Lavrador de Café (Cândido Portinari)
(Uma das Crônicas vencedoras do 4º. Concurso Literário Cidade de Maringá - 2008)
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Plantar, regar, colher, palavras mágicas de efeito esperado. Quando chove e não há seca, certo. Não foi o que sempre aconteceu com Tio Maneco. Só que o homem, apegado à terra, viveu fincado no pedaço de chão da família até à morte. Gente danada essa que fica. Gosto pelo cheiro da terra mesmo esturricada de seca, pela vida de vaca, galinha, porco e olhe lá. Sem jogo de bicho.
Nos anos 40, 50, era assim. Ele e mais o vizinho de mais perto, que nem “cumpade” era. Dois homens e nenhuma mulher. Quase não falavam, nem se falavam. Pitavam cachimbo tosco ou cigarro de palha na porta de casa, depois da lida do dia. Na casa, nem rádio. Novidade nenhuma, salvo alguém morto, trazido em boca de vizinho de léguas adiante.
Na paz do Senhor, nem Nele precisavam pensar muito. Rotina de sempre: ao primeiro raio de sol, levantar, depois, café com broa e pé na estrada até a plantação de milho. Pedacinho de terra que nem dele era. Tio Maneco não tinha bens. A casa era de sapé e dava pro gasto. A do patrão, boa moradia de fazenda. Era natural, era Dono. Com terra a valer, o patrão tinha plantação de cana, o que viria a ser a principal depois, no Norte Fluminense. E tratava seus peões ali, na dureza. Tio Maneco não reclamava de nada. Cordato por natureza, aceitava o que lhe dessem para não morrer de fome. Doença cuidava com as ervas do mato e pronto.
Um dia, a confusão quase o atinge. Choveu demais e a plantação acabou tal e qual na seca. Tio Maneco viveu “de teimoso”. Passou pela chuvarada como quem sai debaixo de chuva fininha. Nem bola.
Aos oitenta anos, apareceu numa reportagem da tevê do governo sobre coisas do Brasil. Queriam mostrar aos da cidade como e o quanto se vive no interior. Assustado, Tio Maneco foi respondendo lacônico, meio desconfiado daquela gente da cidade. – O senhor gosta daqui? – Gosto? Quer mudar pra cidade? – Não. O senhor sabe que vão trazer máquinas pra cá? – Não. O senhor não tem medo de ficar sem sua roça? – Não. Que tal dar um sorriso pra o pessoal que vai ver o senhor na televisão?
Aí foi que Tio Maneco encrencou. Tinha poucos dentes na parte de cima da arcada dentária e nenhum em baixo. Apertou os lábios, não sorriu. E é claro, estragou a reportagem do homem feliz do interior.
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Maria Lindgren
Rio de Janeiro/RJ
Sou uma mulher, que atura a terceira idade sem gostar. Ensinei pouca coisa durante muitos anos. Escrevo muitos escritos para escassa publicação em papel e abundante na internet, o que é absolutamente sinal de minha modernice. Nada me apavora a não ser a violência descarada do mundo de hoje, a solidão e alguns quilos a mais, talvez, algumas rugas. Preciso de gente a meu redor, pois viver só é para macambúzios e eu gosto de gargalhar com os outros. Leio e escrevo, mas necessito de ginástica, ar, sol, brisa fresca, cinema, jantar fora e uma ou outra festinha...Adoro meus amigos virtuais-reais e os reais-reais. Fazem-me falta, como a família.
Fontes:
http://odiariomaringa.com.br/noticia/219511
http://mariajoselindgren.blogspot.com/
Nos anos 40, 50, era assim. Ele e mais o vizinho de mais perto, que nem “cumpade” era. Dois homens e nenhuma mulher. Quase não falavam, nem se falavam. Pitavam cachimbo tosco ou cigarro de palha na porta de casa, depois da lida do dia. Na casa, nem rádio. Novidade nenhuma, salvo alguém morto, trazido em boca de vizinho de léguas adiante.
Na paz do Senhor, nem Nele precisavam pensar muito. Rotina de sempre: ao primeiro raio de sol, levantar, depois, café com broa e pé na estrada até a plantação de milho. Pedacinho de terra que nem dele era. Tio Maneco não tinha bens. A casa era de sapé e dava pro gasto. A do patrão, boa moradia de fazenda. Era natural, era Dono. Com terra a valer, o patrão tinha plantação de cana, o que viria a ser a principal depois, no Norte Fluminense. E tratava seus peões ali, na dureza. Tio Maneco não reclamava de nada. Cordato por natureza, aceitava o que lhe dessem para não morrer de fome. Doença cuidava com as ervas do mato e pronto.
Um dia, a confusão quase o atinge. Choveu demais e a plantação acabou tal e qual na seca. Tio Maneco viveu “de teimoso”. Passou pela chuvarada como quem sai debaixo de chuva fininha. Nem bola.
Aos oitenta anos, apareceu numa reportagem da tevê do governo sobre coisas do Brasil. Queriam mostrar aos da cidade como e o quanto se vive no interior. Assustado, Tio Maneco foi respondendo lacônico, meio desconfiado daquela gente da cidade. – O senhor gosta daqui? – Gosto? Quer mudar pra cidade? – Não. O senhor sabe que vão trazer máquinas pra cá? – Não. O senhor não tem medo de ficar sem sua roça? – Não. Que tal dar um sorriso pra o pessoal que vai ver o senhor na televisão?
Aí foi que Tio Maneco encrencou. Tinha poucos dentes na parte de cima da arcada dentária e nenhum em baixo. Apertou os lábios, não sorriu. E é claro, estragou a reportagem do homem feliz do interior.
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Maria Lindgren
Rio de Janeiro/RJ
Sou uma mulher, que atura a terceira idade sem gostar. Ensinei pouca coisa durante muitos anos. Escrevo muitos escritos para escassa publicação em papel e abundante na internet, o que é absolutamente sinal de minha modernice. Nada me apavora a não ser a violência descarada do mundo de hoje, a solidão e alguns quilos a mais, talvez, algumas rugas. Preciso de gente a meu redor, pois viver só é para macambúzios e eu gosto de gargalhar com os outros. Leio e escrevo, mas necessito de ginástica, ar, sol, brisa fresca, cinema, jantar fora e uma ou outra festinha...Adoro meus amigos virtuais-reais e os reais-reais. Fazem-me falta, como a família.
Fontes:
http://odiariomaringa.com.br/noticia/219511
http://mariajoselindgren.blogspot.com/
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