SANTOS CARVALHO

Do capim rasteiro
vêm uns cri-cris estridentes...
Seresta de grilos ...
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Limerique de Ribeirão Preto/SP

NILTON MANOEL
1945 – 2024

Limeriques Urbanos I

Dizem que a calçada é do povo...
Quero ver crianças de novo
Brincando... brincando,
Vivendo...sonhando...
porém o povo só leva ovo!
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Trova de Pindamonhangaba/SP

JOSÉ VALDEZ DE CASTRO MOURA

As afrontas do passado
não guardo! Vou esquecê-las!
Pois bem sei que um céu nublado
não me deixa ver estrelas!
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Glosa de Fortaleza/CE

NEMÉSIO PRATA

MOTE 
Doce flor que desabrocha, 
perfumando seu cantinho 
envolvendo toda rocha 
com doçura e com carinho. 
José Feldman 
(Campo Mourão/PR) 

GLOSA 
Doce flor que desabrocha, 
exalando os seus olores 
deixa a todos feito tocha 
em busca de seus favores! 

Discreta, a flor permanece 
perfumando seu cantinho 
mas logo que um aparece, 
desaparece em seu ninho! 

Aquele que vem em tocha 
pressente, a distância, o olor, 
envolvendo toda rocha, 
que exala, doce, da flor! 

E todo que busca o amor 
da flor, não fica sozinho; 
recebe-o, em seu ninho, a flor, 
com doçura e com carinho.
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Aldravia do Rio de Janeiro/RJ

ARLENI BATISTA

sinto
simplesmente
saudades
você
ausente
presente...
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Soneto de Minas Gerais

NATHAN DE CASTRO
(Nathan de Castro Ferreira Júnior)
João Pinheiro/MG, 1954 – 2014, Uberlândia/MG

        Soneto em Luta de Esgrima

        Conta até seis e bate o pé no chão,
        quando chegar a dez, prepara a rima...
        O primeiro quarteto está na mão
        e a mágica do sonho se aproxima.

        Deixa que flua a conta da emoção,
        sem ela o peito esfria e desanima...
        O segundo combate é o da paixão
        e imprescindível à luta de esgrima.

        O sabre exige pulso e coordenados
        movimentos perfeitos nos espaços...
        Um toque na cabeça, tronco ou braços,

        pode levar-te à lona dos tablados...
        Mas se vencer, amigo, comemora,
        e te prepara: a morte está lá fora!
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Trova Premiada em Nova Friburgo/RJ, 1987

EDMAR JAPIASSÚ MAIA 
(Miguel Couto/RJ)

Olhando a sogra de pé,
com o rosto sujo de tinta,
viu que o “diabo” ainda é
mais feio quando se pinta!… 
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Poema de Amherst/ Massachussets/ EUA

EMILY DICKINSON
(Emily Elizabeth Dickinson)
(1830 – 1886)

Morri pela Beleza

Morri pela beleza – mas mal me tinha
Acomodado à campa
Quando alguém que morreu pela verdade,
Da casa do lado –

Perguntou baixinho “Por que morreste?”
“Pela beleza”, respondi –
“E eu – pela verdade – Ambas são iguais –
E nós também, somos irmãos”, disse ele.

E assim, como parentes próximos, uma noite
Falámos de uma casa para outra
Até que o musgo nos chegou aos lábios 
E cobriu – os nossos nomes.

(Tradução de Nuno Júdice)
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Triverso de Curitiba/PR

ÁLVARO POSSELT

O clima ficou tenso
Meu pensamento defumou
depois da queima de incenso
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Setilha de Natal/RN

JOSÉ LUCAS DE BARROS
Serra Negra do Norte/RN, 1934 – 2015, Natal/RN

Somos do país do amor,
grande como um continente,
rico que só marajá,
pobre que só indigente;
tem corrupção como regra,
mas tem carnaval que alegra,
de ano em ano, nossa gente.
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Trova do Rio de Janeiro/RJ

ARCHIMINO LAPAGESSE
Florianópolis/SC, 1897 – 1966, Rio de Janeiro/RJ

Saudade, a ponte encantada             
entre o passado e o presente,              
por onde a vida passada
volta a passar novamente
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Hino de Paranavaí/PR

Compositores: Geraldo Marques e Carlos Cagnani

Quando te vemos hoje, assim radiosa,
Teus filhos agitados no labor,
Lembramos da empreitada gloriosa,
Que calejou as mãos do lavrador
E fez romper da terra generosa
Os ricos frutos do progresso e amor!

Estribilho:
Nasceste sob o signo da vitória
Que os filhos teus souberam conquistar
És a um só tempo a evolução e a glória
Cidade que não pode mais parar!

Ó Paranavaí dos cafezais
Simétricos, em flor sobre a paisagem,
De belos e de extensos matagais,
Planícies verdejantes de pastagem...
Da glória tu chegaste até os umbrais!

Estribilho
Nasceste sob o signo da vitória
Que os filhos teus souberam conquistar
És a um só tempo a evolução e a glória
Cidade que não pode mais parar!

Salve teus filhos, que na faina ardente
Sobre teu solo ainda hostil e agreste
Traçaram teu destino florescente!
Salve, ó cidade que te engrandeceste
Ó bela Capital do Noroeste!

Estribilho
Nasceste sob o signo da vitória
Que os filhos teus souberam conquistar
És a um só tempo a evolução e a glória
Cidade que não pode mais parar!
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O 'Hino de Paranavaí - PR' é uma celebração poética da cidade de Paranavaí, localizada no noroeste do Paraná. A letra exalta o progresso e a evolução da cidade, destacando o esforço e a dedicação de seus habitantes. Desde o início, a música remete à imagem de uma cidade radiante, onde o trabalho árduo dos lavradores transformou a terra generosa em frutos de progresso e amor. Essa metáfora da terra fértil simboliza não apenas a riqueza agrícola da região, mas também o crescimento e desenvolvimento contínuo da cidade.

O estribilho reforça a ideia de vitória e evolução, afirmando que Paranavaí nasceu sob o signo da vitória, conquistada pelos seus filhos. A cidade é descrita como um símbolo de evolução e glória, um lugar que não pode mais parar de crescer. Essa mensagem de constante progresso e superação é um tributo ao espírito resiliente e trabalhador dos habitantes de Paranavaí, que, através de suas conquistas, moldaram o destino da cidade.

A letra também faz referência às paisagens naturais de Paranavaí, como os cafezais simétricos, os matagais extensos e as planícies verdejantes. Essas imagens evocam a beleza e a riqueza natural da região, que contribuíram para o seu desenvolvimento. O hino termina com uma saudação aos filhos da cidade, que, com seu trabalho árduo, traçaram um destino florescente para Paranavaí. A cidade é celebrada como a 'Capital do Noroeste', um título que reflete seu crescimento e importância na região. (https://www.letras.mus.br/hinos-de-cidades/943384/
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Poetrix de Portugal

ANTHERO MONTEIRO
(Anthero Manuel Dias Monteiro)
São Paio de Oleiros, 1946 – 2022

uma gaivota só
um til sobre a palavra
Imensidão
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Soneto de de Curitiba/PR

EMÍLIO DE MENESES
(Emílio Nunes Correia de Meneses)
Curitiba/PR, 1816– 1918, Rio de Janeiro/RJ

Supremo apelo

Por que causas, de ti, foge a antiga ventura
E toda, em ti, se embebe a alma, em fel e vinagre?
Certo, uma grande dor te fere e te tortura!
- Mas tão grande, que a grande alma assim te conflagre?

Tanto Sol! Tanta Luz! E esta treva perdura!
- De um espírito mau, diabólico milagre -
Mas olha! Volta à Luz! Volta ao Sol que fulgura
Nos Poemas que te eu dê, no Amor que te eu consagre!

Vem beber no meu verso a fortaleza e a vida!...
Vê tu quanto poder num hemistíquio impera,
E o vigor que há na rima - arma nunca excedida!. ..

Vem, que ao fim da jornada, a glória nos espera!
Vamos! - a galopar, - em fora! a toda a brida,
Na esplanada genial do sonho e da quimera!
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Trova Humorística de Santos/SP

ANTONIO COLAVITE FILHO

 Ao “bebum” que choraminga,
o doutor não mais engana:
-“Se, por lá, cana dá pinga;
por aqui, pinga dá cana!!!”
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Fábula em Versos da França

JEAN DE LA FONTAINE
Château-Thierry, 1621 – 1695, Paris

O leão e o mosquito

«Vai-te, inseto mesquinho e vil na terra!»
Depois de assim ter dito
O leão ao mosquito,
Este lhe declarou cruenta guerra:
«Pensas tu que por seres rei dos bichos
Tua audácia tolero?
Mais força tem o boi e, quando quero,
Sujeito-o a meus caprichos!»
Diz, e toca a avançar;
Foi o herói e o trombeta na batalha.
Zumbe em torno ao leão, tanto o atrapalha,
Que o faz desesperar.
Ao longe põe-se um pouco;
Depois, salta-lhe em cima do cachaço
E torna-o quase louco.
A fera com o rugido atroa o espaço.
De ouvir o horrendo grito
Seus ecos prolongar atroadores,
Tremem os animais dos arredores;
Tudo obra dum mosquito!
O inseto pequenino, ousado e pronto,
Ora ao dorso lhe salta,
Ora as ventas lhe assalta.
A raiva no leão sobe de ponto:
Com a cauda açoita os flancos,
Com o olhar ameaça
E, rugindo duríssimos arrancos,
Com as garras a si se despedaça,
Até que, de fatigado,
Cai, fica estatelado!
O inseto do combate sai com glória
A mais alta e completa,
E na mesma trombeta
Em que a avançar tocou, cantou vitória.
Mas, proclamando ao mundo esta façanha
Não vista e desmedida,
Na teia duma aranha
Cai, fica embaraçado e perde a vida!

A fábula vos diz que os inimigos
Nunca deveis considerar somenos;
E que pode o que escapa a grandes perigos,
Não poder escapar aos mais pequenos.

(tradutor: José Inácio de Araújo)
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Colaborações: gralha1954@gmail.com