Marcadores
- Dicas de escrita (27)
- Florilégio de Trovas (2112)
- Panaceia de Textos (5950)
- Sopa de Letras (1566)
- Versejando (121)
Marcadores
- Vereda da Poesia (206)
- Canções Antigas (175)
- Meus manuscritos (123)
- Trovas em preto & branco (30)
- meus versos (17)
Marcadores
- Contos e Lendas do Mundo (854)
- Estante de Livros (794)
- mensagem na garrafa (137)
- Universos Di Versos (3842)
- Varal de Trovas (545)
quarta-feira, 4 de dezembro de 2024
Daniel Maurício (Poética) 80
José Feldman (A beleza das pequenas coisas)
Acordo com o som familiar do despertador, um pequeno aparelho que luta contra a gravidade da minha vontade de ficar na cama. Ao meu redor, a modernidade se faz presente: smartphones, tablets e uma infinidade de gadgets que tornam a vida mais prática, mas que, ao mesmo tempo, me fazem lembrar de um tempo em que a simplicidade era a regra e não a exceção.
Na minha infância, o despertador era um relógio que precisávamos dar corda manualmente. O ritual de acordar era cheio de sons e movimentos. Eu me lembro do cheiro do café fresco que minha mãe preparava na cozinha, enquanto o rádio tocava músicas que embalam a vida de uma forma mais lenta e reflexiva. A tecnologia avançou, mas também trouxe um ritmo apressado à vida. E, por mais que eu adore a conveniência do mundo moderno, não consigo esquecer as delícias do passado.
Quando olho pela janela, vejo a rua repleta de carros modernos, com suas formas aerodinâmicas e repletos de tecnologia.
A primeira vez que andei em um carro, era um fusca gelo, com seu motor barulhento e aquele cheiro característico de gasolina misturado com couro desgastado. O carro não tinha direção hidráulica, ar-condicionado ou, muito menos, assistente de estacionamento. Era uma experiência visceral, cheia de imperfeições que tornavam cada viagem única.
Hoje, os carros se tornaram verdadeiras máquinas. São equipados com telas sensíveis ao toque, sistemas de navegação e uma infinidade de recursos que prometem segurança e conforto. A tecnologia é impressionante, sem dúvida, mas sinto falta daquelas discussões acaloradas no caminho, dos engarrafamentos em que se contava histórias e se cantava músicas. O que era uma jornada simples se transformou em uma sequência de comandos e aplicativos, onde a interação humana parece ter diminuído.
As ruas, por sua vez, estão adquirindo carros elétricos que deslizam praticamente em silêncio. Enquanto isso, o barulho dos motores rugindo e o cheiro do escapamento dos carros antigos vão se tornando memórias distantes. A modernidade trouxe eficiência e uma nova forma de pensar sobre sustentabilidade, o que é admirável. Mas, em meio a tanta inovação, pergunto-me: onde foram parar as conversas informais que aconteciam em um semáforo vermelho? Onde estão os momentos de pausa que a vida moderna parece ter eliminado?
Os aparelhos domésticos também passaram por uma revolução. Antigamente nossas avós passavam horas na cozinha, utilizando um fogão de lenha que aquecia não apenas os alimentos, mas o coração da casa. Era um espaço de convívio, onde as histórias se entrelaçavam com o cheiro do pão fresco saindo do forno. Hoje, a cozinha é dominada por micro-ondas, air-fryers, fogões digitais e eletrodomésticos que prometem agilidade e eficiência. Cozinhar se tornou uma tarefa rápida, mas com isso, muitos perderam a arte da paciência e do envolvimento emocional na comida.
Ainda assim, algo me toca quando penso nos aparelhos da modernidade. Eles são, sem dúvida, impressionantes. Um smartphone na palma da mão nos conecta ao mundo inteiro, traz informações, entretenimento e a possibilidade de interagir com pessoas de diferentes partes do planeta em um segundo. Ao mesmo tempo, essa conexão global muitas vezes nos desconecta do que está bem diante de nossos olhos. As reuniões familiares se tornaram encontros onde todos estão imersos em suas telas, enquanto o calor humano e as conversas profundas ficam em segundo plano.
Na busca pela eficiência e pela rapidez, parece que esquecemos da beleza das pequenas coisas: um passeio de carro sem destino, uma conversa à mesa ou o tempo gasto para preparar uma refeição. A modernidade trouxe muitos avanços, mas também nos ensinou a viver no modo automático. Precisamos lembrar que a vida é feita de momentos, e não apenas de tarefas a serem cumpridas.
Às vezes, num encontro entre amigos para um jantar, em vez de usar o fogão, opto por preparar algo simples, como um prato que minha avó fazia. Usar as mãos, sentir os ingredientes, ouvir as histórias que emergem enquanto cozinhamos juntos. E, à medida que o cheiro do prato se espalha pela casa, percebo que, mesmo em meio à modernidade, ainda é possível encontrar um espaço para a tradição e o afeto.
A verdade é que, enquanto os carros e aparelhos evoluem, somos nós que decidimos como queremos viver. Podemos escolher ser reféns da tecnologia ou podemos usá-la como uma ferramenta para enriquecer nossas experiências. Assim, ao olhar para o passado, não consigo deixar de valorizar o que a modernidade trouxe, mas também não quero esquecer as lições que a simplicidade do passado nos ensina.
E assim, entre o som do despertador e o ronco do motor, entre as telas brilhantes e as conversas à mesa, sigo navegando por essa dualidade. Afinal, a vida é uma dança entre o que foi e o que é, e cabe a nós encontrar o equilíbrio que nos faça encontrar a felicidade das pequenas coisas..
Fonte: José Feldman. Labirintos da vida. Maringá/PR: IA Poe. Biblioteca Voo da Gralha Azul.
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing
Marcadores:
Meus manuscritos,
Panaceia de Textos
Marcelo Augusto Paiva (Aurora para que vos quero)
Quando à noite me debruço em alguma das janelas de minha morada, contemplo o infinito céu escuro crivado de estrelas cintilantes, as quais, com a serenidade do passar das horas, convidam a Aurora para participar do preâmbulo matinal que se aproxima. Ela se faz presente diante de mim, não apenas aos olhos, mas em minha alma - meus pensamentos - e me faz refletir sobre os sonhos e anseios que tive, realizados ou não. Uma fonte inesgotável de vida, que segue seu caminho pelos pontos de luz estelar ou pela escuridão que deles se avizinha.
Enquanto a contemplo, a Aurora anuncia um novo ciclo que se inicia a partir dela, renova as energias vitais e espirituais para seguir adiante com os desejos e projetos para os dias vindouros, ainda que ela não me acompanhe em toda essa jornada.
Majestosa - e divina - sempre surge com suas cores em vários lugares, cada qual a seu tempo e em circunstâncias exclusivas, comove os apaixonados ou assusta os desinformados, mas nunca deixa de trazer a lume o anúncio de que um novo dia brilhará para nós.
A Aurora faz crer que cada manhã nos renova e faz limpar nossas almas das coisas e dos fatos passados, necrosados pelo destempero das divergências ou das decepções pessoais. Ela nos faz limpar as más lembranças e crer que o brilho do sol que anuncia será o início de novos e melhores dias.
O sereno que a acompanha também me faz pensar em quão frágeis somos perante ela e seu infinito potencial renovador dos dias e da vida que dela seguem.
Às vezes a sinto tocar meus ossos, como se testasse minha resistência ao clima quase congelante, no aguardo do luminoso calor do astro-rei, o sol.
Ao amanhecer, contemplo o azul celestial do céu, iluminado e aquecido pelos raios de luz solar, que a dispensou para se firmar ao longo do dia. E a vida – minha e das outras pessoas - continua. Até ser renovada por nova contemplação da serena, divina e majestosa Aurora...
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = = =
* O autor é de Votorantim/SP
(esta crônica obteve o Menção Honrosa no Concurso de Crônicas Adulto Nacional “Foed Castro Chamma”, em 2020, com o tema Aurora)
Fontes: Luiza Fillus/ Bruno Pedro Bitencourt/ Flávio José Dalazona (org.). III Concurso Literário “Foed Castro Chamma 2020”. Ponta Grossa/PR: Texto e Contexto, 2021.
Livro enviado por Luiza Fillus.
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing
Vereda da Poesia = 169 =
LISETE JOHNSON
Butiá/RS, 1950 – 2020, Porto Alegre/RS
Num arco-íris de cores,
fui descendo de mansinho
sem, se quer, pisar nas flores
que plantaste em meu caminho.
= = = = = =
Poema de
APARECIDO RAIMUNDO DE SOUZA
Vila Velha/ES
Definindo saudade
Saudade, ternura ausente,
que sempre se faz presente
quando nos quer ver sofrer...
Saudade, ternura ingrata
mesmo amando, nos maltrata
Sem nos deixar entender.
= = = = = =
Trova de
NEMÉSIO PRATA
Fortaleza/CE
Selva: bela e exuberante;
cria, de rara beleza,
de Deus que, naquele instante,
nominou-a... Natureza!
= = = = = =
Poema de
LUCIANA SOARES CHAGAS
Rio de Janeiro/RJ
A mulher da moldura
Ela via a moldura como escudo
Escudo como janela
Janela de uma prisão
Prisão com um carcereiro
Que a impedia de se aventurar
Semblante pérfido a lhe vigiar.
Ela sonha em caminhar por uma alameda
Vestida com seda.
A moldura se revela um retrato
Olha o opressor e trama sua fuga de fato
É o fim deste cárcere, afinal
Ele dormirá, ela menciona em tom triunfal.
Atravessa a moldura...
Coração pulsante, olhos atentos
Avista o destino a um passo da porta
Um instante que acolhe e conforta
E a alma que antes sofria,
Dança com liberdade e alegria.
= = = = = =
Trova de
APARÍCIO FERNANDES
Acari/RN, 1934 – 1996, Rio de Janeiro/RJ
Desconfio das vitórias
que neste mundo colhi.
- Se as coisas são ilusórias,
quem garante que eu venci?
= = = = = =
Soneto de
HEGEL PONTES
Juiz de Fora/MG (1932 – 2012)
Ironia de Natal
Disseram que meu pai tinha viajado,
mas não saiu de mala nem sacola...
E tudo desde então ficou mudado.
Venderam meu carrinho e minha bola...
E aos poucos, eu fui vendo, desolado
morrer o passarinho na gaiola.
O fogão cada vez mais apagado
e meus irmãos deixarem de ir à escola...
Depois era preciso "se mudar";
um homem trouxe escrito num papel
que minha mãe, ao ler, pôs-se a chorar...
Era Natal e minha mãe, descrente,
saindo às ruas, qual Papai Noel,
foi dando os filhos todos de presente…
= = = = = = = = =
Trova de
PROFESSOR GARCIA
Caicó/RN
A solidão me angustia
e à noite aumenta o meu drama,
vendo a cadeira vazia
que a tua ausência reclama!
= = = = = =
Poema de
JAQUELINE MACHADO
Cachoeira do Sul/RS
Extravagância e elegância
Gosto de extravagância
porque ela rima com fragrância.
Almas perfumadas me interessam...
Gosto de certos exageros!
De sorrisos largos,
pensamentos loucos
e abraços demorados.
Mas acredito que, extravagância
e elegância precisam andar juntas.
Uma tem a energia do “dar”,
e a outra, do “receber”.
A pessoa elegante sabe se vestir
e se portar com as vestes da educação,
da reciprocidade e da
empatia pelo que o outro sente...
Elegância é amor, razão,
estudo, acerto, proteção.
Extravagância é sentimento, paixão,
audácia e liberdade plena.
Gosto de pessoas que possuem
em suas entranhas, essa mistura
de loucura com docilidade.
Elas sempre conquistam o meu coração...
= = = = = =
Trova de
WANDA DE PAULA MOURTHÉ
Belo Horizonte/MG
Eu fui náufrago da sorte
em um mar de solidão,
mas teu amor foi suporte
e tábua de salvação!
= = = = = =
Soneto de
AMILTON MACIEL MONTEIRO
São José dos Campos/SP
Talentos
Se eu tivesse talento de um pintor,
ia passar a vida a retratar
o teu rosto a sorrir, meu grande amor,
razão de meu viver e meu sonhar!
Se meu engenho fosse de escultor
talentoso, eu iria trabalhar
dia e noite, buscando com ardor,
tua imagem da pedra retirar...
Mas meu talento é pouco para tanto,
eu só posso sonhar com teu encanto,
sem jamais conseguir representá-lo.
Pois nem sequer eu numa simples trova
consegui retratar-te, como prova
de quanto és linda, para meu regalo!
= = = = = =
Trova de
ZAÉ JÚNIOR
Botucatu/SP, 1929 – 2020, São Paulo/SP
Caminheiro de olhos baços,
em busca dos teus carinhos,
para que servem meus passos,
se me apagaste os caminhos?
= = = = = =
Hino de
ITABIRA/MG
Tem belezas minha terra
Vou cantar a minha lira
A primeira é mais sublime
O seu nome é Itabira
Ela tem três altas serras
Com a Serra do Esmeril
O seu ferro é dos melhores
É o primeiro do Brasil
Minha terra tão querida
A cidade mais gentil
Mais formosa e pitoresca
Não há outra no Brasil.
Em seus campos verdejantes
Nascem flores a granel
Em seus bosques almejantes
Frutos mais doces que o mel.
Tem o poço d'Água Santa
E as fontes do Pará
Quem de suas águas bebe
Não se esquece mais de lá.
Minha terra tão querida
A cidade mais gentil
Mais formosa e pitoresca
Não há outra no Brasil
Ali canta o sabiá
Patativa e Bem-te-vi
O canário, o pintassilgo
A saudosa juriti.
Ela voa no progresso
Porque ama a instrução
E seus filhos dela esperam
Do Brasil a salvação
Minha terra tão querida
A cidade mais gentil
Mais formosa e pitoresca
Não há outra no Brasil
= = = = = =
Trova Premiada de
RITA MARCIANO MOURÃO
Ribeirão Preto/SP
Este meu andar sisudo,
que modela a caminhada
já retrata quase tudo
que a vida transforma em nada!
= = = = = =
Recordando Velhas Canções
ESTÃO VOLTANDO AS FLORES
(marcha-rancho, 1962)
Paulo Soledade
Vê,
estão voltando as flores
Vê,
nessa manhã tão linda
Vê,
como é bonita a vida
Vê,
há esperança ainda
Vê,
as nuvens vão passando
Vê,
um novo céu se abrindo
Vê,
o sol iluminando
Por onde nós vamos indo
Por onde nós vamos indo.
= = = = = = = = =
Trova de
OLYMPIO DA CRUZ SIMÕES COUTINHO
Belo Horizonte/MG
Estrela que me seduz
és a imagem da esperança:
- brilhante, mas não traz luz;
tão linda, mas não se alcança.
= = = = = = = = =
Marcadores:
Universos Di Versos,
Vereda da Poesia
Silmar Bohrer (Croniquinha) 124
Que bom se a gente pudesse alçar voos em busca daquelas nuvens e do infinito a que chamamos céu, ou céus - são tantos na vastidão do universo! E as camândulas (rosário de contas grossas) de estrelas? Quisera achegar-me bem perto das amadinhas Três Marias, aquelas das noites estreladas, com quem converso em momentos de silêncio, de inspiração e alumbramento .
Mas esquecemos dos recônditos do ser, da intimidade da vida - ali é que encontramos a seiva, o doce , o mel para nossos dias. Observamos tanto o exterior, mas é no âmago dos pensares e sentimentos que a vida tem mais sentido em todos os sentidos.
E a gente bem pode parodiar o pensador alemão Wolfgang Goethe, dizendo ele "Mais alto devemos olhar, mais alto devemos subir".
Também nós podemos dizer - mais longe nos aprofundar, bisbilhotar, meditar, olhando para o céu interior, onde temos tanta coisa escondida a ser explorada pelos EUS interiores. Porque relíquias verdadeiras, riquezas perenes, estão incrustadas no âmago de cada um. Saibamos farejá-las, buscá-las, encontrá-las.
São tantas pepitas de vida dentro da vida.
Fonte: Texto enviado pelo autor.
Célio Simões* (O nosso português de cada dia) “Novo em folha”
Apesar de muito usada, nem todo mundo conhece a origem da expressão “novo em folha”, quase sempre relacionada a livros. A língua portuguesa é muito rica e expressões passam de geração para geração, sem que se saiba como surgiram. Muitas permanecem imutáveis ao longo dos anos, porém outras sofrem influências e acabam se adaptando aos novos tempos. Mas não há dúvida de que elas enriquecem e dão peculiaridade ao nosso idioma.
Algumas delas têm origem no nosso próprio país, são antigas, remontam ao tempo do império, enquanto outras tem conotação estrangeira, religiosa, mitológica, mística ou histórica. “Novo em folha”, como dito antes, foi inspirada na utilização do papel, particularmente dos livros, tendo em mente as folhas de papel brancas, limpas e sem amassados de livros recém-impressos, novinhos, sem dobras e sem riscos. Mas atualmente a frase pode estar relacionada a outros objetos e também a pessoas.
Quando nos referimos a algo que nunca foi usado ou que está em ótimo estado é trivial falarmos que o objeto está “novo em folha”. Ou quando uma pessoa, após enfrentar uma enfermidade se vê totalmente curada, os familiares dizem que ela está “nova em folha” ou “pronta para outra”. É fácil perceber que usamos o adjetivo "novo" para nos referir tanto a objetos como a pessoas.
Mas e a “folha”? O que a “folha” tem a ver com um carro novo, um sapato recém-comprado ou a alguém que acabou de sair de um hospital? Isso acontece justamente porque a expressão vem das folhas de papel limpinhas e sem máculas, tipo os livros novos quando acabam de ser impressos e não de nenhuma árvore.
Há quem use o termo para dizer que comprou um carro “novo em folha”, para distinguir da aquisição de um seminovo. Mas não é só com o carro zero bala que surge sua utilização, cabe também para um sapato novo, uma roupa nova ou qualquer outro objeto, desde que adquiridos recentemente e em estado impecável.
Quem nunca ouviu: - Comprei uma televisão de 50 polegadas “nova em folha”. Ou, com o mesmo sentido: - Ganhei um computador usado, e depois de uma repaginada, ficou “novo em folha”. As fofoqueiras diriam: - Vocês viram a fulana depois da plástica no rosto? Rejuvenesceu, está “novinha em folha...”.
Mas há situações incomuns em que essa expressão é incluída no diálogo para enfatizar o que se pensa sobre algo ou alguma coisa. Como o sujeito que procurou a oficina, levando seu antigo relógio de pêndulo para mais uma vez ser recuperado. Antes de sair, disse ele ao relojoeiro, com o intuito de enfatizar a importância que o objeto tinha para ele:
- Mas, por favor, tenha muito cuidado com ele, me devolva funcionando, “novo em folha”. É que esse relógio pertenceu ao meu avô e dessa marca não se fabrica mais...
Ao que o outro ironicamente respondeu:
- Graças a Deus...
A música popular brasileira não deixou passar a oportunidade de utilizar a expressão e foi isso que fez o “Trio Xamego”, na composição intitulada “Novinho em Folha”, cujos versos ratificam o sentido com que ela é usada:
Aqui estou eu, novinho em folha
De chapéu de couro, alparcata, culote e gibão
Pra cantar as modas de cabra da peste
Que vem do nordeste do meu torrão
Pra cantar tudo que vem lá da serra
Da minha terra no meu sertão.
Eu não tenho reinado
não tenho coroa
Mas dentro da arte, modéstia à parte
Eu levo a vida tão boa
Trago a zabumba numa sacola
Mas não peço esmola a nenhum cidadão
Novinho em folha estou por aqui
E ninguém vai impedir de eu cantar meu baião!”
Portanto, para tudo que o que está “estalando de novo”, usamos a expressão “novo ou novinho em folha” como um adjetivo, isto é, uma palavra que se junta ao substantivo para modificar o seu significado, acrescentando-lhe qualidade, natureza, modo de ser ou o próprio estado em que a pessoa se encontra. Rodrigo Santos (O Pensador) cunhou uma frase para expressar uma sensação conhecida de todos nós: “Durmo com a expectativa de acordar novo em folha e acordo como se tivesse sido atropelado por um caminhão!”. Quem nunca se sentiu assim?...
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = = =
Estas expressões idiomáticas são publicadas na Terça da Cultura Popular em sites do Pará.
Nas palavras de Célio Simões “A TERÇA DA CULTURA POPULAR começou por acaso. Publiquei num dos sites em que escrevo, um texto explicando a origem de certas expressões idiomáticas, que usamos quase sem perceber nos diálogos do cotidiano. Cito, como exemplo, algumas já divulgadas: Chato de galocha, Mão de vaca, Casa da mãe Joana, Santinha de pau oco, Chegar de mãos abanando, Sem eira nem beira, Dor de cotovelo, etc. Outras virão, na medida do possível. Atualmente tais textos são divulgados por vários sites e blogs de Belém (1), Santarém (1), Óbidos (2), Manaus (1)”
= = = = = = = = = = = = = = = = = =
(*) O autor é advogado, escritor, palestrante, poeta e memorialista. É membro da Academia Paraense de Letras, da Academia Paraense de Letras Jurídicas, da Academia Paraense de Jornalismo, da Academia Artística e Literária de Óbidos, da Confraria Brasileira de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico do Pará e do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós.
Marcadores:
O nosso português de cada dia,
Panaceia de Textos
domingo, 1 de dezembro de 2024
José Feldman (O Ônibus da Confusão)
Nota do autor: Há cerca de 50 anos trabalhei no transporte de passageiros de ônibus urbano, na cidade de Belo Horizonte/MG, verificando quantas pessoas subiam e desciam no ônibus, para calcular a distância apropriada entre os pontos, daí caiu um temporal, as ruas alagaram, o motorista se perdeu ao desviar, saiu discussão, teve gente histérica, foi uma confusão generalizada, daí a ideia deste conto.
==============================================
Era uma tarde chuvosa na cidade, e o ônibus lotado seguia sua rotina habitual. As gotas de chuva tamborilavam no teto, fazendo uma sinfonia que misturava-se ao barulho das conversas e risadas dos passageiros. No entanto, o clima descontraído logo foi interrompido por um forte estrondo.
— O que foi isso? — gritou Dona Maria, uma senhora de cabelo grisalho, segurando a bolsa com firmeza.
— Deve ser só o trovão, Dona Maria! — respondeu João, um jovem de camiseta vermelha, tentando manter o bom humor.
Mas o motorista, preocupado com a enxurrada que começava a invadir as ruas, decidiu desviar o trajeto. Ele virou à esquerda, depois à direita, mas logo percebeu que estava perdido.
— Pessoal, estamos enfrentando um pequeno desvio! — anunciou ele pelo microfone, mas a voz dele mal conseguiu se sobrepor ao barulho dos passageiros.
— Pequeno desvio? Estou a caminho de uma reunião importante! — protestou o Sr. Almeida, um executivo apressado que estava ao telefone. Ele olhou pela janela e viu a água subindo. — Isso não é um desvio, é uma aventura!
— Eu conheço um atalho! — gritou Tânia, uma estudante com uma mochila cheia de livros. — É só seguir pela Rua das Flores!
— Rua das Flores? Você está louca? — respondeu Carlos, um senhor com um chapéu de palha. — Essa rua está sempre alagada! Vamos pela Avenida Central!
— Avenida Central? — interrompeu Mariana, uma jovem com um guarda-chuva quebrado. — A última vez que passei por lá, estava um caos! Precisamos de um plano!
Os passageiros começaram a discutir entre si, cada um defendendo sua própria ideia de qual caminho seguir.
— Pessoal, calma! Eu tenho um mapa! — anunciou Pedro, um rapaz que estava na parte de trás do ônibus. Ele estava tão empolgado que quase levantou do banco. — Aqui diz que podemos pegar a Rua da Alegria!
— Rua da Alegria? — riu Dona Maria. — Com esse temporal, só se for alegria de ver o barco que vamos precisar para atravessar!
— Olha, eu não sei de vocês, mas eu vou descer. Não estou a fim de ser levado por um tsunami! — disse a Sra. Glória, uma mulher mais velha, já se levantando.
— Não, não! Fica todo mundo aqui! — gritou o motorista, tentando manter a ordem. — Precisamos decidir juntos!
— Eu sempre confiei no GPS! — disse o jovem com um celular na mão. — Vamos ver pra onde ele nos leva!
— GPS? E se ele estiver errado? — retrucou Carlos. — Eu confio mais no meu instinto!
A discussão continuava, e o ônibus parecia um verdadeiro tribunal. Cada um defendia sua ideia com fervor, e logo o motorista se viu sem saber a quem ouvir.
— Olha, uma solução pode ser perguntar ao pessoal da rua! — sugeriu Tânia, apontando para um grupo de pessoas que se abrigava em uma marquise.
— Boa ideia! — exclamou o motorista, aliviado. — Vou parar!
Ele estacionou o ônibus em um lugar seguro, e todos os passageiros se aglomeraram na porta.
— O que está acontecendo? — perguntou um dos homens na marquise, enxugando a chuva do rosto.
— Estamos perdidos! Qual é o melhor caminho para a Avenida Central? — perguntou o motorista.
O homem olhou para o céu, pensou por um momento e respondeu:
— Amigo, se eu fosse você, fugiria para o mais perto possível da praia. Aqui não vai ter Avenida Central, só um mar de água!
Os passageiros se entreolharam, um misto de risadas nervosas e uma leve sensação de desespero.
— Eu não vou pra praia! — gritou a Sra. Glória, já com a mão na cintura. — Isso é loucura!
— Então que tal seguir pela Rua do Sol? — sugeriu a jovem Mariana, que parecia ter uma ideia mais otimista. — Pode ser que lá a água não esteja tão alta.
— Rua do Sol? É a única que ainda não ouvi! — disse Pedro, com um sorriso.
— Vamos nessa! — decidiu o motorista, voltando para o volante. — Rua do Sol, aqui vamos nós!
O ônibus seguiu pela nova rota, e a tensão começou a se dissipar. Os passageiros voltaram a conversar, agora em um tom mais leve.
— Vocês acham que vamos chegar a tempo? — perguntou João, olhando pela janela.
— Chegar a tempo do quê? — riu Tânia. — Se não nos afogar primeiro!
— Olha, se tudo der certo, ainda podemos fazer uma festa na praia! — brincou Carlos, arrancando risadas.
— Festa? Com essa chuva? — ironizou a Sra. Glória. — O que vai ter na festa? Natação?
A conversa fluiu e, de repente, o ônibus parecia mais um salão de festas do que um transporte público sufocado. Momentos depois, eles chegaram à Rua do Sol, que estava inundada, mas a água não era tão alta.
— Ufa, estamos a salvo! — exclamou Dona Maria, aliviada. — Agora só falta saber como voltamos pra casa!
— Ah, isso é fácil! — disse Pedro, puxando seu mapa. — Vamos descobrir juntos!
E assim, entre risadas e histórias, o ônibus lotado virou um ponto de encontro, onde a amizade e a camaradagem floresceram mesmo diante da tempestade. Aquele dia, que começou com um temporal, acabou em uma verdadeira aventura, unindo pessoas diferentes por um único objetivo: encontrar o caminho de volta para casa.
==============================================
Era uma tarde chuvosa na cidade, e o ônibus lotado seguia sua rotina habitual. As gotas de chuva tamborilavam no teto, fazendo uma sinfonia que misturava-se ao barulho das conversas e risadas dos passageiros. No entanto, o clima descontraído logo foi interrompido por um forte estrondo.
— O que foi isso? — gritou Dona Maria, uma senhora de cabelo grisalho, segurando a bolsa com firmeza.
— Deve ser só o trovão, Dona Maria! — respondeu João, um jovem de camiseta vermelha, tentando manter o bom humor.
Mas o motorista, preocupado com a enxurrada que começava a invadir as ruas, decidiu desviar o trajeto. Ele virou à esquerda, depois à direita, mas logo percebeu que estava perdido.
— Pessoal, estamos enfrentando um pequeno desvio! — anunciou ele pelo microfone, mas a voz dele mal conseguiu se sobrepor ao barulho dos passageiros.
— Pequeno desvio? Estou a caminho de uma reunião importante! — protestou o Sr. Almeida, um executivo apressado que estava ao telefone. Ele olhou pela janela e viu a água subindo. — Isso não é um desvio, é uma aventura!
— Eu conheço um atalho! — gritou Tânia, uma estudante com uma mochila cheia de livros. — É só seguir pela Rua das Flores!
— Rua das Flores? Você está louca? — respondeu Carlos, um senhor com um chapéu de palha. — Essa rua está sempre alagada! Vamos pela Avenida Central!
— Avenida Central? — interrompeu Mariana, uma jovem com um guarda-chuva quebrado. — A última vez que passei por lá, estava um caos! Precisamos de um plano!
Os passageiros começaram a discutir entre si, cada um defendendo sua própria ideia de qual caminho seguir.
— Pessoal, calma! Eu tenho um mapa! — anunciou Pedro, um rapaz que estava na parte de trás do ônibus. Ele estava tão empolgado que quase levantou do banco. — Aqui diz que podemos pegar a Rua da Alegria!
— Rua da Alegria? — riu Dona Maria. — Com esse temporal, só se for alegria de ver o barco que vamos precisar para atravessar!
— Olha, eu não sei de vocês, mas eu vou descer. Não estou a fim de ser levado por um tsunami! — disse a Sra. Glória, uma mulher mais velha, já se levantando.
— Não, não! Fica todo mundo aqui! — gritou o motorista, tentando manter a ordem. — Precisamos decidir juntos!
— Eu sempre confiei no GPS! — disse o jovem com um celular na mão. — Vamos ver pra onde ele nos leva!
— GPS? E se ele estiver errado? — retrucou Carlos. — Eu confio mais no meu instinto!
A discussão continuava, e o ônibus parecia um verdadeiro tribunal. Cada um defendia sua ideia com fervor, e logo o motorista se viu sem saber a quem ouvir.
— Olha, uma solução pode ser perguntar ao pessoal da rua! — sugeriu Tânia, apontando para um grupo de pessoas que se abrigava em uma marquise.
— Boa ideia! — exclamou o motorista, aliviado. — Vou parar!
Ele estacionou o ônibus em um lugar seguro, e todos os passageiros se aglomeraram na porta.
— O que está acontecendo? — perguntou um dos homens na marquise, enxugando a chuva do rosto.
— Estamos perdidos! Qual é o melhor caminho para a Avenida Central? — perguntou o motorista.
O homem olhou para o céu, pensou por um momento e respondeu:
— Amigo, se eu fosse você, fugiria para o mais perto possível da praia. Aqui não vai ter Avenida Central, só um mar de água!
Os passageiros se entreolharam, um misto de risadas nervosas e uma leve sensação de desespero.
— Eu não vou pra praia! — gritou a Sra. Glória, já com a mão na cintura. — Isso é loucura!
— Então que tal seguir pela Rua do Sol? — sugeriu a jovem Mariana, que parecia ter uma ideia mais otimista. — Pode ser que lá a água não esteja tão alta.
— Rua do Sol? É a única que ainda não ouvi! — disse Pedro, com um sorriso.
— Vamos nessa! — decidiu o motorista, voltando para o volante. — Rua do Sol, aqui vamos nós!
O ônibus seguiu pela nova rota, e a tensão começou a se dissipar. Os passageiros voltaram a conversar, agora em um tom mais leve.
— Vocês acham que vamos chegar a tempo? — perguntou João, olhando pela janela.
— Chegar a tempo do quê? — riu Tânia. — Se não nos afogar primeiro!
— Olha, se tudo der certo, ainda podemos fazer uma festa na praia! — brincou Carlos, arrancando risadas.
— Festa? Com essa chuva? — ironizou a Sra. Glória. — O que vai ter na festa? Natação?
A conversa fluiu e, de repente, o ônibus parecia mais um salão de festas do que um transporte público sufocado. Momentos depois, eles chegaram à Rua do Sol, que estava inundada, mas a água não era tão alta.
— Ufa, estamos a salvo! — exclamou Dona Maria, aliviada. — Agora só falta saber como voltamos pra casa!
— Ah, isso é fácil! — disse Pedro, puxando seu mapa. — Vamos descobrir juntos!
E assim, entre risadas e histórias, o ônibus lotado virou um ponto de encontro, onde a amizade e a camaradagem floresceram mesmo diante da tempestade. Aquele dia, que começou com um temporal, acabou em uma verdadeira aventura, unindo pessoas diferentes por um único objetivo: encontrar o caminho de volta para casa.
Fontes: José Feldman. Labirintos da vida. Maringá/PR: IA Poe. Biblioteca Voo da Gralha Azul,
Imagem criada por JFeldman com Microsoft Bing
Marcadores:
Meus manuscritos,
Panaceia de Textos
sábado, 30 de novembro de 2024
José Feldman (Textos & Trovas) Previsões e ilusões
O profeta idealiza
o futuro, em previsões…
E o poeta o finaliza
colorindo-o de ilusões…
O profeta idealiza o futuro, erguendo-se como uma figura solene em meio ao tumulto do presente. Em uma pequena aldeia, ele caminhava pelas ruas de paralelepípedos, suas vestes longas esvoaçando ao vento. Os aldeões paravam para ouvi-lo, atraídos por suas palavras que pareciam trazer uma luz nas trevas da incerteza. Suas previsões eram como faróis em noites tempestuosas, guiando-os através das tormentas da vida.
“Um dia”, ele proclamava com a voz firme, “as colheitas serão fartas, e a paz reinará entre nós. A era da prosperidade está por vir, bastando que nos unamos em fé e determinação.”
As palavras do profeta, repletas de esperança e otimismo, ecoavam por toda a aldeia, e, por um momento, acendiam a chama da expectativa nos corações dos ouvintes. Ele era um visionário, um sonhador que via além do horizonte, onde a realidade se confundia com a fantasia.
Mas, em meio a essa atmosfera de esperança, existia outro personagem, um poeta que observava tudo com um olhar perspicaz. Ele estava sempre à sombra das árvores, com um caderno em mãos, onde registrava não apenas as previsões do profeta, mas também as nuances da vida que se desenrolavam ao seu redor. O poeta via a beleza nas pequenas coisas, mas também sentia o peso das dores e desilusões que permeavam a existência dos aldeões.
Enquanto o profeta falava de um futuro glorioso, o poeta ouvia e refletia. Ele sabia que as previsões eram apenas isso: previsões. Não se tratava apenas de um futuro idealizado; era necessário colorir essas palavras com a realidade das emoções humanas. A esperança, sem questionamentos, poderia ser uma armadilha, e ele desejava que as pessoas não se deixassem levar apenas pelas promessas.
Certa manhã, após uma longa noite de reflexão, o poeta decidiu que era hora de compartilhar sua visão. Ele subiu a uma pequena colina, onde o profeta costumava pregar, e começou a recitar seus versos.
“O futuro, caro povo, não é apenas o que se sonha, mas também o que se vive. As ilusões podem ser lindas, mas são as verdades que nos moldam.”
Suas palavras dançavam no ar, misturando-se ao vento que passava.
Os aldeões, inicialmente confusos, começaram a ouvir com atenção. O poeta falava sobre a fragilidade da esperança e a beleza das cicatrizes que cada um carrega em sua alma.
“Em cada sorriso escondido, há uma lágrima que não foi enxugada. Em cada sonho realizado, uma renúncia ficou para trás.”
Ele coloria o futuro não apenas com a paleta da esperança, mas também com as sombras da realidade.
O profeta, que até então ouvira em silêncio, sentiu-se incomodado. Ele acreditava que seu papel era inspirar e elevar os espíritos, enquanto o poeta parecia querer puxar as pessoas de volta para o chão.
“Mas o que é a vida sem sonhos?”, questionou o profeta. “Como podemos viver sem acreditar em um futuro melhor?”
O poeta olhou nos olhos do profeta e respondeu:
“Os sonhos são essenciais, mas não devem nos cegar. O futuro é construído sobre as bases do presente. Precisamos reconhecer nossas dores, nossas falhas, para que possamos realmente transformar o que está por vir.”
Havia uma tensão no ar, uma batalha de ideias entre o idealismo do profeta e o pragmatismo do poeta.
Os aldeões, fascinados pela troca, começaram a refletir sobre suas próprias vidas. Era verdade que o profeta trazia esperança, mas também era verdade que o poeta oferecia uma visão mais completa. As ilusões que o poeta coloria não eram meras escapadas; eram uma forma de abraçar a complexidade da vida.
Com o passar dos dias, a aldeia começou a mudar. As pessoas começaram a falar mais, a compartilhar suas histórias, seus medos e suas esperanças. O profeta e o poeta, ao invés de se oporem, começaram a trabalhar juntos.
O profeta falava sobre o futuro e a importância de sonhar, enquanto o poeta trazia as verdades do presente, colorindo os sonhos com a realidade das experiências vividas.
Juntos, eles formaram uma aliança poderosa. O profeta idealizava, mas agora com a consciência das lutas que os aldeões enfrentavam. E o poeta finalizava, não apenas com ilusões, mas com a rica tapeçaria de emoções que compunham a vida de cada um. As previsões do profeta agora estavam entrelaçadas com as verdades do poeta, criando uma narrativa mais profunda e rica.
A aldeia floresceu, não apenas em termos de prosperidade material, mas em conexões humanas. As pessoas aprenderam a sonhar, a esperar pelo futuro, mas também a viver intensamente o presente. O futuro não era apenas um destino a ser alcançado, mas uma jornada a ser apreciada, cheia de cores, sombras e nuances.
E assim, sob a luz do sol poente, o profeta e o poeta caminhavam lado a lado, reconhecendo que, juntos, poderiam iluminar não apenas o horizonte, mas também os corações da aldeia. O futuro, agora, não era apenas uma promessa, mas uma tela em branco, onde cada um poderia pintar sua própria história, entrelaçando sonhos e realidades em uma dança harmoniosa.
Fontes: José Feldman. Labirintos da vida. Maringá/PR: IA Poe. Biblioteca Voo da Gralha Azul.
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing
Marcadores:
Meus manuscritos,
Panaceia de Textos
quinta-feira, 28 de novembro de 2024
José Feldman (Bolinha e a luz que mudou tudo)
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = = =
Poema Para Gwyddion
(1998 – 2001)
Nos sonhos, ainda te vejo,
teu ronronar a me embalar.
A saudade é um desejo,
que não consigo evitar.
Gwyddion, gatinho que seduz,
deixou um eco profundo.
Teu amor era pura luz,
encantava nosso mundo.
Em uma manhã cinzenta, enquanto a cidade despertava com o barulho dos carros e o cheiro do café fresco, Lucas caminhava rumo ao trabalho. Ele sempre passava pelo mesmo caminho, mas naquele dia algo o chamou a atenção. No canto da rua, um pequeno filhotinho de gato, sujo e magro, uma bolinha de pelo, olhava para ele com olhos grandes e desesperados. O coração de Lucas se apertou. Sem pensar duas vezes, ele se agachou e estendeu a mão. O filhote, em um ato de desespero e esperança, subiu na perna dele, buscando calor e segurança.
Lucas, que tinha outros gatos de estimação, sentiu uma onda de compaixão. Ele não podia deixar aquele pequeno ser à mercê do mundo, então, com muito cuidado, pegou o gatinho nos braços e o levou para casa, colocando-o em uma caixinha aconchegante, protegendo-o. No lar, sua esposa, olhou surpresa para o recém-chegado.
— Olha o que eu trouxe! — disse Lucas, com um sorriso nervoso.
Ela, ao ver o estado do filhote, o acolheu com amor.
As opiniões de amigos e familiares ecoavam em sua mente: "Ele não tem salvação". Mas o casal acreditou que, com amor e cuidado, eles poderiam mudar a sorte daquele gatinho. E foi assim que Bolinha, como o casal decidiu chamá-lo, entrou em suas vidas.
Nas semanas seguintes, a transformação de Bolinha foi mágica. Comida, carinho e um lar quentinho fizeram maravilhas. O pequeno filhote, que antes era apenas uma sombra de um gato, tornou-se um animal bonito e peludinho. Ele se tornou a sombra constante do casal, sempre ao redor, pronto para brincar ou simplesmente fazer companhia.
O relacionamento de Bolinha com os outros gatos da casa era um verdadeiro espetáculo de afeto e travessuras. Desde o primeiro momento em que ele entrou no lar, mostrou-se um gato sociável e curioso, rapidamente se integrando ao grupo já estabelecido.
Mesmo sendo o mais novo, rapidamente assumiu uma posição de destaque entre os outros sete gatos. Ele tinha um jeito natural de interagir. Os gatos mais velhos, que inicialmente poderiam ter visto a chegada de um novo membro como uma perturbação, logo se renderam ao charme e à energia do novo membro. Ele se aproximava deles com um jeito brincalhão, e em questão de dias, todos estavam se envolvendo em jogos e brincadeiras.
Bolinha tinha uma personalidade travessa. Ele adorava explorar e se meter em encrenca. Uma vez, enquanto brincava no andar de cima do sobrado onde moravam, ele caiu do balcão e bateu a boca em um cano. A mulher, que estava na sala, ouviu um barulho e correu para ver. Ao abrir a porta, encontrou ele arranhando a madeira da porta, tentando entrar.
— O que você aprontou dessa vez? — ela riu ao vê-lo. Era impossível não se apaixonar por aquele ser tão arteiro.
Ele dormia carinhosamente entre os dois, e nas noites frias, quando queria o calor do cobertor, ele fazia questão de colocar a patinha gelada no rosto dela, despertando-a com um leve toque. Ele era o relações públicas da casa, sempre acolhendo novos amigos. Quando o casal trouxera duas gatinhas siamesas, foi Bolinha quem as recebeu com um charme irresistível, fazendo amizade rapidamente para que se sentissem em casa.
Suas travessuras não tinham fim. Ele aprendeu a abrir a tampa da panela que ficava sobre a mesa, sempre em busca de um pedaço de carne suculenta. E quando ele ia no quintal onde havia uma cachorra pastora belga branca, ele corria em volta dela e junto com Mocinho, um persa azul britânico, que era o líder, deixavam a cachorra tonta.
O casal ria das artimanhas do pequeno, que parecia ter um talento especial para se meter em confusões.
Mas a vida, como sempre, tem seus altos e baixos. Quando o casal decidiu se mudar para outra cidade, a mulher teve que voltar para resolver algumas pendências. Bolinha ficou em casa com os outros gatos, mas a saudade dela começou a pesar em seu coração. Ele andava pela casa, miando e procurando pela sua amada dona. A espera se prolongou por semanas, e o pequeno gato, que antes trazia tanta alegria, começou a definhar.
Infelizmente, em uma noite silenciosa, Bolinha não resistiu. Ele foi encontrado por Lucas, que voltou para casa cansado, apenas para descobrir que seu querido gatinho não estava mais ali. O luto tomou conta do lar. A dona, ao saber da notícia, correu de volta, mas já era tarde. A tristeza era imensa, e mesmo cercados por outros sete gatos, Bolinha deixara um vazio profundo.
Ele sempre fora o bálsamo para os dias cansativos do casal, a luz que iluminava seu lar. As risadas que proporcionava com suas travessuras ecoavam ainda na memória do casal. Embora a vida continuasse, Bolinha nunca foi esquecido. Lucas, muitas vezes, se pegava lembrando das travessuras do pequeno, e as lágrimas escorriam pelo seu rosto, misturando-se com risos saudosos.
A vida de Bolinha, embora breve, foi repleta de amor e alegria. Com pouco mais de três anos, ele deixou uma marca indelével na vida do casal, e em cada canto da casa, ainda se sentia sua presença. Ele não era apenas um gato; ele era um pedaço do coração do casal, e sua memória viveria para sempre.
Fonte: José Feldman. Labirintos da vida. Maringá/PR: IA Poe. Biblioteca Voo da Gralha Azul.
Imagem: arte por Jfeldman: “Gwyddion”
Marcadores:
Meus manuscritos,
Panaceia de Textos
Elias Pescador* (Nas asas da alva)
Linda aurora!... Hoje, logo ao amanhecer, olhei para o céu e vi o pincelar da mão divina ilustrando uma belíssima aquarela na tela da existência... Desenhos, imagens, figuras, qual fotos, ora esparsas, ora contínuas, mas ternas, suaves, como a querer demonstrar a suavidade e a docilidade do carinho; e o vento continuava acariciando o espaço com suas nuvens brancas, e o sol a completar a sutileza da obra de arte desta natureza sublime tocava os flocos de algodão a iluminar tudo, sem dourá-los, apenas para torná-los de um branco puro reluzente.
Era só aprisionar o silêncio e prestar atenção para ouvir a penetrante melodiosa sinfonia. Mas que cidade insensível!... Onde estarão os pássaros para aproveitar este momento mágico e bailar, bailar?... Mas... a maldade do homem conseguiu tirar estes personagens da cena do encantamento.
Crio eu, então, as devidas asas e vou... Voo a atender o chamado inaudito do espírito... Desintegro a me espargir feito criança, a brincar naqueles doces espasmos de carícias... Agora sim, entrego me a bailar... Envolvo-me nesta clara e límpida sedução, brindo à Alva, e integrando as minhas asas às suas asas de amor eu me recuso a despertar, pois "mais perto de Ti eu quero estar!...
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = = =
* O autor é de São Paulo/SP
(esta crônica obteve o 6. Lugar no Concurso de Crônicas Adulto Nacional “Foed Castro Chamma”, em 2020, com o tema Aurora)
Fontes: Luiza Fillus/ Bruno Pedro Bitencourt/ Flávio José Dalazona (org.). III Concurso Literário “Foed Castro Chamma 2020”. Ponta Grossa/PR: Texto e Contexto, 2021.
Livro enviado por Luiza Fillus.
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing
Assinar:
Postagens (Atom)