domingo, 21 de julho de 2024

Coelho Neto (O ambicioso)

De volta ao cemitério, onde, sem uma lágrima, deixara o corpo do pai, Felício recolheu-se à casa deserta, e como havia luar, nem acendeu a candeia, para poupar o azeite.

Sentando sob o alpendre, pôs-se a olhar o arvoredo frondoso, cuja folhagem reluzia à claridade, e, mais longe, ondulando, o canavial e o milho.

O velho aproveitara toda a terra lavradia, respeitando apenas o pequeno bosque, em que se abrigava a fonte, e onde ele e os camaradas iam recolher os galhos secos com que alimentavam o lume.

Seis homens robustos trabalhavam como lavradores, ajudando-os no áspero labor agrícola — uns ao arado, outros na carpa, ou colhendo, ou plantando.

As mulheres cuidavam do serviço doméstico, e ainda raspavam a mandioca, debulhavam o milho, batiam o feijão, retiravam o mel dos favos, e reuniam, à tarde, as aves.

As próprias crianças eram aproveitadas, — umas guiando o gado aos pastos, outras levando a comida aos trabalhadores, à roça; e como havia fartura, era um encanto a vida no sítio que prosperava a olhos vistos.

Sabia-se que o velho tinha haveres; nem ele fazia mistério disso; antes afirmava com garbo, para estimular os homens ao trabalho: “O pouco que tenho, deu-me a terra, assim o ganhareis, se trabalhardes com perseverança. Eu não vos engano — tendes de mim o que mereceis. O bem que fizerdes vos será contado e pago.”

E assim era.

Felício, porém, não se continha aos sábados; mal sopitava a raiva quando o pai pagava as férias aos camaradas.

Aquele dinheiro, passando a mãos alheias, doía-lhe, como se fosse a suas próprias carne tirada aos pedaços e, sempre que se recolhia ao leito, murmurava com avareza:

— Hei de acabar com isto! Para que tanta gente? Um só homem basta, e esse serei eu!

Assim pensou, e assim fez.

No dia seguinte ao enterro do velho, Felício chamou os camaradas, fez-lhes as contas, e despediu-os.

*** 

Quando se viu só, Felício esfregou as mãos contente, dizendo:

— Agora sim! Tudo quanto fizer será meu. Não tenho mais quem coma o que eu planto, nem quem leve os meus lucros!

Os mesmos cães, que guardavam a roça, dando caça aos animais daninhos, foram enxotados à pedrada, e o ambicioso ficou solitário, olhando a lavoura exuberante que se desenvolvia ao sol.

Vieram, porém, as chuvas, e a terra entrou a produzir doidamente. O mato apontou, cresceu, invadindo as culturas, cobrindo os caminhos que desapareciam, e Felício, levantando-se muito cedo, ainda com as estrelas a luzirem no céu, saía, e lá se punha a capinar com ânsia.

Por não ouvir as vozes dos animais que alegravam o sítio, — um boi a mugir, uma ovelha a balar, aqui uma galinha cacarejando aos pintos, adiante a pata, com a pequenina frota penugenta dos patinhos — ficou preocupado.

Por onde andariam? Talvez no pasto. Era melhor assim: não só lhe poupavam o trabalho de os tratar, como ainda, alimentando-se com o que buscavam — e havia tanta erva e eram tantos os bichinhos! — livravam-no de despesas.

E voltava à terra com desespero.

Para não perder tempo em fazer lume, almoçava uma fruta, e continuava a trabalhar, casmurro.

Todo seu esforço, porém, não conseguia conter a invasão. As ervas más apareciam em toda a parte e, apenas a enxada deixava um talhão, logo os rebentos abrolhavam.

Às vezes, ele sentava-se à borda das rampas alagado de suor, os braços doloridos, e ficava ali inerte, com a alma cheia de desânimo, revoltado contra aquela vegetação perniciosa que lhe comprometia a lavoura. Logo, porém, excitado pela ambição, retomava a enxada e prosseguia o trabalho.

Em pouco tempo, a linda, viçosa lavoura de outrora desapareceu, suplantada pelo ervaçal bravio e, onde o milho lourejava com a sua espiga de ouro desnastrada ao sol, cresceram arbustos agrestes e palhegal farfalhante, por entre os quais as cobras venenosas rastejavam chocalhando.

Os animais, mal a noite baixava, saíam das tocas, devorando e destruindo a plantação. Todas as manhãs, Felício parava, pesaroso, diante das covas que eles abriram à noite, e ainda achava restos de mandioca, batatas, raízes de aipim abandonadas à flor da terra.

Já começava a desesperar, mas sempre ambicioso, não se resolvia a recorrer aos lavradores.

Se chamasse alguns homens, tudo voltaria ao antigo viço, mas teria de lhes pagar. Não quis, insistiu no labor inútil que só o alquebrava, e, quando caía prostrado, arquejando, logo ouvia os bem-te-vis, que, das árvores, pareciam vaiá-lo e rir da sua pretensão ridícula.

Levantava-se, enfurecido, indignado, blasfemando, atribuindo a sua desgraça aos invejosos que haviam lançado maus olhos ao sítio.

Um dia, sentiu na água um sabor estranho e logo suspeitou que o andavam envenenando.

Subiu ao bosque para examinar a fonte. Dificilmente deu com ela, tão cheia estava de folhas e ramos podres, até cadáveres de animais boiavam em suas águas antes tão límpidas, porque o velho, de quando em quando, mandava um dos camaradas limpar a fonte para evitar que se formassem balseiros.

Então, lá em cima, lançando os olhos à planície, viu toda a grandeza de sua desgraça: — a roça era um mato intenso, e já em torno da casa os espinheiros cresciam e os juás davam os seus venenosos frutos de ouro.

As lágrimas saltaram-lhe dos olhos e, compreendendo a sua impotência, deixou-se cair em terra humilhado, certo de que sozinho jamais conseguiria vencer aquele mal que era uma vingança da terra.

Lembrou-se, então, dos homens, os leais trabalhadores que haviam ajudado o velho a ganhar o dinheiro que lá estava, em boas moedas, no fundo da arca.

Ah! Se todos ali estivessem... as árvores estariam cobertas de flores, as canas estariam crescidas em touceiras, os milhos ostentariam as gordas espigas, e o gado reluziria nédio.

O gado... onde andariam os seus bois, as suas ovelhas, as suas cabras, os seus cevados e bacorinhos e as aves? Fosse ele procurá-los!

Com um arrancado suspiro desceu vagarosamente à planície.

À noite, preocupado e sem sono, pôs-se a andar pela casa deserta.

Saindo no alpendre, pareceu-lhe ver o velho pai sentado no banco, em que costumava ficar à noite, fumando o seu cachimbo, a olhar distraidamente as estrelas luminosas.

Atentou a visão, e reconheceu o defunto. Felício pôs-se a tremer, agarrado a um dos esteios, e ouviu o pai que, em voz triste, lhe disse:

" - É a ambição que te vai levando à miséria, meu filho! Quiseste, por avareza, fazer o impossível e com ânsia de tudo aproveitar, tudo perdeste. Se não houvesses despedido os auxiliares que aqui deixei, não estarias agora a lamentar o prejuízo: onde há mato haveria flor, a água correria livremente e pura, as roças estariam viçosas, e sentirias a companhia do teu semelhante, e ouvirias, no teu repouso, as vozes dos animais. Fazendo felizes serias venturoso. O muito querer é sempre prejudicial. Quem dá trabalho enriquece sorrindo, quem, do seu pão, dá uma migalha ao pobre, farta-se e faz ventura. Que conseguiste com a ambição?

" Antes de lavrar, terão os homens que desbastar, e assim vais a pagar o teu pecado com as moedas do cofre e ainda com a humilhação. Ficaste isolado, e a urze da terra saiu a acompanhar-te. Se não quiseres que o mal entre no teu coração, enche-o de bondade: a alma virtuosa não aceita o pecado, é como a leira bem plantada e cuidada, onde não cresce o espinhal. Nos espíritos vazios, como nas terras sem cultura, nascem os maus pensamentos como rebentam os cardos. Quiseste, só com teus braços, fazer a tarefa de seis homens, e nem a tua levaste a termo, porque, mal acabavas a carpa, logo as ervas renasciam. Chama os que despediste, dá-lhes trabalho, e não penses que eles te furtam o pão, acrescentam-no e abençoam-no. O egoísta é como o areal solitário, que, por não dar vida à planta, sofre todos os rigores do sol sem o fresco dos arroios e o gozo da mais pequenina sombra. O mundo é de todos, e só é verdadeiramente feliz quando se é bom. Chama os que partiram, recebe-os na tua casa, paga-lhes o trabalho que fizerem, e eles o renovarão o que a avareza destruiu e tornarás a ver os frutos, a ouvir os gados, e outras moedas se irão juntar às que deixei na arca!"

Felício ficou um momento amparado ao esteio, mas o silêncio não foi mais interrompido: o velho desaparecera.

O velho!... Teria sido ele, ou a própria consciência do avarento que assim se manifestara?... Mistério!...

*** 

Na manhã seguinte, começavam a cantar os passarinhos quando Felício desceu à vila para contratar lavradores.

Hoje, o sítio é o mais belo do lugar. A casa é nova e, em torno dela, outras avultam e, entre as árvores frondosas, é da manhã à tarde, um alegre cantar de lavradores.

E os milhos crescem, cresce o canavial, o pomar é todo fruto, e Felício prospera, contente, vendo à volta da sua felicidade tanta gente feliz bendizê-lo.

Fonte: Olavo Bilac & Coelho Neto. Contos Pátrios. RJ: Francisco Alves, 1931. Disponível em Domínio Público.

Vereda da Poesia = 62 =


Trova Humorística de Nova Friburgo/RJ

THEREZINHA TAVARES

Correu atrás de estrupício
e o tropeço foi fatal,
conseguiu só sacrifício:
mais um belo pré-natal!
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Poema do Porto/Portugal

ALBERTO DE SERPA 
(Alberto de Serpa Esteves de Oliveira)
1906 – 1992

Recreio

Na claridade da manhã primaveril,
Ao lado da brancura lavada da escola,
as crianças confraternizam-se com a alegria das aves....

E o sol abre-lhes rosas nas faces saudáveis
A mão doce do vento afaga-lhes os cabelos,
— Um sol discreto que se esconde às vezes entre nuvens brancas...

As meninas dançam de roda e cantam
As suas cantigas simples, de sentido obscuro e incerto,
Acompanhadas de gestos senhoris e graves.

Os rapazes correm sem tino e travam lutas,
Gritam entusiasmados o amor espontâneo à vida,
À vida que vai chegando despercebida e breve...

E a jovem mestra olha todos enlevadamente,
Com um sorriso misterioso nos lábios tristes…
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Aldravia de Juiz de Fora/MG

CECY BARBOSA CAMPOS

Cabelos
molhados
gingando
faceiros
ao
vento
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Soneto do Rio de Janeiro/RJ

JOÃO DA ILHA
(Ciro Vieira da Cunha)
São Paulo/SP, 1897 — 1976, Rio de Janeiro/RJ+

Saudade

Saudade! o teu olhar longo e macio
Derramando doçura em meu olhar...
Um bocado de sol sentindo frio,
Uma estrela vestida de luar...

Saudade! pobre beijo fugidio
Que tanto quis e não cheguei a dar...
A mansidão inédita de um rio
Na volúpia satânica do mar...

Saudade! o nosso amor... o teu afago...
O meu carinho... o teu olhar tão lindo...
Um pedaço de céu dentro de um lago...

Saudade! um lenço branco me acenando...
Uma vontade de chorar sorrindo,
Uma vontade de sorrir chorando...
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Trova Premiada em Cantagalo/RJ, 2012

MARIA DA CONCEIÇÃO FAGUNDES 
(Curitiba/PR)
 
Ventre Materno… o espaço
da semente em gestação,
onde Deus fez Seu regaço
em amor à Criação!
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Poema do Rio de Janeiro/RJ

AFONSO FÉLIX DE SOUZA
Jaraguá/GO, 1925 – 2002, Rio de Janeiro/RJ

Noite sem alma

Noite sem vozes roucas
assombrando o silencio.
Noite nua.

Passos incertos
duro como o asfalto
e pensamentos leves
guiando-me os passos.
Indiferença do luar.
Na rua triste
paradas súbitas.
No olhar o medo ingênuo
da infância que não morre.

Risos de mulher
atrás da janela fechada.
Desejos rápidos
a apressar os passos...
A memória murmura
confidencias,
que o silêncio apaga.

Noite sem véu.
Noite que tem a clara nudez da alma
que sonha no escuro.
Desejos leves de amor a guiar os passos
e essa ânsia incontida de sonhar
que como, a infância
não morre nunca.
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Trova Popular

As rosas é que são belas,
são os espinhos que picam,
mas são as rosas que caem,
são os espinhos que ficam…
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Soneto do Rio de Janeiro/RJ

CONSTÂNCIO ALVES
(Antonio Constâncio Alves)
Salvador/BA, 1862 — 1933, Rio de Janeiro/RJ+

Soneto mudado

Eras em plena mocidade, quando
Da nossa casa, um dia, te partiste;
E eu, coitado, sem mãe, pequeno e triste,
Fiquei por esta vida caminhando.

Assim — no meu amor teu rosto brando
Do tempo à ação maléfica resiste,
E o meu é, hoje, como nunca o viste,
Tanto o passar da idade o foi mudando.

Tão velho estou, que já me não conheces;
Nem poderias ver no que te chora
Esse a quem ensinaste tantas preces.

E tão moça ainda estás que (se memora
A saudade o teu vulto) — me apareces
Como se fosses minha filha agora.
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Trova de Bauru/SP

ERCY MARIA MARQUES DE FARIA

Saudade é um velho barquinho
que  vence o tempo e a distância
e  recolhe, no caminho,
os  pedacinhos da infância ...
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Poema de Rio Claro/SP

PILAR REYNES DA SILVA CASAGRANDE

Os que vêm de longe

Os que vêm de longe não me encontrarão,
pois eu já terei partido;
talvez apenas achem marcas dos meus passos
ao longo do caminho percorrido.
Os que vêm de longe não me chorarão,
porque não saberão o que pensei,
e as pedras que pisei na caminhada
serão apenas pó do que amei,
como poeira do tempo inexorável
sepultando uma inexistência inenarrável.
Os que vêm de longe não entoarão
um verso de esperança e de alegria;
não mostrarão afeto nem tristeza
e serão pobres párias da poesia,
dessa mesma poesia que me invade
como um gosto de encanto e de saudade…
Os que vêm de longe ficarão sozinhos
eu não posso esperar ninguém,
estarei bem longe, muito longe,
dos que vêm de longe sem me ver…
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Trova Humorística de Pindamonhangaba/SP

JOSÉ OUVERNEY

Grita ao marido a ciumenta:
- Não vais tocar mais na banda!
E a loira, ao lado, argumenta:
– Banda não... Meu nome é “Vanda”!
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Soneto de Sorocaba/SP

DOROTHY JANSSON MORETTI
Três Barras/SC, 1926 – 2017, Sorocaba/SP

Poeta

Nunca lhe falta a sensibilidade,
a sutileza, o dom de transferir
às palavras toda a expressividade
na alegria ou na mágoa de sentir.

O poeta é assim, é versatilidade...
Seja o que for que intente traduzir,
mergulha em vida, em sonho, em realidade,
faz de uma noite a aurora reflorir.

Transcende as dores de um mundo sofrido,
pisa os mistérios do desconhecido,
traz as estrelas para o nosso chão.

E quem o escuta, exclama, fascinado:
“Era assim que eu queria ter cantado,
se soubesse escrever minha canção!”
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Trova de Jacarepaguá/RJ

ANTONIO CABRAL FILHO

Enquanto o tempo ameaça
com seus bloqueios constantes,
o amor entorna uma taça
no banquete dos amantes.
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Glosa de Fortaleza/CE

NEMÉSIO PRATA

Mote:
Cabelo é negócio louco... 
há divergências fatais: 
Na cabeça um fio é pouco: 
mas... na sopa... ele é demais!
Elizabete Souza Cruz 
(Nova Friburgo/RJ)

Glosa:
Cabelo é negócio louco... 
que deixa as mulheres loucas 
por perucas..., quando é pouco...; 
quando é muito..., fazem toucas! 

Mulheres! No capilar 
há divergências fatais: 
umas não querem cortar 
outras já cortam demais! 

O calvo indaga, em treslouco, 
ao fazer o seu penteado.. 
Na cabeça um fio é pouco: 
- Vou penteá-lo pra qual lado? 

Este cabelo castanho 
no meu prato não me apraz; 
sou "Coiffeur", e não o estranho, 
mas... na sopa... ele é demais!
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Trova do Rio de Janeiro/RJ

ELTON CARVALHO
1916 – 1994

Angústia é a mágoa escondida
dos que, amargando o sofrer,
vegetam perto da vida
sem ter direito a viver.
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Soneto de Porto Alegre/RS

GISLAINE CANALES
Herval/RS, 1938 – 2018, Porto Alegre/RS

Amo 
 
Amo com toda a força do meu ser. 
Amo a beleza, a arte, uma canção. 
Amo o eterno desejo de vencer. 
Amo os versos que vêm do coração. 
 
Amo as flores, é grande meu querer. 
Amo essa amarga e triste solidão. 
Amo os sonhos que estou sempre a tecer. 
Amo o infinito em sua imensidão. 
 
Amo também a morte, dura e fria. 
Amo na morte, toda a ausência e dor. 
Amo meu mundo em meio à fantasia. 
 
Amo a tristeza, e mais, amo a alegria. 
Amo a vida e esse mundo encantador. 
Amo o amor, amo a paz, amo a poesia.
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Trova Premiada  em São Paulo/SP, 2011

JB XAVIER 
São Paulo/SP
 
Se for teste, meu Senhor,
o viver nesta fornalha,
tu verás que a fé e o amor
de um nordestino não falha!
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Poema de Portugal

SOPHIA DE MELLO BREYNER ANDRESEN
Porto, 1919 – 2004, Lisboa

Retrato de uma Princesa Desconhecida
 
Para que ela tivesse um pescoço tão fino
Para que os seus pulsos tivessem um quebrar de caule
Para que os seus olhos fossem tão frontais e limpos
Para que a sua espinha fosse tão direita
E ela usasse a cabeça tão erguida
Com uma tão simples claridade sobre a testa
Foram necessárias sucessivas gerações de escravos
De corpo dobrado e grossas mãos pacientes
Servindo sucessivas gerações de príncipes
Ainda um pouco toscos e grosseiros
Ávidos cruéis e fraudulentos

Foi um imenso desperdiçar de gente
Para que ela fosse aquela perfeição
Solitária exilada sem destino
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Triverso de de Brasília/DF

CARLOS VIEGAS 

sob o sol de inverno
o gato se espreguiça
ainda no cesto.
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Setilha de Caicó/RN

PROFESSOR GARCIA

Como é linda a primavera
mostrando os seus esplendores,
os campos ficam mais belos
e as plantas mudam de cores;
e a natureza sagrada,
já desperta embriagada
com o perfume das flores!
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Trova de Campos dos Goytacazes/RJ

DIAMANTINO FERREIRA

Nunca fui águia altaneira,
como nunca fui condor:
– remédios à cabeceira,
somente um velho... com dor.
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Hino de Limoeiro do Norte/CE

Limoeiro, Limoeiro
Cantamos em seu louvor!
Tu és bandeira de glória
No mastro do nosso amor
És escola e oficina
De um povo trabalhador

Outrora gigantes bravos
Que no teu seio aportaram
Eram também bandeirantes
Que o Jaguaribe cruzaram!
Sem esmeraldas nos sonhos,
A terra boa encontraram

Limoeiro, Limoeiro...

No palco nobre da vida,
Soprou-te a aura envolvente!
Puseste as mãos em teu campo
Plantaste nele a semente;
Tua cidade floresce
Neste Brasil continente

Limoeiro, Limoeiro...

Tuas planícies nos mostram,
A luta que nos apraz
A busca pelo saber,
Pelo trabalho que faz
Erguer a fronte do povo,
Amar a fonte da paz.

Limoeiro, Limoeiro...

Que belas carnaubeiras
Volteiam tua paisagem!
São vincos que te sustentam,
São elos da tua imagem...
Por si, sós, uma aquarela,
Incentivando coragem.

Limoeiro, Limoeiro...

O Jaguaribe em teu seio,
Sereno, doce, a correr,
Projeta veias profundas
No solo que vai beber
As águas que passam nele,
Impondo o lema - VENCER!
* * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * 
Um Hino de Orgulho e Trabalho
O 'Hino de Limoeiro do Norte' é uma celebração poética e musical da cidade de Limoeiro do Norte, localizada no estado do Ceará, Brasil. A letra exalta as qualidades e a história da cidade, destacando seu papel como um símbolo de glória e amor para seus habitantes. Desde o início, a música enfatiza o orgulho local, referindo-se a Limoeiro como uma 'bandeira de glória' e uma 'escola e oficina de um povo trabalhador'.

A canção também faz referência aos primeiros desbravadores que cruzaram o rio Jaguaribe e encontraram uma terra fértil, sem esmeraldas, mas rica em potencial. Esses pioneiros são comparados a bandeirantes, figuras históricas que exploraram o interior do Brasil. A letra sugere que, apesar de não encontrarem riquezas materiais, os primeiros habitantes de Limoeiro do Norte descobriram um lugar propício para o desenvolvimento e a prosperidade.

Outro aspecto importante do hino é a valorização do trabalho e do conhecimento. A cidade é descrita como um lugar onde a luta pelo saber e pelo trabalho é constante, elevando a dignidade do povo e promovendo a paz. As carnaubeiras, árvores típicas da região, são mencionadas como símbolos de sustentação e coragem, enquanto o rio Jaguaribe é retratado como uma fonte de vida e vitória, com suas águas serenas e profundas.

O hino, portanto, não é apenas uma homenagem à cidade, mas também uma mensagem de incentivo e esperança para seus habitantes. Ele celebra a história, a cultura e os valores de Limoeiro do Norte, reforçando a identidade e o orgulho local. https://www.letras.mus.br/hinos-de-cidades/1160694/significado.html 
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Poetrix de Salvador/BA

GOULART GOMES

Minha Máxima

a cada nova manhã
ressuscito com a certeza
da minha culpa cristã
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Soneto de Portugal

FLORBELA ESPANCA 
(Flor Bela de Alma da Conceição Espanca)
Vila Viçosa, 1894 – 1930, Matosinhos

Vaidade

Sonho que sou a Poetisa eleita, 
Aquela que diz tudo e tudo sabe, 
Que tem a inspiração pura e perfeita, 
Que reúne num verso a imensidade! 

Sonho que um verso meu tem claridade 
Para encher todo o mundo! E que deleita 
Mesmo aqueles que morrem de saudade! 
Mesmo os de alma profunda e insatisfeita! 

Sonho que sou Alguém cá neste mundo... 
Aquela de saber vasto e profundo, 
Aos pés de quem a Terra anda curvada! 

E quando mais no céu eu vou sonhando, 
E quando mais no alto ando voando, 
Acordo do meu sonho...E não sou nada!...
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Trova de Maringá/PR

A. A. DE ASSIS

Ah, belos tempos dourados,
que os sonhos não trazem mais...
Bailavam, corpos colados,
olho no olho, os casais!
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Fábula em Versos da França

JEAN DE LA FONTAINE
Château-Thierry, 1621 – 1695, Paris

O pavão queixando-se a Juno

A Juno o pavão se queixa
Dizendo: «ó deusa celeste,
Com razão de ti murmuro
Pela má voz que me deste.

Sou ave tua, e se quero
Entoar os teus louvores,
Estrujo os campos em torno
Com meus guinchos troadores;

O rouxinol tão mesquinho
Deleita, se a voz levanta,
É honra da primavera,
De ouvi-lo o mundo se encanta!»

Irada lhe torna Juno:
«Cala-te, néscio invejoso!
Porque desejas as vozes
Do rouxinol sonoroso?

De ricas pedras ornada
Não parece a cauda tua?
O listrão do íris brilhante
Em teu colo não flutua?

Ave nenhuma passeia
Que tanto pareça bem;
Em si ninguém reunir pode
Quantos dotes os mais têm.

Repartiu seus dons com todos
A profícua Natureza;
Às águias coragem deu,
Deu aos falcões ligeireza;

Por presságio o corvo grasna,
O mocho nas mortes pia,
A gralha males futuros
Com seu clamor pressagia.

Do que são se aprazem todos;
E se torno a ouvir queixar-te,
Dar-te-ei voz de filomela,
Mas hei de as plumas tirar-te.»

Não quis o invejoso a troca;
Que é nosso instinto invejarmos
Sempre o que os outros possuem,
Sem o que é nosso largarmos.
(tradução: Curvo Semedo)

Recordando Velhas Canções (Cantiga por Luciana)


Composição: Edmundo Souto / Paulinho Tapajós

Manhã no peito de um cantor
cansado de esperar só.
Foi tanto tempo que nem sei
das tardes tão vazias
por onde andei.

Luciana, Luciana,
sorriso de menina
dos olhos de mar...
Luciana, Luciana
abrace essa cantiga
por onde passar.

Nasceu na paz de um beija-flor,
em verso, em voz de amor,
já desponta, aos olhos da manhã,
pedaços de uma vida
que abriu-se em flor.
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A Melodia da Esperança em 'Cantiga Por Luciana'
A música 'Cantiga Por Luciana', interpretada pela cantora Evinha, é uma delicada expressão de afeto e esperança. A letra da canção descreve a sensação de um cantor que se encontra em um estado de solidão e reflexão, marcado pelo tempo que parece ter se estendido indefinidamente, deixando 'tardes tão vazias'. A menção à manhã no peito do cantor sugere um novo despertar, uma renovação de sentimentos e expectativas que se contrapõe ao cansaço e à solidão.

Luciana é apresentada como uma figura luminosa, cujo sorriso e olhar trazem a promessa de alegria e renovação. Ela é a inspiração para a 'cantiga', uma música que carrega consigo a leveza e a beleza, comparáveis à paz de um beija-flor. A canção se torna um veículo para expressar o amor e a admiração que o cantor sente, e Luciana é a musa que dá vida e cor aos dias do artista. A imagem de uma vida que 'abriu-se em flor' evoca a ideia de um novo começo, de possibilidades que se desdobram e se renovam com a presença de Luciana.

Através de metáforas poéticas, 'Cantiga Por Luciana' fala sobre a transformação que o amor e a inspiração podem trazer à vida de uma pessoa. A música é um tributo à figura que traz luz e cor aos dias do cantor, e é também um convite para que Luciana leve essa mensagem de amor e esperança por onde passar, espalhando a beleza que ela representa.

A dupla Edmundo Souto e Paulinho Tapajós ganhou o primeiro lugar no IV Festival Internacional da Canção com a doce “Cantiga por Luciana”, superando a colocação de “Andança”, que fizeram (com Danilo Caymmi) para o FIC de 1968.

Embora sem a força do sucesso anterior (lembra um pouco o adágio da toada “Cinderela”, de Adelino Moreira), a composição encanta pela singeleza do tema, que lhe dá um clima de canção infantil: “Luciana, Luciana / sorriso de menina dos olhos de mar / Luciana, Luciana / abrace esta cantiga por onde passar.”

Esse clima é realçado pela interpretação da cantora Eva (Eva Correia José Maria), que a gravou e defendeu no festival. Integrante do Trio Esperança, Evinha iniciou uma bem-sucedida carreira solo a partir dessa gravação.
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