domingo, 23 de março de 2025

Vereda da Poesia = 230

Soneto de
EDY SOARES
Vila Velha/ES

INQUIETUDES

Vejo em meu rosto as marcas esculpidas.
O espelho mostra a face insatisfeita
nessas manhãs de noites mal dormidas,
que sua ausência junto a mim se deita...

prevalecendo em vão, em nossas vidas,
há sempre um fio de esperança à espreita,
e um “nunca mais” em nossas despedidas
que o esperançoso o coração rejeita!

E neste emaranhado de quimeras,
passam-se os sonhos, vão-se as primaveras,
os dias passam, tudo passa e enfim...

num misto de regressos e tristezas,
envolto no universo de incertezas…
só este amor incerto é certo em mim!
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Quadra Popular de
AUTOR ANÔNIMO

Fui na fonte apanhar água,
molhei a ponta do lenço;
o amor de muitos homens
da minha parte dispenso.
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Poema de
ANTERO JERÓNIMO
Lisboa/ Portugal

Da pele o inebriante apelo 
incita o chamamento dos lábios
num premente e ousado anelo
de beber da fonte o fogo.

Da pele rendidos à química reação
olhos em promessa reagente
deslumbradas mãos em tentação 
num afagar de sentidos sem remissão.

Da pele traça-se relevo mapeado
navegação ausente de pontos cardeais
conquista-se o desejo pela vontade
encanto que nega a breve saciedade.

Da pele essa audível sinfonia de afetos
corpos cegos pela iridescência da paixão
Náiade sulcando as margens do meu rio 
numa promessa de eterna inspiração.
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Haicai do
PROFESSOR GARCIA
Caicó/RN

A noite sem sono
e, a lua cheia de luz,
sozinha no abandono!
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Poema de
DOMINGOS FREIRE CARDOSO
Ilhavo/ Portugal

ANTE A VERDADE PURA E SEM DISFARCE
(Maria Amélia de Carvalho e Almeida in "Ao Sabor das Marés", p. 192)

Ante a verdade pura e sem disfarce
Dos teus olhos interrogando os meus
O coração, nesse instante do adeus
Não logrou fazer mais do que entregar-se.

E vieram as lágrimas juntar-se
Nascidas dos meus olhos tão ateus
Ao enlace dos meus braços pigmeus
Onde o teu colo em dor veio aninhar-se.

O amor falou mais alto nessa hora
Em que tu desististe de ir embora
E voltaste a aquecer a nossa cama.

A lua deu lugar à luz do dia
Das trevas despontou uma alegria
E das cinzas nasceu uma outra chama.
= = = = = = = = = 

Soneto de
AMAURY NICOLINI
Rio de Janeiro/RJ

DANÇA DOS SIGNOS

Hoje bem cedo eu tive a curiosidade
de ler o horóscopo publicado no jornal,
e se o que está escrito ali for a verdade
o dia que começa vai ser sensacional.

Conhecerei muita gente interessante,
terei mil oportunidades de progresso,
viajarei com destino a um lugar distante
e provarei o sabor doce do sucesso.

Fico pensando se você também, feliz,
e lendo o mesmo horóscopo que eu
pede que ainda mais os astros contem.

E depois, sem conseguir nada que quis,
vai descobrir o que foi que errado deu:
o jornal que a gente leu era de ontem.
= = = = = = 

Poema de
FILEMON MARTINS
São Paulo/ SP

IPUPIARA

Cravada no Sertão, jardim de flores
nasceu uma cidade hospitaleira.
Seus campos coloridos, sedutores,
tornam a vida bela e corriqueira.

Berço de heróis, poetas, escritores,
produzem versos na cidade ordeira.
O clima é quente, bom e aviva as cores
da alegria que é sempre verdadeira.

Ipupiara é flor cheia de encanto,
cuja beleza inspira o bem, porquanto
as alegrias são puras e completas.

Há de brilhar no céu, mesmo à distância,
esta Terra de amor e de elegância,
pois tu és a cidade dos Poetas!
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Poeminha de
A. A. DE ASSIS
Maringá/PR

Serra-serra,
será dor.
Cessa a serra,
será flor.
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Poema de
THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA
São Paulo/SP

A JANELA ENCANTADA

Se a luz do dia revela
que a noite de amor é finda,
fecho, depressa, a janela
e pensas que é noite ainda!
* * * *

A casa pobre e singela,
um dia se enriqueceu
e os pais, cheios de alegria,
a chamaram de Maria
quando a menina nasceu.

Um quarto, a sala, a cozinha,
uma porta e uma janela...
Nessa casa pequenina
cresceu, em graça, a menina
que, aos poucos, tornou-se bela!

À tarde sai à janela,
sempre no horário marcado
a olhara rua!... Risonha,
a menina pobre sonha
com seu príncipe encantado!

E é na janela o namoro...
Pede, o moço apaixonado,
ao pai a mão de Maria
e, para sua alegria,
o casamento é marcado.

O tempo passou ligeiro...
Sem a cortina de renda,
a casa em ruínas, fechada,
hoje, a janela encantada
ostenta uma placa: À VENDA.
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Soneto de
ERIGUTEMBERG MENESES
Blumenau/SC

PALETA DE SENTIMENTOS

Se a paleta de cores fosse o peito
E cada cor reflexo dos humores
Seriam os casais vistos nas cores
Dos sentimentos, cada um a seu jeito.

Somente o amor real seria aceito
E não havia ciúme ou rancores.
A vida era um universo de valores
Na arte de expor o par perfeito.

O casal de afeto fiel e franco
Com sentimentos puros era o branco,
A mistura das cores sem ter regra?

E o casal que engana, trai e mente
Teria do extrato reagente
Ao sulfato a cor que mais alegra?
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Poema de
JÉRSON BRITO
Porto Velho/ RO

RELICÁRIO
 
Do jardim retiraste a fragrância,
Lividez se alastrou, inclemente,
Não levaste, entretanto, a semente
Que me faz encurtar a distância.
 
Em mim mesmo encerrei tua essência,
Tua graça, teu jeito elegante,
Não me aparto sequer um instante
Desse alívio pra minha carência.
 
As delícias daquele cenário
Reuni numa doce memória…
Habitante do meu relicário
 
Apesar dos caminhos cinéreos,
Indelével no peito a história
Irradia sabores etéreos.
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Soneto de
MILTON S. SOUZA
Porto Alegre/RS, 1945 – 2018, Cachoeirinha/RS

Escravidão

Fazes de mim o que bem quer... mas não consigo
mudar o rumo desta história complicada.
Sufoco mágoas, resisto, brigo contigo...
mas volto sempre a caminhar na mesma estrada.

Na escravidão desta paixão desenfreada,
sinto morrendo uns tantos sonhos que persigo.
minha alma, às vezes, quase explode, revoltada
por ver que faço sempre o oposto do que digo.

Mas este amor, repleto de contradições,
é força imensa que inventa as próprias razões
e faz a mente parar de raciocinar.

A minha vida mais parece um labirinto:
ando sem rumo, bato portas, choro, minto...
por mais que tente, nunca deixo de te amar.
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Soneto de
LUIZ POETA
(Luiz Gilberto de Barros)
Rio de Janeiro/RJ

FLUTU...ÂNSIAS

Numa doce interferência do destino, 
nossos olhos... cristalinos...se encontraram
e o mundo se tornou tão  pequenino,
ante sonhos que os destinos  projetaram.

E havia tanto encanto em nosso olhar, 
tanto brilho em nosso mar de  poesia,
que nem mesmo a luz da Lua, a flutuar, 
conseguia ofuscar a fantasia.

Nosso amor, que  era tão  adolescente
e inocente em nossa linda ingenuidade,
transformou-se em lembrança... de repente.

repousando no brilho da mesma Lua, 
diluindo-nos, com  mansa  intensidade 
na  saudade que desperta... e que... flutua.
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Luís da Câmara Cascudo (O Marido da Mãe-D’Água)

Era uma vez um moço pescador muito destemido e bom que lutava com as maiores dificuldades para viver. Ultimamente o vento mudara e quase não havia peixe. Passava horas e horas na praia, com a pindaíba na mão e os peixes fugiam dele como o Diabo da cruz. O rapaz estava mesmo desanimado e dormia com fome muitas vezes.

Numa noite de luar estava ele querendo pescar e o peixe escapulindo depois de comer a isca. A noite foi avançando, avançando, o luar ficando alvo como a prata e caindo mesmo a friagem. O rapaz não queria voltar para sua casinha sem levar nem que fosse um peixinho para matar a fome.

Já ia ficando desanimado quando começou a ouvir umas vozes cantando tão bonito que era de encantar. As vozes foram chegando para mais perto, mais perto, e o rapaz principiou a olhar em redor para ver quem estava cantando daquele jeito. Numa ponta de pedra apareceu uma moça bonita como um anjo do céu, cabelo louro, olhos azuis e branca como uma estrangeira. Ficou com o corpo meio fora d’água cantando, cantando, os cabelos espalhados, brilhando como ouro.

O pescador ficou todo arrepiado mas criou coragem e disse:

– Que desejais de um cristão, alma penada?

A moça respondeu:

– Não sou alma penada, cristão! Sou a Mãe-d’Água! Nunca uma pessoa me perguntou alguma coisa e sempre eu dei, e jamais me ofereceram auxílio. Tens coragem?

– Tenho, declarou o rapaz.

– Queres pegar peixe?

– Quero!

– Pois sacode o anzol onde eu estou. Deves vir todas as noites até o quarto minguante e só pescar de meia-noite até o quebrar da barra.

Abanou a mão e mergulhou, sumindo-se.

O rapaz fez o que ela tinha aconselhado e pegou tanto peixe que amanheceu o dia e não pudera carregar tudo para casa.

Nunca mais viu a Mãe-d’Água mas, no tempo da lua, vinha pescar e foi ficando mais aliviado da pobreza. Os meses iam passando e ele ficando com saudade daquela formosura. 

Uma noite de luar, estando na pesca, ouviu o canto da Mãe-d’Água e, largando tudo, correu na confrontação da cantiga. Quando a Mãe-d’Água botou as mãos em cima da pedra o rapaz chegou para junto e, assim que ela se calou, o pescador agradeceu o benefício recebido e perguntou como pagaria tanta bondade.

– Quer casar comigo? – disse a Mãe-d’Água.

O rapaz nem titubeou:

– Quero muito!

A Mãe-d’Água deu uma risada e continuou:

– Então vamos casar. Na noite da quinta para sexta-feira, na outra lua, venha me buscar. Traga roupa para mim. Só traga roupa de cor branca, azul, ou verde. Veja que não venha alfinete, agulha ou coisa alguma que seja de ferro. Só tenho uma condição para fazer. Nunca arrenegue de mim nem dos entes que vivem no mar. Promete?

O rapaz, que estava enamorado por demais, prometeu tudo e deixou a Mãe-d’Água, que desapareceu nas ondas e cantou até sumir-se.

Na noite citada o pescador compareceu ao lugar, trazendo roupa branca, sem alfinete, agulha ou coisa que fosse ferro. Antes de o galo cantar, a Mãe-d’Água saiu do mar. O rapaz estava com um lençol bem grande, todo aberto. A Mãe-d’Água era uma moça tão bonita que os olhos do rapaz ficaram incendiados. Enrolou-a no lençol e foi para casa com ela.

Viveram como Deus com os Santos. A casa ficou uma beleza de arrumada, com roupa, mobília, dinheiro. Comida, água, nada faltava. O rapaz ficou rico da noite para o dia. O povo vivia assombrado com aquela felicidade que parecia milagre.

Passou-se um ano, dois anos, três anos. O rapaz gostava muito da Mãe-d’Água, mas de umas coisas ia se aborrecendo. A moça não tinha falta, mas, na noite da quinta para a sexta-feira, sendo luar, ficava até o quebrar da barra na janela, olhando o mar. Às vezes cantava baixinho que fazia saudade até às pedras e aos bichos do mato. Às vezes chorava devagarinho. O rapaz tratava de consolar a mulher, mas, com o correr dos tempos, acabou ficando enjoado daquela penitência e principiou a discutir com ela.

– Deixe essa janela, mulher! Venha dormir! Deixe de fazer assombração!

A Mãe-d’Água nem respondia, chorando, cantando ou suspirando na sina que Deus lhe dera.

Todo mês sucedia o mesmo. O rapaz ia ficando de mal a pior.

– Venha logo dormir, mulher presepeira! Que quisila idiota é essa? Largue essa mania de cantiga e choro virada para o mar! Você é gente ou é peixe?

E como o melhor já possuía em casa, deu para procurar vadiação do lado de fora, chegando tarde. A Mãe-d’Água recebia-o bem, não se queixando de nada e tudo ia correndo com satisfação e agrado da parte dela.

Numa noite o rapaz foi a um baile e ficou a noite inteira dançando, animado como se fosse solteiro. Nem se lembrava da beleza que esperava por ele em casa.

Só voltou de manhã e foi logo gritando pelo café, leite, bolos e mais coisas para comer. A Mãe-d’Água, com paciência, começou fazendo mais que depressa o que ele dissera, mas não vinha na rapidez do corisco.

O mal-agradecido, sentando-se numa cadeira, de cara franzida, não tendo o que dizer, começou a resmungar.

– Bem feito! Quem me mandou casar com mulher do mar em vez de gente da terra? Bem feito. É tudo misterioso, cheio de histórias. Coisas do mar... hi... eu te arrenego!

Logo que disse essas palavras, a Mãe-d’Água deu um gemido comprido e ficou da cor da cal da parede. Levantou as duas mãos e as águas do mar avançaram como um castigo, numa onda grande, coberta de espuma, roncando como um bicho feroz. 

O rapaz, morrendo de medo, deu uma carreira, subindo um monte perto da casa. Lá de cima se virou para ver. Casa, varanda, cercado, animais, tudo desaparecera. No lugar estava uma lagoa muito calma, pegada a um braço de mar. Ao longe ouviu uma cantiga triste, triste como quem está se despedindo do mundo.

Nunca mais viu a Mãe-d’Água.
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Fontes:
Luís da Câmara Cascudo. Contos Tradicionais do Brasil. Publicado originalmente em 1946. Disponível em Domínio Público.
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing

sábado, 22 de março de 2025

José Feldman (Guirlanda de Versos) * 27 *

 

ENCERRAMENTO DO BLOG DE TROVAS “O VOO DA GRALHA AZUL”


https://voogralhaazul.blogspot.com/
 

 Não vejo razão alguma em manter este blog em funcionamento. A manutenção de um blog como este exige muita pesquisa, muita organização, muita dedicação, revisão, etc., tanto trabalho por nada.  

Há 10 anos no ar, apenas dois seguidores, sendo um deles eu mesmo e um trovador da Itália, e apenas um comentário em mais de 4.500 publicações e dezenas de milhares de trovas. Lamentável que não saibam valorizar a divulgação de trovadores de diversas épocas, vivos ou falecidos.

Na data de hoje, 21 de março, cerca de 50 mil trovas e 1400 trovadores foram excluídas. O Blog deixa de existir.

Neste blog, Singrando Horizontes, estes dias excluí mais de 4 mil publicações e milhares de trovas vinculadas à UBT, entre resultados de concursos, artigos, trovadores, etc. Contudo continuarei divulgando a trova, mas apenas dos amigos, colaboradores, apoiadores e incentivadores, vivos ou falecidos.

Paulo Vinheiro (Uma Flor no Meio da Vida)

Paulo Vinheiro, nome artístico do escritor e poeta Paulo Vieira Pinheiro, é de Monteiro Lobato/SP. 
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“O que queres?” Perguntei-me!

Dia e outro, na procura dos sentidos, me perco nas palavras que brotam por todo lado com seu propósito de me confundir.

Jornais, revistas, livros... tantas letras que doem.

Já li de tudo, me arrebatam as bulas...

Machado, Alencar, Scliar, Saramago, Lobato, e tanta gente que depois de um tempo me cobra: – que dizes? Que me dizes?

Ousado, talvez com um pouco de medo, arrisquei umas pequenas linhas... pequeninas... pequenininhas.

Então escrevi.

Tive a sorte de aprender a letrar pensamentos e os letrei; então achei pouco.

Pensei: – Se posso descrever o que penso... porquê não posso escrever o que sinto?

Vi que existia uma ponte estreita, longa, perigosa e muita vez conflitiva, entre o que eu sentia e pensava.

Sofri, mas não desanimei, então me reescrevi.

Contei contos, desvelei novelas, trabalhei textos... passei a ler com mais cuidado, com mais rigor, com mais seleção.

Passei a ler como se eu tivesse escrito o texto que não escrevi. Busquei o sentimento que vale a pena (no estrito sentido da pena que escreve).

Antes disso, eu não respeitava os que escreveram tanto como mereciam.

Textos bons ou textos nem tanto como queríamos ler, servem para o que servem, para se qualificarem uns aos outros.

Quem sabe o que é bom?

Sempre gostei das coisas mais fáceis, e por isso busquei as mais difíceis, só para me contrariar... só eu sofri no caso das palavras que li.

Agora há pouco me perguntaram:  – E a flor, onde entra nisso que dizes?

Ora entendo que a flor é o produto da expressão do que se diz, do que se escreve, do que se pinta, do que se faz para a apreciação, como o trabalho, como o amor... como a expressão pura e simples da ação.

Existe no campo ou nos jardins, todo o tipo de expressão floral. Existe no jardim de nossos dias uma quantidade de obras a se admirar, umas com mais cuidado, outras com mais atenção, outras detalhadas, outras simples... cada qual com suas qualidades.

Para nós sobra entender o que fizemos ou faremos de nós.

Fontes:
Texto enviado pelo autor.
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing  

Vereda da Poesia = 229


Soneto de
EDY SOARES
Vila Velha/ES

PARAFRASEANDO BILAC

Ouvem estrelas, falam com as flores,
e tantas vezes sofrem dores vãs;
dizem sentir o cheiro das manhãs... 
Haverá loucos, aonde quer que fores!

Fazem dos versos, sempre, os seus divãs,
falam de tédio, mortes, desamores...
e tantas vezes atribuem cores 
aos quadros de floradas temporãs.

São sensacionalistas desvairados
buscando, na poesia os verdes prados,
o bucolismo, a paz o, amor profundo...

Podem pensar que somos masoquistas
ou legião de loucos alquimistas...
Mas os poetas vão salvar o mundo!
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Quadra Popular de
AUTOR ANÔNIMO

O teu rosto de morena
levemente tem a cor;
para poder compará-lo
não encontro uma só flor.
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Poema de
ANTERO JERÓNIMO
Lisboa/ Portugal

MÁSCARA

Maquilha a preceito os traços do seu rosto invisível
para cada ocasião há sempre uma máscara disponível
Frente ao toucador ilude na displicência
sabe embelezar-se com finas vestes d'aparência
Surge em palco, glamorosa! Não tem hora marcada
dispensa convite e não precisa ser anunciada
Conhece de cartilha os dotes da insinuação
assemelha-se à verdade pela força da convicção
Bamboleando-se audaz observa os presentes
vai distribuindo vénias e olhares reluzentes
O sorriso é fácil, a confusão o seu sustento
é exímia a eleger o espectador mais desatento
Pompa, circunstância, a festa vai no seu apogeu
focam-se as atenções na realidade que se esqueceu
Continua a menear-se, coreografia mil vezes ensaiada
tropeça, cai a máscara, foge em debandada
Cessam os aplausos, pois a festa já terminou
falsas vestes em beco escuro alguém abandonou.
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Haicai do
PROFESSOR GARCIA
Caicó/RN

A luz do luar,
vejo arabescos na areia
de espumas do mar!
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Poema de
DOMINGOS FREIRE CARDOSO
Ilhavo/ Portugal

QUE NEM UM RASTO FIQUE NO CAMINHO
(Manuel Lima Monteiro Andrade in "Mãos abertas" p. 122)

Que nem rasto fique no caminho
Por onde me perdi, errando os passos
E os meus pés possam ter deixado traços
Quando avançavam sós e em desalinho.

Por mim acompanhado andei sozinho
Com glória diminuta e bens escassos
Cingi os grandes nadas com meus braços
Plantei agrura e quis colher carinho.

Em vão tentei encher meu ser de bem
Degustar o melhor que a vida tem
Mas o meu peito a graça não achou.

Fugaz e pouca foi a rainha vida
Uma estrela cadente que, perdida
Riscou o céu e logo se esfumou...
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Poema de
ANDRÉ GRANJA CARNEIRO
Atibaia/SP, 1922 – 2014 , Curitiba/PR

QUÂNTICA REALIDADE

Na pequena morte
ressuscito o mundo estranho
da minha cabeça.
Sou o mandarim no sonho da borboleta.
Vivo a irrealidade dos fatos
sem a memória acordada.
Neste próximo milênio
faço 15 bilhões de anos.
Ainda tenho na ponta do dedo
um átomo girando do big-bang.
A cobra,
desesperada
com a falta dos braços,
abraça Eva com o corpo inteiro.
Os avós peixes não se lembram
quando saíram da água.
Não há mais opostos:
real e imaginário,
passado e futuro,
vida e morte.
As palavras caíram
no lago global do esquecimento,
a quântica relatividade dança conosco
no espaço curvo deste planeta redondo.
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Poema de
FILEMON MARTINS
São Paulo/ SP

COISAS DE AMOR

É noite calma. A lua está brilhando,
namorados passeiam pela rua,
enquanto aqui a sós fico sonhando,
- como dói no meu peito a ausência tua.

Quisera, nesta noite, estar amando
tranquilo a contemplar a luz da lua
e seguirmos, unidos, procurando
novos sonhos, que a vida continua...

Meu coração, porém, desconfiado,
parece reviver triste passado,
— não acredita mais nesta emoção. '

Se a vida não perdeu o encantamento
desse sonho de amor, desse momento,
— coisas de amor não têm explicação.
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Poema de
THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA
São Paulo/SP

A IDADE DO OLHAR

O teu olhar me convida
ao amor... e, ainda que evite,
no meu delírio, atrevida,
eu aceito o teu convite.

O olhar de espanto
diante do mundo.
O primeiro brinquedo, Papai Noel, a escola...
A vida correndo sem parar
e eu a brincar
indiferente...
Meu tempo é o presente.

O olhar sem medo
diante do mundo.
O primeiro amor, a faculdade, o emprego...
Em busca dos sonhos, o adeus, o desapego.
Vencendo distâncias, transpondo fronteiras
eu procuro...
Meu tempo é o futuro.

O olhar sereno
diante do mundo.
Os primeiros sonhos sendo refeitos...
Sobre o livro de orações, os óculos
e sobre a folha de papel, em branco, a caneta
à espera da inspiração para a poesia.
A visita, a carta, o telefone,
o enfado...
Meu tempo é o passado.
= = = = = = = = =  

Soneto de
MIGUEL RUSSOWSKY
Santa Maria/RS (1923 – 2009) Joaçaba/SC

JOIA MAIOR!…

Começo por supor, nos ares, o desenho
De um verso magistral procurando agasalho.
Cabe a mim (sou poeta) encontrar um atalho
Para vê-lo nascer nos recursos que tenho.

Com as rimas gentis nas estrofes, me empenho
Em ser original, (Poucas vezes eu falho),
Já nem ouso explicar se é prazer ou trabalho
Exibir ao leitor as farturas do engenho.

O esmeril dá-lhe o brilho e lhe poda as arestas…
Assim é que se faz um soneto bonito,
Para ser declamado em saraus ou em festas.

Ninguém pode dizer o valor de uma joia,
Se polida não foi pela mão do perito.
É na lapidação que a beleza se apoia.
= = = = = = = = =  

Poema de
SEBAS SUNDFELD
Pirassununga/SP, 1924 – 2015, Tambaú/SP

DEVANEIO

Sua imagem visita
a madrugada do meu sonho.
Recebo-a com a carícia da saudade,
A penumbra da sala
tem o aconchego do seu abraço
e as rosas ainda guardam
o perfume do seu corpo.
Reclino lembranças
sobre a almofada de veludo,
onde nossas mãos se encontraram
ainda há pouco,
no adeus das nossas esperanças.
Para brindar sua presença
retida em meus sentidos,
experimento o sabor de beijos
no vinho que você deixou
na taça de cristal.
E o silêncio dos meus lábios
recita a poesia do seu nome,
= = = = = = = = =  

Poema de
LUCIANA SOARES CHAGAS
Rio de Janeiro/RJ

O VENTO

O vento canta entre as árvores,
seu som desliza sobre as folhas,
o mar sereno, em ondas calmas,
enquanto a lua acende a noite.

A chuva cai sem pressa,
beija o chão em gotas frias,
desenha rios nos caminhos,
abraça o tempo sem destino.

O sol desperta em luz dourada,
veste o dia em fogo e sombra,
banha rostos, veste sonhos,
espalha vida pelo ar.

Um olhar faceiro brilha leve,
segue o vento em seus mistérios,
folhas dançam nos cabelos,
o silêncio esconde um susto breve.

No horizonte, o dia espera,
o tempo e o vento são passagem,
o vestido da moça esvoaça,
mostrando as curvas... da paisagem.
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POEMA DE
APARECIDO RAIMUNDO DE SOUZA
Vila Velha/ES

DECISÃO

Parei de correr atrás da saudade
que ficou de você...
Agora não me acho em mim
Acredite! É a mais pura verdade…
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 Poetrix de
REGINALDO COSTA DE ALBUQUERQUE
Campo Grande/ MS

Príncipe moderno

Na dúvida,
anunciou o sapatinho de cristal
nos classificados do jornal.
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quinta-feira, 20 de março de 2025

Adega de Versos 138:

 

A. A. de Assis (Felicidade sem camisa)

A praia não é somente a praia: é um monte de outras alegrias

Coisa bonita é o povo curtindo férias na praia. Um lugar superdemocrático, aberto a todos os padrões. Um homem de calção e sem camisa, uma mulher de maiô ou de biquíni, você não sabe se é alguém que tem mais ou menos dinheiro, se tem mais ou menos cultura, se é mais ou menos importante lá no onde mora. E mais: a maioria nem tá aí para esses grilos de elegância e moda. Todo mundo igual. Todo mundo gente. Gente feliz, que trabalha o ano inteiro e agora está ali celebrando a vida.  

Primavera-verão em Balneário Camboriú. O sol do sul. Paranaenses, catarinenses, gaúchos. Mais banhistas à beça vindos de outros estados. Mais los hermanos argentinos, uruguaios, paraguaios, bolivianos, chilenos. Uns chegados de automóvel, outros de ônibus, de moto ou de avião, outros em grupos de excursão.

Todo mundo numa boa. Logo cedinho arrumando a tralha pra espetar barraca na areia e salgar o corpo no mar. O isopor com as bebidinhas, a cesta cheirosa recheada de comes-comes. As crianças se deliciando com o churro, o sorvete, o milho verde.

No meio dos de férias, também homens e mulheres aproveitando a temporada pra ganhar um dinheirinho vendendo chapéus, roupas, cerveja, algodão doce, cocada, pipoca, ou alugando cadeiras e barracas. Um velhinho oferecendo bilhetes de loteria. Duas moças cantando o pregão: “Salada de frutas, sanduíche natural…”

Mas a praia não é somente a praia: é um monte de outras alegrias. Se o dia acorda chuvinhoso, o pessoal aproveita pra passear no comércio. Esvazia a Avenida Atlântica, enche a Avenida Brasil – um comprido shopping a céu aberto, aquela enorme fileira de lojinhas com o de tudo que a moçada gosta. De noite tem os barzinhos, os restaurantes, as baladas, tem a noite toda pra paquerar, comer, dançar.

Tem também a opção de dar umas esticadas pela vizinhança: Itajaí, Itapema, Bombinhas, Cabeçudas, Beto Carrero, Brusque, Nova Trento, Pomerode…

Gente boa, gente muito gente. Que estuda, trabalha, produz.

Gente do batente, que realmente merece esses belos dias de recreio com a família na praia.

Fonte:
Texto enviado pelo autor. 
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing  

Silmar Bohrer (Croniquinha) 131

Como foi que tudo começou ? 

Diria que é difícil explicar. Mas os relatos históricos de estudiosos e  pesquisadores dizem (ou sugerem) que no princípio tudo era imensidão inócua e vazia. Até o Gênesis confirma. 

E um sopro deu início àquilo chamado vida, lá na frente, transformando tudo em civilização .  Passaram séculos desde as priscas Eras .

A evolução foi tanta, imensa, grandiosa. Para todo lado.  Para todos os seres. 

Chegamos ao ano 2025 e eis que surgem num canto quase esquecido, próximo às barrancas do planeta, dois animaizinhos de quatro pata carregados de energia solar. 

Dois pequenos puros de alegria, humor à beça, traquinagens muitas.  Arrebanhados, logo tomaram conta do ambiente e da empatia da casa. 

Assim é que nos primórdios do ano surgiu o TRIO DA BAGUNCINHA - Theo, Ísis e papai, desde a manhãzinha agitando, brincando, conversando, fazendo o pequeno circo dos cachorrinhos.

As afeições misturaram tanto que quando saio para a rua vejo carinhas de tristes, silentes, de abandono.  Na volta, já no portão encontro Dom Theo e Dona Ísis com os olhos sorrindo e rabos abanando para iniciar a baguncinha do momento.

Dois tesouros dando lições de cachorrismo e civilidade.

Fontes:
Texto enviado pelo autor.
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing