segunda-feira, 31 de março de 2025

Olavo Bilac (O recruta)

Era um rapaz de vinte e dois anos, criado à solta, no campo. Desde pequenino, habituara-se à vida ao ar livre. Mal rompia a aurora, já ele andava, ao sol e à chuva, descalço, pulando e correndo, como cabrito montês. Aos oito anos, já montava em pelo os cavalos mais bravos. Com essa existência de exercícios fortes, fizera-se um colosso. Tinha a face corada, os cabelos negros e duros, uma musculatura possante, espáduas largas, pulso de abater um touro com um soco. 

Não aprendera a ler. Fora criado para, de enxada em punho, lutar com a terra, para lidar com os bois, para arcar com os trabalhos fortes da lavoura. Nada tinha de seu. 

O pai, ao morrer, deixara-lhe, como única herança, a saúde, a força e uma enxada. E era com isso que ele vivia, indo de roça em roça, à procura de emprego. E empregos nunca lhe faltavam, porque não havia, em toda aquela redondeza, quem com mais justiça ganhasse o pão de cada dia. Era sempre o primeiro a sair para o trabalho, e o último a recolher.

Nunca ninguém o vira triste. Com o grande chapéu desabado, atirado para a nuca, ou estivesse curvado sobre a terra cavando-a, ou pela estrada, ao sol ardente, viesse, de aguilhada em punho, guiando os bois morosos, — o Anselmo cantava sempre, com a sua larga voz alegre, que animava os companheiros, e tornava mais leve a canseira da tarefa. Os velhos, quando o viam passar, perguntavam sempre:

“Como vai essa mocidade, Anselmo?” E não havia quem não o amasse.

Também, não tinha dinheiro junto. O que ganhava gastava. Ninguém como ele sabia, nas noites de festa, tirar da viola as modinhas ternas. E era feliz, sem ambições, contentando-se com tão pouco.

Quando chegou ao sertão a notícia da guerra do Paraguai, o terror ganhou toda aquela gente simples, para quem o mundo se limitava àquelas léguas de terra, de cujos limites nunca havia saído. O recrutamento! — falava-se nisso, como na morte, com espanto e medo.

Dizia-se que ninguém seria recrutado. Mas a alma desconfiada do caipira bem adivinhava que essa declaração das autoridades era uma astúcia... Soube-se um dia que chegara ao lugar um destacamento de soldados, comandados por um cabo. Houve quem fugisse. Anselmo não fugiu. Mas quando se viu recrutado, um desespero terrível lhe encheu o coração.

Não era covarde! Muitas e muitas vezes ele, sozinho, lutara contra dois e três... nas brigas de arraial, nunca fugira das facas, que alumiavam na escuridão. Não sabia de perigo que o amedrontasse. E costumava dizer que só tinha medo de si mesmo, daquele gênio arrebatado, que não aturava afrontas. Não era covarde, não: o que o desesperava era o abandono forçado daquela existência, em que nascera e crescera, o apartamento daqueles lugares amados, daquele trabalho que era um hábito velho, daquela gente toda que era a sua família, a sua gente, o seu povo.

Para a sua alma inculta e primitiva de filho da roça, a Pátria não era o Brasil: era o pedaço de terra que ele regava com o suor de seu rosto. Fora daquilo não havia mais nada. Que tinha ele com o resto do mundo? Por que havia ele de vestir uma farda, e ir morrer abandonado e desconhecido, sem uma amizade, sem uma simpatia, numa terra estrangeira, por causa de gente que nunca vira, por causa de questões que não entendia e que não eram suas?

Nunca saíra do seu sertão. Aos vinte e dois anos, ainda não imaginava o que seria o mar. Se os paraguaios viessem até suas roças, então sim: ele e os outros saberiam repelir os invasores; seria o seu dever, a defesa do seu ganha-pão, do seu trabalho, dos seus hábitos. Mas, ir defender a Corte, ir defender o Sul, ir defender o Imperador!... que tinha ele com tudo isso?

Todas essas reflexões lhe passavam pela cabeça, à noite, recolhido, com uma dúzia de outros, à cadeia do lugar, como se fosse um criminoso... e já, antes de partir, tinha saudades daquele céu querido, daqueles matos tão conhecidos, daquela gente com quem se criara. E tinha medo, — tinha medo, ele tão valente! — de morrer crivado de balas paraguaias, longe dos seus... depois, ao seu caráter independente, à sua alma livre repugnava a escravidão da vida militar. Não ter vontade própria, ser governado com uma máquina, caminhar para a morte ao simples aceno de um chefe, sem ver a utilidade desse sacrifício, — tudo lhe parecia uma grande desgraça e uma terrível injustiça.

No dia seguinte os recrutas seguiram para o Rio de Janeiro. Havia pressa. A guerra ia acesa ao Sul, e o Brasil precisava das vidas de todos os seus filhos. Os companheiros de Anselmo iam, como ele, com a alma enlutada de tristeza. Também como ele, não compreendiam a violência do recrutamento, nem reconheciam à Pátria o direito de assim se apoderar da sua mocidade, para a atirar aos horrores do campo de batalha.

Triste viagem! Alguns, homens feitos, robustos e valentes, choravam como crianças. A gente do lugar assistiu à partida.

Havia mães que amaldiçoavam a guerra, gritando, torcendo os braços desesperadamente. Havia noivas que desmaiavam. Quantos daqueles voltariam?...

A chegada ao Rio de Janeiro foi uma tortura. Os recrutas estavam tontos, com aquele barulho, com aquele movimento. Como estava longe a tranquilidade da vida rústica! E que rigor, e que tormento no quartel! Na primeira noite, quando se viu, já fardado, estendido sobre a dura tábua da tarimba, Anselmo teve uma revolta.

Sentiu desejos de fugir dali, ainda que para isso fosse preciso matar alguém. Agitava-se, sacudia-se, mordia os pulsos, afogava na garganta os gritos de cólera e as imprecações. Por fim, essa crise terminou por um choro convulsivo. Dormiu, cansado: e ainda era noite escura, quando o acordou um toque de clarim. Era a hora do primeiro exercício.

Começou então a sua aprendizagem militar. O oficial inferior, que comandava as manobras, era brutal. A sua voz tinha asperezas que ofendiam como bofetadas. Quando um dos recrutas errava, dizia-lhe palavras duras, insultos pesados. Uma vez, como Anselmo não o ouvisse, porque estava pensando na sua roça tão calma e tão bonita a essa hora de sol ardente, o oficial deu-lhe no peito, com a folha da espada, uma pranchada forte. O rapaz sentiu o sangue subir à cabeça. Mas a infelicidade já o tornara submisso. Conteve-se, e obedeceu.

Já no terceiro dia, porém, sentiu-se mais resignado com a sua sorte. Familiarizara-se com os exercícios. Já se ia habitando ao rigor da disciplina. Já se interessava pelas manobras. Já prestava atenção às vozes de comando. Já ia compreendendo que, sem a brutalidade do comandante, nada se poderia conseguir de homens como ele, que nunca tinham visto aquilo, e cuja inteligência era refratária à compreensão daquelas palavras e daqueles movimentos calculados.

Depois, no quartel, começou a conviver com os soldados antigos. Tomou parte nas conversas, que se tratavam no “corpo da guarda”. E principiou a operar-se no seu espírito uma transformação radical. A convivência fazia-o sentir por aqueles homens um afeto de irmão. E tanto ouvia amaldiçoar os paraguaios, que principiou a amaldiçoá-los também, odiando-os de longe. Via agora bem o engano em que estava, quando acreditava que a Pátria era o seu sertão, e nada mais. Aqui, tão longe do sertão, vinha achar o mesmo céu, a mesma língua, quase os mesmos costumes. Em torno dele, só se falava na guerra. Lopes era odiado. Lopes aparecia aos seus olhos como um monstro, cuja única ocupação era matar e torturar os brasileiros. E um dia, Anselmo surpreendeu-se a dizer, com os olhos brilhantes de ódio: “Ah! Quando chegará o dia de irmos dar cabo daquele malvado!...”

O dia chegou. O seu batalhão ia partir. Dia de sol. Ninguém reconheceria naquele esbelto moço que ali ia, marchando com garbo entre os outros, o bisonho caipira, que tanta repugnância tinha outrora pelas coisas da guerra.

Anselmo marchava. E, ao compasso da marcha, ia cantando baixinho, entre dentes, uma daquelas mesmas alegres modinhas da roça, que a sua voz soltava na imensa extensão dos campos, quando, curvado sobre a terra, a cavava, ou quando, pela estrada ao sol ardente, vinha, com a aguilhada ao ombro, guiando os bois morosos.

As ruas estavam cheias de povo. Das janelas, senhoras acenavam com os lenços. Uma banda de música precedia o batalhão. Tocava uma marcha de guerra. Os instrumentos de metal giravam alto, entre as pancadas secas dos tambores. Que sol! Que entusiasmo! Anselmo tremia. Parecia-lhe que o inimigo estava ali perto, ao alcance da sua espingarda: parecia-lhe que ia encontrar, ao dobrar uma esquina, os exércitos paraguaios. E ambicionava cair imediatamente em pleno combate.

No cais, a multidão abria alas. E quando o batalhão estacou, quando se calou a música, o povo prorrompeu em vivas. À espera, perfilados, muitos oficiais, cujas fardas, cobertas de galões, brilhavam ao sol, examinavam a tropa disciplinada, bem disposta, garbosa no seu fardamento novo. De repente, a música tocou os primeiros compassos do hino nacional. Um vento brando, vindo do mar, agitou a bandeira brasileira, que estava no centro do pelotão. A bandeira desdobrou-se, palpitou no ar, espalmada, com um meneio triunfal. Parecia que o símbolo da Pátria abençoava os filhos que iam partir, para defendê-la.

E, então, ali, a ideia sagrada da Pátria se apresentou, nítida e bela, diante da alma de Anselmo. E ele, compreendendo enfim que a sua vida valia menos que a honra da sua nação, pediu a Deus, com os olhos cheios de lágrimas, que o fizesse um dia morrer gloriosamente, abraçado às dobras daquela formosa bandeira, toda verde e dourada, verde como os campos, dourada como as madrugadas da sua terra.
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Olavo Bilac, nasceu em 1865, no Rio de Janeiro/RJ. Cursou Medicina, abandonou o curso, tentou estudar Direito, também não concluiu, e passou a escrever para jornais cariocas. Em 1888, publicou seu primeiro livro - Poesias. No entanto, Bilac era firme em seus posicionamentos políticos e discordava do governo de Floriano Peixoto. Por fazer críticas a ele, foi preso em 1892 e também em 1894. O início do regime republicano, portanto, não foi muito agradável para o poeta. Em 1897, fundou, com outros intelectuais, a Academia Brasileira de Letras e ocupou a cadeira de número 15, cujo patrono é o escritor romântico Gonçalves Dias. No ano seguinte, passou a trabalhar como inspetor escolar. A partir daí, o escritor empreendeu uma campanha em prol do nacionalismo, e, inclusive, escreveu a letra do Hino à Bandeira, além de ter defendido o serviço militar obrigatório. Morreu em 1918, no Rio de Janeiro, deixando certo mistério sobre sua vida íntima. Nunca se casou. Um poeta parnasiano, crítico e nacionalista, mas, ao mesmo tempo, boêmio e libertário. Um homem rigoroso e prático, mas que tinha, possivelmente, uma alma romântica. Enfim, um indivíduo complexo, detentor de uma genialidade que o consagrou como Príncipe dos Poetas.
 
Fontes:
Olavo Bilac e Coelho Neto. Contos pátrios para crianças. Publicado originalmente em 1931. Disponível em Domínio Público. 
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domingo, 30 de março de 2025

Adega de Versos 144: Eritânia Brunoro

 

Arthur Thomas (Floriswalêne)

Florisvaldo encontrou Waldêlene em um forró na casa de amigos. E logo a conheceu, no sentido bíblico da palavra, resultando em uma “inesperada” gravidez.

Ainda como zigoto, nossa heroína iniciou as orações, pressentindo o perigo do nome que lhe seria dado.

Infrutíferas rezas, pois ao nascer, registraram-na com o singelo nome de Floriswalêne.

Começou, então, o suplício em sua vida.

Desde pequena, tentou que a chamassem de Flor, mas a maldade dos colegas de escola não deixava.

Parecia terem prazer em realçar cada sílaba de seu nome.

Em todas as chamadas para verificar a presença dos alunos, no início das aulas, era vítima da zombaria dos colegas.

Passou a adolescência pensando que deveria encontrar um par que tivesse um nome simples e que não quisesse colocar nome composto nos filhos.

Antes mesmo de se aproximar de um rapaz, procurava saber seu nome.

Rejeitou alguns pretendentes, que eram até bonitos e interessantes, mas que tinham nomes como: Devernilson, Everalderson, Marcelinelson, Wellerson, Genilteleson e tantos outros.

Ficava horrorizada somente com a ideia de ter um filho ou filha com nomes estapafúrdios.

Através de uma tia, conheceu um rapaz muito tímido, nem um pouco bonito, mas trabalhador, e o principal para ela, era conhecido pelo apelido Zé.

Encantou-se quando o rapaz a chamou de Flor, mesmo sabendo que o nome dela era Floriswalêne.

Pensando ter encontrado o par quase perfeito, namorou, noivou e marcou a data do almejado casamento.

No dia da união, no cartório, o noivo declarou seu nome como Josevertson de Souza, e como prova de amor, após assinar o livro, disse à ela e às testemunhas que os filhos seriam batizados com a junção dos nomes do casal, para eternizar o amor dos dois.

Floriswalêne teve que ser amparada pelos parentes e atendida na unidade de emergência do hospital mais próximo.

Josevertson nunca entendeu o motivo do pedido de anulação do casamento.
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ARTHUR THOMAZ é natural de Campinas/SP. Segundo Tenente da Reserva do Exército Brasileiro e médico anestesista, aposentado. Poeta e escritor, publicou os livros: "Rimando Ilusões", "Leves Contos ao Léu - Volume I, "Leves Contos ao Léu Mirabolantes - Volume II", "Leves Contos ao Léu - Imponderáveis", "Leves Aventuras ao Léu: O Mistério da Princesa dos Rios", "Leves Contos ao Léu - Insondáveis", "Rimando Sonhos" e "Leves Romances ao Léu: Pedro Centauro".

Fontes:
Arthur Thomaz. Leves contos ao léu: insondáveis. 1. ed. Santos/SP: Bueno Editora, 2024. Enviado pelo autor 
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Vereda da Poesia = 237


Soneto de
CAROLINA RAMOS
Santos/SP

O SABER

O saber, que arrebata e que mantém ativo
o lampejo do gênio e a fluência da história,
abre portas e as fecha, em rigor decisivo,
soberano senhor das chaves da memória.

Esse mesmo saber pode tornar cativo
o incauto que se ilude às promessas de glória
e, a erguer-se em pedestal, não mais que tolo altivo,
permite que a soberba o enleie compulsória!

Ao ver tombar ao chão seus castelos e aprumos,
na busca ao próprio eu, o homem se desengana
a revelar-se anão de limitados rumos!

Sem saber de onde vem, sequer sabe quem é!...
- Toda arrogância vã, toda a vaidade humana,
desmoronam aos pés, humílimos, da Fé!
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Poema de 
ANTONIO JURACI SIQUEIRA
Belém/PA

Há horas que o homem deve
estar só com seus consigos;
outras vezes quer chamego
quer ombros, braços, abrigos…
Deve, pois, ser uma ilha
cercada de… mil amigos!
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Quadra Popular de
AUTOR ANÔNIMO

Você ontem me falou
que não anda, não passeia,
como é que hoje cedinho
eu vi seu rasto na areia?
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Soneto de
VINICIUS DE MORAES
Rio de Janeiro/RJ, 1913 – 1980

Soneto a Quatro Mãos

Tudo de amor que existe em mim foi dado
Tudo que fala em mim de amor foi dito
Do nada em mim o amor fez o infinito
Que por muito tornou-me escravizado.

Tão pródigo de amor fiquei coitado
Tão fácil para amar fiquei proscrito
Cada voto que fiz ergueu-se em grito
Contra o meu próprio dar demasiado.

Tenho dado de amor mais que coubesse
Nesse meu pobre coração humano
Desse eterno amor meu antes não desse.

Pois se por tanto dar me fiz engano
Melhor fora que desse e recebesse
Para viver da vida o amor sem dano.
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Poema de
CASTRO ALVES
Freguesia de Muritiba (hoje, Castro Alves)/BA (1847 – 1871) Salvador/BA

Aqui, onde o talento verdadeiro
Não nega o povo o merecido preito;
Aqui onde no público respeito
Se conquista o brasão mais lisonjeiro.

Aqui onde o gênio sobranceiro
E, de torpes calúnias, ao efeito,
Jesuína, dos zoilos* a despeito,
És tu que ocupas o lugar primeiro!

Repara como o povo te festeja...
Vê como em teu favor se manifesta,
Mau grado a mão, que, oculta, te apedreja!

Fazes bem desprezar quem te molesta;
Ser indif'rente ao regougar** da inveja,
"Das almas grandes a nobreza é esta."
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* zoilos = críticos invejosos, apaixonados.
** regougar = resmungar.
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Soneto de
MARTINS FONTES
Santos/SP, 1884 – 1937

Crepúsculo

Alada, corta o espaço uma estrela cadente.
As folhas fremem. Sopra o vento. A sombra avança.
Paira no ar um langor de mística esperança
e de doçura triste, inexprimivelmente.

À surdina da luz irrompe, de repente,
o coro vesperal das cigarras. E mansa,
E marmórea, no céu, curvo e claro, balança,
entre nuvens de opala, a concha do crescente.

Na alma, como na terra, a noite nasce. É quando,
da recôndita paz das horas esquecidas,
vão, ao luar da saudade, os sonhos acordando...

E, na torre do peito, em plácidas batidas,
melancolicamente o coração chorando,
plange o réquiem de amor das ilusões perdidas.
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Haicai do
PROFESSOR GARCIA
Caicó/RN

Minha mãe, de joelhos,
com o velho terço entre os dedos,
pede a Deus, conselhos!
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Soneto de
DOMINGOS FREIRE CARDOSO
Ilhavo/ Portugal

Enerva-me esta chuva impertinente
(Fernandes Valente Sobrinho in "Poemas Escolhidos", p. 127)

Enerva-me esta chuva impertinente
Que tomba lá dos céus feitos de breu
E as gotas são o pranto que nasceu
De nuvens que tivessem dor de gente.

O vento ainda faz mais repelente
Cada pingo que o meu rosto ofendeu
Lágrima que do ar se desprendeu
Como um cristal da mágoa que alguém sente.

A chuva tudo alaga, tudo invade
Deixando o fino véu dessa umidade
Caído pelo chão, pênsil dos ramos.

E sobe uma revolta ao meu olhar;
Por que há de a Natureza assim chorar
Do modo como nós também choramos?
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Poema de
MACHADO DE ASSIS 
Rio de Janeiro/RJ, 1839 – 1908

GONÇALVES CRESPO

Esta musa da pátria, esta saudosa
Níobe dolorida,
Esquece acaso a vida,
Mas não esquece a morte gloriosa.

E pálida, e chorosa,
Ao Tejo voa, onde no chão caída
Jaz aquela evadida
Lira da nossa América viçosa.

Com ela torna, e, dividindo os ares,
Trépido, mole, doce movimento
Sente nas frouxas cordas singulares.

Não é a asa do vento,
Mas a sombra do filho, no momento
De entrar perpetuamente os pátrios lares.
= = = = = = 

Poemeto de
SOLANGE COLOMBARA
São Paulo/SP

Um olhar pode eternizar um momento
mas uma noite não dura para sempre.
Um sorriso às vezes é aconchego, ou
pode ser um retrospecto, um lamento.
Mas na noite... O sonho torna-se cura.
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Soneto de
FILEMON MARTINS
São Paulo/ SP

MUDANÇA DE RUMO

Não consigo entender tua procura
e essa corrida que não tem descanso,
se a vida foi madrasta, triste e dura,
melhor é procurar outro remanso.

Às vezes, o capricho é uma loucura,
não traz felicidade nem avanço
na procura da Paz e da Ventura,
o Amor fala mais alto, embora manso.

Por que buscar carinho na incerteza,
se aqui mesmo tens luz e tens beleza
que podem transformar o teu desejo?

É melhor prosseguir naquela estrada
onde a felicidade fez morada
e estará te esperando com um beijo.
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Poema de
CÉLIA EVARISTO
Lisboa/ Portugal

MAIS

O teu coração nunca me amou,
o teu olhar nunca me encontrou.
E as vezes em que a tua pele a minha tocou,
foram vezes vazias, 
de ti nada ficou…

E eu queria receber mais, 
apenas uma réstia
do que sempre te dei.

As horas, os minutos e os segundos,
o tempo que te dediquei,
deitaste fora sem pensar
que me poderias magoar.

Dei-te o que nunca tive em troca,
porque quem ama
também espera ser amado.
Mas em vez de amor
recebi a dor 
de um ser abandonado.

E eu queria receber mais, 
apenas uma réstia
do que sempre te dei.

Os passos lentos que davas
quando eu corria
e caía nos teus braços.
Sorria-te,
ignoravas-me.

Pedia-te tempo,
dizias ter pressa.
E a cada momento
uma promessa.

E eu queria receber mais, 
apenas uma réstia
do que sempre te dei.

Nunca soubeste o que era o amor.
A vida, para ti, sempre foi fugaz,
intensa de coisas banais.
Nunca perdeste o teu tempo
para ser mais.
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Poema de
SILMAR BOHRER
Caçador/SC

LÁGRIMAS
         
 A nossa vida é um padecer incessante.
Em cada lágrima um mistério profundo
verte nos olhos o tormento constante
que aflige a alma humana neste mundo.

Em cada lágrima sangra com ardimento
a ferida duma paixão que silenciamos
e escorre da intimidade o sofrimento
pelo delírio do amor que alimentamos.

Em cada lágrima vivemos a desventura
dum adeus tristonho e o mais sagrado
anseio da volta esperada com ternura.

Em cada lágrima existe uma constância
a instruir que só após termos chorado
aprendemos a ver melhor uma distância.
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Poeminha de
A. A. DE ASSIS
Maringá/PR

Ostras
e palavras.
Conteúdo:
pérolas.
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Soneto de
JÉRSON BRITO
Porto Velho/ RO

O CÁLICE

As madrugadas atravesso em claro
Tendo este cálice por companhia,
Sorvo d'angústia o paladar amaro,
Nada mais fulge, nada me alumia.

Quanto negrume verte meu suspiro,
Essa lembrança, quando vem, magoa,
Nenhum alento no horizonte miro,
Somente um brado lastimoso ecoa.

Devaneando nest'alcova escura
Vejo-me à beira dum abismo fero.
Nem mesmo estrelas tem o céu... Nem lua!

A dor me cinge e se tornou clausura,
Se regressares, meu amor, espero
Embebedar-me da meiguice tua.
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Poetrix de
TASSO ROSSI
Porto Velho/RO

GEOMÉTRICA MENTE

tuas curvas,
meus planos…
tangentes.
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Poema de
RITA MOURÃO
Ribeirão Preto/SP

EU E O TEMPO

Nos meus poemas faço uma profunda reflexão
sobre  o  sentido da vida.
Vivi, vivo, sofro e faço versos.
Mas a vida engole com sofreguidão as minhas rimas,
as  minhas  metáforas,  meus  tempos  verbais,
que  tanto  sustentaram  meus quereres.
 E meus poemas já pedem escoras.
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Soneto de
LUIZ POETA
(Luiz Gilberto de Barros)
Rio de Janeiro/RJ

ANTES DE NÓS

Quando eu partir para o destino derradeiro
Irá  comigo, o amigo que... ficar
e eu dormirei dentro da luz do seu olhar 
mais fraternal, mais luminoso e prazenteiro.

Ele há  de rir, sorrir, cantar o que eu cantei,
lembrar-se-á até  das minhas gargalhadas,
remoerá, com alegria, as piadas
que me contou e que eu também já lhe contei.

Se ele se for antes de mim, hei de guardá-lo 
no coração, porque a bênção  fraternal
que há em nós há de fazer-me preservá-lo 

e preservar- me dentro do seu coração, 
porque o amor que torna o outro tão  igual. 
sempre abençoa quem foi verdadeiro irmão.
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Poema de
J. G. DE ARAÚJO JORGE
Tarauacá/AC (1914 – 1987) Rio de Janeiro/RJ

A ESPERA

Ela tarda... E eu me sinto inquieto, quando
julgo vê-la surgir, num vulto, adiante,
- os lábios frios, trêmula e ofegante,
os seus olhos nos meus, linda, fitando...

O céu desfaz-se em luar... Um vento brando
nas folhagens cicia, acariciante,
enquanto com o olhar terno de amante
fico à sombra da noite perscrutando...

E ela não vem...Aumenta-me a ansiedade:
- o segundo que passa e me tortura,
é o segundo sem fim da eternidade...

Mas eis que ela aparece de repente!...
- E eu feliz, chego a crer que igual ventura
bem valia esperar-se eternamente!...
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Soneto de
ÓGUI LOURENÇO MAURI
Catanduva/SP

BEIJOS DE VERDADE
(Anadiplose*)

Verdade! Beijos poéticos, dei!...
Dei no rosto, com afeto e carinho.
Carinho à cova dos seios, sonhei;
Sonhei e me deliciei de mansinho.

De mansinho, fui; te beijei na nuca;
Na nuca, sempre pensei te beijar.
Beijar devagar, te deixar maluca;
Maluca, enfim, sem poder disfarçar.

Disfarçar, nunca foi, aliás, teu forte.
Forte é, mesmo, o amor que sinto por ti.
Por ti, faço tudo, busco meu norte.
Meu norte é teu rumo, eu não desisti.

Eu não desisti de abraçar-te ao vivo.
Ao vivo, em cores, sentir teu calor.
Calor presente, eis um forte motivo.
Motivo que sublima nosso amor.

Amor tão sofrido alimenta os sonhos.
Sonhos tais de te abraçar à vontade...
Vontade de ver teus lábios risonhos.
Risonhos, para beijos de verdade!
_____________________________
(*) - Figura de linguagem que consiste na repetição da palavra (ou últimas  palavras) de um verso (frase) como palavra(s) inicial(ais) do verso seguinte.
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Soneto de
EDY SOARES
Vila Velha/ES

ANJOS E DEMÔNIOS

Se acaso ainda sofre, noite afora,
em sua infinitude mal dormida;
se a insônia, em noites tristes, apavora
e o pranto ainda inunda a sua vida...

Talvez seja o momento, então, querida,
de ponderar que enquanto você chora 
minha alma, aqui, também está sofrida
e a dor da despedida me devora.

Bem sei que tenho em mim algum defeito
mas nem por isso a vejo no direito
de impor a culpa inteira a mim somente.

Nenhum de nós é santo ou pecador,
mas creio que erra ainda mais, amor,
não assumindo o que deveras sente!...
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Poema de
CECÍLIA MEIRELES
Rio de Janeiro RJ, 1901-1964

ALVA

Deixei meus olhos sozinhos
nos degraus da sua porta.
Minha boca anda cantando,
mas todo o mundo está vendo
que a minha vida está morta.

Seu rosto nasceu das ondas
e em sua boca há uma estrela.
Minha mão viveu mil vidas
para uma noite encontrá-la
e noutra noite perdê-la.

Caminhei tantos caminhos,
tanto tempo e não sabia
como era fácil a morte
pela seta do silêncio
no sangue de uma alegria.

Seus olhos andam cobertos
de cores da primavera.
Pelos muros de seu peito,
durante inúteis vigílias,
desenhei meus sonhos de hera.

Desenho, apenas, do tempo,
cada dia mais profundo,
roteiro do pensamento,
saudade das esperanças
quando se acabar o mundo…
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Lima Barreto (Os nossos jornais)

Na Câmara (houve um jornal que registrasse a frase) o senhor Jaurès observou que os nossos jornais eram pobres no tocante a informações da vida do estrangeiro. Afora os telegramas lacônicos naturalmente, ele não encontrava nada que o satisfizesse.

Jaurès não disse que fosse esse o único defeito dos nossos jornais; quis tão somente mostrar um deles.

Se ele quisesse demorar no exame, diretor de um grande jornal, como é e, habituado à grande imprensa do velho mundo, havia de apresentar muitos outros.

Mesmo quem não é diretor de um jornal parisiense e não está habituado à imprensa europeia, pode, do pé para as mãos, indicar muitos.

Os nossos jornais diários têm de mais e têm de menos; têm lacunas e demasias.

Uma grande parte deles é ocupada com insignificantes notícias oficiais.

Há longas seções sobre exército, marinha, estradas de ferro, alfândega, etc. de nenhum interesse, ou melhor, se há nelas interesse, toca a um número tão restrito de leitores que não vale a pena sacrificar os outros, mantendo-as.

Que me importa a mim saber quem é o conferente do armazém K? Um jornal que tem dez mil leitores, unicamente para atender ao interesse de meia dúzia, deve estar a publicar que foram concedidos passes à filha do bagageiro X? Decerto, não. Quem quer saber essas coisas, dirija-se às publicações oficiais ou vá à repartição competente, informar-se.

A reportagem de ministérios é de uma indigência desoladora. Não há mais nada que extratos do expediente; e o que se devia esperar de propriamente reportagem, isto é, descoberta de atos premeditados, de medidas em que os governantes estejam pensando, enfim, antecipações ao próprio diário do senhor Calino, não se encontra.

Demais, não está aí só, o emprego inútil que os nossos jornais fazem de um espaço precioso. Há mais ainda. Há os idiotas “binóculos”. Longe de mim o pensamento de estender o adjetivo da seção aos autores. Sei bem que alguns deles que o não são; mas a coisa o é, talvez com plena intenção dos seus criadores. Mas... continuemos. Não se compreende que um jornal de uma grande cidade esteja a ensinar às damas e aos cavalheiros como devem trazer as luvas, como devem cumprimentar e outras futilidades. Se há entre nós, sociedade, as damas e cavalheiros devem saber estas coisas e quem não sabe faça como M. Jourdain: tome professores. Não há de ser com preceitos escorridos diariamente, sem ordem, nem nexo – que um acanhado fazendeiro há de se improvisar em Caxangá. Se o matuto quer imiscuir-se na sociedade que tem para romancista o psiquiatra Afrânio, procure professores de boas maneiras, e não os há de faltar. Estou quase a indicar o próprio Figueiredo, o Caxangá ou o meu amigo Marques Pinheiro e talvez o Bueno, se ele não andasse agora metido em coisas acadêmicas.

De resto, esses binóculos, gritando bem alto elementares preceitos de civilidade, nos envergonham. Que dirão os estrangeiros, vendo, pelos nossos jornais, que não sabemos abotoar um sapato ? Não há de ser bem; e o senhor Gastão da Cunha, o Chamfort oral que nos chegou do Paraguai e vai para a Dinamarca, deve examinar bem esse aspecto da questão, já que se zangou tanto com o interessante Afrânio, por ter dito, diante de estrangeiros, na sua recepção na Academia, um punhado de verdades amargas sobre a diligência de Canudos.

Existe, a tomar espaço nos nossos jornais, uma outra bobagem. Além desses binóculos, há uns tais diários sociais, vidas sociais, etc. Em alguns tomam colunas, e, às vezes, páginas. Aqui nesta Gazeta, ocupa, quase sempre duas e três.

Mas, isso é querer empregar espaço em pura perda. Tipos ricos e pobres, néscios e sábios, julgam que as suas festas íntimas ou os seus lutos têm um grande interesse para todo o mundo. Sei bem o que é que se visa com isso: agradar, captar o níquel, com esse meio infalível: o nome no jornal.

Mas, para serem lógicos com eles mesmo, os jornais deviam transformar-se em registros de nomes próprios, pois só os pondo aos milheiros é que teriam uma venda compensadora. A coisa devia ser paga e estou certo que os tais diários não desapareceriam.

Além disso, os nossos jornais ainda dão muita importância aos fatos policiais. Dias há que parecem uma morgue, tal é o número de fotografias de cadáveres que estampam; e não ocorre um incêndio vagabundo que não mereça as famosas três colunas – padrão de reportagem inteligente. Não são bem “Gazetas” dos Tribunais, mas, já são um pouco Gazetas do Crime e muito Gazetas Policiais.

A não ser isso, eles desprezam tudo o mais que forma a base da grande imprensa estrangeira. Não há as informações internacionais, não há os furos sensacionais na política, nas letras e na administração. A colaboração é uma miséria.

Excetuando A Imprensa, que tem a sua frente o grande espírito de Alcindo Guanabara, e um pouco O Pal, os nossos jornais da manhã nada têm que se ler. Quando excetuei esses dois, decerto, punha hors-concours o velho Jornal do Comércio; e dos dois, talvez, só a Imprensa seja exceção, porque a colaboração de O Paiz é obtida entre autores portugueses, fato que pouco deve interessar à nossa atividade literária.

A Gazeta (quem te viu e quem te vê) só merece ser aqui falada porque seria injusto esquecer o Raul Manso. Mas, está tão só! E não se diga que eles não ganham dinheiro e, tanto ganham que os seus diretores vivem na Europa ou levam no Rio trem de vida nababesco.

É que, em geral, não querem pagar a colaboração; e, quando a pagam, fazem-no forçados por empenhos, ou obrigados pela necessidade de agradar a colônia portuguesa, em se tratando de escritores lusos.

E por falar nisso, vale a pena lembrar o que são as correspondências portuguesas para os nossos jornais. Não se encontram nelas indicações sobre a vida política, mental ou social de Portugal; mas, não será surpresa ver-se nelas notícias edificantes como esta: “A vaca do Zé das Amêndoas, pariu ontem uma novilha”; “o Manuel das Abelhas foi, trasanteontem, mordido por um enxame de vespas”.

As dos outros países não são assim tão pitorescas; mas chegam, quando as há, pelo laconismo, a parecer telegrafia.

Então o inefável Xavier de Carvalho é mestre na coisa, desde que não se trate de festas da famosa Societé d’Études Portugaises!

Os jornais da tarde não são lá muito melhores. A Notícia faz repousar o interesse da sua leitura na insipidez dos Pequenos Ecos e na graça – gênero Moça de Família do amável Antônio. Unicamente o Jornal do Comércio e esta Gazeta procuram sair fora do molde comum, graças ao alto descortino do Félix e a experiência jornalística do Vítor.

Seria tolice exigir que os jornais fossem revistas literárias, mas, isto de jornal sem folhetins, sem crônicas, sem artigos, sem comentários, sem informações, sem curiosidades, não se compreende absolutamente.

São tão baldos de informações que, por eles, nenhum de nós tem a mais ligeira notícia da vida dos estados. Continua do lado de fora o velho Jornal do Comércio.

Coisas da própria vida da cidade não são tratadas convenientemente. Em matéria de tribunais, são de uma parcimônia desdenhosa. O júri, por exemplo, que, nas mãos de um jornalista hábil, podia dar uma seção interessante, por ser tão grotesco, tão característico e inédito, nem mesmo nos seus dias solenes é tratado com habilidade.

Há alguns que têm o luxo de uma crônica judiciária, mas, o escrito sai tão profundamente jurista que não pode interessar os profanos. Quem conhece as crônicas judiciárias de Henri de Varennes, no Fígaro, tem pena que não apareça um discípulo dele nos nossos jornais.

Aos apanhados dos debates da Câmara e do Senado podia dar-se mais cor e fisionomia, os aspectos e as particularidades do recinto e dependências não deviam ser abandonados.

Há muito que suprimir nos nossos jornais e há muito que criar. O senhor Jaurès mostrou um dos defeitos dos nossos jornais e eu pretendi indicar alguns. Não estou certo de que, suprimidos eles, os jornais possam ter a venda decuplicada. O povo é conservador, mas não foi nunca contando com a adesão imediata do povo que se fizeram revoluções.

Não aconselho a ninguém que faça uma transformação no nosso jornalismo. Talvez fosse mal sucedido e talvez fosse bem, como foi Ferreira de Araújo, quando fundou, há quase quarenta anos, a Gazeta de Noticias. Se pudesse, tentava; mas como não posso, limito-me a clamar, a criticar.

Fico aqui e vou ler os jornais. Cá tenho o Binóculo, que me aconselha a usar o chapéu na cabeça e as botas nos pés. Continuo a leitura. A famosa seção não abandona os conselhos. Tenho mais este: as damas não devem vir com toaletes luxuosas para a Rua do Ouvidor. Engraçado esse Binóculo! Não quer toaletes luxuosas nas ruas, mas ao mesmo tempo descreve essas toaletes. Se elas não fossem luxuosas haveria margem para as descrições? O Binóculo não é lá muito lógico...

Bem. Tomo outro. É o Correio da Manhã. Temos aqui uma seção interessante: “O que vai pelo mundo”. Vou ter notícias da França, do Japão, da África do Sul, penso eu. Leio de fio a pavio. Qual nada! O mundo aí é Portugal só e unicamente Portugal. Com certeza, foi a república recentemente proclamada, que o fez crescer tanto. Bendita república!

Fez mais que o Albuquerque terríbil e Castro forte e outros em quem poder não teve a morte.
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AFONSO HENRIQUES DE LIMA BARRETO nasceu em 1881, na cidade do Rio de Janeiro. Era negro e de família pobre. Sua mãe era professora primária e morreu de tuberculose quando Lima Barreto tinha 6 anos. Seu pai era tipógrafo, porém sofria de doença mental. Mas tinha um padrinho com posses - o Visconde de Ouro Preto (1836-1912) -, o que permitiu que o escritor estudasse no Colégio Pedro II. Depois, ingressou na Escola Politécnica, mas não concluiu o curso de Engenharia, pois precisava trabalhar. Em 1903, fez concurso e foi aprovado para atuar junto  à Diretoria do Expediente da Secretaria da Guerra. Assim, concomitantemente ao trabalho como funcionário público, escrevia os seus textos literários.  Em 1905, trabalhou como jornalista no Correio da Manhã. Lançou, em 1907, a revista Floreal. Em 1909, o seu primeiro romance foi editado em Portugal: Recordações do escrivão Isaías Caminha. O romance Triste fim de Policarpo Quaresma foi publicado, pela primeira vez, em 1911, no Jornal do Comércio, em forma de folhetim. Em 1914, Lima Barreto foi internado em um hospital psiquiátrico pela primeira vez. Se candidatou três vezes a uma vaga na Academia Brasileira de Letras, recebeu dela, apenas uma menção honrosa em 1921. Morreu em 1922.

Fonte:
Publicado na Gazeta da Tarde, Rio de Janeiro, em 20 outubro 1911. Disponível em Domínio Público.  
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