Depois de aposentado, o Ricardo vagueava pelas ruas da Baixa de Lisboa, para passar o tempo e recordar antigos episódios da sua vida. Nesse dia, por casualidade, passou pelo café onde seu amigo Alberto passava as tardes a ler o jornal. Entrou no café e dirigiu-se logo para a mesa onde seu amigo estava.
- Olá, Alberto, como vai essa saúde? Passas o tempo aqui sentado e daqui a pouco nem andar consegues!
- Tinha o pressentimento que algo desagradável me ia acontecer hoje. Não sabia o que era, mas com certeza que eras tu que me ias aparecer! Já me vai correr a tarde mal. Tu que andas sempre a vaguear pela Baixa, hoje deu-te para entrares aqui neste café posso perguntar porquê?
- Porque? Porque tinha saudades tuas e queria cumprimentar o meu querido amigo, Alberto.
- Querido amigo? Por favor não me ofendas com esse termo tão nobre, quando é verdadeiro!
- É o que eu sou: nobre e verdadeiro. E vim cá dizer-te que ontem vi a tua querida Lena ainda te recordas dela?
- És um verdadeiro finório (cara de pau). E o que eu tenho com isso?
- Como foi a tua amada pensei que ficasses feliz por eu a ter encontrado.
- És mesmo impossível. És sempre o mesmo amigo da onça!
- Não sei porquê, pois até na altura tive a gentileza de te apresentar a ela, o que ficaste (na altura) muito contente. Pois uma avião (moça linda e apetecível não aparecia todos os dias)!
- Já conheço essa conversa tua há muito, grande (nem te quero classificar). Mas em que falaram. De mim?
- De ti não! Falámos das nossas anteriores passagens pela vida. Mas vou contar-te tudo tim-tim por tim-tim?
Ontem fui dar um passeio até ao Terreiro do Paço e junto à muralha que separa o rio Tejo, vi ao longe um vulto de mulher que não me era desconhecida. Aproximei-me dela e qual o meu espanto que reconheci a Madalena. A nossa conhecida Lena!
- Olha quem encontro aqui, a minha querida e inesquecível amiga Lena!
- O que é que fazes aqui? Já pensava que tivesses morrido (o que não seria nenhuma pena?).
- Passei casualmente por aqui e mesmo de costas reconheci-te. Ainda hoje és uma avião, embora diferente do que conheci há anos, é certo respondeu-lhe ele.
- Para ti é tudo casualmente, grande finório (cara de pau). Deves estar a recordar as malandrices que fizeste na outra Banda (margem esquerda do Tejo), principalmente em Cacilhas e em Almada?
- Recordo-me daquela vez em que me convidaste a jantar no Ginjal (Cacilhas); não me recordo bem em que restaurante. Seria no Floresta?
- Nesse não foi de certeza, pois era muito caro para a minha bolsa. Foi no restaurante Elias.
- Recordo-me. Até notei que tu eras freguês habitual daquele restaurante, pois o garçon piscou-te o olhos e levou-nos para a tua mesa preferida, junto de uma janela que se via o Tejo e grande parte de Lisboa.
- Lena, tu tens boa memória! Claro que tinha ido algumas vezes a esse restaurante ? com os meus pais.
- Deixa-me rir ahahah. Que ingénua eu era nessa altura. Depois do jantar, quiseste que eu fosse a uma pequena praia que ficava mais adiante do Gihjal, onde tu dizias que tinhas pescado muito, com uma armação de dois varões de ferro; fazias um triângulo com a linha e colocavas um sinizinho; depois lançavas a linha ao mar e quando o peixe picava, o sininho tocava? Cara de Pau.
- Lena, a minha intenção era ensinar-te a arte de pescar, nada mais?
- Ricardo, quase que estou a acreditar (só quase) é que depois desse ensinamento, passaste à pesca em alto mar, e longe do razoável:
- Parece que me estou a recordar, sim. Sabes que esta memória já não é a que foi!
- Cara de Pau! Perdemos com a conversa o último barco para Lisboa, pois quando chegámos ao cais de embarque, já o ferryboat tinha partida há mais de uma hora. E ficámos no teu decrépito e furado Volkswagem, a quem tu chamavas carochinha (no Brasil fusca).
- Querida amiga, e ficámos muito bem, até às 6.30 horas quando do primeiro ferry para Lisboa.
- Tinha ido ao cabeleireiro fazer uns caracolinhos e quando abri a janela do meu quarto para minha mãe não saber a que horas tinha regressado, assustei-me a ver-me ao espelho, com o cabelo todo desgrenhado (em desalinho), além das nódoas de óleo que manchavam o meu vestido novo, apanhadas na tua praia, onde prometeste dar-me uma lição de pesca.
- Felizmente, tinhas deixado a janela de teu quarto só encostada. Eras previdente?
- Só deixava a janela encostada quando saía contigo.
- E com os outros?
- Não comento. Mais tarde, houve outro dia que me convidaste a ir a um baile, não em Cacilhas mas em Almada. Não me recordo o nome da localidade que dizias haver um grande baile.
- Parece-me que estou a recordar-me. Jantámos no restaurante Gonçalves.
- Onde também eras conhecido?
- Nesse dia não fomos para a praia que tinha óleo na areia. Subimos até ao castelo de Almada e depois descemos uma descida muito íngreme até quase ao Olho de Boi, onde descarregavam os barcos de pesca e onde me tinha dito haver um grande baile (mentiram-me).
- Ricardo, não sei porquê não acredito, nem na altura acreditei. Mas continua?
- Deve estar recordada que a estrada estava em reparação do lado do mar (direito) e tivemos que fazer inversão de marcha, e subir o que tínhamos descido. Quando chegámos junto das muralhas do castelo?
- Num recanto que devias conhecer muito bem? Continua.
- O carochinha avariou e tivemos que passar lá a noite. Dessa vez não te ensinei a pescar lembraste?
- Se me lembro, dessa tão estranha avaria, pois às 6 horas da manhã, o carro estava bom para apanharmos o ferry às 6.30 horas. Há avarias assim e tu eras mestre em inventá-las!
- Pelo menos, nessa manhã não chegaste a casa com o vestido com nódoas de óleo.
- De óleo vegetal, não, mas com nódoas negras (hematoma) nas pernas, principalmente nos joelhos.
- Nesse dia também tive problemas com minha mãe por causa das calças?
- Ricardo, por falar em tua mãe, ela era uma formidável cúmplice tua. Atendia muito bem os meus telefonemas, mas tu nunca estavas em casa; ou tinhas saído em serviço da empresa, ou tinhas saída não sabia para onde e por fim disse-me que tinhas ido fim-de-semana com a tua noiva. Perguntei-lhe quem era tua noiva o que ela me respondeu com grande descontração: não sei, são tantas!. Cara de Pau, da pior espécie!
- Mas tu gostavas do cá cara de pau!!! rssss
- Na nossa última saída te fintei e muito bem recordaste?
- Não. São fatos passados há tanto tempo?
- Vou-te recordar: Combinámos ir a um baile no Estoril. Desta vez não fomos para a outra margem, que ainda não havia a ponte 25 de abril (estava em começo de construção). Jantámos em Oeiras e depois seguimos para o Estoril. No regresso e como habitualmente, o teu carochinha avariou perto da Parede. Enquanto tu fingias que estavas a consertar o carro, eu sorrateiramente, procurei a casa de uma amiga, enfermeira no Sanatório da Parede. Faço ideia da rua cara depois de teres esperado horas e eu não ter aparecido! kakakaka
- Estou a recordar, estou. Esperei uma hora ou hora e meia antes de regressar a casa de meus pais. Imagina quão furioso eu estava, sua cara de pau, cafajeste, pilantra, etc... Confesso que não achei graça nenhuma com a tua atitude.
- Estás muito abrasilado, deves ter visto já muitas telenovelas!
- Pois é, minha amiga, hoje a juventude tem mais liberdade, mas no nosso tempo fazíamos tudo que eles fazem, mas tínhamos que ser mais engenhocas.
- E nesse aspeto, Ricardo, tu eras um grande engenheiro: Até talvez merecesses o Prémio Nobel.
- Estamos aqui parados e podíamos ir a qualquer lado?
- Eu vou ao Barreiro.
- Então podemos ir ao Barreiro?
- Tu é que sabes, mas na gare meu filho e meu neto estão à minha espera?
- Certo. Podíamos marcar um encontro para outro dia?
- Talvez para o próximo século! Passa bem e se possível, com mais juízo nessa cabeça oca!
- Então, inté?
- E foi assim amigo Alberto a minha conversa com a nossa Lena! Na próxima vez que nos encontrarmos, pago eu os cafés.
- Não disse que te pagava o café!
- Até à próxima, amigo!
FIM
(este texto é pura ficção, qualquer situação, lugar ou pessoas é pura coincidência)
Fonte:
Carlos Leite Ribeiro - Marinha Grande - Portugal
- Olá, Alberto, como vai essa saúde? Passas o tempo aqui sentado e daqui a pouco nem andar consegues!
- Tinha o pressentimento que algo desagradável me ia acontecer hoje. Não sabia o que era, mas com certeza que eras tu que me ias aparecer! Já me vai correr a tarde mal. Tu que andas sempre a vaguear pela Baixa, hoje deu-te para entrares aqui neste café posso perguntar porquê?
- Porque? Porque tinha saudades tuas e queria cumprimentar o meu querido amigo, Alberto.
- Querido amigo? Por favor não me ofendas com esse termo tão nobre, quando é verdadeiro!
- É o que eu sou: nobre e verdadeiro. E vim cá dizer-te que ontem vi a tua querida Lena ainda te recordas dela?
- És um verdadeiro finório (cara de pau). E o que eu tenho com isso?
- Como foi a tua amada pensei que ficasses feliz por eu a ter encontrado.
- És mesmo impossível. És sempre o mesmo amigo da onça!
- Não sei porquê, pois até na altura tive a gentileza de te apresentar a ela, o que ficaste (na altura) muito contente. Pois uma avião (moça linda e apetecível não aparecia todos os dias)!
- Já conheço essa conversa tua há muito, grande (nem te quero classificar). Mas em que falaram. De mim?
- De ti não! Falámos das nossas anteriores passagens pela vida. Mas vou contar-te tudo tim-tim por tim-tim?
Ontem fui dar um passeio até ao Terreiro do Paço e junto à muralha que separa o rio Tejo, vi ao longe um vulto de mulher que não me era desconhecida. Aproximei-me dela e qual o meu espanto que reconheci a Madalena. A nossa conhecida Lena!
- Olha quem encontro aqui, a minha querida e inesquecível amiga Lena!
- O que é que fazes aqui? Já pensava que tivesses morrido (o que não seria nenhuma pena?).
- Passei casualmente por aqui e mesmo de costas reconheci-te. Ainda hoje és uma avião, embora diferente do que conheci há anos, é certo respondeu-lhe ele.
- Para ti é tudo casualmente, grande finório (cara de pau). Deves estar a recordar as malandrices que fizeste na outra Banda (margem esquerda do Tejo), principalmente em Cacilhas e em Almada?
- Recordo-me daquela vez em que me convidaste a jantar no Ginjal (Cacilhas); não me recordo bem em que restaurante. Seria no Floresta?
- Nesse não foi de certeza, pois era muito caro para a minha bolsa. Foi no restaurante Elias.
- Recordo-me. Até notei que tu eras freguês habitual daquele restaurante, pois o garçon piscou-te o olhos e levou-nos para a tua mesa preferida, junto de uma janela que se via o Tejo e grande parte de Lisboa.
- Lena, tu tens boa memória! Claro que tinha ido algumas vezes a esse restaurante ? com os meus pais.
- Deixa-me rir ahahah. Que ingénua eu era nessa altura. Depois do jantar, quiseste que eu fosse a uma pequena praia que ficava mais adiante do Gihjal, onde tu dizias que tinhas pescado muito, com uma armação de dois varões de ferro; fazias um triângulo com a linha e colocavas um sinizinho; depois lançavas a linha ao mar e quando o peixe picava, o sininho tocava? Cara de Pau.
- Lena, a minha intenção era ensinar-te a arte de pescar, nada mais?
- Ricardo, quase que estou a acreditar (só quase) é que depois desse ensinamento, passaste à pesca em alto mar, e longe do razoável:
- Parece que me estou a recordar, sim. Sabes que esta memória já não é a que foi!
- Cara de Pau! Perdemos com a conversa o último barco para Lisboa, pois quando chegámos ao cais de embarque, já o ferryboat tinha partida há mais de uma hora. E ficámos no teu decrépito e furado Volkswagem, a quem tu chamavas carochinha (no Brasil fusca).
- Querida amiga, e ficámos muito bem, até às 6.30 horas quando do primeiro ferry para Lisboa.
- Tinha ido ao cabeleireiro fazer uns caracolinhos e quando abri a janela do meu quarto para minha mãe não saber a que horas tinha regressado, assustei-me a ver-me ao espelho, com o cabelo todo desgrenhado (em desalinho), além das nódoas de óleo que manchavam o meu vestido novo, apanhadas na tua praia, onde prometeste dar-me uma lição de pesca.
- Felizmente, tinhas deixado a janela de teu quarto só encostada. Eras previdente?
- Só deixava a janela encostada quando saía contigo.
- E com os outros?
- Não comento. Mais tarde, houve outro dia que me convidaste a ir a um baile, não em Cacilhas mas em Almada. Não me recordo o nome da localidade que dizias haver um grande baile.
- Parece-me que estou a recordar-me. Jantámos no restaurante Gonçalves.
- Onde também eras conhecido?
- Nesse dia não fomos para a praia que tinha óleo na areia. Subimos até ao castelo de Almada e depois descemos uma descida muito íngreme até quase ao Olho de Boi, onde descarregavam os barcos de pesca e onde me tinha dito haver um grande baile (mentiram-me).
- Ricardo, não sei porquê não acredito, nem na altura acreditei. Mas continua?
- Deve estar recordada que a estrada estava em reparação do lado do mar (direito) e tivemos que fazer inversão de marcha, e subir o que tínhamos descido. Quando chegámos junto das muralhas do castelo?
- Num recanto que devias conhecer muito bem? Continua.
- O carochinha avariou e tivemos que passar lá a noite. Dessa vez não te ensinei a pescar lembraste?
- Se me lembro, dessa tão estranha avaria, pois às 6 horas da manhã, o carro estava bom para apanharmos o ferry às 6.30 horas. Há avarias assim e tu eras mestre em inventá-las!
- Pelo menos, nessa manhã não chegaste a casa com o vestido com nódoas de óleo.
- De óleo vegetal, não, mas com nódoas negras (hematoma) nas pernas, principalmente nos joelhos.
- Nesse dia também tive problemas com minha mãe por causa das calças?
- Ricardo, por falar em tua mãe, ela era uma formidável cúmplice tua. Atendia muito bem os meus telefonemas, mas tu nunca estavas em casa; ou tinhas saído em serviço da empresa, ou tinhas saída não sabia para onde e por fim disse-me que tinhas ido fim-de-semana com a tua noiva. Perguntei-lhe quem era tua noiva o que ela me respondeu com grande descontração: não sei, são tantas!. Cara de Pau, da pior espécie!
- Mas tu gostavas do cá cara de pau!!! rssss
- Na nossa última saída te fintei e muito bem recordaste?
- Não. São fatos passados há tanto tempo?
- Vou-te recordar: Combinámos ir a um baile no Estoril. Desta vez não fomos para a outra margem, que ainda não havia a ponte 25 de abril (estava em começo de construção). Jantámos em Oeiras e depois seguimos para o Estoril. No regresso e como habitualmente, o teu carochinha avariou perto da Parede. Enquanto tu fingias que estavas a consertar o carro, eu sorrateiramente, procurei a casa de uma amiga, enfermeira no Sanatório da Parede. Faço ideia da rua cara depois de teres esperado horas e eu não ter aparecido! kakakaka
- Estou a recordar, estou. Esperei uma hora ou hora e meia antes de regressar a casa de meus pais. Imagina quão furioso eu estava, sua cara de pau, cafajeste, pilantra, etc... Confesso que não achei graça nenhuma com a tua atitude.
- Estás muito abrasilado, deves ter visto já muitas telenovelas!
- Pois é, minha amiga, hoje a juventude tem mais liberdade, mas no nosso tempo fazíamos tudo que eles fazem, mas tínhamos que ser mais engenhocas.
- E nesse aspeto, Ricardo, tu eras um grande engenheiro: Até talvez merecesses o Prémio Nobel.
- Estamos aqui parados e podíamos ir a qualquer lado?
- Eu vou ao Barreiro.
- Então podemos ir ao Barreiro?
- Tu é que sabes, mas na gare meu filho e meu neto estão à minha espera?
- Certo. Podíamos marcar um encontro para outro dia?
- Talvez para o próximo século! Passa bem e se possível, com mais juízo nessa cabeça oca!
- Então, inté?
- E foi assim amigo Alberto a minha conversa com a nossa Lena! Na próxima vez que nos encontrarmos, pago eu os cafés.
- Não disse que te pagava o café!
- Até à próxima, amigo!
FIM
(este texto é pura ficção, qualquer situação, lugar ou pessoas é pura coincidência)
Fonte:
Carlos Leite Ribeiro - Marinha Grande - Portugal
Nenhum comentário:
Postar um comentário