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terça-feira, 3 de junho de 2014
Dorothy Jansson Moretti (Baú de Trovas) 15
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Florilégio de Trovas,
Sorocaba
Folclore Brasileiro (Mitos Indígenas) Iamulumulu - A formação dos rios
Savuru era um espírito que possuía duas esposas. A pedido dos irmãos Kuát ( Sol) e Iaê ( Lua ), que as cobiçavam, as ariranhas o mataram, ficando sua esposa mais velha com o Sol e a outra com a Lua.
Seguiram então os casais em direção à aldeia de Kanutsipei. Durante o caminho, os irmãos encontraram dificuldades e necessitaram da ajuda de outros espíritos: Iamulumulu lhes curou a impotência, Ierêp fez com que neles nascesse o ciúme das esposas e, uma vez cansados, pediram a Uiaó algo que os fizessem adormecer.
No dia seguinte, dispostos, retomaram a caminhada. Chegando ao local pretendido, estavam sedentos e pediram água a Kanutsipei. A água, porém, estava suja. O irmão Lua, tomando a forma de um beija-flor, voou rapidamente à procura de boa água. Ao voltar contou-lhes que o espírito os enganara, mantendo escondidos muitos potes com a mais pura água. Contrariados, os casais retornaram a sua aldeia, contando a todos o que ocorrera.
O Sol e a Lua uniram-se a vários espíritos, Vanivani, lananá, Kanaratê, os zunidores Hori-hori, invocando também os espíritos das águas que habitavam a copa do Jatobá. Chamaram ainda as máscaras Jakuikutu, Mearatsim, Ivat, Jakuiaép e Tauari. Reunidos, dançaram e resolveram voltar à aldeia de Kanutsipei para tomarem posse de sua água, quebrando todos os seus potes, conduzindo-a a outras regiões.
Mearatsim, o primeiro a chegar, cantou para espantar o dono do local. Chegaram então os outros espíritos e, à medida que os potes foram quebrados, formou-se ali uma grande lagoa, de onde cada um dos espíritos criou um rio.
Assim, o Sol criou o Rio Ronouro; Vani-vani formou o Rio Maritsauá; Kanaratê, o Paranajuva; Tracajá, o Kuluene e Iananá, um afluente do Ronouro.
A formação dos rios não agradou ao Sol, pois todos corriam para Morená, a região sagrada dos espíritos. Iniciou-se ali uma grande confusão, em meio à qual a Lua foi engolida por um grande peixe. O Sol, desesperado, saiu à procura do irmão, no ventre dos peixes que encontrava. Chegou a capturar o Tucunaré, o Matrinxã, o Pirarara e a Piranha. Mas havia sido o Jacunaum que o engolira, informou o Acará. E ambos, unidos, partiram à caça dos peixe.
Pediram a Taperá (andorinha do campo) que lhes conseguisse um grande anzol, ocultando-o num charuto. O Acará nadou à procura de Jacunaum, oferecendo-lhe fumo. Desta maneira, o Sol conseguiu fisgá-lo. Entretanto, dentro do peixe, restavam apenas os ossos de seu irmão.
Desejando ardentemente que a Lua revivesse, o Sol arrumou no chão seu esqueleto, cobrindo-o com as folhas perfumadas do Enemeóp. Aos poucos, como por encanto, a carne foi surgindo, revestindo os ossos até formar um novo corpo. Faltava-lhe ainda a vida. O Sol então introduziu um mosquitinho em sua narina, provocando-lhe um espirro, que o fez finalmente despertar.
Assim foram criados os rios e, a partir daí, iniciou-se a prática da pajelança, tendo sido o Sol o primeiro pajé.
Fonte:
Jayhr Gael (Mitos indígenas). www.caminhodewicca.com.br
Seguiram então os casais em direção à aldeia de Kanutsipei. Durante o caminho, os irmãos encontraram dificuldades e necessitaram da ajuda de outros espíritos: Iamulumulu lhes curou a impotência, Ierêp fez com que neles nascesse o ciúme das esposas e, uma vez cansados, pediram a Uiaó algo que os fizessem adormecer.
No dia seguinte, dispostos, retomaram a caminhada. Chegando ao local pretendido, estavam sedentos e pediram água a Kanutsipei. A água, porém, estava suja. O irmão Lua, tomando a forma de um beija-flor, voou rapidamente à procura de boa água. Ao voltar contou-lhes que o espírito os enganara, mantendo escondidos muitos potes com a mais pura água. Contrariados, os casais retornaram a sua aldeia, contando a todos o que ocorrera.
O Sol e a Lua uniram-se a vários espíritos, Vanivani, lananá, Kanaratê, os zunidores Hori-hori, invocando também os espíritos das águas que habitavam a copa do Jatobá. Chamaram ainda as máscaras Jakuikutu, Mearatsim, Ivat, Jakuiaép e Tauari. Reunidos, dançaram e resolveram voltar à aldeia de Kanutsipei para tomarem posse de sua água, quebrando todos os seus potes, conduzindo-a a outras regiões.
Mearatsim, o primeiro a chegar, cantou para espantar o dono do local. Chegaram então os outros espíritos e, à medida que os potes foram quebrados, formou-se ali uma grande lagoa, de onde cada um dos espíritos criou um rio.
Assim, o Sol criou o Rio Ronouro; Vani-vani formou o Rio Maritsauá; Kanaratê, o Paranajuva; Tracajá, o Kuluene e Iananá, um afluente do Ronouro.
A formação dos rios não agradou ao Sol, pois todos corriam para Morená, a região sagrada dos espíritos. Iniciou-se ali uma grande confusão, em meio à qual a Lua foi engolida por um grande peixe. O Sol, desesperado, saiu à procura do irmão, no ventre dos peixes que encontrava. Chegou a capturar o Tucunaré, o Matrinxã, o Pirarara e a Piranha. Mas havia sido o Jacunaum que o engolira, informou o Acará. E ambos, unidos, partiram à caça dos peixe.
Pediram a Taperá (andorinha do campo) que lhes conseguisse um grande anzol, ocultando-o num charuto. O Acará nadou à procura de Jacunaum, oferecendo-lhe fumo. Desta maneira, o Sol conseguiu fisgá-lo. Entretanto, dentro do peixe, restavam apenas os ossos de seu irmão.
Desejando ardentemente que a Lua revivesse, o Sol arrumou no chão seu esqueleto, cobrindo-o com as folhas perfumadas do Enemeóp. Aos poucos, como por encanto, a carne foi surgindo, revestindo os ossos até formar um novo corpo. Faltava-lhe ainda a vida. O Sol então introduziu um mosquitinho em sua narina, provocando-lhe um espirro, que o fez finalmente despertar.
Assim foram criados os rios e, a partir daí, iniciou-se a prática da pajelança, tendo sido o Sol o primeiro pajé.
Fonte:
Jayhr Gael (Mitos indígenas). www.caminhodewicca.com.br
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Contos e Lendas do Mundo,
Cultura Indigena
Marcelo Spalding (Começando um texto informativo)
Lage, em Teoria e Técnica do Texto Jornalístico, procura fazer uma tipologia dos tipos de lead, reconhecendo que para além do lead clássico há outras possibilidades de se começar um texto jornalístico. Façamos um paralelo entre essa tipologia e as possibilidade de se começar um texto informativo:
O lead clássico
"O lead clássico ordena os elementos da proposição - quem/o que, fez o que, quando, onde, como, por que/para que - a partir da notação mais importante. Isto é, se o mais importante é o sujeito da oração principal, começa-se pelo sujeito; se o mais importante for o objeto, constrói-se o período na voz passiva; se o mais importante for alguma das circunstâncias, começa-se pela circunstância"
Como vimos na técnica da pirâmide invertida, esse é o lead que expõe os fatos mais importante primeiros e o aprofundamento, as explicações ou as razões depois. Considerando que os leitores muitas vezes não vão além o primeiro parágrafo de um texto, tem se tornado uma técnica cada vez mais utilizada nos textos informativos.
O lead narrativo
"Ao contrário do lead clássico, que começa pela notação mais importante, aqui se alinham os fatos sucessivos que conduzem ao clímax. É como um pequeno conto, de poucas linhas."
O lead clássico
"O lead clássico ordena os elementos da proposição - quem/o que, fez o que, quando, onde, como, por que/para que - a partir da notação mais importante. Isto é, se o mais importante é o sujeito da oração principal, começa-se pelo sujeito; se o mais importante for o objeto, constrói-se o período na voz passiva; se o mais importante for alguma das circunstâncias, começa-se pela circunstância"
Como vimos na técnica da pirâmide invertida, esse é o lead que expõe os fatos mais importante primeiros e o aprofundamento, as explicações ou as razões depois. Considerando que os leitores muitas vezes não vão além o primeiro parágrafo de um texto, tem se tornado uma técnica cada vez mais utilizada nos textos informativos.
O lead narrativo
"Ao contrário do lead clássico, que começa pela notação mais importante, aqui se alinham os fatos sucessivos que conduzem ao clímax. É como um pequeno conto, de poucas linhas."
O começo de um texto a partir de uma narrativa pode ser útil quando é necessário apresentar ao leitor as personagens envolvidas. É uma técnica muito comum nas petições iniciais dos advogados, em que primeiramente é preciso expor os fatos, para posteriormente fazer a argumentação e apresentar as demandas. No telejornalismo, esse tipo de início também é muito comum, funcionando como uma espécie de metonímia para a matéria abordada.
O lead resumo
"Utiliza-se eventualmente na cobertura (continuações) de eventos em que há várias informações de destaque, mais ou menos equivalentes, e que devem ser condensadas em uma única matéria."
O lead resumo não é uma contextualização anterior à matéria, e sim a apresentação de diversos fatos importantes de forma sucinta. O exemplo trazido por Lage é bastante claro: "Dois dias depois do terremoto que atingiu 20 cidades turcas, o número de mortos elevou-se a sete mil, o de feridos a 30 mil, uma grande refinaria estava ainda em chamas e crescia o temor de que o caos dos transportes e serviços públicos cause fome e epidemias. Há mais de mil desaparecidos e cem mil desabrigados."
Nesse caso, a sequência do texto é que abordará com um pouco mais de detalhamento cada um dos fatos ali mencionados.
O lead flash
"Uma frase curta - e de impacto - inicia o texto. Utiliza-se, às vezes, como recurso para estabelecer uma relação retórica - geralmente uma antítese - entre eventos distintos."
O que Lage chama de lead flash é na verdade uma frase anterior ao lead que funciona para chamar a atenção para o texto. Por exemplo: "Um homem foi crucificado na Arábia Saudita" ou "Bill Gates ficou dez bilhões de dólares mais rico desde a crise cambial russa, que tornou o Brasil mais pobre". Seu uso deve ser extremamente moderado e limitado a situações em que o jogo de palavras justifica essa frase anterior.
Nariz de cera
Embora Lage não o aborde em seus tipos de lead, até por não ser mesmo um tipo de lead, o conceito de nariz de cera é muito importante e, quando bem utilizado, pode ser benéfico para o texto informativo. Por definição, é o parágrafo introdutório em um texto que retarda a abordagem do assunto enfocado.
No jornalismo, o nariz de cera é geralmente condenado por tender à prolixidade e ser o oposto do lead; mas em crônicas, por exemplo, ele tem um papel muito importante, pois com ele o autor quebra o gelo e introduz aos poucos o assunto que abordará (por vezes, polêmico).
O lead resumo
"Utiliza-se eventualmente na cobertura (continuações) de eventos em que há várias informações de destaque, mais ou menos equivalentes, e que devem ser condensadas em uma única matéria."
O lead resumo não é uma contextualização anterior à matéria, e sim a apresentação de diversos fatos importantes de forma sucinta. O exemplo trazido por Lage é bastante claro: "Dois dias depois do terremoto que atingiu 20 cidades turcas, o número de mortos elevou-se a sete mil, o de feridos a 30 mil, uma grande refinaria estava ainda em chamas e crescia o temor de que o caos dos transportes e serviços públicos cause fome e epidemias. Há mais de mil desaparecidos e cem mil desabrigados."
Nesse caso, a sequência do texto é que abordará com um pouco mais de detalhamento cada um dos fatos ali mencionados.
O lead flash
"Uma frase curta - e de impacto - inicia o texto. Utiliza-se, às vezes, como recurso para estabelecer uma relação retórica - geralmente uma antítese - entre eventos distintos."
O que Lage chama de lead flash é na verdade uma frase anterior ao lead que funciona para chamar a atenção para o texto. Por exemplo: "Um homem foi crucificado na Arábia Saudita" ou "Bill Gates ficou dez bilhões de dólares mais rico desde a crise cambial russa, que tornou o Brasil mais pobre". Seu uso deve ser extremamente moderado e limitado a situações em que o jogo de palavras justifica essa frase anterior.
Nariz de cera
Embora Lage não o aborde em seus tipos de lead, até por não ser mesmo um tipo de lead, o conceito de nariz de cera é muito importante e, quando bem utilizado, pode ser benéfico para o texto informativo. Por definição, é o parágrafo introdutório em um texto que retarda a abordagem do assunto enfocado.
No jornalismo, o nariz de cera é geralmente condenado por tender à prolixidade e ser o oposto do lead; mas em crônicas, por exemplo, ele tem um papel muito importante, pois com ele o autor quebra o gelo e introduz aos poucos o assunto que abordará (por vezes, polêmico).
Fazendo uma analogia com a fala, o nariz de cera é aquele momento inicial de uma reunião de negócios em que as duas partes falam sobre o clima, o time de futebol e a família, antes de partir para os temas árduos que provocaram a reunião.
Fonte:
Marcelo Spalding in http://www.cursosdeescrita.com.br/4107/comecando-um-texto-informativo
Fonte:
Marcelo Spalding in http://www.cursosdeescrita.com.br/4107/comecando-um-texto-informativo
Gonçalves Dias (Primeiros Cantos) 7
A Escrava
O bien qu’aucun bien ne peut rendre!
Patrie! doux nom que l’exil fait comprendre!
- Marino Faliero
Oh! doce país de Congo
Doces terras d’além-mar!
Oh! dias de sol formoso!
Oh! noites d’almo luar!
Desertos de branca areia
De vasta, imensa extensão,
Onde livre corre a mente,
Livre bate o coração!
Onde a leda caravana
Rasga o caminho passando,
Onde bem longe se escuta
As vozes que vão cantando!
Onde longe inda se avista
O turbante muçulmano,
O Iatagã recurvado,
Preso à cinta do Africano!
Onde o sol na areia ardente
Se espelha, como no mar;
Oh! doces terras de Congo,
Doces terras d’além-mar!
Quando a noite sobre a terra
Desenrolava o seu véu,
Quando sequer uma estrela
Não se pintava no céu;
Quando só se ouvia o sopro
De mansa brisa fagueira,
Eu o aguardava - sentada
Debaixo da bananeira.
Um rochedo ao pé se erguia,
Dele à base uma corrente
Despenhada sobre pedras,
Murmurava docemente.
E ele às vezes me dizia:
- Minha Alsgá, não tenhas medo;
Vem comigo, vem sentar-te
Sobre o cimo do rochedo.
E eu respondia animosa:
- Irei contigo. onde fores! -
E tremendo e palpitando
Me cingia aos meus amores.
Ele depois me tornava
Sobre o rochedo - sorrindo.
- As águas desta corrente
Não vês como vão fugindo?
Tão depressa corre a vida,
Minha Alsgá; depois morrer
Só nos resta!... - Pois a vida
Seja instantes de prazer.
Os olhos em torno volves
Espantados - Ah! também
Arfa o teu peito ansiado!...
Acaso temes alguém?
Não receies de ser vista,
Tudo agora jaz dormente;
Minha voz mesmo se perde
No fragor desta corrente.
Minha Alsgá, porque estremeces?
Porque me foges assim?
Não te partas, não me fujas,
Que a vida me foge a mim!
Outro beijo acaso temes,
Expressão de amor ardente?
Quem o ouviu? - o som perdeu-se
No fragor desta corrente.
Assim praticando amigos
A aurora nos vinha achar!
Oh! doces terras de Congo,
Doces terras d’além-mar!
Do ríspido senhor a voz irada
Rábida soa,
Sem o pranto enxugar a triste escrava
Pávida voa.
Mas era em mora por cismar na terra,
Onde nascera,
Onde vivera tão ditosa, e onde
Morrer devera!
Sofreu tormentos, porque tinha um peito,
Qu’inda sentia;
Mísera escrava! no sofrer cruento.
Congo! dizia.
Ao Dr. João Duarte Lisboa Serra
23 agosto.
Mais um pungir de acérrima saudade,
Mais um canto de lágrimas ardentes,
Oh! minha Harpa, - oh! minha Harpa desditosa.
Escuta, ó meu amigo: da minha alma
Foi uma lira outrora o instrumento;
Cantava nela amor, prazer, venturas,
Até que um dia a morte inexorável
Triste pranto de irmão veio arrancar-te!
As lágrimas dos olhos me caíram,
E a minha lira emudeceu de mágoa!
Então aventei eu que a vida inteira
Do bardo, era um perene sacerdócio
De lágrimas e dor; - tomei uma Harpa:
Na corda da aflição gemeu minha alma,
Foi meu primeiro canto um epicédio!
Minha alma batizou-se em pranto amargo,
Na frágua do sofrer purificou-se!
Lancei depois meus olhos sobre o mundo,
Cantor do sofrimento e da amargura;
E vi que a dor aos homens circundava,
Como em roda da terra o mar se estreita;
Que apenas desfrutamos, - miserandos!
Desbotado prazer entre mil dores,
- Uma rosa entre espinhos aguçados,
Um ramo entre mil vagas combatido.
Voltou-se então p’ra Deus o meu esp’rito,
E a minha voz queixosa perguntou-lhe:
- Senhor, porque do nada me tiraste,
Ou por que a tua voz onipotente
Não fez secar da minha vida a sebe,
Quando eu era principio e feto - apenas?
Outra voz respondeu-me dentro d’alma:
- Ardam teus dias como o feno, - ou durem
Como o fogo de tocha resinosa,
- Como rosa em jardim sejam brilhantes,
Ou baços como o cardo montesinho.
Não deixes de cantar, ó triste bardo. -
E as cordas da minha harpa - da primeira
À extrema - da maior à mais pequena,
Nas asas do tufão - entre perfumes,
Um cântico de amores exaltaram
Ao trono do Senhor; - e eu disse às turbas:
- Ele nos faz gemer porque nos ama;
Vem o perdão nas lágrimas contritas,
Nas asas do sofrer desce a demência;
Sobre quem chora mais ele mais vela!
Seu amor divinal é como a lâmpada,
Na abóbada dum templo pendurada,
Mais luz filtrando em mais opacas trevas.
Eu o conheço: - o cântico do bardo
É bálsamo ao que morre, - é lenitivo,
Mas doloroso, mas funéreo e triste
A quem lhe carpe infausto a morte crua.
Mas quando a alma do justo, espedaçando
O invólucro de lodo, aos céus remonta,
Como estrada de luz correndo os astros,
Seguindo o som dos cânticos dos anjos
Que na presença do Senhor se elevam;
Choro... tão bem Jesus chorou a Lázaro!
Mas na excelsa visão que se me antolha
Bebo consolações, - minha alma anseia
A hora em que também há de asilar-se
No seio imenso do perdão do Eterno.
Chora, amigo: porém quando sentires
O pranto nos teus olhos condensar-se,
Que já não pode mais banhar-te as faces,
Ergue os olhos ao céu, onde a luz mora,
Onde o orvalho se cria, onde parece
Que a tímida esperança nasce e habita.
E se eu - feliz! - puder inda algum dia
Ferir por teu respeito na minha harpa
A leda corda onde o prazer palpita,
A corda do prazer que ainda inteira,
Que virgem de emoção inda conservo,
Suspenderei minha harpa dalgum tronco
Em of’renda à fortuna; - ali sozinha,
Tangida pelo sopro só do vento,
Há de mistérios conversar co’a noite.
De acorde estreme perfumando as brisas:
Qual Harpa de Sião presa aos salgueiros
Que não há de cantar a desventura,
Tendo cantos gentis vibrado nela.
O Desterro de um Pobre Velho
Et dulces moriens reminiscitur Argos.
- Virgílio
O! schwer ist’s, in der Fremde sterben unbeweint
- Schiller
A aurora vem despontando,
Não tarda o sol a raiar:
Cantam aves, - a natura
Já começa a respirar.
Bem mansa na branca areia
Onda queixosa murmura,
Bem mansa aragem fagueira
Entre a folhagem sussurra.
É hora cheia de encantos,
E hora cheia de amor;
A relva brilha enfeitada,
Mais fresca se mostra a flor.
Esbelta joga a fragata,
Como um corcel a nitrir;
Suspensa a amarra tem presa,
Suspensa, que vai partir.
Em demanda da fragata,
Leve barco vem vogando;
Nele um velho cujas faces
Mudo choro está cortando.
Quem era o velho tão nobre,
Que chorava,
Por assim deixar seus lares,
Que deixava?
“Ancião, por que te ausentas?
Corres tu trás de ventura?
Louco! a morte já vem perto.
Tens aberta a sepultura.
“Louco velho, já não sentes
Bater frouxo o coração? .
Oh! que o sente! - É lei d’exílio
A que o leva em tal sazão!
“Não ver mais a cara pátria,
Não ver mais o que deixava,
Não ver nem filhos, nem filhas,
Nem o casal, que habitava!...
“Oh! que é má pena de morte,
A pena de proscrição;
Traz dores que martirizam,
Negra dor de coração!
“Pobre velho! - longe, longe
Vás sustento mendigar;
Tens de sofrer novas dores,
Novos males que penar.
“Não t’há de valer a idade,
Nem a dor tamanho e nobre;
Tens de tragar vis afrontas,
- Insultos que sofre o pobre!
“Nada acharás no degredo,
Que fale dos filhos teus;
Ninguém sente a dor do pobre,,,
Só te fica a mão de Deus.
“O sol, que além vês raiando
Entre nuvens de carmim,
Noutros climas, noutras terras
Não verás raiar assim.
“Não verás a rocha erguida,
Onde t’ias assentar;
Nem o som bem conhecido
Do teu sino hás de escutar.
“Há de cair sobre as ondas
O pranto do teu sofrer,
E nesse abismo salgado,
Salgado se há de perder.”
Já chegou junto à fragata,
Já na escada de apoiou,
Já com voz intercortada
Último adeus soluçou.
Canta o nauta, e solta as velas
Ao vento que o vai guiar;
E a fragata mui veleira
Vai fugindo sobre o mar.
E o velho sempre em silêncio
A calva testa dobrou,
E pranto mais abundante
O rosto senil cortou.
Inda se vê branca a vela
Do navio, que partiu;
Mais além - inda se avista!
Mais além - já se sumiu!
O Orgulhoso
Eu o vi! - tremendo era no gesto,
Terrível seu olhar;
E o cenho carregado pretendia
O globo dominar.
Tremendo era na voz, quando no peito
Fervia-lhe o rancor!
E aos demais homens, como um cedro à relva,
Se cria sup’rior.
E o pobre agricultor, junto a seus filhos,
Dentro do humilde lar,
Quisera, antes que os dele, ver um Tigre
Os olhos fuzilar:
Que a um filho seu talvez quisera o nobre
Para um Executor;
Ou para o leito infesto alguma filha
Do triste agricultor.
Quem ousaria resistir-lhe? - Apenas
Algum pobre ancião
Já sobre o seu sepulcro, desejando
A morte e a salvação.
Alguns dias apenas decorreram;
E eis que ele se sumiu!
E a laje dos sepulcros fria e muda
Sobre ele já caiu.
E o bárbaro tropel dos que o serviam
Exulta com seu fim!
E a turba aplaude; e ninguém chora a morte
De homem tão ruim.
O Cometa
Ao Sr. Francisco Sotero dos Reis
Non est potestas, quae comparetur ei qui
factus est ut nullum timeret.
- Job
O bien qu’aucun bien ne peut rendre!
Patrie! doux nom que l’exil fait comprendre!
- Marino Faliero
Oh! doce país de Congo
Doces terras d’além-mar!
Oh! dias de sol formoso!
Oh! noites d’almo luar!
Desertos de branca areia
De vasta, imensa extensão,
Onde livre corre a mente,
Livre bate o coração!
Onde a leda caravana
Rasga o caminho passando,
Onde bem longe se escuta
As vozes que vão cantando!
Onde longe inda se avista
O turbante muçulmano,
O Iatagã recurvado,
Preso à cinta do Africano!
Onde o sol na areia ardente
Se espelha, como no mar;
Oh! doces terras de Congo,
Doces terras d’além-mar!
Quando a noite sobre a terra
Desenrolava o seu véu,
Quando sequer uma estrela
Não se pintava no céu;
Quando só se ouvia o sopro
De mansa brisa fagueira,
Eu o aguardava - sentada
Debaixo da bananeira.
Um rochedo ao pé se erguia,
Dele à base uma corrente
Despenhada sobre pedras,
Murmurava docemente.
E ele às vezes me dizia:
- Minha Alsgá, não tenhas medo;
Vem comigo, vem sentar-te
Sobre o cimo do rochedo.
E eu respondia animosa:
- Irei contigo. onde fores! -
E tremendo e palpitando
Me cingia aos meus amores.
Ele depois me tornava
Sobre o rochedo - sorrindo.
- As águas desta corrente
Não vês como vão fugindo?
Tão depressa corre a vida,
Minha Alsgá; depois morrer
Só nos resta!... - Pois a vida
Seja instantes de prazer.
Os olhos em torno volves
Espantados - Ah! também
Arfa o teu peito ansiado!...
Acaso temes alguém?
Não receies de ser vista,
Tudo agora jaz dormente;
Minha voz mesmo se perde
No fragor desta corrente.
Minha Alsgá, porque estremeces?
Porque me foges assim?
Não te partas, não me fujas,
Que a vida me foge a mim!
Outro beijo acaso temes,
Expressão de amor ardente?
Quem o ouviu? - o som perdeu-se
No fragor desta corrente.
Assim praticando amigos
A aurora nos vinha achar!
Oh! doces terras de Congo,
Doces terras d’além-mar!
Do ríspido senhor a voz irada
Rábida soa,
Sem o pranto enxugar a triste escrava
Pávida voa.
Mas era em mora por cismar na terra,
Onde nascera,
Onde vivera tão ditosa, e onde
Morrer devera!
Sofreu tormentos, porque tinha um peito,
Qu’inda sentia;
Mísera escrava! no sofrer cruento.
Congo! dizia.
Ao Dr. João Duarte Lisboa Serra
23 agosto.
Mais um pungir de acérrima saudade,
Mais um canto de lágrimas ardentes,
Oh! minha Harpa, - oh! minha Harpa desditosa.
Escuta, ó meu amigo: da minha alma
Foi uma lira outrora o instrumento;
Cantava nela amor, prazer, venturas,
Até que um dia a morte inexorável
Triste pranto de irmão veio arrancar-te!
As lágrimas dos olhos me caíram,
E a minha lira emudeceu de mágoa!
Então aventei eu que a vida inteira
Do bardo, era um perene sacerdócio
De lágrimas e dor; - tomei uma Harpa:
Na corda da aflição gemeu minha alma,
Foi meu primeiro canto um epicédio!
Minha alma batizou-se em pranto amargo,
Na frágua do sofrer purificou-se!
Lancei depois meus olhos sobre o mundo,
Cantor do sofrimento e da amargura;
E vi que a dor aos homens circundava,
Como em roda da terra o mar se estreita;
Que apenas desfrutamos, - miserandos!
Desbotado prazer entre mil dores,
- Uma rosa entre espinhos aguçados,
Um ramo entre mil vagas combatido.
Voltou-se então p’ra Deus o meu esp’rito,
E a minha voz queixosa perguntou-lhe:
- Senhor, porque do nada me tiraste,
Ou por que a tua voz onipotente
Não fez secar da minha vida a sebe,
Quando eu era principio e feto - apenas?
Outra voz respondeu-me dentro d’alma:
- Ardam teus dias como o feno, - ou durem
Como o fogo de tocha resinosa,
- Como rosa em jardim sejam brilhantes,
Ou baços como o cardo montesinho.
Não deixes de cantar, ó triste bardo. -
E as cordas da minha harpa - da primeira
À extrema - da maior à mais pequena,
Nas asas do tufão - entre perfumes,
Um cântico de amores exaltaram
Ao trono do Senhor; - e eu disse às turbas:
- Ele nos faz gemer porque nos ama;
Vem o perdão nas lágrimas contritas,
Nas asas do sofrer desce a demência;
Sobre quem chora mais ele mais vela!
Seu amor divinal é como a lâmpada,
Na abóbada dum templo pendurada,
Mais luz filtrando em mais opacas trevas.
Eu o conheço: - o cântico do bardo
É bálsamo ao que morre, - é lenitivo,
Mas doloroso, mas funéreo e triste
A quem lhe carpe infausto a morte crua.
Mas quando a alma do justo, espedaçando
O invólucro de lodo, aos céus remonta,
Como estrada de luz correndo os astros,
Seguindo o som dos cânticos dos anjos
Que na presença do Senhor se elevam;
Choro... tão bem Jesus chorou a Lázaro!
Mas na excelsa visão que se me antolha
Bebo consolações, - minha alma anseia
A hora em que também há de asilar-se
No seio imenso do perdão do Eterno.
Chora, amigo: porém quando sentires
O pranto nos teus olhos condensar-se,
Que já não pode mais banhar-te as faces,
Ergue os olhos ao céu, onde a luz mora,
Onde o orvalho se cria, onde parece
Que a tímida esperança nasce e habita.
E se eu - feliz! - puder inda algum dia
Ferir por teu respeito na minha harpa
A leda corda onde o prazer palpita,
A corda do prazer que ainda inteira,
Que virgem de emoção inda conservo,
Suspenderei minha harpa dalgum tronco
Em of’renda à fortuna; - ali sozinha,
Tangida pelo sopro só do vento,
Há de mistérios conversar co’a noite.
De acorde estreme perfumando as brisas:
Qual Harpa de Sião presa aos salgueiros
Que não há de cantar a desventura,
Tendo cantos gentis vibrado nela.
O Desterro de um Pobre Velho
Et dulces moriens reminiscitur Argos.
- Virgílio
O! schwer ist’s, in der Fremde sterben unbeweint
- Schiller
A aurora vem despontando,
Não tarda o sol a raiar:
Cantam aves, - a natura
Já começa a respirar.
Bem mansa na branca areia
Onda queixosa murmura,
Bem mansa aragem fagueira
Entre a folhagem sussurra.
É hora cheia de encantos,
E hora cheia de amor;
A relva brilha enfeitada,
Mais fresca se mostra a flor.
Esbelta joga a fragata,
Como um corcel a nitrir;
Suspensa a amarra tem presa,
Suspensa, que vai partir.
Em demanda da fragata,
Leve barco vem vogando;
Nele um velho cujas faces
Mudo choro está cortando.
Quem era o velho tão nobre,
Que chorava,
Por assim deixar seus lares,
Que deixava?
“Ancião, por que te ausentas?
Corres tu trás de ventura?
Louco! a morte já vem perto.
Tens aberta a sepultura.
“Louco velho, já não sentes
Bater frouxo o coração? .
Oh! que o sente! - É lei d’exílio
A que o leva em tal sazão!
“Não ver mais a cara pátria,
Não ver mais o que deixava,
Não ver nem filhos, nem filhas,
Nem o casal, que habitava!...
“Oh! que é má pena de morte,
A pena de proscrição;
Traz dores que martirizam,
Negra dor de coração!
“Pobre velho! - longe, longe
Vás sustento mendigar;
Tens de sofrer novas dores,
Novos males que penar.
“Não t’há de valer a idade,
Nem a dor tamanho e nobre;
Tens de tragar vis afrontas,
- Insultos que sofre o pobre!
“Nada acharás no degredo,
Que fale dos filhos teus;
Ninguém sente a dor do pobre,,,
Só te fica a mão de Deus.
“O sol, que além vês raiando
Entre nuvens de carmim,
Noutros climas, noutras terras
Não verás raiar assim.
“Não verás a rocha erguida,
Onde t’ias assentar;
Nem o som bem conhecido
Do teu sino hás de escutar.
“Há de cair sobre as ondas
O pranto do teu sofrer,
E nesse abismo salgado,
Salgado se há de perder.”
Já chegou junto à fragata,
Já na escada de apoiou,
Já com voz intercortada
Último adeus soluçou.
Canta o nauta, e solta as velas
Ao vento que o vai guiar;
E a fragata mui veleira
Vai fugindo sobre o mar.
E o velho sempre em silêncio
A calva testa dobrou,
E pranto mais abundante
O rosto senil cortou.
Inda se vê branca a vela
Do navio, que partiu;
Mais além - inda se avista!
Mais além - já se sumiu!
O Orgulhoso
Eu o vi! - tremendo era no gesto,
Terrível seu olhar;
E o cenho carregado pretendia
O globo dominar.
Tremendo era na voz, quando no peito
Fervia-lhe o rancor!
E aos demais homens, como um cedro à relva,
Se cria sup’rior.
E o pobre agricultor, junto a seus filhos,
Dentro do humilde lar,
Quisera, antes que os dele, ver um Tigre
Os olhos fuzilar:
Que a um filho seu talvez quisera o nobre
Para um Executor;
Ou para o leito infesto alguma filha
Do triste agricultor.
Quem ousaria resistir-lhe? - Apenas
Algum pobre ancião
Já sobre o seu sepulcro, desejando
A morte e a salvação.
Alguns dias apenas decorreram;
E eis que ele se sumiu!
E a laje dos sepulcros fria e muda
Sobre ele já caiu.
E o bárbaro tropel dos que o serviam
Exulta com seu fim!
E a turba aplaude; e ninguém chora a morte
De homem tão ruim.
O Cometa
Ao Sr. Francisco Sotero dos Reis
Non est potestas, quae comparetur ei qui
factus est ut nullum timeret.
- Job
Eis nos céus rutilando ígneo cometa!
A imensa cabeleira o espaço alastra,
E o núcleo, como um sol tingido em sangue,
Alvacento luzir verte agoireiro
Sobre a pávida terra.
Poderosos do mundo, grandes, povo,
Dos lábios removei a taça ingente,
Que em vossas festas gira; eis que rutila
O sangüíneo cometa em céus infindos!...
Pobres mortais, - sois vermes!
O Senhor o formou terrível, grande;
Como indócil corcel que morde o freio,
Retinha-o só a mão do Onipotente.
Ao fim lhe disse: - Vai, Senhor dos Mundos,
Senhor do espaço infindo.
E qual louco temido, ardendo em fúria,
Que ao vento solta a coma desgrenhada,
E vai, néscio de si, livre de ferros,
De encontro às duras rochas, - tal progride
O cometa incansável.
Se na marcha veloz encontra um mundo,
O mundo em mil pedaços se converte;
Mil centelhas de luz brilham no espaço
A esmo, como um tronco pelas vagas
Infrenes combatido.
Se junto doutro mundo acaso passa,
Consigo o arrasta e leva transformado;
A cauda portentosa o enlaça e prende,
E o astro vai com ele, como argueiro
Em turbilhão levado.
Como Leviatã perturba os mares,
Ele perturba o espaço; - como a lava,
Ele marcha incessante e sempre; - eterno,
Marcou-lhe largo giro a lei que o rege,
- Às vezes o infinito.
Ele carece então da eternidade!
E aos homens diz - e majestoso e grande
Que jamais o verão; e passa, e longe
Se entranha em céus sem fim, como se perde
Um barco no horizonte!
A imensa cabeleira o espaço alastra,
E o núcleo, como um sol tingido em sangue,
Alvacento luzir verte agoireiro
Sobre a pávida terra.
Poderosos do mundo, grandes, povo,
Dos lábios removei a taça ingente,
Que em vossas festas gira; eis que rutila
O sangüíneo cometa em céus infindos!...
Pobres mortais, - sois vermes!
O Senhor o formou terrível, grande;
Como indócil corcel que morde o freio,
Retinha-o só a mão do Onipotente.
Ao fim lhe disse: - Vai, Senhor dos Mundos,
Senhor do espaço infindo.
E qual louco temido, ardendo em fúria,
Que ao vento solta a coma desgrenhada,
E vai, néscio de si, livre de ferros,
De encontro às duras rochas, - tal progride
O cometa incansável.
Se na marcha veloz encontra um mundo,
O mundo em mil pedaços se converte;
Mil centelhas de luz brilham no espaço
A esmo, como um tronco pelas vagas
Infrenes combatido.
Se junto doutro mundo acaso passa,
Consigo o arrasta e leva transformado;
A cauda portentosa o enlaça e prende,
E o astro vai com ele, como argueiro
Em turbilhão levado.
Como Leviatã perturba os mares,
Ele perturba o espaço; - como a lava,
Ele marcha incessante e sempre; - eterno,
Marcou-lhe largo giro a lei que o rege,
- Às vezes o infinito.
Ele carece então da eternidade!
E aos homens diz - e majestoso e grande
Que jamais o verão; e passa, e longe
Se entranha em céus sem fim, como se perde
Um barco no horizonte!
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oceanos de versos diversos
Machado de Assis (Almas Agradecidas) Capítulo IV
O novo emprego de Magalhães era muito melhor que o primeiro em categoria e lucro, de maneira que a demissão, longe de lhe ser um golpe funesto do destino, foi um lance de melhor fortuna.
Passou Magalhães a ter melhor casa e a alargar um pouco mais a bolsa, pois que a tinha agora mais farta que dantes; Oliveira observava esta mudança e regozijava-se com a ideia de que contribuíra para ela.
A vida de ambos continuaria por este teor, plácida e indiferente, se um acontecimento não a viesse perturbar de repente.
Um dia, achou Magalhães que Oliveira parecia preocupado. Perguntou-lhe francamente o que era.
— Que há de ser? disse Oliveira. Eu sou um miserável nessas coisas de amores; estou apaixonado.
— Queres que te diga uma coisa? — O quê? — Acho que fazes mal em diluir o teu coração com essas mulheres.
— Que mulheres? — Essas.
— Não me compreendes, Magalhães; a minha atual paixão é séria; amo uma menina honesta.
— Que mágoas então são essas? Casa com ela.
— Esse é o ponto. Creio que ela não me ama.
— Ah! Houve um silêncio.
— Mas não te resta esperança nenhuma? perguntou Magalhães.
— Não posso dizer isso; não penso que ela seja sempre esquiva ao meu sentimento; mas por ora nada há entre nós.
Magalhães entrou a rir.
— Pareces-me calouro, homem! disse ele. Quantos anos tem ela? — Dezessete.
— A idade da inocência; suspiras em silêncio e queres que ela te adivinhe. Nunca chegarás ao cabo. Tem-se comparado o amor à guerra. Assim é. No amor, querem-se atos de bravura como na guerra. Avança afoitamente e vencerás.
Oliveira ouvia estas palavras com a atenção de um homem sem iniciativa, a quem todo conselho serve. Confiava no juízo de Magalhães e o parecer dele era razoável.
— Parece-te então que eu devo expor-me? — Sem dúvida.
O advogado referiu depois todas as circunstâncias do seu encontro com a moça em questão. Pertencia a uma família com quem esteve em casa de terceiro; o pai era um excelente homem, que o convidou a frequentar a casa, e a mãe uma excelente senhora, que ratificou o convite do marido. Oliveira não tinha ido lá depois disso, porque, segundo imaginava, a moça não correspondia à sua afeição.
— És um tolo, disse Magalhães quando o amigo acabou a narração. Vês a rapariga num baile, ficas gostando dela, e só porque ela não te caiu logo nos braços, desistes de lhe frequentar a casa. Oliveira, tem juízo: vai à casa dela, e dir-me-ás daqui a pouco tempo se te não aproveita o conselho. Queres casar, não? — Oh! podias pôr em dúvida?...
— Não; é uma pergunta. Não é casamento romântico? — Que queres dizer com isso? — Ela é rica? Oliveira franziu a testa.
— Não te zangues, disse Magalhães. Eu não sou nenhum espírito rasteiro; também, conheço as delicadezas do coração. Nada vale mais que um amor verdadeiro e desinteressado. Não se me há de censurar, porém, que eu procure ver o lado prático das coisas; um coração de ouro vale muito; mas um coração de ouro com ouro vale mais.
— Cecília é rica.
— Pois tanto melhor! — Afianço-te, porém, que essa consideração...
— Não precisas afiançar nada; eu bem sei o que vales, disse Magalhães apertando as mãos de Oliveira. Anda, meu amigo, não te detenho; procura a tua felicidade.
Animado por estes conselhos, tratou Oliveira de sondar o terreno para declarar a sua paixão. Omiti de propósito a descrição de Cecília feita por Oliveira ao seu amigo Magalhães. Não desejava exagerar aos olhos dos leitores a beleza da moça, que a um namorado parece sempre maior do que realmente é. Mas Cecília era realmente formosa.
Era uma beleza, uma flor em toda a extensão da palavra. Todas as forças e fulgores da mocidade estavam nela, que apenas saía da adolescência e parecia anunciar longa e esplêndida juventude. Não era alta, mas também não era baixa. Era acima de meã. Era muito corada e viva; tinha uns olhos brilhantes e buliçosos, olhos de namorada ou namoradeira; era talvez um pouco afetada, mas deliciosa; tinha certas exclamações que lhe ficavam bem nos seus lábios finos e úmidos.
Oliveira não viu logo todas estas coisas na noite em que lhe falou; mas não tardou que ela se lhe revelasse assim, desde que começou a frequentar a casa dela.
Nisto, era Cecília ainda um pouco criança; não sabia dissimular, nem era difícil captar-lhe a confiança. Mas, através das aparências de frivolidade e volubilidade, descobria-lhe Oliveira sólidas qualidades de coração. O contacto redobrou o seu amor. No fim de um mês, Oliveira parecia perdido por ela.
Magalhães continuava a ser o conselheiro de Oliveira e o seu único confidente. Um dia, pediu-lhe o namorado que fosse com ele à casa de Cecília.
— Tenho medo, disse Magalhães.
— Por quê? — Sou capaz: de precipitar tudo, e isso não sei se será conveniente antes de conhecer bem o terreno. Em qualquer caso, não é mau que eu vá examinar por mim mesmo as coisas. Irei quando quiseres.
— Amanhã? — Seja amanhã.
No dia seguinte, Oliveira apresentou Magalhães em casa do comendador Vasconcelos.
— É o meu melhor amigo, disse Oliveira.
Na casa de Vasconcelos, já estimavam o advogado; esta apresentação bastava para recomendar Magalhães.
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Passou Magalhães a ter melhor casa e a alargar um pouco mais a bolsa, pois que a tinha agora mais farta que dantes; Oliveira observava esta mudança e regozijava-se com a ideia de que contribuíra para ela.
A vida de ambos continuaria por este teor, plácida e indiferente, se um acontecimento não a viesse perturbar de repente.
Um dia, achou Magalhães que Oliveira parecia preocupado. Perguntou-lhe francamente o que era.
— Que há de ser? disse Oliveira. Eu sou um miserável nessas coisas de amores; estou apaixonado.
— Queres que te diga uma coisa? — O quê? — Acho que fazes mal em diluir o teu coração com essas mulheres.
— Que mulheres? — Essas.
— Não me compreendes, Magalhães; a minha atual paixão é séria; amo uma menina honesta.
— Que mágoas então são essas? Casa com ela.
— Esse é o ponto. Creio que ela não me ama.
— Ah! Houve um silêncio.
— Mas não te resta esperança nenhuma? perguntou Magalhães.
— Não posso dizer isso; não penso que ela seja sempre esquiva ao meu sentimento; mas por ora nada há entre nós.
Magalhães entrou a rir.
— Pareces-me calouro, homem! disse ele. Quantos anos tem ela? — Dezessete.
— A idade da inocência; suspiras em silêncio e queres que ela te adivinhe. Nunca chegarás ao cabo. Tem-se comparado o amor à guerra. Assim é. No amor, querem-se atos de bravura como na guerra. Avança afoitamente e vencerás.
Oliveira ouvia estas palavras com a atenção de um homem sem iniciativa, a quem todo conselho serve. Confiava no juízo de Magalhães e o parecer dele era razoável.
— Parece-te então que eu devo expor-me? — Sem dúvida.
O advogado referiu depois todas as circunstâncias do seu encontro com a moça em questão. Pertencia a uma família com quem esteve em casa de terceiro; o pai era um excelente homem, que o convidou a frequentar a casa, e a mãe uma excelente senhora, que ratificou o convite do marido. Oliveira não tinha ido lá depois disso, porque, segundo imaginava, a moça não correspondia à sua afeição.
— És um tolo, disse Magalhães quando o amigo acabou a narração. Vês a rapariga num baile, ficas gostando dela, e só porque ela não te caiu logo nos braços, desistes de lhe frequentar a casa. Oliveira, tem juízo: vai à casa dela, e dir-me-ás daqui a pouco tempo se te não aproveita o conselho. Queres casar, não? — Oh! podias pôr em dúvida?...
— Não; é uma pergunta. Não é casamento romântico? — Que queres dizer com isso? — Ela é rica? Oliveira franziu a testa.
— Não te zangues, disse Magalhães. Eu não sou nenhum espírito rasteiro; também, conheço as delicadezas do coração. Nada vale mais que um amor verdadeiro e desinteressado. Não se me há de censurar, porém, que eu procure ver o lado prático das coisas; um coração de ouro vale muito; mas um coração de ouro com ouro vale mais.
— Cecília é rica.
— Pois tanto melhor! — Afianço-te, porém, que essa consideração...
— Não precisas afiançar nada; eu bem sei o que vales, disse Magalhães apertando as mãos de Oliveira. Anda, meu amigo, não te detenho; procura a tua felicidade.
Animado por estes conselhos, tratou Oliveira de sondar o terreno para declarar a sua paixão. Omiti de propósito a descrição de Cecília feita por Oliveira ao seu amigo Magalhães. Não desejava exagerar aos olhos dos leitores a beleza da moça, que a um namorado parece sempre maior do que realmente é. Mas Cecília era realmente formosa.
Era uma beleza, uma flor em toda a extensão da palavra. Todas as forças e fulgores da mocidade estavam nela, que apenas saía da adolescência e parecia anunciar longa e esplêndida juventude. Não era alta, mas também não era baixa. Era acima de meã. Era muito corada e viva; tinha uns olhos brilhantes e buliçosos, olhos de namorada ou namoradeira; era talvez um pouco afetada, mas deliciosa; tinha certas exclamações que lhe ficavam bem nos seus lábios finos e úmidos.
Oliveira não viu logo todas estas coisas na noite em que lhe falou; mas não tardou que ela se lhe revelasse assim, desde que começou a frequentar a casa dela.
Nisto, era Cecília ainda um pouco criança; não sabia dissimular, nem era difícil captar-lhe a confiança. Mas, através das aparências de frivolidade e volubilidade, descobria-lhe Oliveira sólidas qualidades de coração. O contacto redobrou o seu amor. No fim de um mês, Oliveira parecia perdido por ela.
Magalhães continuava a ser o conselheiro de Oliveira e o seu único confidente. Um dia, pediu-lhe o namorado que fosse com ele à casa de Cecília.
— Tenho medo, disse Magalhães.
— Por quê? — Sou capaz: de precipitar tudo, e isso não sei se será conveniente antes de conhecer bem o terreno. Em qualquer caso, não é mau que eu vá examinar por mim mesmo as coisas. Irei quando quiseres.
— Amanhã? — Seja amanhã.
No dia seguinte, Oliveira apresentou Magalhães em casa do comendador Vasconcelos.
— É o meu melhor amigo, disse Oliveira.
Na casa de Vasconcelos, já estimavam o advogado; esta apresentação bastava para recomendar Magalhães.
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continua...
segunda-feira, 2 de junho de 2014
Dorothy Jansson Moretti (Baú de Trovas) 14
Marcadores:
Florilégio de Trovas,
Sorocaba
A. A. de Assis (Revista Virtual de Trovas "Trovia" n. 174 - junho de 2014)
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Amei-te só de me olhares,
o coração adivinha:
Deus faz as almas aos pares,
fez a tua e fez a minha
Américo Durão
A velhice é idade linda,
e não me assusta jamais...
Só não gosto mais ainda
porque ela é curta demais!...
Dom Nivaldo Monte
O gênio nunca se exalta
se o vulgo lhe diz asneiras.
– As moscas não contaminam
o cimo das cordilheiras...
F. Luzia Netto
Desconfio que a saudade
não gosta de ti, meu bem.
Quando tu vens, ela vai...
quando tu vais, ela vem...
Luiz Otávio
Ah se eu pudesse saber
qual a mulher que ele quer!
Que não iria eu fazer
para ser essa mulher?
Magdalena Léa
Ah, saudade, esta verdade
jamais a gente abandona:
vai-se a dona da saudade,
fica a saudade da dona!
Maia D’Athayde – PE
O poeta, em sua lida,
ainda que o mundo o afronte,
tem sempre um sopro de vida
que o leva além do horizonte...
Milton Nunes Loureiro
Não tenho calma!... Não posso
esquecer tão de repente
o grande amor que foi nosso
e hoje em dia é meu somente...
Nydia Iaggi Martins
------------------------------------------
------------------------------------------
Bêbado morre afogado,
e o "colega" diz, formal:
– Ele num tava habituado,
bebeu água... se deu mal.
Dorothy Jansson Moretti
– Homem que é homem dá duro,
procure um trabalho, diacho!
– Procurar até procuro,
mas, graças a Deus... não acho!
Élbea Priscila – SP
Buraco de fechadura,
na minha infância inocente,
era a perfeita moldura
das belas primas da gente!
Héron Patrício – SP
Só três?! (o paizão lamenta),
vendo os bebês no bercinho.
Ah, se a rede não rebenta,
"nóis enchia” esse quartinho!
Jaime Pina da Silveira – SP
Depois de um beijo molhado,
sentiu algo diferente...
Perguntou ao namorado:
– Onde foi parar meu dente?
Mª Lúcia Godoy Pereira – MG
Foi à loucura a torcida
porque a mulher do goleiro,
em gandula convertida,
dava bola ao time inteiro...
Newton Vieira – MG
A trova nos apresenta
detalhes que nos comovem:
os menores de sessenta
são chamados de “ala jovem”...
Osvaldo Reis – PR
Da abelha o casal tem tudo:
primeiro o mel da paixão;
segunda fase – abelhudo;
terceira fase – ferrão!...
Roza de Oliveira – PR
------------------------------------------
Amei-te só de me olhares,
o coração adivinha:
Deus faz as almas aos pares,
fez a tua e fez a minha
Américo Durão
A velhice é idade linda,
e não me assusta jamais...
Só não gosto mais ainda
porque ela é curta demais!...
Dom Nivaldo Monte
O gênio nunca se exalta
se o vulgo lhe diz asneiras.
– As moscas não contaminam
o cimo das cordilheiras...
F. Luzia Netto
Desconfio que a saudade
não gosta de ti, meu bem.
Quando tu vens, ela vai...
quando tu vais, ela vem...
Luiz Otávio
Ah se eu pudesse saber
qual a mulher que ele quer!
Que não iria eu fazer
para ser essa mulher?
Magdalena Léa
Ah, saudade, esta verdade
jamais a gente abandona:
vai-se a dona da saudade,
fica a saudade da dona!
Maia D’Athayde – PE
O poeta, em sua lida,
ainda que o mundo o afronte,
tem sempre um sopro de vida
que o leva além do horizonte...
Milton Nunes Loureiro
Não tenho calma!... Não posso
esquecer tão de repente
o grande amor que foi nosso
e hoje em dia é meu somente...
Nydia Iaggi Martins
------------------------------------------
------------------------------------------
Bêbado morre afogado,
e o "colega" diz, formal:
– Ele num tava habituado,
bebeu água... se deu mal.
Dorothy Jansson Moretti
– Homem que é homem dá duro,
procure um trabalho, diacho!
– Procurar até procuro,
mas, graças a Deus... não acho!
Élbea Priscila – SP
Buraco de fechadura,
na minha infância inocente,
era a perfeita moldura
das belas primas da gente!
Héron Patrício – SP
Só três?! (o paizão lamenta),
vendo os bebês no bercinho.
Ah, se a rede não rebenta,
"nóis enchia” esse quartinho!
Jaime Pina da Silveira – SP
Depois de um beijo molhado,
sentiu algo diferente...
Perguntou ao namorado:
– Onde foi parar meu dente?
Mª Lúcia Godoy Pereira – MG
Foi à loucura a torcida
porque a mulher do goleiro,
em gandula convertida,
dava bola ao time inteiro...
Newton Vieira – MG
A trova nos apresenta
detalhes que nos comovem:
os menores de sessenta
são chamados de “ala jovem”...
Osvaldo Reis – PR
Da abelha o casal tem tudo:
primeiro o mel da paixão;
segunda fase – abelhudo;
terceira fase – ferrão!...
Roza de Oliveira – PR
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-------------------------------------------
A vida, além de um prazer,
é a chance que a gente tem
de, mais que apenas viver,
ser luz na vida de alguém.
A. A. de Assis – PR
Nas trilhas da minha vida
és um sol a chamejar
tal qual a luz refletida
por um farol sobre o mar.
Agostinho Rodrigues – RJ
Aos céus envio um recado,
Deus não vejo em meu apelo...
Porém se O tenho a meu lado,
para que preciso vê-Lo?
Almir Pinto de Azevedo – RJ
Se minha trova não for
para semear o bem,
não faço, nem por favor;
não fará falta a ninguém!
Amilton Monteiro – SP
Na distante mocidade,
só taperas construí...
Pela vida, na verdade,
eu passei, mas não vivi.
Angélica Villela Santos – SP
Não se faz mais amizade
como dantes se fazia...
Hoje até felicidade
anda assim: meio vazia.
Ari Santos de Campos – SC
Se alguém te humilha, perdoa,
e se alguém te fere, esquece.
Ódio guardado magoa,
só o amor envolve e aquece.
Arlene Lima – PR
Para ficar ao teu lado,
o que quiseres serei:
serei teu amo ou criado,
personal lover ou rei...
Bruno Pedina Torres – RJ
Cai a tarde... a alma descansa,
vendo o mar de calmas águas...
– Ah! se essa maré, tão mansa,
pudesse lavar-me as mágoas!!!
Carolina Ramos – SP
Eu trago no pensamento
tantas angústias e apelos,
e sinto inveja do vento
quando roça os teus cabelos.
Clenio Borges – RS
Fumo escuro, céu cinzento,
todo o ar contaminado...
e o ser humano - avarento -
mata e morre sufocado!
Colavite Filho – SP
Nosso anel só de ternura,
elo de eterno esplendor,
guarda em firmeza e espessura
toda a beleza do amor.
Conceição Abritta – MG
Traz-me a árvore lembrança
dos verdes anos, agora.
Como foi bom ser criança,
com meus sonhos desde a aurora.
Cônego Telles – PR
Ponha luz no seu caminho,
pinte a estrada de alegria,
deixe um rastro de carinho,
faça um mundo de poesia!
Dáguima Verônica – MG
Um fio de água barrenta,
à ponte, num balbucio:
- Velha ponte, vê se aguenta,
até que eu volte a ser rio!...
Darly O. Barros – SP
Uma “bomba de luares”
e uma “cuia de afeição”,
eis as formas singulares
de se tomar chimarrão!
Delcy Canalles – RS
Beijo nas faces, carícias
– como tantas, inocentes;
mas abraços são primícias
dos desejos mais ardentes!
Diamantino Ferreira – RJ
Da mãe tristonha no asilo
brota uma dor que esfacela:
cuidou de dez e um pupilo
e os onze não cuidam dela.
Dinair Leite – PR
Distante é grande a vontade,
saudade no peito bate...
Antes matar a saudade
que deixar que ela nos mate.
Djalma da Mota – RN
Das ofensas de um irmão
não guardes nenhum rancor,
que um minuto de perdão
vale uma vida de amor!
Domitilla Borges Beltrame – SP
De nossa firme aliança
depende a preservação
do mundo, que é nossa herança
à próxima geração.
Eliana Jimenez – SC
Vivo em constante conflito,
entre o delírio e a razão:
– meu sonho alcança o infinito...
meus pés... tropeçam no chão.
Elisabeth Souza Cruz – RJ
Neste instante derradeiro,
em que nada mais restou,
sou errante marinheiro
que na saudade afundou...
Ester Figueiredo – RJ
Minha alma tão pequena
perto de um mar tão profundo
torna-se grande e serena
para as ressacas do mundo.
Fátima Panisset – RJ
Brinquedos bons eu não tinha,
mas sabia achar maneira,
e com latas de sardinha
eu tinha uma frota inteira.
Flávio Stefani – RS
Revendo entulhos e tacos,
na tapera dos meus sonhos,
chorei por ver tantos cacos
dos meus dias mais risonhos!
Francisco Garcia – RN
Com a visão embaciada
e o caminhar pouco ereto,
vejo o esplendor da alvorada
pelos olhos do meu neto.
Francisco Pessoa – CE
Nos olhos o mesmo brilho
e este orgulho que nos trai,
quando no peito de um filho
bate um coração de pai!
Gabriel Bicalho – MG
Mesmo que a tantos iluda
com diversas abordagens,
história de amor não muda,
mudam só os personagens.
Gilvan Carneiro da Silva – RJ
Meu verso é meu companheiro
no cenário da ilusão
e o universo, imenso, inteiro,
se torna pequeno então!
Gislaine Canales – SC
Sem destino, caladinho,
travesso no que produz,
vaga-lume é garotinho
pichando a noite de luz.
Humberto Del Maestro – ES
Seu beijo me dá prazer,
me faz perder o juízo...
Eu nem preciso morrer
para entrar no paraíso!
Istela Marina – PR
Não haverá sociedade
que possa ser construída
sem a fé na humanidade
e o respeito pela vida!
J.B. Xavier – SP
Tal judeus em sua viagem
fugindo da escravidão,
seja esta vida passagem
pra nossa libertação!
Jeanette De Cnop – PR
Mantenha a cabeça erguida,
sorria, volte a cantar...
Sem ânimo para a vida,
você não sai do lugar!
Jorge Fregadolli – PR
Doce flor que desabrocha
perfumando seu cantinho,
envolvendo toda rocha
com doçura e com carinho.
José Feldman – PR
A inspiração não me veio
trazer um verso feliz,
mas em teus olhos eu leio
a trova que não te fiz.
José Lucas de Barros – RN
“Mãe-Natureza”! – Eis o nome
de quem, em nome do amor,
gera o fruto e estanca a fome
do seu próprio predador!...
José Ouverney – SP
Chego a perder a esperança,
vendo ao relento, a dormir,
uma sofrida criança
sem lar, sem paz, sem porvir!
José Valdez – SP
Não vacile ante um impasse,
ninguém sem um só viveu;
tão lindo o dia renasce
da noite, que nem morreu.
Laérson Quaresma – SP
A esperança da vitória
impulsiona o caminhar,
e um dia se chega à glória,
mas não sem antes lutar!
Lucília Decarli – PR
Paz, amor, felicidade!
Palavras tão usuais,
que seriam, na verdade,
mais bonitas, se reais.
Luiz Antonio Cardoso – SP
Sempre foste minha amada
e, no doce cativeiro,
sem algema e sem mais nada,
tu me prendes por inteiro.
Luiz Carlos Abritta – MG
Se caem do céu as águas,
com tanta beleza e encanto,
por que desencanto e mágoas
há nas águas do meu pranto?
Mª Conceição Fagundes – PR
A vida é tênue fumaça,
é uma linha de retrós...
Dizem que é o tempo que passa,
mas quem passa somos nós!
Ma. Thereza Cavalheiro – SP
Sou como as uvas pisadas
pra fazer vinho e licor,
que mesmo sendo esmagadas
dão de presente o sabor.
Manoel Cavalcante – RN
Saibam todos que o trabalho
ao homem bom enobrece;
mas quem não pega no malho,
seu espírito empobrece!
Maurício Friedrich – PR
Os teus olhos patrocinam
pensamentos variados:
todos aqueles que animam
os sonhos dos namorados.
Nilton Manoel – SP
Não há fronteira na vida
que separe um grande amor,
quando a ponte foi erguida
pelas mãos do Criador.
Olga Agulhon – PR
Ante tanta aberração
num mundo fora dos trilhos
pergunto ao meu coração:
– O que eu ensino aos meus filhos?
Olympio Coutinho – MG
Trovador que espalha o sonho
que lhe mora n’alma inquieta
revela ao mundo tristonho
a bênção que é ser um poeta!
Renato Alves – RJ
Dos instantes devotados
a cada luta vencida,
todos estão retratados
no painel da minha vida.
Roberto Acruche – RJ
Ante as agruras da vida,
não se entregue facilmente:
Após a névoa temida,
o "sol" brilha novamente.
Ruth Farah – RJ
No embalo da serenata,
quisera ser como a lua
vestindo com tons de prata
os homens tristes da rua!
Selma Spinelli – SP
Minha esperança, em essência,
bem mais que estreitar os laços,
é fazer da tua ausência
uma presença... em meus braços.
Sérgio Ferreira da Silva – SP
Deixei-te... Agora eu lamento
a decisão da partida,
pois vi que o arrependimento
põe gosto de sal na vida!
Thereza Costa Val – MG
Ao raiar de um novo dia,
quantas razões de viver!
A esperança se irradia
nas brumas do amanhecer!
Wagner Lopes – MG
No grande palco da vida,
temos de ser bons atores,
pois a dureza da lida
não favorece amadores.
Wanda Mourthé – MG
Finge o sol, quando declina,
que se cansou do fulgor,
dando à estrela pequenina
seu momento de esplendor.
Wandira F. Queiroz – PR
Nosso amor, nossos carinhos,
vão conosco na viagem,
pondo flores nos caminhos
e embelezando a paisagem!
Yedda Patrício – SP
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A vida, além de um prazer,
é a chance que a gente tem
de, mais que apenas viver,
ser luz na vida de alguém.
A. A. de Assis – PR
Nas trilhas da minha vida
és um sol a chamejar
tal qual a luz refletida
por um farol sobre o mar.
Agostinho Rodrigues – RJ
Aos céus envio um recado,
Deus não vejo em meu apelo...
Porém se O tenho a meu lado,
para que preciso vê-Lo?
Almir Pinto de Azevedo – RJ
Se minha trova não for
para semear o bem,
não faço, nem por favor;
não fará falta a ninguém!
Amilton Monteiro – SP
Na distante mocidade,
só taperas construí...
Pela vida, na verdade,
eu passei, mas não vivi.
Angélica Villela Santos – SP
Não se faz mais amizade
como dantes se fazia...
Hoje até felicidade
anda assim: meio vazia.
Ari Santos de Campos – SC
Se alguém te humilha, perdoa,
e se alguém te fere, esquece.
Ódio guardado magoa,
só o amor envolve e aquece.
Arlene Lima – PR
Para ficar ao teu lado,
o que quiseres serei:
serei teu amo ou criado,
personal lover ou rei...
Bruno Pedina Torres – RJ
Cai a tarde... a alma descansa,
vendo o mar de calmas águas...
– Ah! se essa maré, tão mansa,
pudesse lavar-me as mágoas!!!
Carolina Ramos – SP
Eu trago no pensamento
tantas angústias e apelos,
e sinto inveja do vento
quando roça os teus cabelos.
Clenio Borges – RS
Fumo escuro, céu cinzento,
todo o ar contaminado...
e o ser humano - avarento -
mata e morre sufocado!
Colavite Filho – SP
Nosso anel só de ternura,
elo de eterno esplendor,
guarda em firmeza e espessura
toda a beleza do amor.
Conceição Abritta – MG
Traz-me a árvore lembrança
dos verdes anos, agora.
Como foi bom ser criança,
com meus sonhos desde a aurora.
Cônego Telles – PR
Ponha luz no seu caminho,
pinte a estrada de alegria,
deixe um rastro de carinho,
faça um mundo de poesia!
Dáguima Verônica – MG
Um fio de água barrenta,
à ponte, num balbucio:
- Velha ponte, vê se aguenta,
até que eu volte a ser rio!...
Darly O. Barros – SP
Uma “bomba de luares”
e uma “cuia de afeição”,
eis as formas singulares
de se tomar chimarrão!
Delcy Canalles – RS
Beijo nas faces, carícias
– como tantas, inocentes;
mas abraços são primícias
dos desejos mais ardentes!
Diamantino Ferreira – RJ
Da mãe tristonha no asilo
brota uma dor que esfacela:
cuidou de dez e um pupilo
e os onze não cuidam dela.
Dinair Leite – PR
Distante é grande a vontade,
saudade no peito bate...
Antes matar a saudade
que deixar que ela nos mate.
Djalma da Mota – RN
Das ofensas de um irmão
não guardes nenhum rancor,
que um minuto de perdão
vale uma vida de amor!
Domitilla Borges Beltrame – SP
De nossa firme aliança
depende a preservação
do mundo, que é nossa herança
à próxima geração.
Eliana Jimenez – SC
Vivo em constante conflito,
entre o delírio e a razão:
– meu sonho alcança o infinito...
meus pés... tropeçam no chão.
Elisabeth Souza Cruz – RJ
Neste instante derradeiro,
em que nada mais restou,
sou errante marinheiro
que na saudade afundou...
Ester Figueiredo – RJ
Minha alma tão pequena
perto de um mar tão profundo
torna-se grande e serena
para as ressacas do mundo.
Fátima Panisset – RJ
Brinquedos bons eu não tinha,
mas sabia achar maneira,
e com latas de sardinha
eu tinha uma frota inteira.
Flávio Stefani – RS
Revendo entulhos e tacos,
na tapera dos meus sonhos,
chorei por ver tantos cacos
dos meus dias mais risonhos!
Francisco Garcia – RN
Com a visão embaciada
e o caminhar pouco ereto,
vejo o esplendor da alvorada
pelos olhos do meu neto.
Francisco Pessoa – CE
Nos olhos o mesmo brilho
e este orgulho que nos trai,
quando no peito de um filho
bate um coração de pai!
Gabriel Bicalho – MG
Mesmo que a tantos iluda
com diversas abordagens,
história de amor não muda,
mudam só os personagens.
Gilvan Carneiro da Silva – RJ
Meu verso é meu companheiro
no cenário da ilusão
e o universo, imenso, inteiro,
se torna pequeno então!
Gislaine Canales – SC
Sem destino, caladinho,
travesso no que produz,
vaga-lume é garotinho
pichando a noite de luz.
Humberto Del Maestro – ES
Seu beijo me dá prazer,
me faz perder o juízo...
Eu nem preciso morrer
para entrar no paraíso!
Istela Marina – PR
Não haverá sociedade
que possa ser construída
sem a fé na humanidade
e o respeito pela vida!
J.B. Xavier – SP
Tal judeus em sua viagem
fugindo da escravidão,
seja esta vida passagem
pra nossa libertação!
Jeanette De Cnop – PR
Mantenha a cabeça erguida,
sorria, volte a cantar...
Sem ânimo para a vida,
você não sai do lugar!
Jorge Fregadolli – PR
Doce flor que desabrocha
perfumando seu cantinho,
envolvendo toda rocha
com doçura e com carinho.
José Feldman – PR
A inspiração não me veio
trazer um verso feliz,
mas em teus olhos eu leio
a trova que não te fiz.
José Lucas de Barros – RN
“Mãe-Natureza”! – Eis o nome
de quem, em nome do amor,
gera o fruto e estanca a fome
do seu próprio predador!...
José Ouverney – SP
Chego a perder a esperança,
vendo ao relento, a dormir,
uma sofrida criança
sem lar, sem paz, sem porvir!
José Valdez – SP
Não vacile ante um impasse,
ninguém sem um só viveu;
tão lindo o dia renasce
da noite, que nem morreu.
Laérson Quaresma – SP
A esperança da vitória
impulsiona o caminhar,
e um dia se chega à glória,
mas não sem antes lutar!
Lucília Decarli – PR
Paz, amor, felicidade!
Palavras tão usuais,
que seriam, na verdade,
mais bonitas, se reais.
Luiz Antonio Cardoso – SP
Sempre foste minha amada
e, no doce cativeiro,
sem algema e sem mais nada,
tu me prendes por inteiro.
Luiz Carlos Abritta – MG
Se caem do céu as águas,
com tanta beleza e encanto,
por que desencanto e mágoas
há nas águas do meu pranto?
Mª Conceição Fagundes – PR
A vida é tênue fumaça,
é uma linha de retrós...
Dizem que é o tempo que passa,
mas quem passa somos nós!
Ma. Thereza Cavalheiro – SP
Sou como as uvas pisadas
pra fazer vinho e licor,
que mesmo sendo esmagadas
dão de presente o sabor.
Manoel Cavalcante – RN
Saibam todos que o trabalho
ao homem bom enobrece;
mas quem não pega no malho,
seu espírito empobrece!
Maurício Friedrich – PR
Os teus olhos patrocinam
pensamentos variados:
todos aqueles que animam
os sonhos dos namorados.
Nilton Manoel – SP
Não há fronteira na vida
que separe um grande amor,
quando a ponte foi erguida
pelas mãos do Criador.
Olga Agulhon – PR
Ante tanta aberração
num mundo fora dos trilhos
pergunto ao meu coração:
– O que eu ensino aos meus filhos?
Olympio Coutinho – MG
Trovador que espalha o sonho
que lhe mora n’alma inquieta
revela ao mundo tristonho
a bênção que é ser um poeta!
Renato Alves – RJ
Dos instantes devotados
a cada luta vencida,
todos estão retratados
no painel da minha vida.
Roberto Acruche – RJ
Ante as agruras da vida,
não se entregue facilmente:
Após a névoa temida,
o "sol" brilha novamente.
Ruth Farah – RJ
No embalo da serenata,
quisera ser como a lua
vestindo com tons de prata
os homens tristes da rua!
Selma Spinelli – SP
Minha esperança, em essência,
bem mais que estreitar os laços,
é fazer da tua ausência
uma presença... em meus braços.
Sérgio Ferreira da Silva – SP
Deixei-te... Agora eu lamento
a decisão da partida,
pois vi que o arrependimento
põe gosto de sal na vida!
Thereza Costa Val – MG
Ao raiar de um novo dia,
quantas razões de viver!
A esperança se irradia
nas brumas do amanhecer!
Wagner Lopes – MG
No grande palco da vida,
temos de ser bons atores,
pois a dureza da lida
não favorece amadores.
Wanda Mourthé – MG
Finge o sol, quando declina,
que se cansou do fulgor,
dando à estrela pequenina
seu momento de esplendor.
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Nosso amor, nossos carinhos,
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Folclore Brasileiro (Mitos Indígenas) Sinaá - inundação e fim do mundo
Sinaá, o mais poderoso pajé da tribo Juruna, era filho de mãe índia e pai onça. Do felino herdara o poder de enxergar também pelas costas, o que lhe permitia observar tudo o que se passava ao seu redor.
Caminhava com sua gente por toda a região, ensinando a seus companheiros serem bons e bravos. Seu povo alimentava-se de farinha de mandioca, raspa de madeira, jabutis e sucuris, cobras imensas que habitam na água.
Certa vez, uma enorme sucuri foi capturada e queimada por haver devorado diversos índios. Inesperadamente brotaram de suas cinzas diversas espécies de vegetais, como a mandioca, o milho, o cará, a abóbora, a pimenta, e algumas plantas frutíferas, até então desconhecidas para aquela tribo.
Foi um pássaro surgido do céu que os ensinou a utilizar e preparar tais alimentos e também fazê-los multiplicar-se. A partir daquele dia, fartas roças se formaram.
Para garantir o sustento de seu povo, Sinaá, face às fortes chuvas e à ameaça de grande inundação, construiu uma imensa canoa, onde plantou mudas de cada espécie. Em poucos dias o rio transbordou e a enchente cobriu toda a região, mas o grande pajé livrou seu povo da fome.
Já mais velho, Sinaá casou-se com uma aranha, que lhe teceu novas vestes para melhor abrigá-lo. Chegando a atingir idade bastante avançada, já ostentava longas barbas brancas. Seus poderes, porém, permitiam-lhe remoçar a cada banho de cachoeira, para que pudesse viver até o fim de seu povo, como tanto queria.
Quando isto ocorresse, Sinaá derrubaria a forquilha de uma enorme árvore que apontava para o céu, sustentando-o. O céu desabaria sobre todos os povos e o mundo teria o seu fim.
Fonte:
Jayhr Gael (Mitos indígenas). www.caminhodewicca.com.br
Caminhava com sua gente por toda a região, ensinando a seus companheiros serem bons e bravos. Seu povo alimentava-se de farinha de mandioca, raspa de madeira, jabutis e sucuris, cobras imensas que habitam na água.
Certa vez, uma enorme sucuri foi capturada e queimada por haver devorado diversos índios. Inesperadamente brotaram de suas cinzas diversas espécies de vegetais, como a mandioca, o milho, o cará, a abóbora, a pimenta, e algumas plantas frutíferas, até então desconhecidas para aquela tribo.
Foi um pássaro surgido do céu que os ensinou a utilizar e preparar tais alimentos e também fazê-los multiplicar-se. A partir daquele dia, fartas roças se formaram.
Para garantir o sustento de seu povo, Sinaá, face às fortes chuvas e à ameaça de grande inundação, construiu uma imensa canoa, onde plantou mudas de cada espécie. Em poucos dias o rio transbordou e a enchente cobriu toda a região, mas o grande pajé livrou seu povo da fome.
Já mais velho, Sinaá casou-se com uma aranha, que lhe teceu novas vestes para melhor abrigá-lo. Chegando a atingir idade bastante avançada, já ostentava longas barbas brancas. Seus poderes, porém, permitiam-lhe remoçar a cada banho de cachoeira, para que pudesse viver até o fim de seu povo, como tanto queria.
Quando isto ocorresse, Sinaá derrubaria a forquilha de uma enorme árvore que apontava para o céu, sustentando-o. O céu desabaria sobre todos os povos e o mundo teria o seu fim.
Fonte:
Jayhr Gael (Mitos indígenas). www.caminhodewicca.com.br
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Cultura Indigena
Alex Nascimento (Rio Grande do Norte Poético)
Castelo de Engady - Caicó/RN |
ETERNAMENTE INVERNO
E mais fácil esconder um crime
Do que uma paixão.
Quando você disse que
Não me queria mais,
Senti um frio amargo
Como no dia em que sentei
No batente da calçada
Depois de olhar meu pai morto,
Mas você estava vivo:
A quem enterrar?
Seus olhos molharam
Algumas vezes enquanto falava,
Chorando por mim — senti —,
E eu imóvel, pálida, silente,
Sofrendo por você sofrer,
Encurralada por dentro, pensando
Em que número infinito pararia
A dor de um
Por outro que doía.
Contida parti,
Estranha me encerrei
No quarto,
E tudo ali,
De livros a óperas
A pinturas a roupas
A tudo ali,
Me era tão alheio e inexistente
Quanto a Via Láctea
Antes de você.
Mas era o meu mundo
E sempre havia sido,
E esse sobretipo de mundo
Não se acaba
Pelos antes ou pelos depois
Que a gente cria em sete dias
E então descansa.
Continuei-me quieta e triste.
Tive reflexões de mais cores
Do que pode um prisma suportar.
Pensei sobre minha repulsão
A discutir sobre sentimentos,
Este torneio cansativo de pecados,
Espantosa gargalhada em funeral.
Pensei em Ronald Golias professando:
A águia subiu, subiu, subiu,
Depois desceu, desceu, desceu;
Ó águia, se ias descer,
Pra que subiste tanto?
E pensei que Golias me faz feliz
Até quando sei que não sou.
Pensei que você é
O melhor homem do mundo, e
Pensei coisas belas, medianas e
Vergonhosas.
Pensei que o tempo e eu
Havíamos parado de agonia,
Mas não,
Amanhã faz um século e um minuto
Que senti aquele frio,
Mas só amanhã.
O tempo não foi
Nem santo nem remédio,
Também não é doença
Esta saudade. Quem sabe,
A morte, enganando longamente
O dia seguinte.
Mas isso só amanhã.
SONETO 81
Aqui, das grades deste sanatório,
São vistas criaturas tão normais,
Os eruditos, os intelectuais,
A padronização do envoltório.
Espécie de santinhos de oratório,
Na mão de cada um, um edelvais,
A sisudez como credenciais,
Não faltam bichos ao laboratório.
É cada um de si o próprio herói;
Por tolos tão amorfos, invejados;
De mestres são chamados, como sói,
Pela meiguice ingênua dos tarados,
Que nem mesmo imaginam como dói
Suportar o relincho dos letrados.
SONETO 17
Se é a morte o começo de uma vida
já que a vida é o princípio de uma morte
é o azar o prenúncio de uma sorte
é a chegada o início da partida
Expulsão é intróito de acolhida
cicatriz é prefácio a novo corte
medo fraco é prelúdio a grito forte
limiar é a entrada da saída
Não sei se é amor o que ela sente
não sinto mais amar sem ela perto
não sei se é verdade o que ela mente
Não minto o que seria descoberto
não sei se não saber me faz um crente
não creio que sabendo esteja certo
MULHER
Mulher Obstinada a lutar,
Mulher obstinada a ter,
a querer, ser...
Mulher lutadora da vida.
Mulher que escreve as
Linhas do tempo nas palmas
das mãos.
Ser mulher não é ser frágil
é ser única... Ser sempre
capaz de ver, ouvir, sentir,
buscar, crer, procurar, e
aceitar.
AMAR VOCÊ
Disse ao belo Verso.
Cantai a ele uma canção.
Aos sentimentos escondidos
Que me tocam o coração.
Seja assim e por inteiro
Para sempre uma emoção.
Eterna como o vento,
Latente inspiração.
Um sonho bem vivido.
Meu amor sua canção.
Feito de palavra.
Escritos com paixão.
Pois, agora belo amado.
Um beijo lhe darei.
Desafiando o meu tempo,
Serei seu de mais ninguém.
E mais fácil esconder um crime
Do que uma paixão.
Quando você disse que
Não me queria mais,
Senti um frio amargo
Como no dia em que sentei
No batente da calçada
Depois de olhar meu pai morto,
Mas você estava vivo:
A quem enterrar?
Seus olhos molharam
Algumas vezes enquanto falava,
Chorando por mim — senti —,
E eu imóvel, pálida, silente,
Sofrendo por você sofrer,
Encurralada por dentro, pensando
Em que número infinito pararia
A dor de um
Por outro que doía.
Contida parti,
Estranha me encerrei
No quarto,
E tudo ali,
De livros a óperas
A pinturas a roupas
A tudo ali,
Me era tão alheio e inexistente
Quanto a Via Láctea
Antes de você.
Mas era o meu mundo
E sempre havia sido,
E esse sobretipo de mundo
Não se acaba
Pelos antes ou pelos depois
Que a gente cria em sete dias
E então descansa.
Continuei-me quieta e triste.
Tive reflexões de mais cores
Do que pode um prisma suportar.
Pensei sobre minha repulsão
A discutir sobre sentimentos,
Este torneio cansativo de pecados,
Espantosa gargalhada em funeral.
Pensei em Ronald Golias professando:
A águia subiu, subiu, subiu,
Depois desceu, desceu, desceu;
Ó águia, se ias descer,
Pra que subiste tanto?
E pensei que Golias me faz feliz
Até quando sei que não sou.
Pensei que você é
O melhor homem do mundo, e
Pensei coisas belas, medianas e
Vergonhosas.
Pensei que o tempo e eu
Havíamos parado de agonia,
Mas não,
Amanhã faz um século e um minuto
Que senti aquele frio,
Mas só amanhã.
O tempo não foi
Nem santo nem remédio,
Também não é doença
Esta saudade. Quem sabe,
A morte, enganando longamente
O dia seguinte.
Mas isso só amanhã.
SONETO 81
Aqui, das grades deste sanatório,
São vistas criaturas tão normais,
Os eruditos, os intelectuais,
A padronização do envoltório.
Espécie de santinhos de oratório,
Na mão de cada um, um edelvais,
A sisudez como credenciais,
Não faltam bichos ao laboratório.
É cada um de si o próprio herói;
Por tolos tão amorfos, invejados;
De mestres são chamados, como sói,
Pela meiguice ingênua dos tarados,
Que nem mesmo imaginam como dói
Suportar o relincho dos letrados.
SONETO 17
Se é a morte o começo de uma vida
já que a vida é o princípio de uma morte
é o azar o prenúncio de uma sorte
é a chegada o início da partida
Expulsão é intróito de acolhida
cicatriz é prefácio a novo corte
medo fraco é prelúdio a grito forte
limiar é a entrada da saída
Não sei se é amor o que ela sente
não sinto mais amar sem ela perto
não sei se é verdade o que ela mente
Não minto o que seria descoberto
não sei se não saber me faz um crente
não creio que sabendo esteja certo
MULHER
Mulher Obstinada a lutar,
Mulher obstinada a ter,
a querer, ser...
Mulher lutadora da vida.
Mulher que escreve as
Linhas do tempo nas palmas
das mãos.
Ser mulher não é ser frágil
é ser única... Ser sempre
capaz de ver, ouvir, sentir,
buscar, crer, procurar, e
aceitar.
AMAR VOCÊ
Disse ao belo Verso.
Cantai a ele uma canção.
Aos sentimentos escondidos
Que me tocam o coração.
Seja assim e por inteiro
Para sempre uma emoção.
Eterna como o vento,
Latente inspiração.
Um sonho bem vivido.
Meu amor sua canção.
Feito de palavra.
Escritos com paixão.
Pois, agora belo amado.
Um beijo lhe darei.
Desafiando o meu tempo,
Serei seu de mais ninguém.
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oceanos de versos diversos,
Universos Di Versos
Gonçalves Dias (Primeiros Cantos) 6
Foi mantida a grafia original.
--------------------------
O Vate
No Álbum de um Poeta
No Álbum de um Poeta
Moi. . . j’aimerai la victoire;
Pour mon coer, ami de toute gloire,
Les triomphes d’autrui ne sont pas un affront.
Poète, j’eus toujours un chanl pour les poétes,
Et jamais le laurier qui pare d’autre têtes
Ne jeta d’ombre sur mon front.
- V. Hugo
Vate! Vate! que és tu? - Nos seus extremos
Fadou-te Deus um coração de amores,
Fadou-te uma alma acesa borbulhando
Ardidos pensamentos, como a lava
Que o gigante Vesúvio arroja às nuvens.
Vote! vote! que és tu? - Foste ao princípio
Sacerdote e profeta;
Eram nos céus teus cantos uma prece,
Na terra um vaticínio.
E ele cantava então: - Jeová me disse,
Majestoso e terrível.
“Vês tu Jerusalém como orgulhosa
“Campeã entre as nações, como no Líbano
“Um cedro a cuja sombra a hissope cresce?
“Breve a minha ira transformada em raios
“Sobre ela cairá;
“Um fero vencedor dentro em seus muros
“Tributária a fará;
“E quando escravos seus filhos, sobre pedra
“Pedra não ficará.”
E os réprobos de saco se vestiam,
Em pó, em cinza envoltos;
E colando co’a terra os torpes lábios,
E açoitando cu’as mãos o peito imbele,
Senhor! Senhor! - clamavam.
E o vate entanto o pálido semblante
Meditabundo sobre as mãos firmara,
Suplicando ao Senhor do interno d’alma.
Foram santos então. - Homero o mundo
Criou segunda vez, - o inferno o Dante, -
Milton o paraíso, - foram grandes!
E hoje!... em nosso exílio erramos tristes,
Mimosa esp’rança ao infeliz legando.
Maldizendo a soberba, o crime, os vicio;:
E o infeliz se consola, e o grande treme.
Damos ao infante aqui do pão que temos,
E o manto além ao mísero raquítico:
Somos hoje Cristãos.
À Morte Prematura
Da Il.ma Sra. D.
(no Álbum de seu Irmão Da. J. D. Lisboa Serra)
On dirait que le ciel aux coeurs plus magnanimes
Measure plus de maux.
- Lamartine
Perfeita formosura em tenra idade
Qual flor, que antecipada foi colhida,
Murchada está da mão da sorte dura.
- Camões (soneto)
Lá, bem longe daqui, em tarde amena,
Gozando a viração das frescas auras,
Que do Brasil os bosques brandamente
Faziam balançar, - e que espalhavam
No éter encantado odor, pureza -
Do que a rosa mais bela, - meiga e casta,
Como as virgens do sol,
Que de vezes não foi ela pendente
Dos braços fraternais em meigo abraço;
Como mimosa flor presa, enlaçada
A tenro arbusto que a vergôntea débil
Lhe ampara docemente. . .
E o Irmão que só nela se revia,
O Irmão que a adorava, qual se adora
Um mimo do Senhor;
Que a tinha por farol, conforto e guia,
Os seus dias contava por encantos;
E as virtudes co’os dias pleiteavam.
E ela morreu no viço de seus anos!...
E a laje fria e muda dos sepulcros
Se fechou sobre o ente esmorecido
Ao despontar de vida
Tão rica de esperanças e tão cheia
De formosura e graças!... _
Campal campa! que de terror incutes!
Quanto esse teu silêncio me horroriza!
E quanto se assemelha a tua calma
À do cruel malvado que impassível
Contempla a sua vítima torcer-se
Em convulsões horríveis, desesp’radas;
Cruas vascas da morte!...
Quem tão má fé te criou?
Tu que tragas o ente que esmorece
Ao despontar de vida
Tão rica de esperanças e tão cheia
De formosura e graças?!
O farol se apagou? a luz sumiu-se!
Como o fugaz clarão do meteoro,
Extinguiu-se a esperança; e o malfadado
Sobre a terra deserta em vão procura
Traços dessa que amou, que tanto o amara,
Da jovem companheira de seus brincos,
Pesares e alegrias.
Ele a procurai... o viajor pasmado
Nos campos de Pompéia, alonga a vista
Pela amplidão do plano,
Destroços e ruínas encontrando,
Onde esperava movimento e vida.
Não poder eu a troco de meu sangue
Poupar-te dessas lágrimas metade!
Oh! poder que eu pudesse! - e almo sorriso.
Que tanto me compraz ver-te nos lábios,
Inda uma vez brilhasse!
E essa existência,
Que tão cara me é, ta visse eu leda,
E feliz como a vida dos Arcanjos!
Infeliz é quem chora: ela finou-se,
Porque os anjos à terra não pertencem:
Mas lá dos imortais sobre os teus dias
A suspirada irmã vela incessante.
Vinde, cândidas rosas, açucenas,
Vinde, roxas saudades;
Orvalhai, tristes lágrimas, as c’roas,
Que hão de a campa adornar por mim depostas
Em holocausto à vítima da morte.
Inocência, pudor, beleza e graça
Com ela nessa campa adormeceram.
Anjo no coração, anjo no rosto,
Devera o amor chorar sobre o teu seio,
Que não grinaldas fúnebres tecer-te;
Devera voz d’esposo acalentar-te
O sono da inocência, - não grosseira
Canção de trovador não conhecido.
Coimbra, junho de 1841.
A Mendiga
Donnez: -
Et quand vous paraîtrez devant juge austère
Vous direz: J’ai connu la pitié sur la terre,
Je puis la demander aux cieux!
- Turquety
I
Eu sonhei durante a noite...
Que triste foi meu sonhar!
Era uma noite medonha,
Sem estrelas, sem luar.
E ao través do manto escuro
Das trevas, meus olhos viam
Triste mendiga formosa,
Qu’infortúnios consumiam.
Era uma pobre mendiga,
Porém, cândida donzela;
Pudibunda, afável, doce,
Amorosa, e casta, e bela.
Vestia rotos andrajos,
Que o seu corpo mal cobriam;
Por vergonha os olhos dela
Sobre ela se não volviam.
Pelas costas descobertas
Cortador o frio entrava;
Tinha fome e sede, - e o pranto
Nos seus olhos borbulhava.
E qual vemos dos céus descendo rápido
Um fugaz meteoro, vi descendo
Um anjo do Senhor; - Parou sobre ela,
E mudo a contemplava. - Uma tristeza
Simpática, indizível pouco e pouco
Do anjo nas feições se foi pintando:
Qual tristeza de irmão que a irmã mais nova
Conhece enferrna e chora. - Ela no peito
Menor sentiu a dor, e humilde orava.
II
De um vasto edifício nas frias escadas
Eu vi-a sentada; - era um templo, diziam,
Secreto concílio de sócios piedosos,
Que o bem tinha juntos, que bem só faziam.
Defronte um palácio soberbo se erguia,
E dele partia confuso rumor:
- A dança girava, e a orquestra sonora
Cantava alegria, prazeres e amor.
E quando ao palácio um conviva chegava,
Rugindo se abria o ruidoso portão;
Eflúvios de incenso nos ares corriam
Da rua esteirada com vivo clarão.
E a triste mendiga ali ‘stava ao relento,
Com fome, com frio, com sede e com dor;
E eu vi o seu anjo, mais triste no aspecto,
Mais baço, mais turvo da glória o fulgor.
E à porta do vasto sombrio edifício
Um vulto chegou.
- Senhor, uma esmola! bradou-lhe a mendiga
E o vulto parou.
E rude no acento, no aspecto severo,
Lhe disse: - O teu nome?
Tornou-lhe a mendiga: - Senhor, uma esmola,
Que eu morro de fome.
- Não, dizes teu nome? lhe torna o soberbo
- Sou órfã, sozinha;
Meu nome qu’importa, se eu sofro, se eu gemo,
Se eu choro mesquinha!”
- Em vis meretrizes não cabe esse orgulho,
Tornou-lhe o Senhor,
Que à noite, nas trevas, contratam no crime,
Vendendo o pudor.
E a porta do templo - erguido à piedade
Com força batia;
Co’o peso do insulto acrescido à crueza,
A triste gemia.
III
Ouvi depois um rodar que a todo o instante
Mais distinto se ouvia; e logo um forte,
Fascinador clarão por toda a rua
Se derramou soberbo. - Infindos pajens
Ricas librés trajando, mil archotes
Nos ares revolviam; - fortes, rápidos,
Fumegantes corcéis, sorvendo a terra,
Tiravam rica sege melindrosa.
Sobre a terra saltou airosa e bela
A dona, em frente do festivo paço;
E a mendiga bradou: - Senhora minha,
Dai uma esmola, dai! - À voz dorida
Volveu-se o rosto d’anjo, porém d’anjo
Não era o coração; - foi-lhe importuno,
Mais que importuno... da mesquinha o grito!
E da mendiga o protetor celeste
Parecia falar em favor dela;
E a rica dona o escutava, como
Se ouvisse a interna voz que dentro mora.
E eu dizia também - Ó bela Dona,
Dai-lhe uma esmola, daí; - de que vos serve
Um óbolo mesquinha, que não pode
Sequer um dixe sem valor comprar-vos?
Ah! bela como sois, que vos importam
Custosas flores, com que ornais a fronte?
Para a salvar do vórtice do crime,
O preço delas, uma só, da coisa,
Que sem valor julgardes, é bastante.
Sabeis? - Além da vida, além da morte,
Quando deixardes o ouropel na campa,
Quando subirdes do Senhor ao trono,
Sem andrajos sequer, também mendiga,
Ali tereis as lágrimas do pobre,
A bênção do afligido, a prece ardente
Do que sofrendo vos bendisse, - ó Dona.
Fechou-se a porta festival sobre ela!
E a donzela se ergueu, corou de pejo,
Lançando os olhos pela rua escusa,
E segura no andar, e firme, à porta
Do palácio bateu - entrou - sumiu-se.
E o anjo, como aflito sob um peso,
Um gemido soltou; era uma nota
Melancólica e triste, - era um suspiro
Mavioso de virgem, - um soído
Subtil, mimoso, como d’Harpa Eólia,
Que a brisa da manhã roçou medrosa.
IV
Dos muros ao través meus olhos viram
Soberba roda de convivas, - todos
Veludos, sedas, e custosas galas
Trajavam senhoris. - Reinava o jogo
Avaro e grave, leda e viva a dança
Em vórtices girava, a orquestra doce
Cantava oculta; condensados, bastos,
Em redor do banquete estavam muitos.
A mendiga ali estava, - não trajando
Sujos farrapos, mas delgadas telas.
Choviam brindes e canções e vivas
À Deusa airosa do banquete; todos
Um volver dos seus olhos, um sorriso,
Uma voz de ternura, um mimo, um gesto
Cobiçavam rivais; - e ali com ela,
Como um raio do sol por entre as nuvens
Lá na quadra hibernal penetra a custo
Quase sem vida, sem calor, sem força,
Menos brilhante vi seu anjo belo.
Nos curtos lábios da feliz mendiga
Passava rápido um sorriso às vezes;
Outras chorava, no volver do rosto,
Na taça do prazer sorvendo o pranto.
Encontradas paixões sentia o anjo:
Parecia chorar co’o seu sorriso,
Parecia sorrir co’o choro dela.
Pour mon coer, ami de toute gloire,
Les triomphes d’autrui ne sont pas un affront.
Poète, j’eus toujours un chanl pour les poétes,
Et jamais le laurier qui pare d’autre têtes
Ne jeta d’ombre sur mon front.
- V. Hugo
Vate! Vate! que és tu? - Nos seus extremos
Fadou-te Deus um coração de amores,
Fadou-te uma alma acesa borbulhando
Ardidos pensamentos, como a lava
Que o gigante Vesúvio arroja às nuvens.
Vote! vote! que és tu? - Foste ao princípio
Sacerdote e profeta;
Eram nos céus teus cantos uma prece,
Na terra um vaticínio.
E ele cantava então: - Jeová me disse,
Majestoso e terrível.
“Vês tu Jerusalém como orgulhosa
“Campeã entre as nações, como no Líbano
“Um cedro a cuja sombra a hissope cresce?
“Breve a minha ira transformada em raios
“Sobre ela cairá;
“Um fero vencedor dentro em seus muros
“Tributária a fará;
“E quando escravos seus filhos, sobre pedra
“Pedra não ficará.”
E os réprobos de saco se vestiam,
Em pó, em cinza envoltos;
E colando co’a terra os torpes lábios,
E açoitando cu’as mãos o peito imbele,
Senhor! Senhor! - clamavam.
E o vate entanto o pálido semblante
Meditabundo sobre as mãos firmara,
Suplicando ao Senhor do interno d’alma.
Foram santos então. - Homero o mundo
Criou segunda vez, - o inferno o Dante, -
Milton o paraíso, - foram grandes!
E hoje!... em nosso exílio erramos tristes,
Mimosa esp’rança ao infeliz legando.
Maldizendo a soberba, o crime, os vicio;:
E o infeliz se consola, e o grande treme.
Damos ao infante aqui do pão que temos,
E o manto além ao mísero raquítico:
Somos hoje Cristãos.
À Morte Prematura
Da Il.ma Sra. D.
(no Álbum de seu Irmão Da. J. D. Lisboa Serra)
On dirait que le ciel aux coeurs plus magnanimes
Measure plus de maux.
- Lamartine
Perfeita formosura em tenra idade
Qual flor, que antecipada foi colhida,
Murchada está da mão da sorte dura.
- Camões (soneto)
Lá, bem longe daqui, em tarde amena,
Gozando a viração das frescas auras,
Que do Brasil os bosques brandamente
Faziam balançar, - e que espalhavam
No éter encantado odor, pureza -
Do que a rosa mais bela, - meiga e casta,
Como as virgens do sol,
Que de vezes não foi ela pendente
Dos braços fraternais em meigo abraço;
Como mimosa flor presa, enlaçada
A tenro arbusto que a vergôntea débil
Lhe ampara docemente. . .
E o Irmão que só nela se revia,
O Irmão que a adorava, qual se adora
Um mimo do Senhor;
Que a tinha por farol, conforto e guia,
Os seus dias contava por encantos;
E as virtudes co’os dias pleiteavam.
E ela morreu no viço de seus anos!...
E a laje fria e muda dos sepulcros
Se fechou sobre o ente esmorecido
Ao despontar de vida
Tão rica de esperanças e tão cheia
De formosura e graças!... _
Campal campa! que de terror incutes!
Quanto esse teu silêncio me horroriza!
E quanto se assemelha a tua calma
À do cruel malvado que impassível
Contempla a sua vítima torcer-se
Em convulsões horríveis, desesp’radas;
Cruas vascas da morte!...
Quem tão má fé te criou?
Tu que tragas o ente que esmorece
Ao despontar de vida
Tão rica de esperanças e tão cheia
De formosura e graças?!
O farol se apagou? a luz sumiu-se!
Como o fugaz clarão do meteoro,
Extinguiu-se a esperança; e o malfadado
Sobre a terra deserta em vão procura
Traços dessa que amou, que tanto o amara,
Da jovem companheira de seus brincos,
Pesares e alegrias.
Ele a procurai... o viajor pasmado
Nos campos de Pompéia, alonga a vista
Pela amplidão do plano,
Destroços e ruínas encontrando,
Onde esperava movimento e vida.
Não poder eu a troco de meu sangue
Poupar-te dessas lágrimas metade!
Oh! poder que eu pudesse! - e almo sorriso.
Que tanto me compraz ver-te nos lábios,
Inda uma vez brilhasse!
E essa existência,
Que tão cara me é, ta visse eu leda,
E feliz como a vida dos Arcanjos!
Infeliz é quem chora: ela finou-se,
Porque os anjos à terra não pertencem:
Mas lá dos imortais sobre os teus dias
A suspirada irmã vela incessante.
Vinde, cândidas rosas, açucenas,
Vinde, roxas saudades;
Orvalhai, tristes lágrimas, as c’roas,
Que hão de a campa adornar por mim depostas
Em holocausto à vítima da morte.
Inocência, pudor, beleza e graça
Com ela nessa campa adormeceram.
Anjo no coração, anjo no rosto,
Devera o amor chorar sobre o teu seio,
Que não grinaldas fúnebres tecer-te;
Devera voz d’esposo acalentar-te
O sono da inocência, - não grosseira
Canção de trovador não conhecido.
Coimbra, junho de 1841.
A Mendiga
Donnez: -
Et quand vous paraîtrez devant juge austère
Vous direz: J’ai connu la pitié sur la terre,
Je puis la demander aux cieux!
- Turquety
I
Eu sonhei durante a noite...
Que triste foi meu sonhar!
Era uma noite medonha,
Sem estrelas, sem luar.
E ao través do manto escuro
Das trevas, meus olhos viam
Triste mendiga formosa,
Qu’infortúnios consumiam.
Era uma pobre mendiga,
Porém, cândida donzela;
Pudibunda, afável, doce,
Amorosa, e casta, e bela.
Vestia rotos andrajos,
Que o seu corpo mal cobriam;
Por vergonha os olhos dela
Sobre ela se não volviam.
Pelas costas descobertas
Cortador o frio entrava;
Tinha fome e sede, - e o pranto
Nos seus olhos borbulhava.
E qual vemos dos céus descendo rápido
Um fugaz meteoro, vi descendo
Um anjo do Senhor; - Parou sobre ela,
E mudo a contemplava. - Uma tristeza
Simpática, indizível pouco e pouco
Do anjo nas feições se foi pintando:
Qual tristeza de irmão que a irmã mais nova
Conhece enferrna e chora. - Ela no peito
Menor sentiu a dor, e humilde orava.
II
De um vasto edifício nas frias escadas
Eu vi-a sentada; - era um templo, diziam,
Secreto concílio de sócios piedosos,
Que o bem tinha juntos, que bem só faziam.
Defronte um palácio soberbo se erguia,
E dele partia confuso rumor:
- A dança girava, e a orquestra sonora
Cantava alegria, prazeres e amor.
E quando ao palácio um conviva chegava,
Rugindo se abria o ruidoso portão;
Eflúvios de incenso nos ares corriam
Da rua esteirada com vivo clarão.
E a triste mendiga ali ‘stava ao relento,
Com fome, com frio, com sede e com dor;
E eu vi o seu anjo, mais triste no aspecto,
Mais baço, mais turvo da glória o fulgor.
E à porta do vasto sombrio edifício
Um vulto chegou.
- Senhor, uma esmola! bradou-lhe a mendiga
E o vulto parou.
E rude no acento, no aspecto severo,
Lhe disse: - O teu nome?
Tornou-lhe a mendiga: - Senhor, uma esmola,
Que eu morro de fome.
- Não, dizes teu nome? lhe torna o soberbo
- Sou órfã, sozinha;
Meu nome qu’importa, se eu sofro, se eu gemo,
Se eu choro mesquinha!”
- Em vis meretrizes não cabe esse orgulho,
Tornou-lhe o Senhor,
Que à noite, nas trevas, contratam no crime,
Vendendo o pudor.
E a porta do templo - erguido à piedade
Com força batia;
Co’o peso do insulto acrescido à crueza,
A triste gemia.
III
Ouvi depois um rodar que a todo o instante
Mais distinto se ouvia; e logo um forte,
Fascinador clarão por toda a rua
Se derramou soberbo. - Infindos pajens
Ricas librés trajando, mil archotes
Nos ares revolviam; - fortes, rápidos,
Fumegantes corcéis, sorvendo a terra,
Tiravam rica sege melindrosa.
Sobre a terra saltou airosa e bela
A dona, em frente do festivo paço;
E a mendiga bradou: - Senhora minha,
Dai uma esmola, dai! - À voz dorida
Volveu-se o rosto d’anjo, porém d’anjo
Não era o coração; - foi-lhe importuno,
Mais que importuno... da mesquinha o grito!
E da mendiga o protetor celeste
Parecia falar em favor dela;
E a rica dona o escutava, como
Se ouvisse a interna voz que dentro mora.
E eu dizia também - Ó bela Dona,
Dai-lhe uma esmola, daí; - de que vos serve
Um óbolo mesquinha, que não pode
Sequer um dixe sem valor comprar-vos?
Ah! bela como sois, que vos importam
Custosas flores, com que ornais a fronte?
Para a salvar do vórtice do crime,
O preço delas, uma só, da coisa,
Que sem valor julgardes, é bastante.
Sabeis? - Além da vida, além da morte,
Quando deixardes o ouropel na campa,
Quando subirdes do Senhor ao trono,
Sem andrajos sequer, também mendiga,
Ali tereis as lágrimas do pobre,
A bênção do afligido, a prece ardente
Do que sofrendo vos bendisse, - ó Dona.
Fechou-se a porta festival sobre ela!
E a donzela se ergueu, corou de pejo,
Lançando os olhos pela rua escusa,
E segura no andar, e firme, à porta
Do palácio bateu - entrou - sumiu-se.
E o anjo, como aflito sob um peso,
Um gemido soltou; era uma nota
Melancólica e triste, - era um suspiro
Mavioso de virgem, - um soído
Subtil, mimoso, como d’Harpa Eólia,
Que a brisa da manhã roçou medrosa.
IV
Dos muros ao través meus olhos viram
Soberba roda de convivas, - todos
Veludos, sedas, e custosas galas
Trajavam senhoris. - Reinava o jogo
Avaro e grave, leda e viva a dança
Em vórtices girava, a orquestra doce
Cantava oculta; condensados, bastos,
Em redor do banquete estavam muitos.
A mendiga ali estava, - não trajando
Sujos farrapos, mas delgadas telas.
Choviam brindes e canções e vivas
À Deusa airosa do banquete; todos
Um volver dos seus olhos, um sorriso,
Uma voz de ternura, um mimo, um gesto
Cobiçavam rivais; - e ali com ela,
Como um raio do sol por entre as nuvens
Lá na quadra hibernal penetra a custo
Quase sem vida, sem calor, sem força,
Menos brilhante vi seu anjo belo.
Nos curtos lábios da feliz mendiga
Passava rápido um sorriso às vezes;
Outras chorava, no volver do rosto,
Na taça do prazer sorvendo o pranto.
Encontradas paixões sentia o anjo:
Parecia chorar co’o seu sorriso,
Parecia sorrir co’o choro dela.
Machado de Assis (Almas Agradecidas) Capítulo III
Um dia de manhã, leu Oliveira, ainda na cama, a notícia da demissão de Magalhães, impressa no Jornal do Commercio. Grande foi a sua mágoa, mas ainda maior que a mágoa foi a raiva que esta notícia lhe causou. Demitir Magalhães! Oliveira mal podia compreender este ato do ministro. O ministro era necessariamente tolo ou tratante.
Havia patronato naquilo. Não seria pagamento a algum eleitor solícito? Estas e outras conjecturas preocuparam o advogado até à hora do almoço. Almoçou pouco. O estômago acompanhava a dor do coração.
Magalhães devia ir nesse dia ao escritório de Oliveira. Com que ansiedade esperou este a hora marcada! Esteve a ponto de faltar a um depoimento de testemunhas. Mas a hora chegou e Magalhães não apareceu. Oliveira estava sobre brasas. Qual a razão da falta? Não atinava com ela.
Eram quatro horas, quando saiu do escritório, e sua resolução imediata foi meter-se num tílburi e seguir para a Glória.
Assim o fez.
Quando lá chegou, estava Magalhães lendo um romance. Não parecia abatido pelo golpe ministerial. Todavia, não estava alegre. Fechou o livro lentamente e abraçou o amigo.
Oliveira não podia conter a sua cólera.
— Lá vi hoje, disse ele, a notícia da tua demissão. É uma patifaria sem nome...
— Por quê? — Ainda o perguntas? — Sim; por quê? O ministro é senhor dos seus atos e responsável por eles; podia demitir-me e fê-lo.
— Mas fez mal, disse Oliveira.
Magalhães sorriu tristemente.
— Não podia deixar de o fazer, disse ele; um ministro é muitas vezes um amanuense do destino, que só parece ocupar-se em me perturbar a vida e multiplicar todos os esforços.
Que queres? Eu já estou acostumado, não resisto; dia virá em que estes golpes terão um termo. Dia virá em que eu possa vencer a má fortuna de uma vez para sempre. Tenho o remédio nas mãos.
— Deixa-te de tolices, Magalhães.
— Tolices? — Mais que tolices; sê forte! Magalhães abanou a cabeça.
— Não custa aconselhar fortaleza, murmurou ele; mas quem tem sofrido como eu...
— Já não contas com os amigos? — Os amigos não podem tudo.
— Muito obrigado! Eu te mostrarei, se podem.
— Não te iludas, Oliveira; não te esforces a favor de um homem que a sorte condenou.
— Histórias! — Sou um condenado.
— És um fracalhão.
— Acreditas que eu...
— Acredito que és um fracalhão, e que não pareces aquele mesmo Magalhães que sabe conservar o sangue frio em todas as ocasiões graves. Descansa, eu tirarei desforra brilhante. Antes de quinze dias estarás empregado.
— Não creias...
— Desafias-me? — Não; bem conheço de que é capaz teu coração nobre e generoso... mas...
— Mas o quê? Receio que a má fortuna seja mais forte do que eu.
— Verás.
Oliveira deu um passo para a porta.
— Nada disso impede que venhas jantar comigo, disse ele, voltando-se para Magalhães.
— Obrigado; já jantei.
— Anda ao menos comigo para ver se te distrais.
Magalhães recusou; mas Oliveira insistiu com tão boa vontade que não havia recusar.
Durante a noite seguinte meditou Oliveira acerca do negócio de Magalhães. Tinha amigos importantes, os mesmos que forcejavam por lhe abrir carreira política. Oliveira pensou neles como os mais próprios para levar a cabo a obra de seus desejos. O grande caso para ele era empregar Magalhães, em cargo tal que despicasse da prepotência ministerial. O substantivo prepotência era a exata expressão de Oliveira.
Não lhe ocultaram os amigos que o caso não era fácil; mas prometeram que a dificuldade seria vencida. Não se dirigiram ao ministro da Guerra, mas a outro; Oliveira pôs em campo o recurso feminino. Duas senhoras de seu conhecimento foram em pessoa falar ao ministro, em favor do feliz candidato.
Não negou o digno membro do poder executivo a dificuldade de criar um lugar para dar ao pretendente. Seria cometer a injustiça de tirar o pão a empregados úteis ao país.
Instavam, porém, os padrinhos, audiências e cartas, pedidos de toda sorte; nada ficou por empregar em favor de Magalhães.
Depois de cinco dias de lutas e solicitações diárias, declarou o ministro que poderia dar um bom emprego a Magalhães na Alfândega de Corumbá. Já era boa vontade da parte do ministro, mas os protetores de Magalhães recusaram a graça.
— O que se deseja de V. Excia., disse um deles, é que o nosso afilhado seja empregado aqui mesmo na corte. Vai nisso uma questão de honra, e uma questão de comodidade.
Tinha boa vontade o ministro, e entrou a cogitar no meio de acomodar o pretendente.
Havia em uma das repartições a seu cargo um empregado que durante o ano faltava muitas vezes ao ponto, e na última peleja eleitoral votara contra o ministro. Caiu-lhe uma demissão em casa, e para evitar empenhos mais fortes, no mesmo dia em que apareceu a demissão do empregado vadio, apareceu a nomeação de Magalhães.
Foi o próprio Oliveira que levou a Magalhães o desejado decreto.
— Dá-me cá um abraço, disse ele, e reza aí um mea culpa. Venci o destino. Estás nomeado.
— Quê! será possível? — Aqui tens o decreto! Magalhães caiu nos braços de Oliveira.
A gratidão de quem recebe um benefício é sempre menor que o prazer daquele que o faz.
Magalhães exprimia todo seu reconhecimento pela dedicação e perseverança de Oliveira; mas a alegria de Oliveira não tinha limites. A explicação desta diferença está talvez neste fundo de egoísmo que há em todos nós.
Em todo caso, a amizade dos dois ex-colegas ganhou com isso maior solidez.
Fonte:
www.dominiopublico.gov.br
Havia patronato naquilo. Não seria pagamento a algum eleitor solícito? Estas e outras conjecturas preocuparam o advogado até à hora do almoço. Almoçou pouco. O estômago acompanhava a dor do coração.
Magalhães devia ir nesse dia ao escritório de Oliveira. Com que ansiedade esperou este a hora marcada! Esteve a ponto de faltar a um depoimento de testemunhas. Mas a hora chegou e Magalhães não apareceu. Oliveira estava sobre brasas. Qual a razão da falta? Não atinava com ela.
Eram quatro horas, quando saiu do escritório, e sua resolução imediata foi meter-se num tílburi e seguir para a Glória.
Assim o fez.
Quando lá chegou, estava Magalhães lendo um romance. Não parecia abatido pelo golpe ministerial. Todavia, não estava alegre. Fechou o livro lentamente e abraçou o amigo.
Oliveira não podia conter a sua cólera.
— Lá vi hoje, disse ele, a notícia da tua demissão. É uma patifaria sem nome...
— Por quê? — Ainda o perguntas? — Sim; por quê? O ministro é senhor dos seus atos e responsável por eles; podia demitir-me e fê-lo.
— Mas fez mal, disse Oliveira.
Magalhães sorriu tristemente.
— Não podia deixar de o fazer, disse ele; um ministro é muitas vezes um amanuense do destino, que só parece ocupar-se em me perturbar a vida e multiplicar todos os esforços.
Que queres? Eu já estou acostumado, não resisto; dia virá em que estes golpes terão um termo. Dia virá em que eu possa vencer a má fortuna de uma vez para sempre. Tenho o remédio nas mãos.
— Deixa-te de tolices, Magalhães.
— Tolices? — Mais que tolices; sê forte! Magalhães abanou a cabeça.
— Não custa aconselhar fortaleza, murmurou ele; mas quem tem sofrido como eu...
— Já não contas com os amigos? — Os amigos não podem tudo.
— Muito obrigado! Eu te mostrarei, se podem.
— Não te iludas, Oliveira; não te esforces a favor de um homem que a sorte condenou.
— Histórias! — Sou um condenado.
— És um fracalhão.
— Acreditas que eu...
— Acredito que és um fracalhão, e que não pareces aquele mesmo Magalhães que sabe conservar o sangue frio em todas as ocasiões graves. Descansa, eu tirarei desforra brilhante. Antes de quinze dias estarás empregado.
— Não creias...
— Desafias-me? — Não; bem conheço de que é capaz teu coração nobre e generoso... mas...
— Mas o quê? Receio que a má fortuna seja mais forte do que eu.
— Verás.
Oliveira deu um passo para a porta.
— Nada disso impede que venhas jantar comigo, disse ele, voltando-se para Magalhães.
— Obrigado; já jantei.
— Anda ao menos comigo para ver se te distrais.
Magalhães recusou; mas Oliveira insistiu com tão boa vontade que não havia recusar.
Durante a noite seguinte meditou Oliveira acerca do negócio de Magalhães. Tinha amigos importantes, os mesmos que forcejavam por lhe abrir carreira política. Oliveira pensou neles como os mais próprios para levar a cabo a obra de seus desejos. O grande caso para ele era empregar Magalhães, em cargo tal que despicasse da prepotência ministerial. O substantivo prepotência era a exata expressão de Oliveira.
Não lhe ocultaram os amigos que o caso não era fácil; mas prometeram que a dificuldade seria vencida. Não se dirigiram ao ministro da Guerra, mas a outro; Oliveira pôs em campo o recurso feminino. Duas senhoras de seu conhecimento foram em pessoa falar ao ministro, em favor do feliz candidato.
Não negou o digno membro do poder executivo a dificuldade de criar um lugar para dar ao pretendente. Seria cometer a injustiça de tirar o pão a empregados úteis ao país.
Instavam, porém, os padrinhos, audiências e cartas, pedidos de toda sorte; nada ficou por empregar em favor de Magalhães.
Depois de cinco dias de lutas e solicitações diárias, declarou o ministro que poderia dar um bom emprego a Magalhães na Alfândega de Corumbá. Já era boa vontade da parte do ministro, mas os protetores de Magalhães recusaram a graça.
— O que se deseja de V. Excia., disse um deles, é que o nosso afilhado seja empregado aqui mesmo na corte. Vai nisso uma questão de honra, e uma questão de comodidade.
Tinha boa vontade o ministro, e entrou a cogitar no meio de acomodar o pretendente.
Havia em uma das repartições a seu cargo um empregado que durante o ano faltava muitas vezes ao ponto, e na última peleja eleitoral votara contra o ministro. Caiu-lhe uma demissão em casa, e para evitar empenhos mais fortes, no mesmo dia em que apareceu a demissão do empregado vadio, apareceu a nomeação de Magalhães.
Foi o próprio Oliveira que levou a Magalhães o desejado decreto.
— Dá-me cá um abraço, disse ele, e reza aí um mea culpa. Venci o destino. Estás nomeado.
— Quê! será possível? — Aqui tens o decreto! Magalhães caiu nos braços de Oliveira.
A gratidão de quem recebe um benefício é sempre menor que o prazer daquele que o faz.
Magalhães exprimia todo seu reconhecimento pela dedicação e perseverança de Oliveira; mas a alegria de Oliveira não tinha limites. A explicação desta diferença está talvez neste fundo de egoísmo que há em todos nós.
Em todo caso, a amizade dos dois ex-colegas ganhou com isso maior solidez.
Fonte:
www.dominiopublico.gov.br
sexta-feira, 30 de maio de 2014
Dorothy Jansson Moretti (Baú de Trovas) 13
Marcadores:
Florilégio de Trovas,
São Paulo,
Sorocaba
Folclore Brasileiro (Mitos Indígenas) Arutsãm, o sapo astucioso
O sapo Arutsãm foi ao encontro de seu cunhado onça, para dele tomar emprestado um arco e uma gaita de bambu.
Aproximando-se de seu território, foi alertado por outros animais, com ironia, do perigo que estava correndo. Mesmo assim prosseguiu.
A onça mostrou-se gentil ao recebê-lo, convidando-o para um banho no lago, cuidando, porém, para que sempre caminhasse atrás do convidado.
Arutsãm desconfiado, manteve-se atento.
Ao anoitecer a onça esperou ansiosa que o cunhado adormecesse, aguardando o momento ideal para devorá-lo. Arutsãm, entretanto, colocou sobre os seus, olhos de um vagalume, ludibriando assim a onça, que o julgava acordado e não ousou atacá-lo.
No dia seguinte, já de posse do arco e da gaita, despediu-se agradecido de seu anfitrião. Esperto que era, espalhou formigas no caminho, que, atacando a onça, faziam com que esta batesse as patas no chão, acusando sua proximidade.
Arutsãm seguia o seu caminho. Passava agora pelo território das serpentes, a quem seu inimigo incansável pediu que o apanhassem. O astuto sapo atraiu-as até o lago, saltando velozmente para outra margem, escapando à sua perseguição.
Chegando à aldeia das cobras, apressou-se em quebrar todas as panelas de barro de suas fêmeas. Ao verem o estrago, estas o perseguiram enfurecidas.
Neste momento, partiu Arutsãm para seu grande salto: como um toque mágico, pulou para a lua, onde, zombeteiro, está eternamente a tocar sua gaita.
Ainda hoje, em noites claras, a onça contempla a lua (Iaê), lamentando o fracasso do seu plano traidor.
Fonte:
Jayhr Gael (Mitos indígenas). www.caminhodewicca.com.br
Aproximando-se de seu território, foi alertado por outros animais, com ironia, do perigo que estava correndo. Mesmo assim prosseguiu.
A onça mostrou-se gentil ao recebê-lo, convidando-o para um banho no lago, cuidando, porém, para que sempre caminhasse atrás do convidado.
Arutsãm desconfiado, manteve-se atento.
Ao anoitecer a onça esperou ansiosa que o cunhado adormecesse, aguardando o momento ideal para devorá-lo. Arutsãm, entretanto, colocou sobre os seus, olhos de um vagalume, ludibriando assim a onça, que o julgava acordado e não ousou atacá-lo.
No dia seguinte, já de posse do arco e da gaita, despediu-se agradecido de seu anfitrião. Esperto que era, espalhou formigas no caminho, que, atacando a onça, faziam com que esta batesse as patas no chão, acusando sua proximidade.
Arutsãm seguia o seu caminho. Passava agora pelo território das serpentes, a quem seu inimigo incansável pediu que o apanhassem. O astuto sapo atraiu-as até o lago, saltando velozmente para outra margem, escapando à sua perseguição.
Chegando à aldeia das cobras, apressou-se em quebrar todas as panelas de barro de suas fêmeas. Ao verem o estrago, estas o perseguiram enfurecidas.
Neste momento, partiu Arutsãm para seu grande salto: como um toque mágico, pulou para a lua, onde, zombeteiro, está eternamente a tocar sua gaita.
Ainda hoje, em noites claras, a onça contempla a lua (Iaê), lamentando o fracasso do seu plano traidor.
Fonte:
Jayhr Gael (Mitos indígenas). www.caminhodewicca.com.br
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Machado de Assis (Almas Agradecidas) Capítulo II
Três dias depois, apareceu Magalhães no escritório de Oliveira; falou na sala a um porteiro que lhe pediu o cartão.
— Não tenho cartão, respondeu Magalhães envergonhado; esqueci-me de o trazer; diga-lhe que é o Magalhães.
— Queira esperar alguns minutos, tornou o porteiro; ele está conversando com uma pessoa.
Magalhães assentou-se numa cadeira de braços, enquanto o porteiro assoava silenciosamente o nariz e tomava uma pitada de rapé, que lhe não ofereceu. Magalhães examinou detidamente as cadeiras, as estantes, os quadros de gravuras, os capachos e as escarradeiras. A sua curiosidade era minuciosa e sagaz; parecia estar avaliando o gosto ou a riqueza de seu ex-colega.
Minutos depois, ouviu-se um rumor de cadeiras, e não tardou que viesse da sala do fundo um velho alto e empertigado, vestido com certo apuro, a quem o porteiro fez largos cumprimentos até o patamar da escada.
Magalhães não esperou que o porteiro fosse avisar Oliveira; atravessou o corredor que separava as duas salas e foi ter com o amigo.
— Ora, viva! disse este apenas o viu entrar. Estimo que não lhe houvesse esquecido a promessa. Sente-se; chegou a casa com chuva? — Começou a chuviscar, quando eu me achava a dois passos da porta, respondeu Magalhães.
— Que horas são? — Pouco mais de duas, creio eu.
— O meu relógio está parado, disse Oliveira, lançando o olhar de esguelha para o colete de Magalhães, que não tinha relógio. Naturalmente, ninguém mais me procurará hoje; e ainda que venham, quero descansar.
Oliveira tocou a campainha apenas acabou de proferir estas palavras. Veio o porteiro.
— Se vier alguém, disse Oliveira, não estou cá.
O porteiro inclinou-se e saiu.
— Estamos livres de importunos, disse o advogado, apenas o porteiro virou as costas.
Todas estas maneiras e palavras de simpatia e cordialidade foram angariando a confiança de Magalhães, que começou a parecer alegre e franco com o seu ex-colega.
Longa foi a conversa, que durou até às 4 horas da tarde. As 5 jantava Oliveira; mas o outro jantava às 3, e se o não disse, era talvez por deferência, se não fosse por cálculo.
Um jantar copioso e escolhido não era melhor que o ramerão culinário de Magalhães? Fosse uma ou outra coisa, Magalhães suportou a fome com admirável denodo. Eram 4 horas da tarde, quando Oliveira deu acordo de si.
— Quatro horas! exclamou ele, ouvindo as badaladas de um sino próximo. Naturalmente, já você perdeu a hora do jantar.
— Assim é, respondeu Magalhães; eu costumo jantar às 3 horas. Não importa; adeus.
— Isso é que não; há de ir jantar comigo — Não; obrigado...
— Ande cá, jantaremos no hotel mais próximo, porque a minha casa é longe. Eu ando com ideia de mudar de casa; estou muito fora do centro da cidade. Vamos aqui ao Hotel de Europa.
Os vinhos eram bons; Magalhães gostava de vinhos bons. No meio do jantar, tinha-se-lhe desenvolvido completamente a língua. Oliveira fazia quanto podia para tirar ao amigo da infância toda espécie de acanhamento. Isto e o vinho deram excelente resultado.
Desta ocasião em diante foi que Oliveira começou a apreciar o ex-colega. Era Magalhães um rapaz de agudo espírito, boa observação, conversador ameno, um pouco lido em obras fúteis e correntes. Tinha, além disso, o dom de ser naturalmente insinuante. Com estas prendas juntas não era difícil, era antes facílimo angariar as boas graças de Oliveira, que, à sua extrema bondade, reunia uma natural confiança, ainda não diminuída pelos cálculos da vida madura. Demais Magalhães tinha sido infeliz; esta circunstância era aos olhos de Oliveira um realce. Finalmente, o seu ex-colega já lhe confiara no trajeto do escritório ao hotel, que não contava um amigo debaixo do sol. Oliveira queria ser esse amigo.
Qual importa mais à vida, ser Dom Quixote ou Sancho Pança? O ideal ou o prático? A generosidade ou a prudência? Oliveira não hesitava entre esses dois opostos papéis; nem sequer pensara neles. Estava no período do coração.
Apertaram-se os laços da amizade entre os dois colegas. Oliveira mudou-se para a cidade, o que deu azo a que os dois amigos se encontrassem mais vezes. A frequência veio a uni-los ainda mais.
Oliveira apresentou Magalhães a todos os seus amigos; levou-o à casa de alguns. A sua palavra afiançava o hóspede que, dentro em pouco tempo, captava as simpatias de todos.
Nisto era Magalhães superior a Oliveira. Não faltava ao advogado inteligência, nem maneiras, nem dom para se fazer estimado. Mas os dotes de Magalhães superavam os dele. A conversa de Magalhães era mais picante, mais variada, mais atraente. Há muito quem prefira a amizade de um homem sarcástico, e Magalhães tinha seus longes de sarcástico.
Não se magoava com isto Oliveira, antes parecia ter certa glória em ver que seu amigo obtinha por seu mérito a estima dos outros.
Facilmente acreditará o leitor que estes dois amigos se fizessem confidentes de todas as coisas, principalmente de coisas de amores. Nada esconderam a este respeito um ao outro, com a diferença de que Magalhães, não tendo amores atuais, confiou ao amigo apenas algumas proezas antigas, ao passo que Oliveira, a braços com algumas aventuras, não dissimulou nenhuma delas, e tudo contou a Magalhães.
E foi bem que o fizesse, porque Magalhães era homem de bom conselho, dava ao amigo pareceres sensatos, que ele ouvia e aceitava com grande proveito seu e para maior glória da recíproca amizade.
A dedicação de Magalhães ainda se manifestava por outro modo. Não era raro vê-lo desempenhar um papel de conciliador, auxiliar uma inocente mentira, ajudar o amigo em todas as dificuldades que o amor depara aos seus alunos.
============
— Não tenho cartão, respondeu Magalhães envergonhado; esqueci-me de o trazer; diga-lhe que é o Magalhães.
— Queira esperar alguns minutos, tornou o porteiro; ele está conversando com uma pessoa.
Magalhães assentou-se numa cadeira de braços, enquanto o porteiro assoava silenciosamente o nariz e tomava uma pitada de rapé, que lhe não ofereceu. Magalhães examinou detidamente as cadeiras, as estantes, os quadros de gravuras, os capachos e as escarradeiras. A sua curiosidade era minuciosa e sagaz; parecia estar avaliando o gosto ou a riqueza de seu ex-colega.
Minutos depois, ouviu-se um rumor de cadeiras, e não tardou que viesse da sala do fundo um velho alto e empertigado, vestido com certo apuro, a quem o porteiro fez largos cumprimentos até o patamar da escada.
Magalhães não esperou que o porteiro fosse avisar Oliveira; atravessou o corredor que separava as duas salas e foi ter com o amigo.
— Ora, viva! disse este apenas o viu entrar. Estimo que não lhe houvesse esquecido a promessa. Sente-se; chegou a casa com chuva? — Começou a chuviscar, quando eu me achava a dois passos da porta, respondeu Magalhães.
— Que horas são? — Pouco mais de duas, creio eu.
— O meu relógio está parado, disse Oliveira, lançando o olhar de esguelha para o colete de Magalhães, que não tinha relógio. Naturalmente, ninguém mais me procurará hoje; e ainda que venham, quero descansar.
Oliveira tocou a campainha apenas acabou de proferir estas palavras. Veio o porteiro.
— Se vier alguém, disse Oliveira, não estou cá.
O porteiro inclinou-se e saiu.
— Estamos livres de importunos, disse o advogado, apenas o porteiro virou as costas.
Todas estas maneiras e palavras de simpatia e cordialidade foram angariando a confiança de Magalhães, que começou a parecer alegre e franco com o seu ex-colega.
Longa foi a conversa, que durou até às 4 horas da tarde. As 5 jantava Oliveira; mas o outro jantava às 3, e se o não disse, era talvez por deferência, se não fosse por cálculo.
Um jantar copioso e escolhido não era melhor que o ramerão culinário de Magalhães? Fosse uma ou outra coisa, Magalhães suportou a fome com admirável denodo. Eram 4 horas da tarde, quando Oliveira deu acordo de si.
— Quatro horas! exclamou ele, ouvindo as badaladas de um sino próximo. Naturalmente, já você perdeu a hora do jantar.
— Assim é, respondeu Magalhães; eu costumo jantar às 3 horas. Não importa; adeus.
— Isso é que não; há de ir jantar comigo — Não; obrigado...
— Ande cá, jantaremos no hotel mais próximo, porque a minha casa é longe. Eu ando com ideia de mudar de casa; estou muito fora do centro da cidade. Vamos aqui ao Hotel de Europa.
Os vinhos eram bons; Magalhães gostava de vinhos bons. No meio do jantar, tinha-se-lhe desenvolvido completamente a língua. Oliveira fazia quanto podia para tirar ao amigo da infância toda espécie de acanhamento. Isto e o vinho deram excelente resultado.
Desta ocasião em diante foi que Oliveira começou a apreciar o ex-colega. Era Magalhães um rapaz de agudo espírito, boa observação, conversador ameno, um pouco lido em obras fúteis e correntes. Tinha, além disso, o dom de ser naturalmente insinuante. Com estas prendas juntas não era difícil, era antes facílimo angariar as boas graças de Oliveira, que, à sua extrema bondade, reunia uma natural confiança, ainda não diminuída pelos cálculos da vida madura. Demais Magalhães tinha sido infeliz; esta circunstância era aos olhos de Oliveira um realce. Finalmente, o seu ex-colega já lhe confiara no trajeto do escritório ao hotel, que não contava um amigo debaixo do sol. Oliveira queria ser esse amigo.
Qual importa mais à vida, ser Dom Quixote ou Sancho Pança? O ideal ou o prático? A generosidade ou a prudência? Oliveira não hesitava entre esses dois opostos papéis; nem sequer pensara neles. Estava no período do coração.
Apertaram-se os laços da amizade entre os dois colegas. Oliveira mudou-se para a cidade, o que deu azo a que os dois amigos se encontrassem mais vezes. A frequência veio a uni-los ainda mais.
Oliveira apresentou Magalhães a todos os seus amigos; levou-o à casa de alguns. A sua palavra afiançava o hóspede que, dentro em pouco tempo, captava as simpatias de todos.
Nisto era Magalhães superior a Oliveira. Não faltava ao advogado inteligência, nem maneiras, nem dom para se fazer estimado. Mas os dotes de Magalhães superavam os dele. A conversa de Magalhães era mais picante, mais variada, mais atraente. Há muito quem prefira a amizade de um homem sarcástico, e Magalhães tinha seus longes de sarcástico.
Não se magoava com isto Oliveira, antes parecia ter certa glória em ver que seu amigo obtinha por seu mérito a estima dos outros.
Facilmente acreditará o leitor que estes dois amigos se fizessem confidentes de todas as coisas, principalmente de coisas de amores. Nada esconderam a este respeito um ao outro, com a diferença de que Magalhães, não tendo amores atuais, confiou ao amigo apenas algumas proezas antigas, ao passo que Oliveira, a braços com algumas aventuras, não dissimulou nenhuma delas, e tudo contou a Magalhães.
E foi bem que o fizesse, porque Magalhães era homem de bom conselho, dava ao amigo pareceres sensatos, que ele ouvia e aceitava com grande proveito seu e para maior glória da recíproca amizade.
A dedicação de Magalhães ainda se manifestava por outro modo. Não era raro vê-lo desempenhar um papel de conciliador, auxiliar uma inocente mentira, ajudar o amigo em todas as dificuldades que o amor depara aos seus alunos.
============
continua...
Fonte:
www.dominiopublico.gov.br
Gonçalves Dias (Primeiros Cantos) 5
Amor! Delírio – Engano
Y el llanto que en su cólera derrama,
La hoguera apaga del antiguo amor!
- Zorrilla
Amor! delírio - engano... Sobre a terra
Amor tão bem fruí; a vida Inteira
Concentrei num só ponto - amá-la, e sempre.
Amei! - dedicação, ternura, extremos
Cismou meu coração, cismou minha alma,
- Minha alma que na taça da ventura
Vida breve d’amor sorveu gostosa.
Eu e ela, ambos nós, na terra ingrata
Oásis, paraíso, éden ou templo
Habitamos uma hora; e logo o tempo
Com a foice roaz quebrou-lhe o encanto,
Doce encanto que o amor nos fabricara.
E eu sempre a via!... quer nas nuvens d’oiro
Quando ia o sol nas vagas sepultar-se,
Ou quer na branca nuvem que velava _
O círculo da lua, - quer no manto
D’alvacenta neblina que baixava
Sobre as folhas do bosque, muda e grave,
Da tarde no cair; nos céus, na terra,
A ela, a ela só, viam meus olhos.
Seu nome, sua voz - ouvia eu sempre;
Ouvia-os no gemer da parda rola,
No trépido correr da veia argêntea,
No respirar da brisa, no sussurro
Do arvoredo frondoso, na harmonia
Dos astros inefável; - o seu nome!
Nos fugitivos sons de alguma frauta,
Que da noite o silêncio realçavam,
Os ares e a amplidão divinizando,
Ouviam meus ouvidos; e de ouvi-lo
Arfava de prazer meu peito ardente.
Ah! quantas vezes, quantas! junto dela
Não senti sua mão tremer na minha;
Não lhe escutei um lânguido suspiro,
Que vinha lá do peito à flor dos lábios
Deslizar-se e morrer?! Dos seus cabelos
A mágica fragrância respirando,
Escutando-lhe a voz doce e pausada,
Mil venturas colhi dos lábios dela,
Que Instantes de prazer me futuravam.
Cada sorriso seu era uma esp’rança,
E cada esp’rança enlouquecer de amores.
E eu amei tanto! - Oh! não! não hão de os homens
Saber que amor, à ingrata, havia eu dado;
Que afetos melindrosos, que em meu peito
Tinha eu guardado para ornar-lhe a fronte!
Oh! - não, - morra comigo o meu segredo;
Rebelde o coração murmure embora.
Que de vezes, pensando a sós comigo,
Não disse eu entre mim: - Anjo formoso,
Da minha vida que farei, se acaso
Faltar-me o teu amor um só instante;
- Eu que só vivo por te amar, que apenas
O que sinto por ti a custo exprimo?
No mundo que farei, como estrangeiro
Pelas vagas cruéis à praia Inóspita
Exânime arrojado? - Eu, que isto disse,
Existo e penso - e não morri, - não morro
Do que outrora senti, do que ora sinto
De pensar nela, de a rever em sonhos,
Do que fui, do que sou e ser podia!
Existo; e ela de mim jaz esquecida!
Esquecida talvez de amor tamanho,
Derramando talvez noutros ouvidos
Frases doces de amor, que dos seus lábios
Tantas vezes ouvi, - que tantas vezes
Em êxtase divino aos céus me alçaram,
- Que dando à terra ingrata o que era terra
Minha alma além das nuvens transportaram.
Existo! como outrora, no meu peito
Férvido o coração pular sentindo,
Todo o fogo da vida derramando
Em queixas mulheris, em moles versos.
E ela!... ela talvez nos braços doutrem
Com sua vida alimenta uma outra vida,
Com o seu coração o de outro amante,
Que mais feliz do que eu, inferno! a goza.
Ela, que eu respeitei, que eu venerava
Como a relíquia santa! - a quem meus olhos,
Receando ofendê-la, tantas vezes
De castos e de humildes se abaixaram!
Ela, perante quem sentia eu presa
A voz nos lábios e a paixão no peito!
Ela, ídolo meu, a quem o orgulho,
A força d’homem, o sentir, vontade
Própria e minha dediquei, - sujeita
À voz de alguém que não sou eu, - desperta,
Talvez no instante em que de mim se lembra,
Por um ósculo frio, por carícias
Devidas dum esposo!...
Oh! não poder-te,
Abutre roedor, cruel ciúme,
Tua funda raiz e a imagem dela
No peito em sangue espedaçar raivoso!
Mas tu, cruel, que és meu rival, numa hora,
Em que ela só julgar-se, hás de escutar-lhe
Um quebrado suspiro do imo peito,
Que d’eras já passadas se recorda.
Hás de escutá-lo, e ver-lhe a cor do rosto
Enrubescer-se ao deparar contigo!
Presa serás também d’atros cuidados,
Terás ciúme, e sofrerás qual sofro:
Nem menor que o meu mal quero a vingança.
Delírio
Quando dormimos o nosso espírito vela.
- Ésquilo
A noite quando durmo, esclarecendo
As trevas do meu sono,
Uma etérea visão vem assentar-se
Junto ao meu leito aflito!
Anjo ou mulher? não sei. - Ah! se não fosse
Um qual véu transparente,
Como que a alma pura ali se pinta
Ao través do semblante,
Eu a crera mulher... - E tentas, louco,
Recordar o passado,
Transformando o prazer, que desfrutaste,
Em lentas agonias?!
Visão, fatal visão, por que derramas
Sobre o meu rosto pálido
A luz de um longo olhar, que amor exprime
E pede compaixão?
Por que teu coração exala uns fundos,
Magoados suspiros,
Que eu não escuto, mas que vejo e sinto
Nos teus lábios morrer?
Por que esse gesto e mórbida postura
De macerado espírito,
Que vive entre aflições, que já nem sabe
Desfrutar um prazer?
Tu falas! tu que dizes? este acento,
Esta voz melindrosa,
Noutros tempos ouvi, porém mais leda;
Era um hino d’amor.
A voz, que escuto, é magoada e triste,
- Harmonia celeste,
Que à noite vem nas asas do silêncio
Umedecer as faces
Do que enxerga outra vida além das nuvens.
Esta voz não é sua;
É acorde talvez d’harpa celeste,
Caído sobre a terra!
Balbucias uns sons, que eu mal percebo,
Doridos, compassados,
Fracos, mais fracos; - lágrimas despontam
Nos teus olhos brilhantes...
Choras! tu choras!... Para mim teus braços
Por força irresistível
Estendem-se, procuram-me; procuro-te
Em delírio afanoso.
Fatídico poder entre nós ambos
Ergueu alta barreira;
Ele te enlaça e prende... mal resistes...
Cedes enfim. . . acordo!
Acordo do meu sonho tormentoso,
E choro o meu sonhar!
E fecho os olhos, e de novo intento
O sonho reatar.
Embalde! porque a vida me tem preso;
E eu sou escravo seu!
Acordado ou dormindo, é triste a vida
Dês que o amor se perdeu.
Há contudo prazer em nos lembrarmos
Da passada ventura,
Como o que educa flores vicejantes
Em triste sepultura.
Epicédio
Passa la bella donna e par che dorma.
- Tasso
Seu rosto pálido e belo
Já não tem vida nem cor!
Sobre ele a morte descansa,
Envolta em baço palor.
Cerraram-se olhos tão puros,
Que tinham tanto fulgor;
Coração que tanto amava
Já hoje não sente amor;
Que o anjo belo da morte
A par desse anjo baixou!
Trocaram brandas palavras,
Que Deus somente escutou.
Ventura, prazer, ledice
Duma outra vida contou;
E o anjo puro da terra
Prazer da terra enjeitou.
Depois co’as asas candentes
O formoso anjo do céu
Roçou-lhe a face mimosa,
Cobriu-lhe o rosto co’um véu.
Depois o corpo engraçado
Deixou à terra sem vida,
De tênue palor coberto,
- Verniz de estátua esquecida.
E bela assim, como um lírio
Murcho da sesta ao ardor,
Teve a inocência dos anjos,
Tendo o viver duma flor.
Foi breve! - mas a desgraça
A testa não lhe enrugou,
E aos pés do Deus que a crIara
Alma inda virgem levou.
Sai da larva a borboleta,
Sai da rocha o diamante,
De um cadáver mudo e frio
Sai uma alma radiante.
Não choremos essa morte,
Não choremos casos tais;
Quando a terra perde um justo,
Conta um anjo o céu de mais.
Sofrimento
Meu Deus, Senhor meu Deus, o que há no mundo
Que não seja sofrer?
O homem nasce, e vive um só instante,
E sofre até morrer!
A flor ao menos, nesse breve espaço
Do seu doce viver,
Encanta os ares com celeste aroma,
Querida até morrer.
É breve o romper d’alva, mas ao menos
Traz consigo prazer;
E o homem nasce e vive um só instante:
E sofre até morrer!
Meu peito de gemer já está cansado,
Meus olhos de chorar;
E eu sofro ainda, e já não posso alivio
Sequer no pranto achar!
Já farto de viver, em meia vida,
Quebrado pela dor,
Meus anos hei passado, uns após outros,
Sem paz e sem amor.
O amor que eu tanto amava do imo peito,
Que nunca pude achar,
Que embalde procurei, na flor, na planta,
No prado, e terra, e mar!
E agora o que sou eu? - Pálido espectro,
Que da campa fugiu;
Flor ceifada em botão; imagem triste
De um ente que existiu...
Não escutes, meu Deus, esta blasfêmia;
Perdão, Senhor, perdão!
Minha alma sinto ainda, - sinto, escuto
Bater-me o coração.
Quando roja meu corpo sobre a terra,
Quando me aflige a dor,
Minha alma aos céus se eleva, como o incenso,
Como o aroma da flor.
E eu bendigo o teu nome eterno e santo,
Bendigo a minha dor,
Que vai além da terra aos céus infindos
Prender-me ao criador.
Bendigo o nome teu, que uma outra vida
Me fez descortinar,
Uma outra vida, onde não há só trevas,
E nem há só penar.
Y el llanto que en su cólera derrama,
La hoguera apaga del antiguo amor!
- Zorrilla
Amor! delírio - engano... Sobre a terra
Amor tão bem fruí; a vida Inteira
Concentrei num só ponto - amá-la, e sempre.
Amei! - dedicação, ternura, extremos
Cismou meu coração, cismou minha alma,
- Minha alma que na taça da ventura
Vida breve d’amor sorveu gostosa.
Eu e ela, ambos nós, na terra ingrata
Oásis, paraíso, éden ou templo
Habitamos uma hora; e logo o tempo
Com a foice roaz quebrou-lhe o encanto,
Doce encanto que o amor nos fabricara.
E eu sempre a via!... quer nas nuvens d’oiro
Quando ia o sol nas vagas sepultar-se,
Ou quer na branca nuvem que velava _
O círculo da lua, - quer no manto
D’alvacenta neblina que baixava
Sobre as folhas do bosque, muda e grave,
Da tarde no cair; nos céus, na terra,
A ela, a ela só, viam meus olhos.
Seu nome, sua voz - ouvia eu sempre;
Ouvia-os no gemer da parda rola,
No trépido correr da veia argêntea,
No respirar da brisa, no sussurro
Do arvoredo frondoso, na harmonia
Dos astros inefável; - o seu nome!
Nos fugitivos sons de alguma frauta,
Que da noite o silêncio realçavam,
Os ares e a amplidão divinizando,
Ouviam meus ouvidos; e de ouvi-lo
Arfava de prazer meu peito ardente.
Ah! quantas vezes, quantas! junto dela
Não senti sua mão tremer na minha;
Não lhe escutei um lânguido suspiro,
Que vinha lá do peito à flor dos lábios
Deslizar-se e morrer?! Dos seus cabelos
A mágica fragrância respirando,
Escutando-lhe a voz doce e pausada,
Mil venturas colhi dos lábios dela,
Que Instantes de prazer me futuravam.
Cada sorriso seu era uma esp’rança,
E cada esp’rança enlouquecer de amores.
E eu amei tanto! - Oh! não! não hão de os homens
Saber que amor, à ingrata, havia eu dado;
Que afetos melindrosos, que em meu peito
Tinha eu guardado para ornar-lhe a fronte!
Oh! - não, - morra comigo o meu segredo;
Rebelde o coração murmure embora.
Que de vezes, pensando a sós comigo,
Não disse eu entre mim: - Anjo formoso,
Da minha vida que farei, se acaso
Faltar-me o teu amor um só instante;
- Eu que só vivo por te amar, que apenas
O que sinto por ti a custo exprimo?
No mundo que farei, como estrangeiro
Pelas vagas cruéis à praia Inóspita
Exânime arrojado? - Eu, que isto disse,
Existo e penso - e não morri, - não morro
Do que outrora senti, do que ora sinto
De pensar nela, de a rever em sonhos,
Do que fui, do que sou e ser podia!
Existo; e ela de mim jaz esquecida!
Esquecida talvez de amor tamanho,
Derramando talvez noutros ouvidos
Frases doces de amor, que dos seus lábios
Tantas vezes ouvi, - que tantas vezes
Em êxtase divino aos céus me alçaram,
- Que dando à terra ingrata o que era terra
Minha alma além das nuvens transportaram.
Existo! como outrora, no meu peito
Férvido o coração pular sentindo,
Todo o fogo da vida derramando
Em queixas mulheris, em moles versos.
E ela!... ela talvez nos braços doutrem
Com sua vida alimenta uma outra vida,
Com o seu coração o de outro amante,
Que mais feliz do que eu, inferno! a goza.
Ela, que eu respeitei, que eu venerava
Como a relíquia santa! - a quem meus olhos,
Receando ofendê-la, tantas vezes
De castos e de humildes se abaixaram!
Ela, perante quem sentia eu presa
A voz nos lábios e a paixão no peito!
Ela, ídolo meu, a quem o orgulho,
A força d’homem, o sentir, vontade
Própria e minha dediquei, - sujeita
À voz de alguém que não sou eu, - desperta,
Talvez no instante em que de mim se lembra,
Por um ósculo frio, por carícias
Devidas dum esposo!...
Oh! não poder-te,
Abutre roedor, cruel ciúme,
Tua funda raiz e a imagem dela
No peito em sangue espedaçar raivoso!
Mas tu, cruel, que és meu rival, numa hora,
Em que ela só julgar-se, hás de escutar-lhe
Um quebrado suspiro do imo peito,
Que d’eras já passadas se recorda.
Hás de escutá-lo, e ver-lhe a cor do rosto
Enrubescer-se ao deparar contigo!
Presa serás também d’atros cuidados,
Terás ciúme, e sofrerás qual sofro:
Nem menor que o meu mal quero a vingança.
Delírio
Quando dormimos o nosso espírito vela.
- Ésquilo
A noite quando durmo, esclarecendo
As trevas do meu sono,
Uma etérea visão vem assentar-se
Junto ao meu leito aflito!
Anjo ou mulher? não sei. - Ah! se não fosse
Um qual véu transparente,
Como que a alma pura ali se pinta
Ao través do semblante,
Eu a crera mulher... - E tentas, louco,
Recordar o passado,
Transformando o prazer, que desfrutaste,
Em lentas agonias?!
Visão, fatal visão, por que derramas
Sobre o meu rosto pálido
A luz de um longo olhar, que amor exprime
E pede compaixão?
Por que teu coração exala uns fundos,
Magoados suspiros,
Que eu não escuto, mas que vejo e sinto
Nos teus lábios morrer?
Por que esse gesto e mórbida postura
De macerado espírito,
Que vive entre aflições, que já nem sabe
Desfrutar um prazer?
Tu falas! tu que dizes? este acento,
Esta voz melindrosa,
Noutros tempos ouvi, porém mais leda;
Era um hino d’amor.
A voz, que escuto, é magoada e triste,
- Harmonia celeste,
Que à noite vem nas asas do silêncio
Umedecer as faces
Do que enxerga outra vida além das nuvens.
Esta voz não é sua;
É acorde talvez d’harpa celeste,
Caído sobre a terra!
Balbucias uns sons, que eu mal percebo,
Doridos, compassados,
Fracos, mais fracos; - lágrimas despontam
Nos teus olhos brilhantes...
Choras! tu choras!... Para mim teus braços
Por força irresistível
Estendem-se, procuram-me; procuro-te
Em delírio afanoso.
Fatídico poder entre nós ambos
Ergueu alta barreira;
Ele te enlaça e prende... mal resistes...
Cedes enfim. . . acordo!
Acordo do meu sonho tormentoso,
E choro o meu sonhar!
E fecho os olhos, e de novo intento
O sonho reatar.
Embalde! porque a vida me tem preso;
E eu sou escravo seu!
Acordado ou dormindo, é triste a vida
Dês que o amor se perdeu.
Há contudo prazer em nos lembrarmos
Da passada ventura,
Como o que educa flores vicejantes
Em triste sepultura.
Epicédio
Passa la bella donna e par che dorma.
- Tasso
Seu rosto pálido e belo
Já não tem vida nem cor!
Sobre ele a morte descansa,
Envolta em baço palor.
Cerraram-se olhos tão puros,
Que tinham tanto fulgor;
Coração que tanto amava
Já hoje não sente amor;
Que o anjo belo da morte
A par desse anjo baixou!
Trocaram brandas palavras,
Que Deus somente escutou.
Ventura, prazer, ledice
Duma outra vida contou;
E o anjo puro da terra
Prazer da terra enjeitou.
Depois co’as asas candentes
O formoso anjo do céu
Roçou-lhe a face mimosa,
Cobriu-lhe o rosto co’um véu.
Depois o corpo engraçado
Deixou à terra sem vida,
De tênue palor coberto,
- Verniz de estátua esquecida.
E bela assim, como um lírio
Murcho da sesta ao ardor,
Teve a inocência dos anjos,
Tendo o viver duma flor.
Foi breve! - mas a desgraça
A testa não lhe enrugou,
E aos pés do Deus que a crIara
Alma inda virgem levou.
Sai da larva a borboleta,
Sai da rocha o diamante,
De um cadáver mudo e frio
Sai uma alma radiante.
Não choremos essa morte,
Não choremos casos tais;
Quando a terra perde um justo,
Conta um anjo o céu de mais.
Sofrimento
Meu Deus, Senhor meu Deus, o que há no mundo
Que não seja sofrer?
O homem nasce, e vive um só instante,
E sofre até morrer!
A flor ao menos, nesse breve espaço
Do seu doce viver,
Encanta os ares com celeste aroma,
Querida até morrer.
É breve o romper d’alva, mas ao menos
Traz consigo prazer;
E o homem nasce e vive um só instante:
E sofre até morrer!
Meu peito de gemer já está cansado,
Meus olhos de chorar;
E eu sofro ainda, e já não posso alivio
Sequer no pranto achar!
Já farto de viver, em meia vida,
Quebrado pela dor,
Meus anos hei passado, uns após outros,
Sem paz e sem amor.
O amor que eu tanto amava do imo peito,
Que nunca pude achar,
Que embalde procurei, na flor, na planta,
No prado, e terra, e mar!
E agora o que sou eu? - Pálido espectro,
Que da campa fugiu;
Flor ceifada em botão; imagem triste
De um ente que existiu...
Não escutes, meu Deus, esta blasfêmia;
Perdão, Senhor, perdão!
Minha alma sinto ainda, - sinto, escuto
Bater-me o coração.
Quando roja meu corpo sobre a terra,
Quando me aflige a dor,
Minha alma aos céus se eleva, como o incenso,
Como o aroma da flor.
E eu bendigo o teu nome eterno e santo,
Bendigo a minha dor,
Que vai além da terra aos céus infindos
Prender-me ao criador.
Bendigo o nome teu, que uma outra vida
Me fez descortinar,
Uma outra vida, onde não há só trevas,
E nem há só penar.
terça-feira, 27 de maio de 2014
Dorothy Jansson Moretti (Baú de Trovas) 12
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Folclore Brasileiro (Mitos Indígenas) Igaranhã - a canoa encantada
Um índio da tribo Kamaiúra iniciou a construção de uma canoa com a casca do jatobá. Ao terminá-la retomou para junto de sua mulher, que há pouco dera à luz, permanecendo por alguns dias.
Algum tempo depois, voltando à mata onde havia deixado a canoa, não mais a encontrou. Entristeceu-se e, pensativo, tentou imaginar o que ocorrera. Talvez a tivessem roubado, ou algum animal a tivesse destruído. Como poderia pescar agora? Absorto, despertou com um ruído.
Foi grande o seu espanto ao perceber que em sua direção movimentava-se lentamente, por si mesma, uma canoa, a mesma que ele construíra, agora com vida e olhos na proa.
Talvez houvesse se transformado em um animal, pensou. Dar-lhe-ia então um nome: Igaranhã - o crocodilo. Entrou na canoa, ordenando-lhe que seguisse em direção ao lago.
Assim que Igaranhã tocou a água, cobriu-se com muitos peixes, dos mais variados tipos, cores e tamanhos, que saltavam sem cessar da água para dentro da embarcação.
Os primeiros, a própria canoa devorou, ficando no entanto a maior parte para o índio.
Á sua mulher, maravilhada, falou apenas de um lugar ideal para a pesca, que houvera encontrado.
Dias depois, retomando ao mesmo local, nada encontrou sob a frondosa árvore. Como por encanto a canoa surgiu novamente da mata, dirigindo-se ao lago e o fenômeno repetiu-se.
O índio ambicioso recolheu rapidamente os peixes, sem deixar à Igaranhã sua parcela do alimento. Esta então, muito contrariada, acabou por devorar seu próprio dono.
Fonte:
Jayhr Gael (Mitos indígenas). www.caminhodewicca.com.br
Algum tempo depois, voltando à mata onde havia deixado a canoa, não mais a encontrou. Entristeceu-se e, pensativo, tentou imaginar o que ocorrera. Talvez a tivessem roubado, ou algum animal a tivesse destruído. Como poderia pescar agora? Absorto, despertou com um ruído.
Foi grande o seu espanto ao perceber que em sua direção movimentava-se lentamente, por si mesma, uma canoa, a mesma que ele construíra, agora com vida e olhos na proa.
Talvez houvesse se transformado em um animal, pensou. Dar-lhe-ia então um nome: Igaranhã - o crocodilo. Entrou na canoa, ordenando-lhe que seguisse em direção ao lago.
Assim que Igaranhã tocou a água, cobriu-se com muitos peixes, dos mais variados tipos, cores e tamanhos, que saltavam sem cessar da água para dentro da embarcação.
Os primeiros, a própria canoa devorou, ficando no entanto a maior parte para o índio.
Á sua mulher, maravilhada, falou apenas de um lugar ideal para a pesca, que houvera encontrado.
Dias depois, retomando ao mesmo local, nada encontrou sob a frondosa árvore. Como por encanto a canoa surgiu novamente da mata, dirigindo-se ao lago e o fenômeno repetiu-se.
O índio ambicioso recolheu rapidamente os peixes, sem deixar à Igaranhã sua parcela do alimento. Esta então, muito contrariada, acabou por devorar seu próprio dono.
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Jayhr Gael (Mitos indígenas). www.caminhodewicca.com.br
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