quinta-feira, 8 de agosto de 2019

Luiz Otávio (Jardim de Trovas) I


Aquele amor passageiro,
aquela afeição tão pura,
e esta saudade tamanha
de tão pequena ventura!…

Até o próprio mendigo
pode ser rico também:
se possui um grande amigo,
tem algo que poucos têm!

Beijos de mãe… filha… esposa…
Tantos beijos ganha a gente!
– Como pode a mesma coisa
ter sabor tão diferente?!

Ciúmes talvez não ferissem
e eu teria paz infinda,
se os homens jamais te vissem,
ou tu não fosses tão linda!…

Com tristeza a gente conta:
No mundo, que tanto ilude,
há virtude – quase afronta,
pecado, quase virtude!…

Dois anos… e a angústia, o medo
do mundo desconhecido…
– Minha mãe partiu tão cedo!
Primeiro sonho perdido!

Esta ~mágoa, sem remédio…
Esta esquisita ansiedade…
Esta doçura que é tédio…
– É o que chamamos Saudade…

Esta saudade pungente
de um bem que não volta mais,
se amargura a alma da gente,
quanto alívio ela nos traz!

Eu, amor, te procurava,
estando perto de ti…
ao meu lado, não te achava…
Agora, longe, eu te vi…

“Feliz Natal!” – você diz…
– Numa carta, já se vê.
Mas como o terei feliz,
se estou longe de você?!…

Não há maior desencanto
do que ouvir, com suavidade,
ao dizer: “Amo-te tanto!”
– “Tenho-te muita amizade…”

Não me pagaste a promessa
de me fazeres feliz
e como eu paguei tão caro
promessas que não te fiz!

Nossa casa pequenina
é um céu em miniatura!
Possui a bênção divina,
a paz… o amor… a ventura!

Por mais que na vida amemos
com loucura e intenso ardor,
jamais nos esqueceremos
do nosso primeiro amor…

Saudade – um sonho desfeito…
uma angústia… um “não sei quê…”
– Este vazio em meu peito
todo cheio de você…

Semeia sempre com calma!
Ajuda a planta a crescer!
E eleva mais a tua alma,
deixando os outros colher!…

Sentimento singular
que virtude deve ser:
sentir mais prazer em dar,
do que mesmo em receber…

Sorrias… e eu te beijei
nesse momento preciso…
Desde então ficou gravado
nos meus lábios teu sorriso…

Tua saudade, querida,
tão viva no peito meu,
é a morte dentro da vida…
é a vida do que morreu…

Tu me pedes que te esqueça…
Eu só queria, porém,
que olvidasses a quem queres,
como eu te quero, meu bem…


Fonte:
Luiz Otávio. Cantigas dos sonhos perdidos, Rio de Janeiro: Livraria Freitas Bastos, 1964.

Nenhum comentário: