sábado, 8 de março de 2025

José Feldman (Guirlanda de Versos) * 24 *

 

Giuseppe Paolo Dell’ Orso (Memórias de um Vinhedo)

Na Itália dos anos 70, a luz do sol dançava sobre as colinas da Pieve di Soligo, cidade do no interior da Itália, criando um espetáculo que parecia pintado à mão. Giovanni, um jovem de espírito livre, acordava ao amanhecer, quando a neblina ainda abraçava a terra. O aroma da terra molhada e o canto dos pássaros eram a sinfonia que lhe dava bom dia. A vida nos vinhedos era dura, mas cheia de beleza e significado.

Giovanni cresceu entre as videiras, aprendendo com seu pai os segredos do cultivo. As mãos calejadas do velho eram um testemunho de anos de trabalho árduo, e cada uva colhida era um pedacinho de história que se entrelaçava com a tradição familiar. As tardes eram passadas entre risadas e cantos, enquanto a família se reunia para a colheita. A alegria do trabalho em conjunto era contagiante e, para Giovanni, não havia lugar mais encantador no mundo.

A conexão com a natureza era profunda. Giovanni entendia que a terra não era apenas um recurso; era um lar. Ele via cada estação como uma parte do ciclo da vida — a primavera trazia o renascimento, o verão a abundância, o outono a gratidão, e o inverno, a pausa necessária. Essa harmonia era um reflexo de sua própria existência, onde cada desafio e cada conquista se entrelaçavam como as raízes das videiras.

Com o passar dos anos, Giovanni encontrou o amor em Isabella, uma jovem com olhos que brilhavam como as estrelas. Juntos, sonharam em construir uma família e cultivar não apenas uvas, mas também memórias. A cerimônia de casamento foi celebrada sob as videiras floridas, com amigos e familiares ao redor, dançando e rindo, enquanto o vinho escorria como um rio de felicidade.

A vida seguiu seu curso, e logo vieram os filhos. Cada um deles crescia correndo pelos vinhedos, brincando entre as folhas e aprendendo a amar a terra. Giovanni os ensinava a respeitar a natureza, a entender o valor de cada planta e cada animal que cruzava seu caminho. Para ele, a preservação ambiental não era apenas uma ideia; era um legado que ele desejava deixar.

Mas os anos 70 também trouxeram mudanças. A modernização começou a ameaçar o modo de vida tradicional. Máquinas pesadas substituíam as mãos calejadas, e vinhedos exuberantes davam lugar a monoculturas. Giovanni observava preocupado enquanto as colinas que antes eram vibrantes se tornavam mais áridas. O que aconteceria com o futuro dos seus filhos se a natureza fosse esquecida?

Em um dia especialmente claro, Giovanni decidiu que precisava agir. Reuniu a família e compartilhou suas preocupações. “A natureza nos deu tudo”, disse ele, com a voz embargada pela emoção. “Precisamos protegê-la, não apenas para nós, mas para aqueles que virão depois de nós.” 

As crianças, com seus olhinhos curiosos, prometeram ajudar. Juntos, plantaram novas árvores, criaram um pequeno pomar e começaram a aprender sobre as práticas sustentáveis.

Os anos passaram, e a família de Giovanni se tornou um exemplo na comunidade. Outros vinhedos começaram a seguir seu caminho, buscando um equilíbrio entre tradição e inovação. A conexão com a natureza foi reestabelecida, e a beleza das colinas voltou a brilhar. A luta pela preservação não era apenas uma batalha, mas uma dança entre os seres humanos e a terra, onde cada passo importava.

Giovanni olhava para seus filhos, agora crescidos, e sentia um orgulho imenso. Havia algo mágico em ver a continuidade da vida, em saber que suas lições foram passadas adiante. As risadas que ecoavam pelo vinhedo eram um lembrete de que a natureza e a família estavam entrelaçadas, como as raízes das videiras.

Hoje, ao recordar aqueles dias, Giovanni entende que a verdadeira riqueza não está apenas na colheita abundante, mas na conexão que cultivamos com o mundo ao nosso redor. A preservação ambiental é um ato de amor, um compromisso com o futuro. E, enquanto a luz do sol se põe sobre as colinas da Pieve di Soligo, ele sabe que, assim como as videiras, a vida é um ciclo contínuo de crescimento, amor e respeito pela natureza. Que as futuras gerações possam sempre encontrar beleza e sabedoria nas lições da terra.
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GIUSEPPE PAOLO DELL’ORSO nasceu em 1935, em Pieve di Soligo, na Itália. Desde jovem, demonstrava um profundo amor pela literatura, influenciado por seu avô, um poeta local. Foi para Roma estudar Literatura Italiana na Universidade La Sapienza. Destacou-se como um aluno excepcional, recebendo diversos prêmios acadêmicos. Após obter seu diploma, se mudou para a Inglaterra, onde fez pós-graduação em Literatura Comparada na Universidade de Harvard, cuja pesquisa lhe rendeu um doutorado com honras e o prêmio Harvard Literary Fellowship, um reconhecimento pela contribuição significativa ao campo da literatura. Em 2001, foi convidado a lecionar Literatura Italiana em uma universidade no Brasil, no estado do Paraná. No Brasil, se envolveu profundamente com a comunidade literária, fazendo amizade com muitos escritores locais. Organizou encontros literários e oficinas de poesia, promovendo um intercâmbio cultural que unia vozes italianas e brasileiras. Defensor ativo de causas sociais, contribuiu para várias entidades filantrópicas tanto no Brasil, quanto na Itália, focando em projetos que promovem a educação e a inclusão social, ajudando a criar bibliotecas comunitárias e programas de alfabetização em áreas carentes.  Aposentado, perpetua a ideia de que a literatura é uma ponte que conecta pessoas, independentemente de fronteiras. Em 2005 criou uma conexão com o gestor cultural José Feldman. Conheceu o trabalho deste na Biblioteca de Parma onde há trovas e poemas da autoria de Feldman. Juntos, iniciaram diversos projetos que visavam fomentar a literatura e a troca cultural entre Brasil e Itália.
“A influência de Feldman na minha carreira literária é inegável. Através de suas iniciativas, não só ajudou a promover minhas obras, mas também contribuiu para a criação de uma comunidade literária vibrante, ao mesmo tempo que eu trazia uma nova perspectiva à cena literária, enriquecendo o diálogo cultural com nossas experiências e visões. A nossa amizade é um exemplo de como a literatura pode unir pessoas de diferentes culturas e origens. Juntos, promovemos a poesia e a literatura, mostrando que a arte é uma ponte que conecta corações e mentes, independentemente das fronteiras. A admiração mútua e a colaboração entre nós é um testemunho do poder transformador da amizade na literatura.” (GP Dell’Orso)
Autor de diversos livros, tanto em italiano quanto em português, com destaque para a poesia. Seus textos e poemas refletem a fusão entre a tradição literária italiana e as influências culturais brasileiras.

Fontes:
Giuseppe Paolo Dell’Orso. Cantos da Terra. Enviado pelo autor.
Imagem criada por Jfeldman com IA Microsoft Bing

Vereda da Poesia = 223


Soneto de
ANÍBAL BEÇA
Manaus/ AM, 1946 – 2009

MANHÃ

A manhã nasce das muitas janelas
deste sereno corpo fatigado,
sede  dos meus caminhos sem cancelas,
na luz de muitos astros albergados.

Casa em que me recolho das mazelas,
dos louros, derroteiros, lado a lado,
para de mim ouvir franca sequela:
Ecce Homo! Eis o triste camuflado.

Essa tristeza antiga em residência,
às vezes se constrói em face alegre,
máscara sem eu mesmo em aparência

num carnaval insólito em seu frege.
O que me salva a cor nessa vivência
é saber que a poesia é quem me rege.
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Trova de
NAIR LOPES RODRIGUES
Santos/SP

Por eu ser tão sonhadora
sentindo o amor e a emoção,
tornei-me uma trovadora
e da trova fiz paixão!
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Poema de
SILVIAH CARVALHO
Manaus/AM

CAMINHOS DO CORAÇÃO

Quando tudo acaba no coração da gente,
Ficamos em meio a um deserto,
Sem direção, tudo é vazio,
A alma treme exposta ao incerto.

Na ânsia louca de preencher o espaço,
A alma aflita pede socorro,
O corpo balança cai em qualquer braço,
Assim começa tudo de novo,

A falsa esperança mostrou o caminho,
Em seus braços findou-se o medo,
Enganou-se de novo com falsos carinhos.

Seguiu os passos para linda miragem,
Pisou as flores, morreu nos espinhos,
E o amor começa no mesmo caminho.

De novo o deserto,
De novo o incerto,
De novo os espinhos…
= = = = = = = = =  

Trova de
THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA
São Paulo/SP

Embora a razão me peça
que te esqueça… eu tento em vão…
paixão é página impressa
no livro do coração!
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Poema de
DOMINGOS FREIRE CARDOSO
Ilhavo/ Portugal

VEM TER COMIGO, À NOITE, À MINHA CAMA
(Glória Marreiros in "Colar de Pérolas", p. 21)

Vem ter comigo, à noite, à minha cama
Falar-me das saudades que sentiste
Que eu envolvo o teu corpo que despiste
Em lençóis com o nosso monograma.

No calor do aconchego é que se inflama
O excelso dom da vida que consiste
Em fazer singular tudo o que existe
E ao apagado círio dar a chama.

Vem afogar em mim os teus cansaços
Molda-te ao travesseiro dos meus braços
Que a cama é doce, quente e hospitaleira.

Dorme que o maior bem que pode haver
É o de numa só noite alguém viver
Os sonhos todos de uma vida inteira.
= = = = = = = = = 

Trova de
DOROTHY JANSSON MORETTI 
Três Barras/SC, 1926 – 2017, Sorocaba/SP

"Ao céu vai o bem dotado. 
E o criminoso aonde vai?" 
Diz o filho do advogado: 
"Não sei... isso é com meu pai..."
= = = = = = 

Soneto de
AFONSO FREDERICO SCHMIDT
Cubatão/ SP, 1890-1964, São Paulo/SP

LOUCURA VERDE

Nas longas noites em que eu me enveneno,
cigarro a espiralar sobre cigarro,
traz-me a saudade o teu perfil bizarro,
que eu não sei mais se é louro ou se é moreno.

Não é bem um perfil, mas um pequeno
alvoroço de névoas, um desgarro
de linhas onde, surpreendido, esbarro
com o teu olhar a me sorrir, sereno...

Depois teu vulto se dilui aos poucos,
mas teus olhos heris, como os dos loucos,
ficam parados, mortos, ante os meus.

— Verdes, curvos cristais, por onde eu vejo
monstros verdes passando num cortejo,
sob um sol verde como os olhos teus.
= = = = = = 

Trova do 
PROFESSOR GARCIA
Caicó/ RN

Há uma sombra em meu caminho
que me segue…e, mesmo assim…
Nem quer me deixar sozinho
nem diz o que quer de mim!
= = = = = = 

Poema de
FILEMON MARTINS
São Paulo/ SP

CAMINHADA

A caminhada é longa, nós sabemos
que é difícil vencer este caminho,
mas a fé nos ajuda, assim nós cremos,
melhor lutar do que ceder ao espinho.

Não temer o perigo é o que queremos,
porque o mundo se torna tão mesquinho
que às vezes é preciso que busquemos
um punhado de amor e de carinho.

E enquanto a vida nos disser prossiga,
buscaremos obter na fé amiga
os pomos que a vitória nos conduz.

Almas gêmeas seremos pela vida,
unidas pelo amor – missão cumprida
para o destino que nos leva à luz!
= = = = = = = = =  

Trova de
ERCY M. M. MARQUES
Bauru/SP

Ante a suave passagem
do barquinho em águas calmas,
o vento, em meio à folhagem,
celebra, batendo palmas...
= = = = = = 

Poema de
APARECIDO RAIMUNDO DE SOUZA
Vila Velha/ES

DESEJOS

Queria ser 
o seu “tudo” na vida...
o caminho a percorrer,
os perigos a enfrentar,
o amanhã por nascer,
o sorriso 
do seu olhar.

Queria 
ser o seu 
agora;
o seu melhor 
momento 
de felicidade
e encantamento...

Queria, 
ser também,
a sua, 
esperança.
A sua alegria,
a sua ilusão, 
e fantasia.

Queria, 
finalmente,
estar em seu coração...
ser seu momento
de reflexão
na calma tarde 
refletida lá fora.
= = = = = = 

Trova de
APARÍCIO FERNANDES
Acari/RN, 1934 – 1996, Rio de Janeiro/RJ

Guia o nauta e o peregrino,
rege os nobres e os plebeus.
- É que o dedo do destino
faz parte da mão de Deus!
= = = = = = 

Soneto de
CAROLINA RAMOS
Santos/SP

DESENCANTO
(Primeiro sonho de amor, 1944)

Personagens esparsos… pela vida
caminhamos, atrás de uma quimera.
Alguns se acham… o amor lhes dá guarida,
juntos mudam o inverno em primavera!

E sonhei que assim fosse… embevecida,
ao dar contigo, como se soubera
que à tua sombra, cálida e querida,
acharia a ventura à minha espera!

– Errei! Tinha as mãos de amores cheias…
E o jovem coração, já saturado,
no fogo das paixões, ainda incendeias,

pensando ser feliz, quem sabe, assim!
Nosso romance, apenas esboçado,
“ sem nunca ter começo, teve fim”. (*)
= = 
(*) Chave de Ouro de Guilherme de Almeida
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Trova de
SÉRGIO FERREIRA DA SILVA
São Paulo/SP

Quando a Morte, então, chegou
trazendo o eterno conforto,
o preguiçoso exclamou: 
– Passa amanhã, que eu tô morto!
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Cantiga Infantil de Roda
SAMBA LELÊ 

   Samba Lelê tá doente
Tá com a cabeça quebrada
Samba Lelê precisava
É de uma boa lambada

Samba, samba, samba, ô Lelê
Samba, samba, samba, ô Lalá
Samba, samba, samba, ô Lelê
Pisa na barra da saia, ô Lalá
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Quadra Popular de
AUTOR ANÔNIMO

Abrigo de todo o mundo,
tens, quarto, testemunhado
exaltação do feliz
e queixas do desgraçado.
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Poema de
VANICE ZIMERMAN
Curitiba/PR

VENTO MENINO

Vento menino
Despenteia meus cabelos
Brinca de Destino
E espalha as reticências...
Vento Menino
Faz com que eu viaje em sonhos
E reencontre meu  Amor...
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Luciana Soares (O Mistério do Pastel Desaparecido)

Toda sexta-feira era sagrada, na casa do Espanhol e de sua esposa Lulu, um rodízio de pastéis! E quem comandava a fritura (pilotava o fogão), era Dona Luiza, a sogra, uma verdadeira autoridade em massas crocantes e recheios generosos.

Os sabores eram variados: queijo, palmito, carne, camarão etc., mas o queridinho da família era o pastel de banana. 

Aquela semana, resolveram inovar e ousaram investir na versão: banana com queijo. Espanhol, que torceu o nariz no início, foi o primeiro a se render. Lulu deu a ideia de fazer meia dúzia, já prevendo a disputa.

Quando os pastéis ficaram prontos, o cheiro dominou a casa. Dona Luíza organizou tudo na mesa e, entre goles de suco e mordidas crocantes, chegou a vez de degustarem o “sexteto”, nome que deram aos pastéis. Dos seis pastéis de banana com queijo, cinco foram devorados em tempo recorde. Mas, e o sexto?

Espanhol, com a boca cheia, jurou que só comeu um. Lulu levantou suspeitas, mas estava certa de ter pegado apenas dois. Luiza, indignada, alegou que só deu uma mordida no dela.

A tensão pairou no ar. Reviraram a travessa, olharam embaixo da mesa, até checaram o “dog” da vizinha que apareceu na porta. Nada do pastel.

A tradição das sextas-feiras se manteve, mas desde então, toda vez entre uma mordida e outra, a pergunta ressurge: "Cadê o pastel que sumiu?"

E até hoje ninguém assumiu.
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LUCIANA SOARES CHAGAS é do Rio de Janeiro/RJ. Doutoranda em Educação, Mestre em Psicanálise, Saúde e Sociedade. Especialista em Gestão de Recursos Humanos. Formação em Pedagogia Empresarial. Especialização em Mídias e Tecnologia na Educação pela Universidade Veiga de Almeida e Licenciatura em Pedagogia. Docente há mais de 10 anos dos cursos de MBAs do Núcleo de Negócios e das Pós Graduação de Educação. Palestrante nas Jornadas presenciais para os alunos da EaD. Atuou como Instrutora comportamental em empresas como ABRADECONT, Marinha de Brasil-EMGEPRON, Miriam S.A., CIPA Administradora (BKR-Lopes e Machado), IBEF, Casa de Cultura (SevenStarmarketing). Diretora e sócia da Prassos Treinamento Empresarial. Autora de diversos E-books de disciplinas da área de Pedagogia na Universidade Veiga de Almeida e Organizadora do Livro E-Book da Coletânea de textos sobre inclusão escolar: Pedagogia.

Fontes:
Texto enviado pela autora.
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing 

sexta-feira, 7 de março de 2025

Adega de Versos 130: Silmar Bohrer

 

Monsenhor Orivaldo Robles (O desperdício)

Faz anos, era véspera do aniversário de meu afilhado, criança dos seus quatro ou cinco anos. A comadre surpreende-o atirando ao lixo um monte de brinquedos. “Que é isso, filho?”. A resposta desconcerta-a: “Ah, mãe, amanhã é meu aniversário. Vai vir tudo novo”. A comadre não alisa. Faz desabar sobre o pequeno um sermão a respeito de crianças pobres, que se sentiriam felizes com um só daqueles brinquedos que ele estava jogando fora. O compadre reforça a bronca. Conta de sua infância na zona rural. Com os irmãos fabricava os próprios brinquedos utilizando carretéis de linha usados, sarrafos de madeira, vidros de remédio vazios e outras peças. “O pai e os tios, meu filho, nem sonhavam com um brinquedo desses que enchem o seu quarto. Um só já nos tornaria felizes. Mas a gente não tinha dinheiro”. Confrange-se o coraçãozinho do garoto. Ele cai num pranto sentido, que pai e mãe precisam consolar.

Dias depois, na pia da cozinha aparece aberto um potinho de iogurte quase cheio. A repreensão vem na hora: “Filho, se você não aguentava tomar um inteiro, por que abriu? Quantos pobrezinhos desejam um iogurte...” Rápido, ele corta o discurso: “Ih, pai, não vem de novo com esse papo dos pobres, que outro dia eu fui obrigado a chorar por causa deles”.

A cena acontece todos os dias numa infinidade de lares brasileiros. Infelizmente, nem todos os pais são educadores como o compadre e a comadre. Boa parte se preocupa com cortinas, camas, sofás e roupas. Cuidam que restos de comida ou bebida não os emporcalhem. Cuidado cosmético, beleza externa para os outros verem, só isso.

O desperdício é hábito generalizado, que importa combater desde cedo. A criança não tem ideia do uso correto das coisas. Não sabe se está gastando muito ou pouco. Precisa de orientação sobre o sentido exato de quantidades e valores. Senão, vai se acostumar com o esbanjamento. Se os pais não transmitem, também no consumo, noções de disciplina – pior, se eles mesmos dão exemplo de gastança irresponsável –, será difícil corrigir vícios arraigados no povo.

O opúsculo “Exigências evangélicas e éticas de superação da miséria e da fome”, publicado em abril de 2002 (Documentos da CNBB – 69), ensina, já no subtítulo: “Alimento, dom de Deus, direito de todos”. O acesso à comida de qualidade e em quantidade suficiente é direito de toda pessoa, de qualquer condição, em qualquer lugar do planeta. Como se tornar gente, na plenitude do termo, sem poder se alimentar?

A este absurdo chegamos: países cheios de pessoas doentes por comerem em excesso, enquanto em outros a população vem sendo exterminada pela fome. Dentro do Brasil convivemos com ambas as situações. Temos gente desperdiçando, ao lado de quem não possui o necessário para comer.

O problema vem de longe. Não será resolvido da noite para o dia. Mas é preciso que todos se sintam comprometidos. Não adianta ficar lançando a culpa nas costas dos outros. Para o faminto pouco importa quem provocou a fome. O que ele quer é comida.

Nas propostas concretas, sugerem-se medidas possíveis, algumas bem simples, como “educar para o melhor aproveitamento do alimento produzido, evitando todo o desperdício”.

É urgente começar dentro de casa, educando as novas gerações. Como, desde muito, fazem os compadres.
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MONSENHOR ORIVALDO ROBLES nasceu em Polôni (SP) em 1941. Estudou em Jales e Poloni e ingressou no Seminário Nossa Senhora da Paz, em São José do Rio Preto, em 1953. Cursou Filosofia em Curitiba (PR), graduando-se na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, de Mogi das Cruzes SP, com diploma reconhecido pela USP, São Paulo. Graduou-se em Teologia no Studium Theologicum de Curitiba, afiliado à Pontifícia Universidade Lateranense, de Roma. Lecionou no Colégio Estadual Dr. Gastão Vidigal, e no Instituto de Educação, em Maringá (PR) (1967-1969). No Colégio Estadual e na Escola Normal de Paranacity (PR) (1970-1972). Por quase onze anos trabalhou como pároco de Marialva, de onde saiu no início de 1983 para assumir, por seis anos, o cargo de reitor do Seminário Arquidiocesano Nossa Senhora da Glória - Instituto de Filosofia de Maringá. Em 1989 assumiu a Paróquia Santa Maria Goretti, em Maringá, onde trabalhou por mais de 20 anos. Desde 2009, trabalhou na Catedral Metropolitana de Maringá, exercendo a função de vigário paroquial. Foi palestrante convidado a discorrer, em colégios ou outros núcleos humanos, sobre temas ligados à cidadania, formação pessoal e sobre ética pessoal ou pública. Em 2012 teve publicado o livro "Celeiro Desprovido", com 270 páginas, contendo 118 crônicas e artigos escritos desde 1995. Em 2017, foi publicado o livro dos 60 anos da Diocese de Maringá. Foi articulista mensal ou semanal, por mais de quinze anos, de jornais editados em Maringá, além de ter matérias reproduzidas em revistas ou blogs da região.Faleceu de enfisema pulmonar, em 2019, em Maringá/PR.

Fontes:
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing  

Baú de Trovas "014"

 

651
Que enorme esperança, irmãos,
um simples gesto nos traz:
o encontro de duas mãos
selando um voto de paz!
A. A. DE ASSIS
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652
Hei de alcançar teus carinhos,
pois estou certo de que
quase todos os caminhos
me conduzem a você!
APARÍCIO FERNANDES
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653
Eu vi, ao nascer do dia,
a rosa despetalada
e o assassino que fugia:
o vento da madrugada!
ARLINDO TADEU HAGEN
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654
Se a vida é um texto e deixamos
para trás folha esquecida,
de perda em perda é que vamos
perdendo o senso da vida.
CAROLINA RAMOS
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655
O pior da viuvez
são angústias sem respostas:
sai um mês... vem outro mês...
...e quem vem coçar-me as costas?
CÉLIA GUIMARÃES SANTANA
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656
Nesses dias tão tristonhos
que a vida nos infligiu,
parece que em muitos sonhos
nenhuma rosa se abriu.
CENIZE DE ANDRADE
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657
Dá meus olhos, morto, Amada,
ao cego da nossa rua.
Se o morto não vê mais nada,
veja o cego a graça tua...
CICERO COSTA
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658
Agora que na parede
do meu quarto de saudade
vejo apenas uma rede,
eu vivo pela metade!...
CLARINDO BATISTA
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659
Meu verso é barco largado
na pauta da inspiração;
tendo Deus sempre ao meu lado
não temo nem furacão!
DÁGUIMA VERÔNICA
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660
Juntas, duas alianças,
no dedo da mão esquerda,
são permanentes lembranças
da minha infinita perda...
DOMINGOS FREIRE CARDOSO
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661
Fugir do tempo?... Tolice!...
Por mais que acaso se tente,
o fantasma da velhice
burla o acaso e encontra a gente!
EDMAR JAPIASSÚ MAIA
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662
Manhãs são novos começos,
festas da vida, alvorada
da fé que não vê tropeços,
mas a luz no fim da estrada…
ELIAS PESCADOR 
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663
Seja a paz um elo forte
na corrente da amizade,
que ela ao mundo inteiro exorte
ao amor, que é só verdade!
FLÁVIO ROBERTO STEFANI
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664
Caminhos cheios de marcas,
recordações do viver.
Nos corações são as arcas...
guardam o bem e o sofrer.
JOSÉ FELDMAN
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665
Me diga, pai:– Furacão
é feito de vento? – Exato!
– Mas se o vento fura o cão,
porque é que não fura o gato?
JOSÉ MARIA MACHADO DE ARAÚJO 
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666
Sua boca tem segredos,
e assim, você me seduz,
revelo então, os meus medos
que nem a noite reluz!
JULIANA APPEL
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667
Oh perfeita entre as perfeitas,
eu tenho invejas estranhas
da cama em que tu te deitas,
da água com que te banhas!
JUNQUILHO LOURIVAL 
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668
Há sorriso de ironia,
há sorriso imerso em dor,
há também de simpatia...
mas o melhor é o de amor!
LÓLA PRATA
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669
Que não haja preconceito,
mas respeito ao nosso irmão,
sem tolher o seu direito
por simples pigmentação!...
LUCÍLIA ALZIRA TRINDADE DECARLI
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670
Eu te agrado, tu me agradas,
e, no doce cativeiro,
sem algemas, sem ciladas,
tu me prendes por inteiro!
LUIZ CARLOS ABRITTA 
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671
De tanto contar mentira
o meu primo pescador
casou com uma “traíra”
que morde a isca aonde for.
LUIZ MORAES
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672
No instante em que tu partiste
houve uma pausa... sem fim...
Deixaste teu rosto triste,
sorrindo... dentro de mim.
LUIZ POETA
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673
Na humildade dos seus passos,
lembre sempre a decisão
de dar a mão, nos fracassos,
a quem lhe estendeu a mão...!
MARA MELINNI 
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674
Por vingança o centro-avante,
que há muito tempo vai mal,
fez gol contra fulminante
a um segundo do final.
MARIA HELENA CALAZANS DUARTE
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675
Volte agora com vontade,
ser o amor que me encantou,
traga consigo a saudade,
que ao partir, você deixou!
MARIA LUIZA WALENDOWSKY
= = = = = = = = = 
676
São gotas de poesia,
ou de algum raro licor, 
que o orvalho, com alegria, 
põe no cálice da flor.
MARLÊ B. J. DE ARAÚJO
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677
Minha passagem na terra 
tem a marca que eu queria, 
todo amor, sem qualquer guerra: 
– Doce viagem, que alegria!
MARLI VOIGT 
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678
Escuto ainda, a cadência
duma canção de ninar;
era mamãe, com paciência,
tentando me acalentar…
MAURICIO NORBERTO FRIEDRICH
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679
Enquanto a nau Esperança
singrar os mares da vida,
minha Quimera não cansa
e nem se dá por vencida.
MIGUEL RUSSOWSKY 
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680
Com textos, fotos ou mapas,
o bom livro é uma estrutura
onde o leitor, entre as capas,
mata a sede da cultura.
MILTON SEBASTIÃO SOUZA 
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681
É muito triste de ver
a juventude perdida;
e, à Internet se render,
perdendo a essência da vida...
MYRTHES MASIERO
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682
Foi por falta de carinho 
que errei e perdi meus passos, 
mas bendigo o “mau caminho” 
que me levou aos teus braços… 
NÁDIA HUGUENIN 
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683
Dando salva de Poesia
enalteço o Trovador
pela Trova que eu queria
ser, da mesma, o seu Autor.
NEI GARCEZ
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684
Selva: bela e exuberante;
cria, de rara beleza,
de Deus que, naquele instante,
nominou-a... Natureza!
NEMÉSIO PRATA
= = = = = = = = = 
685
Creio que quem olha a Terra
sob o azul e branco manto
não acredita que a guerra
possa tingi-la de pranto.
OLYMPIO COUTINHO
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686
Quando a tarde veste o manto,
torna escura a luz do dia,
saudade, dói outro tanto,
do tanto que já doía.
PROFESSOR GARCIA
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687
É tempo de liberdade,
vamos partir os grilhões,
numa só cumplicidade
que se fundam corações.
RAYMUNDO DE SALLES BRASIL
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688
A tristeza em minha casa
está num quarto vazio:
de dia a saudade abrasa,
à noite mata de frio.
ROBERTO PINHEIRO ACRUCHE
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689
Aproveita, criançada,
o tempo, alegre, ligeiro,
que da a uma simples calçada
dimensões do mundo inteiro!
RODOLPHO ABBUD 
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690
Por berço tive a montanha!
Sou camponês, trovador!
No universo da campanha,
meu estro virou condor!
RUI CARDOSO NUNES
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691
A vida é um mar de rosas
legando beleza e olor,
às criaturas bondosas,
que sabem semear o amor.
SARA FURQUIM 
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692
A Trova que se revela
em sua forma e magia
é uma pequena aquarela
na tela da Poesia.
SEBAS SUNDFELD
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693
Com tanta delicadeza,
um regato a serra desce...
E eu tenho quase certeza
que a própria serra agradece!
SELMA PATTI SPINELLI 
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694
A alegria da pessoa
que demonstra amor à vida,
à sua volta ressoa...
torna a estrada colorida…
SOLANGE COLOMBARA
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695
É o abuso da riqueza
e o desprezo à educação
que põe sobre a nossa mesa
a fome, em lugar do pão.
SÔNIA SOBREIRA DA SILVA
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696
Finda a paixão proibida...
E ao seguir novos caminhos,
a decisão foi da vida,
que fez, de nós... dois sozinhos!
THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA 
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697
Come e bebe no batuque
e não sai endividada,
pois aplica o velho truque
de sair só “desmaiada” !
THEREZINHA ZANONI FERREIRA
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698
Buscando quimeras vãs
e redentoras auroras,
fui vivendo de "amanhãs"
e não vivi meus "agoras"…
WANDA DE PAULA MOURTHÉ
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699
Há um relógio em cada esquina
marcando o tempo atual;
mas não marca quem destina,
nosso destino final.
WELLINGTON FREITAS
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700
A esperar que regressasse,
postei-me à porta, rezando...
E, se ele nunca voltasse
continuaria esperando...
YEDDA RAMOS PATRÍCIO
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NOTAS
- De acordo com a Conaprest da UBT, não são mais aceitas rimas tipo eijo/ejo; ágoa/água; oca/louca, etc.

- Antes da fundação da UBT, não havia a obrigatoriedade de rimar o 1. verso com o 3. verso. Para concursos de trovas, é obrigatória a rima do 1. verso com 3. verso, 2. verso com 4. verso. (Sistema ABAB)