sexta-feira, 4 de janeiro de 2008

Viagens no Tempo e Paradoxos Temporais (Marcus Valério)

As Viagens no Tempo gozam de uma posição de destaque na FC, não só remontam aos subgêneros mais antigos como talvez estejam entre os mais populares. Ao mesmo tempo parecem a primeira vista as mais absurdas, pois é difícil conceber como seria possível se deslocar no tempo, entretanto, estão entre as poucas que possuem base cientifica plausível, mais especificamente sobre a Teoria da Relatividade.

As viagens para o futuro são mais do que plausíveis, eles existem e ocorrem a todo instante, porém em escalas imperceptíveis. Como, segundo a Teoria da Relatividade, o movimento afeta o ritmo de passagem do tempo, quanto mais rápido alguém se mover, mas rápido ela avança para o futuro em relação a referenciais mais lentos. Ou seja, alguém que viaje constantemente de avião chega ao futuro mais rápido que alguém que nunca o tenha feito, pois o tempo para ela terá passado mais lentamente e ela terá envelhecido menos.

No entanto a diferença será desprezível. Mesmo os astronautas que foram à Lua, que são os seres humanos que experimentaram as maiores velocidades de deslocamento na história, cerca de 40mil km/h, experimentaram avanços para o futuro insignificantes.

Para que uma viagem ao futuro apresente resultados perceptíveis é necessário velocidades de deslocamento muito maiores, que poderão ser possíveis futuramente. Uma nave capaz de se mover ao menos à metade da velocidade da luz, já apresentaria resultados bastante impressionantes.

Mas se as viagens para o futuro são teoricamente possíveis e até futuramente prováveis, as viagens para o passado ainda são altamente improváveis mesmo em ousadas especulações teóricas.

Acelerar até a velocidade da luz por exemplo, o que já é bastante improvável levando em conta nossos conhecimentos científicos atuais, apenas congelaria a passagem do tempo, permitindo que o viajante avançasse o quanto quissesse para o futuro, mas ao que parece nada sugere que seja possível ultrapassar tal limite e que mesmo o fazendo o tempo retrocederia.

Uma analogia interessante é a seguinte: Suponha que você esteja acostumado a percorrer o trajeto de sua casa até a casa de uma amiga em 20 minutos. Então adquire um meio de deslocamento mais rápido e passa a fazer o percurso em apenas 10 minutos. Com outro meio de transporte esse tempo passa a ser de 5, e assim por diante.

Chegaria a um ponto em que teoricamente você gastaria um tempo que tendesse a zero, ou seja, se transferiria instantaneamente de um local a outro. Mas, e se fosse possível aumentar ainda mais a velocidade, ocorreria de você chegar à casa de sua amiga ANTES de ter saído da sua?

Pelo nosso paradigma científico atual tudo indica que não. Você nunca conseguiria gastar um tempo Zero de descolamento, ainda que chegasse a um tempo desprezível muitíssimo próximo de zero. No entanto, considero ingênuo acreditar que nossas concepções científicas atuais bateram definitivamente o martelo sobre a questão, e vamos deixar em aberto a possibilidade de viagem para o passado.

Temos que recorrer então à Filosofia para compreender certas questões. Muitas coisas podem ser possíves dependendo do contexto. Por exemplo, não temos dificuldade em imaginar que num outro Universo submetido a outras leis físicas, fosse possível ultrapassar a velocidade da luz e ou viajar para o passado. Nós podemos imaginar isso por que se trata de uma Possibilidade LÓGICA. Ou seja, ela pode ser racionalmente concebível.

Porém, se uma coisa for LOGICAMENTE Impossível, ela com certeza o será FISICAMENTE Impossivel. Nós podemos conceber logicamente coisas impossíveis fisicamente, mas se uma coisa for logicamente inconcebível, ele com certeza será impossível.

O problema com as viagens no tempo para o passado é que elas geralmente apresentam resultados logicamente impossíveis, PARADOXOS. E talvez o mais problemático seja o mais comum em obras de Ficção Centífica sobre Viagens no Tempo:

O PARADOXO DE CAUSA E EFEITO, que diz que:
Se alguém viaja para o passado no objetivo de alterar um evento para mudar o presente, assim que o fizesse o motivo pelo qual se viajou deixaria de existir, e consequentemente a viagem também. Sendo assim, o mínimo que deveria acontecer seria a perda de memória por parte do viajante, ou seu lançamento numa realidade paralela.

Há meios de se superar essa dificuldade, mas raramente isso é feito com desenvoltura principalmente em HQs ou Filmes.

Em Os 12 Macacos por exemplo, houve um excelente tratamento do tema, mas admitindo a impossibilidade de se alterar o passado de modo que a própria tentativa de alteração fez parte do processo.

Em minha opinião no cinema os exemplos mais desastrosos são os de Jornada nas Estrelas, principalmente em STAR TREK VIII, onde no passado um evento principal é alterado mudando o presente, nos caso os Borgs eliminando o evento que resultaria em boa parte do avanço tecnológico humano, e então através de uma viagem os protagonistas repõem o evento principal no lugar.

Entretanto fazem inúmeras outras alterações nada insignificantes, mas que em nada afetam os acontecimentos futuros, e fica sempre a pergunta: Por que os Borgs não tentam de novo? E de novo e de novo? E se viajassem para impedir que os heróis impeçam a mudança no passado? Por que não uma outra viagem para impedir a raiz de todos os problemas? Quando isso pararia?

E o pior! Se os Borgs conseguissem impedir o tal evento, a Terra nunca teria desenvolvido tecnologias de viagens espacias, e sendo assim nunca teria se integrado a federação e muito menos conhecido os Borgs, que também não teriam o menor interesse numa tecnologia pouco avançada, e portanto não teriam vindo à Terra.

Esse resultados são ilógicos, e podemos esclarecer isso formalizando e simplificando a questão:
Os Borgs vieram à Terra para assimilar sua Tecnologia Avançada.
Para eliminar a forte resistência dos terrestres, que se baseia em tecnologia avançada, os Borgs viajaram no tempo e prejudicaram o desenvolvimento da Tecnologia Terrestre.
Sem tecnologia avançada, os terrestres não puderam resistir aos Borgs.

E aqui fica clara a contradição, o item 3 entra em conflito com o item 1, se os terrestres perderam sua tecnologia avançada devido a viagem no tempo dos borgs, para que então os Borgs teriam vindo à Terra?

Outro exemplo é o seguinte: Se você viajasse para o passado para impedir uma tragédia e o conseguisse, a tragédia, que é motivo de sua viagem, deixaria de existir, sendo assim sua viagem também.

É até concebível que isso ocorra desde que o viajante perca completamente a memória de sua viagem, pois ela também teria deixado de existir. E dessa forma seria possível que há um minuto atrás a realidade em que você vive fosse outra, mas você viajou no tempo e a alterou, de modo que agora vive numa outra realidade tendo se esquecido totalmente da realidade anterior em que viveu.

Pior! Pode ser então que a realidade que vivemos tenha sido alterada infinitas vezes, mas ninguém, nem mesmo os viajantes do tempo responsáveis, saberiam disso.

Outra forma de evitar esse paradoxo é afirmar que os viajantes na verdade passaram para uma dimensão paralela, e dessa forma eles nada mais fizeram do que escolher um Universo alternativo, e tenham se tornado seres multi dimensionais. Mas isso também implica em que para as pessoas que não sejam esses viajantes, as mudanças simplesmente não ocorrem, ou seja, se você viaja no tempo e impede a tragédia, e volta para o seu tempo sem perder a memória, você teria na verdade entrado em um universo alternativo, para o qual aquela tragédia de fato jamais ocorreu, mas o universo original permanece inalterado.

Já uma situação como a ocorrida em filmes como De Volta para o Futuro, é absurda, pois o viajante, Martin McFly, faz alterações drásticas em sua realidade e volta para ela, e ainda que ela não evolvam exatamente a causa da viagem no tempo, elas deveriam estar automaticamente registradas em sua memória, ou aquela realidade para a qual ele voltou já seria um universo alternativo.

Explicando mais detalhadamente, cada vez que ele alterava um detalhe do passado de seus pais isso viria a resultar em mudanças no futuro. Porém ele estava de certa forma protegido dessas mudanças, talvez por não estar em seu tempo original. Quando ele volta para seu Presente encontra várias coisas mudadas e não as reconhece, isso significa que sua memória pertence à realidade anterior, ele vêm de uma realidade anterior, alternativa, caso contrário, ele deveria se lembrar automaticamente de tudo, não sofrendo nenhum estranhamento com as mudanças.

Para explicar minha teoria, devemos ter em mente, e muito claramente, a expressão:
O UNIVERSO É INFINITO!

Depois pensemos nas seguintes possibilidades de idealização do tempo:
Nesta idealização temos uma Linha do Tempo, que imaginamos como correndo da Esquerda para a Direita. em vermelho temos o PASSADO, e em azul o FUTURO. O PRESENTE, representado em verde, seria um intervalo infinitamente pequeno entre o Passado e o Futuro, um evento instantâneo que transforma este último no primeiro.

Foi o filósofo Santo Agostinho que, no Quarto Século da Era Comum, teve a ousadia de ser o primeiro a questionar a natureza do tempo e perceber uma estranha contradição. Parece que o Tempo, de uma certa forma, não existe, pois o Passado não existe mais, o Futuro ainda não existe, e o Presente é infinitamente pequeno, sendo assim, como poderia existir?

Mas não foi por acaso que citei esse grande filósofo, pois ao final de sua vida, sem dúvida envolvido também nestas questões, ele se tornou Determinista, isto é, alguém que acredita que o Futuro está definitiva e inalteravelmente escrito. Opinião que é compartilhada por muitas pessoas ainda hoje.

Esta representação do tempo, acima, expressa então o Pré-Determinismo, mais conhecido por Destino, que é idéia de que todos os eventos do futuro já estão definidos e não podem ser evitados. Uma forma de expressar isso é exatamente pensando no tempo como uma linha por onde corre o presente. Agostinho, que era um filósofo cristão, se apercebeu que isso trazia um grande problema para a idéia de Livre-Arbítrio, pois como podemos ter escolha se todo o futuro já está definido?

Um outra forma de imaginarmos o tempo seria:
Aqui, temos um Futuro indefinido, onde várias possibilidades podem ser realizadas e, assim sendo, que não pode ser previsto com exatidão. O Presente seria então um fenômeno que converte possibilidades em fatos transformando-os em passado, de onde não mais podem ser alterados. Ao menos é assim que muitas outras pessoas costumam pensar.

Entretanto, há uma outra forma de pensar o tempo, uma forma um tanto mais ousada, onde todas as possibilidades jamais seria exatamente fechadas, mas sim ficando "sempre" em aberto. Assim seria:
Aqui teríamos então, não somente uma linha de tempo, mas várias, mais provavelmente infinitas. E todas elas paralelas. É esse o conceito de Realidades Paralelas, ou Alternativas, apresentadas em muitas obras de FC. Esta concepção sugere que tais linhas sejam independentes entre si, e que somente algum evento muito incomum poderia misturá-las.

Isso então, acaba não sendo muito diferente da idéia anterior de Determinismo, com a única diferença que tal determinismo não seria único, mas para cada ser que vivesse em um, ele seria inviolável.

No entanto, podemos também visualizar estas linhas da seguinte forma:
Vemos aqui que o Tempo seria um processo que converteria possibilidades em realidades, deixando-as no Passado. É razoável supor que o Passado, uma vez consumado, não possa mais ser alterado, mas o Futuro é livremente aberto às possibilidades. Assim, existiriam diversas realidades paralelas, todas indeterminadas, sendo convertidas pelo efeito "Presente", de, "Possibilidade de Futuro" para "Passado".

E aqui, já é importante frisar, essas possibilidades tem que ser INFINITAS! Ou seja, existiriam Infinitas realidades paralelas, Infinitos Passados consumados com todas as infinitas possibilidades.

É exatamente neste contexto que poderíamos pensar em viagens no tempo para o passado, que inclusive alterassem eventos, mas que não causassem paradoxos. Pois qualquer alteração já estaria prevista em uma das infinitas linhas de possibilidades passadas, e assim, cada vez que um viajante do tempo o fizesse, estaria na verdade saltando para um universo paralelo. Ou poderíamos pensar também que tal universo só passasse a existir assim que a alteração fosse efetuada.

O mais importante é que os eventos do presente original do viajante não seriam afetados. Se pensarmos no exemplo de De Volta para o Futuro poderíamos exemplificar com a idéia de que Martin Macfly, ou voltar 30 anos no tempo, retornou por sua própria linha temporal, porém ao emergir no passado, imediatamente passou para uma linha paralela, permanecendo nela mesmo quando voltou ao futuro. Essa é a única forma de explicar que ele não tivesse nenhuma memória dos eventos que ele mesmo gerou.

É claro que essa teoria não salva o paradoxo no filme, pois se é assim, deveria haver um duplo, um outro Martin neste universo paralelo, que evidentemente vive normalmente em sua realidade e que não teria viajado no tempo.

Essa teoria abre possibilidade para qualquer tipo de viagem temporal, tornando qualquer possibilidade logicamente possível. É claro que ela acrescenta alguns aspectos perturbadores. A maioria das pessoas tem dificuldade em lidar com a idéia de uma infinitude de possibilidades, mas essa concepção, ou pelo menos a possibilidade de cada viagem ao passado gerar um universo paralelo totalmente novo, me parece a única forma de tornar as viagens para o passado racionalmente viáveis.

Outra consequência seriam os infinitos "eus" paralelos coexistindo nessa multiplicidade de universos, algo um tanto perturbador. Uma possibilidade de atenuar a tensão desta idéia seria que na realidade tais universos não existissem previamente, mas que fossem gerados pelas viagens no tempo, passando então a serem independentes. Porém isso leva à questão de qual seria o resultado de diversas viagens constantemente gerando realidades paralelas. Poderia isso induzir a um tipo de perturbação em todos os universos? Em especial no original?

Fonte:
www.xr.pro.br/FC/ParadoxTime.html

Filosofia da Ficção Científica (Marcus Valério)

O que chamamos FICÇÃO CIENTÍFICA, é um "gênero" literário que possui características ímpares, como ser historicamente datável e permitir qualquer tipo de situação. Tais características decorrem principalmente do fato de ela não ser um "gênero", mas uma fusão entre:
O Grau de Extrapolação da Realidade; e
O Grau de Racionalidade que justifica essa extrapolação.

O termo "Científico" não é preciso, fazendo melhor sentido talvez na concepção de "Ciência" do início do Século XX, quando o termo surgiu, onde a palavra Ciência possuía conotações distintas das que apresenta ao final deste mesmo século.

Para entender melhor o que significa a FC, é necessário fazer algumas distinções simples. Um relato, conto ou estória, pode ser inicialmente FICÇÃO e NÃO-FICÇÃO.

Na Não-Ficção estariam os relatos baseados em eventos considerados reais, ainda que muitos sejam questionávies, inclusive eventos históricos incertos. Como tudo está sujeito a interpretação, nunca se pode garantir uma completa fidelidade, mas para simplificar, consideremos a existência de um âmbito na literatura que descreve a "Realidade".

A Ficção por sua vez trata de algo que não tenha uma plena representação na realidade, e por sua vez pode ser REALISTA ou não, entendendo "Realista" no sentido de Plausível.

As Ficções Realistas então, são aquelas que poderiam ocorrer no contexto da realidade sem violar a normalidade do mundo, podendo inclusive, muitas vezes, serem confundidas com eventos reais, o que obriga muitas produções a incluírem a advertência de não se confundir tal obra de Ficção, com fatos, eventos, lugares ou pessoas reais, cuja qualquer semelhança será mera coincidência.

As Ficções Não-Realistas abrangem todas as criações que a princípio não teriam lugar na realidade. Entre elas os primeiros temas de expressão cultural humana, os temas Mitológicos, com seus contos e feitos fantásticos, transformados em produção artística literária desde os primórdios da escrita humana.

Portanto a Ficção Fantástica é de certa forma, tão antiga quanto a cultura humana. Porém a FF teria que se separar da Mitologia, coisa que embora tenha ocorrido há milênios, não parece haver precisão quanto a época onde tenham surgido as primeiras obras de criação livre sobre temas fantásticos que não tenham ligação direta com a mitologia.

Muitas dessas obras teriam se perdido no tempo, outras se impregnaram à cultura e ajudaram a formar novas mitologias, o que viria, até hoje, a confundir o fantástico com o real. Mas como "gênero" literário em si, creio que só mesmo a partir da Idade Moderna poderemos colher alguns exemplos mais claros.

Com o Renascimento, o advento da Imprensa, o Iluminismo, e a ascensão da Ciência, o modo da sociedade interpretar a realidade mudou. A partir daí passaria a haver um maior questionamento sobre o mundo que nos cerca. Antes em geral a Religião satisfazia a grande maioria das pessoas sobre o que o mundo é, ou deveria ser.

Mas com o progresso Científico a mente humana foi libertada para investigar, questionar, e se possível invalidar aquilo que não pudesse ser comprovado, ou que não apresentasse um mínimo de coerência.

Nesse âmbito, a FF prosseguiu cada vez mais independente das crenças populares, podendo então produzir estórias com conteúdos plenamente novos. Mas por outro lado um impulso cada vez maior para o racional começou a transformar o gênero. As pessoas, incapazes de abandonar a Fantasia mas empurradas pela Racionalidade, e também contagiadas pelo progresso científico que prometia grandes feitos no futuro, passaram a incorporar uma cada vez maior acuidade racional.

Até que por fim surgiria Ficção Científica, que é uma tentativa de produzir um conteúdo a princípio Fantástico mas que poderia ser real sem grande impacto para a normalidade do mundo.

A grande diferença então é:
A FICÇÃO FANTÁSTICA é incondicionalmente fora da realidade.
A FICÇÃO CIENTÍFICA é relativamente fora da realidade. Isto é, está fora apenas no contexto em que vivemos, poderá ser real numa época futura, pode ter sido real numa época passada, ou em um outro mundo ou local em especial.
Um nome mais preciso seria: FICÇÃO SUPRA-REALISTA RACIONAL.

É claro que há confusão entre esses dois campos, FF e FC, como entre vários outros, mas podemos tentar compreender essas relações e diferenciações.

Os diversos gêneros propriamente ditos: Ação, Aventura, Comédia, Drama, Épico, Erótico, Guerra, Policial, Suspense, Terror e etc, podem ser tanto Ficção quanto Não-Ficção. A vida real pode nos proporcionar qualquer uma dessas experiências.

Mas quando Ficção, esse gêneros também podem ser Realistas ou Supra Realistas, dependendo do conteúdo que tragam. E quando Supra Realistas podem ser Fantásticos ou Científicos, ou melhor dizendo, podem não ter preocupação em se validar racionalmente, ou sim.

A Ficção Científica não é um "gênero" propriamente dito, não como os outros, ela seria na verdade um dos 4 Super "Gêneros", ou Campos:
NÃO-FICÇÃO
FICÇÃO REALISTA
FICÇÃO SUPRA REALISTA CIENTÍFICA
FICÇÃO SUPRA REALISTA FANTÁSTICA (que é a mais distante da realidade)

Numa linhagem progressiva:
Não-Ficção < = > Ficção Realista < = > Ficção Científica < = > Ficção Fantástica

O limiar que separa a FC da FF, bem como a que separa a Ficção da Não-Ficção, pode ser difícil definir, mas a maioria das obras poderão ser enquadradas claramente em um desses Supra Gêneros.

Ficção Científica < = > Ficção Fantástica

Quanto ao Supra Realismo, num extremo teremos aquele modelo de Ficção Fantástica que mais se distancia de qualquer possibilidade real, no outro extremo teremos a radical High Science Fiction (Alta Ficção Científica), ou Hi Sci-Fi, que tenta garantir a perfeita validade de seus argumentos, baseando-se o mais metodicamente possível em projeções plausíves das possibilidades científicas futuras, e em geral assegurando que serão possíveis no futuro.

É por isso que obras de gênero misto, podendo misturar comédia, drama, policial e etc, são difíceis de classificar, indo parar, por exemplo nas locadoras de vídeo, nas mais diversas seções, mas se houver algum elemento de FC, a obra invariavelmente será colocada no grupo FC. Embora muitas vezes haja um completo desentendimento sobre o que significa FC, e já pude constatar, até preconceito.

Até a década de 80 no Distrito Federal, a programação de cinema por exemplo, acessível por telefone, ignorava por completo a FC, categorizando os filmes apenas nos gêneros Aventura, Comédia, Drama, Erótico, Suspense ou Terror, além de outros mais específicos como Karatê e Faroeste.

Toda essa dificuldade resulta em considerar que a FC seja um gênero de natureza equivalente aos outros, quando na verdade sua natureza é bem diferente. Ela é basicamente um grau específico do Supra Realismo da História.

Podemos também, para maior esclarecimento, correlacionar o Grau de RACIONALIDADE com o Grau de SUPRA REALISMO de forma cruzada. Não esquecendo que a Racionalidade está sendo aplicada apenas no âmbito dos argumentos que validam o supra realismo da obra.

Considerando que qualquer obra neste âmbito possui algum grau Positivo de Supra Realismo, verificamos que as obras de FC exigem um grau de racionalidade mínima. O nível de Supra Realismo, desde que haja um mínimo, não afeta sua qualidade como FC, determinada tão somente pelo grau de Racionalidade.

Graficamente pode-se dizer que exemplos populares da FC cinematográfica, no ponto "A" seria uma obra com baixo grau de Supra Realismo e alto grau de Racionalidade, "2001-Uma odisséia no Espaço" por exemplo. No ponto "C" teríamos uma obra de maior Supra Realismo e grau pouco menor de Racionalidade, como The Matrix.

No ponto "D" teríamos obras cujo grau de racionalidade embora elevado, ainda não as caracterizaria como FC. Um exemplo são as obras de Tolkien, O Senhor dos Anéis. Apesar da ambientação fantástica, existe uma racionalidade intrínseca no mundo. É possível detectar claros limites para as magias dos personagens após uma maior intimidade com a obra, ao leitor é dado saber o que é possível ou não dentro deste universo fantástico.

Talvez um pouco acima do mesmo ponto "D" eu classificaria uma obra que invariavelmente é considerada FC, os filmes de Star Wars de George Lucas, que apenas a roupagem técnica lhe empresta um teor de FC, porém de baixa racionalidade. As batalhas espaciais, as Espadas de Luz, a gravidade artificial das naves, nada é explicado racionalmente, e são em geral absurdas. Apenas a roupagem lhes disfarça a característica de FF.

No ponto "F" teríamos obras ainda mais supra reais e menos racionais, como Harry Potter, e mais além, e mais abaixo, os famosos contos de fadas, onde virtualmente tudo pode ocorrer sem qualquer justificação racional.

É difícil encontrar filmes no ponto "B", mas são tema comuns na literatura. Esse talvez seja um dos maiores desafios ao escritor, criar ambientações muito ousadas e validá-las racionalmente. A série "Duna", de Frank Herbert, talvez seja um bom exemplo popular, mas obras menos famosas como "Fundação" de Isaac Asimov, representam melhor esse duplo exponente de supra realismo e racionalidade.

E no ponto "E" é relativamente simples encontrar exemplos. Quaisquer temas que envolvam uma dose discreta de sobrenatural.

A dificuldade em se perceber melhor esse esquema é que nos acostumamos a classificar obras arbitrariamente apenas pela sua aparência superficial, e é claro, termos associado rígidamente a racionalidade ao "científico", ainda que essa associação seja útil para categorizar certos casos.

Mas notaremos uma inegável afinidade entre públicos que apreciam certas obras de FC e FF que tem em comum uma coerência e lógica interna satisfatórias, ao mesmo tempo que tem menor apreço por obras que falhem nestes quesitos independente de suas roupagens.

O que tem definido mais claramente a FC é antes de tudo os pressupostos. Quando estes são previstos pelo nosso Paradigma científico atual, a obra tende a ser imediatamente classificada como FC, mesmo que careça de racionalidade em justificar seu Supra Realismo, e mesmo obras muitíssimo ordenadas conceitualmente, lógicamente possíveis, ficarão de fora do "gênero" FC se apresentarem pressupostos místicos ou espirituais.

Isso é evidentemente compreensível, e poderíamos dizer, sensato na maioria das vezes para fins de classificação, mas tem como efeito colateral criar uma nebulosidade nas categorias. E além disso criar um problema relativo ao curiosos processos de OBSOLESCÊNCIA de obras que podem mesmo perder seu status de FC.

Muitas obras já foram superadas pela realidade, como as de Júlio Verne, e algumas de Asimov, muitas vezes se baseando em concepções plausíveis na sua época de produção. É comum classificar-se algumas destas obras como RETROFUTURISTAS, e muitas são propositalmente produzidas com essa características mesmo depois de seus pressupostos já estarem superados. O que interessa porém, é o grau de racionalidade com que o tema é tratado, a coerência interna.

Em Filosofia, ao se falar em "mundos logicamente possíveis", faz-se "experimentos" imaginários que devem ser consistentes mesmo que seus pressupostos não sejam válidos em nosso mundo real. Uma obra de FC deve, necessariamente, se passar em um Universo Logicamente Possível, onde seus pressupostos não entrem em contradições.

Diferenciar essa essência racional da simples roupagem é quase impossível para os pouco envolvidos com obras de FC, mas é intuitivamente claro para os fãs do gênero.

Do mesmo modo como certas obras são refutadas pela realidade, outras podem ser confirmadas, embora mais comumentemente superadas. Temas como a viagem à Lua por exemplo, servem como um ótimo exemplo das diferentes formas de FC, sendo representado por obras clássicas de seus precursores, H.G.Wells e Júlio Verne.

Ambos desenvolveram sua viagem à Lua. Verne é em geral menos Supra Realista que Wells, e também menos Racional."A Viagem à Lua" de Verne por exemplo, exige premissas triviais em seu tempo, a cápsula que vai ao espaço é um projétil disparado por um canhão. Ou seja, isso não exigiu grande esforço de imaginação para a época.

Já Wells usa um conceito muito mais ousado. Em sua obra "O Primeiro Homem na Lua", existe a "Cavorita", um material sólido desenvolvido por um excêntrico e genial cientista que possui a propriedade de barrar o efeito da Gravidade. Com isso constrói-se uma cápsula capaz de se isolar da atração da Terra e subir até a Lua.

Portanto, o grau de Supra Realismo é maior. Mas ao mesmo tempo é mais racional, pois uma vez aceita a possibilidade lógica da Cavorita, a temática se desenvolve com perfeição, sem incorrer em contradições. Diferente de Verne que comete um erro primário em sua Viagem à Lua, ao supor que seres humanos poderiam ser colocados dentro de uma cápsula e serem acelerados de 0 a 660 mil Km/h (velocidade de lançamenteo necessária para entrar em órbita) em menos de um segundo, e sobreviverem! Ainda que a Viagem a Lua de Verne tenha um indisfarçável tom satírico.

Portanto, voltando ao gráfico, Wells estaria mais próximo dos pontos "C" e "B", ao passo que Verne mais à esquerda de "C" e em geral mais abaixo. E não estou aqui fazendo um julgamento de valor sobre os autores, pois são características de seus estilos literários. Mary Shelley, por exemplo, na ainda mais precursora obra "Frankstein", estaria por volta do limiar, próximo ao ponto "D", pois que seu livro basicamente usa uma premissa razoavelmente "Alquímica" para desenvolver uma tragédia.

Mas a confusão entre FF e FC não pode ser solucionada em definitivo, pois na verdade a Ficção Supra Realista pode se confundir mesmo com a Não-Ficção, ou seja com o que consideramos Realidade. Temos vários relatos de eventos fantásticos cujas fontes garantem ser reais. Há filmes com estórias Ufológicas por exemplo que se dizem baseados em fatos reais, ou eventos milagrosos e místicos em geral.

Afinal, o que poderia haver de mais fantástico do que a saga de Moisés e as 10 pragas do Egito, travessia do Mar Vermelho e etc? Boa parte da humanidade considera tais eventos verídicos. No entanto um filme como Impacto Profundo já pode ser considerado Ficção Realista, assim como muitas obras de FC do passado já foram superadas pela realidade, o que porém não aconteceria com a FF. Mas nem mesmo nosso avanço e progresso científico não conseguem eliminar a crença de muitos em eventos Fantásticos.

Como podemos ver, a dificuldade em se definir o quem vem a ser ou não Ficção e se esta é Fantástica ou Científica, não é um simples problema da literatura em si. É um problema da própria realidade. Nós não temos como ter certeza da "realidade" de tudo a nossa volta, não podemos de fato garantir se muitas coisas são de fato possíveis ou não, e essa dificuldade se estende e se intensifica na produção de Supra Realismo.

Os próprios fatos históricos e cotidianos estão sujeitos a elevados graus de interpretação e distorção, e uma pessoa crédula pode ter muito mais convicção da existência de fenômenos extra ordinários do que de certos fatos triviais.

Fatos ou Interpretações? Realidade, ou Ficção? Ilusão? São questões universais, que a Filosofia ainda tem muito o que investigar.
Fonte:

quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

Como funcionam os jornais (Bob Wilson)

Introdução
Os jornais foram a primeira forma de comunicação de banda larga. Muito antes dos computadores, televisão, rádio, telefones e telégrafo, os jornais eram a maneira mais barata e eficiente de atingir as massas populares com notícias, comentários e anúncios. Os jornais, desde o tempo em que eram apenas uma grande folha de papel impressa à mão, têm sido um meio de comunicação de acesso aleatório, pois os leitores podem passar fácil e rapidamente pelas diferentes seções de um jornal, voltando a elas dias ou semanas depois. Além disso, pelo fato de seu "software" possuir uma linguagem comum, ele é universal e eterno. Por exemplo, um jornal publicado antes da Revolução Americana pode ser lido hoje como foi lido em 1775.

Neste artigo, vamos dar uma olhada nos bastidores de um complexo negócio em crescimento, que é a administração de um jornal, usando o The Herald-Sun (em inglês), de Durham, na Carolina do Norte, como exemplo real. Vamos examinar como as notícias são cobertas e descritas, como chegam ao jornal, como o jornal chega na gráfica e finalmente é distribuído, chegando às bancas e à sua casa. Também daremos uma olhada no jornal como uma empresa e discutiremos como ocorre o equilíbrio entre lucratividade e as funções de prestação de serviço e comunicação na sociedade.

O papel do jornal nos Estados Unidos tem mudado com o passar do tempo?

Embora o jornal de 1775 ainda seja legível, existe uma grande diferença entre ele e seu equivalente moderno. Em 1775, o jornal era publicado sob os caprichos de um governo colonial britânico, com pouca tolerância para a livre expressão de idéias, principalmente idéias políticas radicais. A Primeira Emenda à Constituição (em inglês), parte da Declaração dos Direitos dos Cidadãos Americanos (Bill of Rights) adicionada à Constituição Americana em 1791, proibiu leis que restringissem a liberdade de imprensa. Em uma era de reis e imperadores, isso significou um enorme passo rumo à liberdade individual e uma afronta à autoridade do Estado.

Os princípios e práticas que regem os jornais de hoje (objetividade jornalística, escrita concisa, notícias nacionais e internacionais) surgiram depois da Guerra Civil americana. Esta era a Idade de Ouro dos jornais diários, não somente pelo grande número de jornais então em circulação, mas também pelos lucros que eles geravam, permitindo a magnatas da imprensa como William Randolph Hearst e Joseph Pulitzer (em inglês) viverem em um patamar suntuoso. Nunca antes os jornais haviam exercido tanta influência na política e na cultura americana. Hearst, cujo império, ou melhor, parte dele, ainda existe até os dias de hoje, era tão poderoso que foi responsabilizado (ou culpado) pela explosão da guerra contra a Espanha em 1898.

O crescimento do telejornalismo

Com o crescimento do telejornalismo na década de 60, os jornais se confrontaram com seu primeiro grande concorrente. Hoje, a ABC News (em inglês) declara que mais americanos ficam informados através da ABC do que de qualquer outra fonte - e isso é provavelmente verdade. Os 1600 jornais diários americanos continuam servindo milhões de leitores, mas não são mais o meio de comunicação de massa dominante do país. O que mais se questiona nesse inicio de século é como fazer para sobreviver e progredir na indústria do jornal com a cultura atual mais sintonizada nos meios eletrônicos de comunicação que na tinta de impressão.

Os jornais vão sair de circulação?

Podemos dizer com certeza que os jornais não vão cair no esquecimento, como aconteceu com o Código Morse. Eles são um meio de comunicação portátil e conveniente. Ninguém leva o monitor do computador para a mesa do café da manhã para ler as notícias matinais. Além disso, os jornais têm provado estar dispostos a se renovar para os leitores de hoje, enfatizando bom design, fotos coloridas e histórias detalhadas que relatam ou interpretam acontecimentos atuais.

Pessoas e departamentos diferentes contribuem para um processo que lembra um rio com inúmeros afluentes. Entre eles estão cinco com grande importância para os leitores de um jornal: notícias, editorial, anúncios, produção e distribuição.

O que são notícias e como funcionam?

Curiosamente, para uma publicação denominada jornal, ninguém jamais criou uma definição padrão para o que é uma notícia. Mas o termo tem normalmente uma significação ampla: coisas anormais ( falhas humanas, falhas mecânicas e desastres naturais são freqüentemente "notícia").

Repórteres são os olhos e os ouvidos do jornal. Eles colhem informações de muitas fontes: algumas públicas, como registros na polícia, e outras privadas, como um informante do governo. Às vezes um repórter prefere ser preso do que revelar o nome de uma fonte confidencial. Os jornais orgulhosamente se consideram o Quarto Poder, que expõe o mal comportamento do Legislativo, Executivo e Judiciário.

Alguns repórteres são responsáveis pelos furos de reportagem ou por uma área de cobertura, como tribunais, prefeitura, educação, negócios, medicina e assim por diante. Outros são chamados repórteres gerais, o que significa que ficam de plantão para qualquer tipo de acontecimento, como acidentes, eventos cívicos e histórias interessantes. Dependendo das necessidades de um jornal durante o ciclo diário de notícias, repórteres especializados mudam facilmente do furo de reportagem para notícias gerais (novos repórteres eram chamados de focas, mas o termo não é mais usado).

Nos filmes, os repórteres têm trabalhos emocionantes, agitados e perigosos, vivendo de acordo com a famosa declaração sobre a vida nos jornais: "confortar os aflitos e afligir os confortados". Embora alguns jornalistas já tenham acaabado mortos devido a investigações, o trabalho em um jornal é rotina para a grande maioria dos repórteres. Eles são nossos cronistas da vida diária, filtrando a realidade e trazendo um senso de ordem para um mundo desordenado.

Todos os repórteres atendem, em última instância, a um editor. Dependendo de seu tamanho, um jornal pode ter inúmeros editores, começando com um editor-executivo, responsável pelo setor de notícias. Subordinado ao editor-executivo está o editor-geral, que inspeciona o trabalho diário do setor de notícias. Outros editores das áreas de esportes, fotografia, estadual, nacional, coluna e óbitos, por exemplo, também podem ser subordinados ao editor-geral.

No entanto, o editor mais conhecido - e de alguma forma o mais crucial - é o editor-chefe. Os repórteres trabalham diretamente para este editor, que determina histórias, reforça prazos e é o primeiro a ver os rascunhos dos repórteres no sistema de composição ou na rede de computadores. Estes editores são chamados de gatekeepers (guardião/porteiro), pois controlam quase tudo o que deve ou não entrar na próxima edição do jornal. Normalmente trabalhando sob o estresse das notícias de última hora, suas decisões são traduzidas diretamente no conteúdo do jornal.

Uma vez que o editor metropolitano termina de editar o rascunho de um repórter, a história vai do sistema de composição até outra parte do setor de notícias, a mesa de redação, através da rede de computadores. Aqui, os vice-editores verificam a ortografia e outros erros. Eles também procuram nos artigos tudo aquilo que pode confundir o leitor ou deixar perguntas sem respostas. Se necessário, eles podem verificar fatos na biblioteca do jornal, que mantém uma coleção de livros de referência, microfilmes e cópias online de edições antigas.

A chefe da mesa de redação manda as histórias concluídas para outros editores, que ajustam histórias locais, as manchetes (escritas pelo editor, não pelo repórter!) e as fotos digitais nas páginas. Os jornais fazem cada vez mais este trabalho, chamado de paginação, com computadores pessoais, usando programas disponíveis em qualquer loja de artigos para computador. Microsoft Windows, Word e Quark Express são três programas que, apesar de não serem específicos para produção de jornais, são facilmente adaptados para isso. Antes de vermos o que ocorre com as páginas eletrônicas feitas pela mesa de redação, é útil entendermos como outros setores do jornal contribuem com o ciclo de produção.

O que são os editoriais?

Um jornal publica sua visão sobre fatos atuais, regionais ou nacionais, nos editoriais. O editorial é um texto opinativo não assinado que reflete a posição coletiva da redação do jornal. Editoriais não são notícias, são opiniões baseadas em fatos. Por exemplo, os editoriais podem criticar a atuação de autoridades públicas como o prefeito, o chefe de polícia ou o conselho de alunos local. Por outro lado, podem também elogiar pessoas por suas contribuições. Seja qual for o assunto, jornais esperam que seus editoriais aumentem o nível de discussão na comunidade.

Isto ocorre de duas maneiras que são familiares para o leitor: as cartas ao editor e os artigos de opinião editorial. As cartas estão sempre entre as seções mais lidas de um jornal, pois é onde os leitores expressam suas opiniões. Alguns jornais limitam as cartas a um determinado número de palavras, 150, 250 ou até 300, enquanto outros publicam cartas de qualquer tamanho. Os artigos de opinião editorial normalmente têm de 850 a 1000 palavras. Os jornais têm espaço para cartas ao editor e artigos de opinião editorial, disponíveis como parte de sua contribuição para o diálogo.

O editorial é dirigido por um redator que não trabalha no setor de notícias. Pessoas que trabalham em jornais chamam isso de "separação entre a Igreja e o Estado", o que significa que há uma linha que não deve ser ultrapassada entre notícia e opinião. Se esta linha for ultrapassada, o jornal perde seu bem mais valioso, a credibilidade. Por este motivo, os redatores em alguns grandes jornais são subordinados ao editor, que é o diretor-geral da empresa, e não ao editor-executivo. Em outros jornais ele pode ser. Seja qual for o modelo da organização, nenhum dos dois departamentos pode dizer um ao outro o que publicar no jornal.

Por que os anúncios são importantes para um jornal?

O número de páginas é determinado não pelo setor de notícias, mas pela quantidade de anúncios vendidos para aquele dia (além de cadernos especiais devido a grandes eventos ou acontecimentos, como tornados, campeonatos esportivos ou outros acontecimentos importantes). O setor correspondente coloca os anúncios nas páginas antes de serem liberados para o setor de notícias. Como regra, os jornais imprimem um pouco mais de anúncios do que notícias. Os anúncios correspondem a 60% ou mais das páginas semanais, mas na edição de domingo é comum que as notícias tomem mais espaço do que os anúncios. A proporção de anúncios com relação a notícias deve ser alta porque os jornais não conseguem sobreviver sem os ganhos que os anúncios proporcionam. Os editores chamam este espaço deixado de "buraco na notícia". O setor de anúncios e o de notícias não influenciam no conteúdo um do outro.

Três tipos de anúncios dominam os jornais modernos:

anúncios de exibição - com fotos e gráficos, estes anúncios podem custar milhares de dólares, dependendo do tamanho. Estes anúncios, normalmente de lojas de departamento, cinemas e outros negócios, podem ser preparados por uma agência de publicidade ou pelo próprio departamento de anúncios. São chamados de carro-chefe e são responsáveis pela maior parte da renda;

anúncios classificados - normalmente chamados de classificados, são publicados em caracteres miniatura chamados de ágatas. Estes anúncios são de pessoas que querem comprar ou vender produtos, empresas procurando funcionários ou comerciantes oferecendo serviços. Os classificados têm preço acesssível, são populares e eficazes, atingindo milhares de prováveis consumidores;

folhetos - o terceiro tipo de anúncio é feito por grandes cadeias de lojas. Estes folhetos coloridos são colocadoss no meio do jornal para serem distribuídos com a edição de domingo. Os folhetos trazem ganhos menores do que os anúncios carro-chefe. Os jornais cobram para distribuir os folhetos, mas não tem controle sobre seu conteúdo ou qualidade de impressão.

Como é produzido um jornal?

O setor de produção faz o trabalho pesado. Nestes departamentos há especialistas que operam e fazem a manutenção das prensas, fotocompositoras, digitalizadores de imagens e máquinas de impressão fotográfica. Alguns funcionários trabalham no turno diurno, enquanto outros no noturno.
Com início em torno de 1970, os setores de produção de jornal iniciaram um movimento histórico longe da tecnologia de trabalho intenso das máquinas fotocompositoras Linotype e outras "de última geração" usadas em impressão em relevo. Esta foi a mesma técnica usada por Johannes Gutenberg no século XIV: imprimir uma página de papel diretamente em um bloco. A invenção da fotocomposição, baseada em processos fotográficos, acelerou a produção e reduziu os altos custos de despesas gerais da impressão em relevo. Além disso, a fotocomposição funcionava melhor com as novas prensas em offset que estavam começando a ser usadas.

A maioria dos jornais diários mudaram para alguma forma de impressão em offset. Este processo grava a imagem de uma página de jornal em chapas finas de alumínio (páginas com fotos ou letras coloridas precisam de mais chapas). Estas chapas, agora com a imagem positiva revelada a partir do negativo de uma página, vão para outros especialistas para colocação na prensa. Este processo é denominado offset porque as chapas de metal não encostam no papel que entra na máquina. Em vez disso, as chapas transferem a imagem feita com tinta para um rolo de borracha que imprime a página.
Embora as máquinas para impressão de jornais sejam grandes e barulhentas, são delicadas com o papel de imprensa, o papel de que é feito o jornal. Estas máquinas precisam ser delicadas pois o papel de imprensa é caro e deve passar por esses rolos enormes sem serem rasgados. Estas complexas máquinas de três andares, que podem custar mais de US$ 40 milhões, são chamadas de prensas rotativas, pois usam papel contínuo em vez de folhas individuais.

Além de colocar tinta no papel, a prensa também monta as páginas do jornal na seqüência correta. Tudo ocorre tão rápido que uma prensa em offset consegue produzir 70 mil cópias por hora na correia transportadora, que por sua vez manda as cópias para o setor de distribuição que já está aguardando.

Como são distribuídos os jornais?

A responsabilidade de levar o jornal da gráfica até o leitor é do setor de distribuição. Jornais grandes publicam dois, três ou até quatro edições, todas devendo estar prontas para deixar a gráfica em um horário determinado. A primeira edição, às vezes chamada de edição "buldogue", vai até os locais mais distantes da área de circulação. Isto pode significar vários municípios ou até mesmo um estado inteiro. As edições posteriores contêm notícias mais frescas e chegam até áreas menores. A edição final, que vai para impressão depois da meia-noite, contêm as notícias mais recentes, mas cobre uma área geográfica menor, normalmente uma cidade.

Qualquer assinante de um jornal diário sabe que ele é jogado em sua porta ainda de madrugada. Empresas terceirizadas chamadas de transportadoras compram os jornais com desconto e fazem a entrega, usando veículos próprios. Quando jornais vespertinos eram comuns, os veículos usados eram bicicletas. O primeiro emprego de muitos jovens americanos era como entregador de jornais pela vizinhança.

O departamento de circulação determina as rotas que os entregadores devem seguir. Este departamento também é responsável pelas vendas em máquinas de moedas. Ele mantém um registro de faturamento dos assinantes, interrompe e inicia as entregas mediante solicitação e usa mensageiros para entregar jornais que possam ter sido esquecidos.

Devido à circulação do jornal, o número de pessoas que o recebem tem grande impacto nos índices de anúncios. A Audit Bureau of Circulations (em inglês), agência independente de aferição de tiragens, examina e autoriza as quantidades para circulação. Isto assegura ao setor de anúncios e aos anunciantes que a demanda de circulação é válida.

Em 18 horas de trabalho bem coordenado, realizado por vários setores, o que as pessoas que trabalham em jornais chamam de "um rascunho da história" passa por sistemas de computador, máquinas de tratamento de imagens e impressões (que deixariam Gutenberg perplexo) indo até seu destino final, os leitores. Depois das 3h30 da manhã, poucas pessoas ficam na gráfica. Os funcionários de todos os outros setores já foram para casa. As prensas ficam silenciosas, talvez em manutenção pelo restante da noite. O silêncio repentino não dura muito. Em menos de quatro horas, o jornal desperta e começa tudo de novo.

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Bob Wilson é autor, escritor e redator de editorial no The Herald-Sun em Durham, N.C. Ele é formado pela University of Missouri School of Journalism e fez mestrado na Duke University. Ele também é autor de "Landing Zones: Southern Veterans Remember Vietnam" (1990, Duke University Press).

Fonte:

O Livro e A Editora

Livro é um volume transportável, composto por, pelo menos, 49 páginas, sem contar as capas, encadernadas, contendo texto manuscrito ou impresso e/ou imagens e que forma uma publicação unitária (ou foi concebido como tal) ou a parte principal de um trabalho literário, científico ou outro.

Em ciência da informação o livro é chamado monografia, para distingui-lo de outros tipos de publicação como revistas, periódicos, teses, tesauros, etc.

O livro é um produto intelectual e, como tal, encerra conhecimento e expressões individuais ou colectivas. Mas também é nos dias de hoje um produto de consumo, um bem e sendo assim a parte final de sua produção é realizada por meios industriais (impressão e distribuição). A tarefa de criar um conteúdo passível de ser transformado em livro é tarefa do autor. Já a produção dos livros, no que concerne a transformar os originais em um produto comercializável, é tarefa do editor, em geral contratado por uma editora. Uma terceira função associada ao livro é a coleta e organização e indexação de coleções de livros, típica do bibliotecário.

História

A história do livro é uma história de inovações técnicas que permitiram a melhora da conservação dos volumes e do acesso à informação, da facilidade em manuseá-lo e produzi-lo. Esta história é intimamente ligada às contingências políticas e econômicas e à história de idéias e religiões.

Antiguidade

Na Antiguidade surge a escrita, anteriormente ao texto a ao livro. A escrita consiste de código capaz de transmitir e conservar noções abstratas ou valores concretos, em resumo: palavras. É importante destacar aqui que o meio condiciona o signo, ou seja, a escrita foi em certo sentido orientada por esse tipo de suporte; não se esculpe em papel ou se escreve no mármore.

Os primeiros suportes utilizados para a escrita foram tabuletas de argila ou de pedra. A seguir veio o khartés (volumen para os romanos, forma pela qual ficou mais conhecido), que consistia em um cilindro de papiro, facilmente transportado. O "volumen" era desenrolado conforme ia sendo lido, e o texto era escrito em colunas na maioria das vezes (e não no sentido do eixo cilíndrico, como se acredita). Algumas vezes um mesmo cilindro continha várias obras, sendo chamado então de tomo. O comprimento total de um "volumen" era de c. 6 ou 7 metros, e quando enrolado seu diâmetro chegava a 6 centímetros.

O papiro consiste em uma parte da planta, que era liberada, livrada (latim libere, livre) do restante da planta - daí surge a palavra liber libri, em latim, e posteriormente livro em português. Os fragmentos de papiros mais "recentes" são datados do século II a.C..

Aos poucos o papiro é substituído pelo pergaminho, excerto de couro bovino ou de outros animais. A vantagem do pergaminho é que ele se conserva mais ao longo do tempo. O nome pergaminho deriva de Pérgamo, cidade da Ásia menor onde teria sido inventado e onde era muito usado. O "volumen" também foi substituído pelo códex, que era uma compilação de páginas, não mais um rolo. O códex surgiu entre os gregos como forma de codificar as leis, mas foi aperfeiçoado pelos romanos nos primeiros anos da Era Cristã. O uso do formato códice (ou códice) e do pergaminho era complementar, pois era muito mais fácil costurar códices de pergaminho do que de papiro.

Uma conseqüência fundamental do códice é que ele faz com que se comece a pensar no livro como objeto, identificando definitivamente a obra com o livro.

A consolidação do códex acontece em Roma, como já citado. Em Roma a leitura se dava tanto em público (para a plebe), evento chamado recitatio, como em particular, para os ricos. Além disso, é muito provável que em Roma tenha surgido pela primeira vez a leitura por lazer (voluptas), desvinculada do senso prático que a caracterizara até então. Os livros eram adquiridos em livrarias. Assim aparece também a figura do editor, com Atticus, homem de grande senso mercantil. Algumas obras eram encomendadas pelos governantes, como a Eneida, encomendada a Virgílio por Augusto.

Acredita-se que o sucesso da religião cristã se deve em grande parte ao surgimento do códice, pois a partir de então tornou-se mais fácil distribuir informações em forma escrita.

Idade Média

Na idade Média o livro sofre um pouco, na Europa, as consequências do excessivo fervor religioso, e passa a ser considerado em si como um objecto de salvação. A característica mais marcante da Idade Média é o surgimento do monges copistas, homens dedicados em período integral a reproduzir as obras, herdeiros dos escribas egípcios ou dos libraii romanos. Nos monastérios era conservada a cultura da Antiguidade. Apareceram nessa época os textos didáticos, destinados à formação dos religiosos.

O livro continua sua evolução com o aparecimento de margens e páginas em branco. Também surge a pontuação no texto, bem como o uso de letras maiúsculas. Também aparecem índices, sumários e resumos, e na categoria de gêneros, além do didático, aparecem os florilégios (coletâneas de vários autores), os textos auxiliares e os textos eróticos. Progressivamente aparecem livros em língua vernacular, rompendo com o monopólio do latim na literatura. O papel passa a substituir o pergaminho.

Mas a invenção mais importante, já no limite da Idade Média, foi a impressão, no século XIV. Consistia originalmente da gravação em blocos de madeira do conteúdo de cada página do livro; os blocos eram mergulhados em tinta, e o conteúdo transferido para o papel, produzindo várias cópias. Foi em 1405 surgia na China, por meio de Pi Sheng, a máquina impressora de tipos móveis, mas a técnologia que provocaria uma revolução cultural moderna foi desenvolvida por Johannes Gutenberg.

Idade Moderna

No Ocidente, em 1455, Johannes Gutenberg inventa a imprensa com tipos móveis reutilizáveis, o primeiro livro impresso nessa técnica foi a Bíblia em latim. Houve certa resistência por parte dos copistas, pois a impressora punha em causa a sua ocupação. Mas com a impressora de tipos móveis, o livro popularizou-se definitivamente, tornando-se mais acessível pela redução enorme dos custos da produção em série.

Com o surgimento da imprensa desenvolveu-se a técnica da tipografia, da qual dependia a confiabilidade do texto e a capacidade do mesmo para atingir um grande público. As necessidades do tipo móvel exigiram um novo desenho de letras; caligrafias antigas, como a Carolíngea, estavam destinadas ao ostracismo, pois seu excesso de detalhes e fios delgados era impraticável, tecnicamente.

Uma das figuras mais importantes do início da tipografia é o italiano Aldus Manutius. Ele foi importante no processo de maturidade do projeto tipográfico, o que hoje chamariamos de design gráfico ou editorial. A maturidade desta nova técnica levou, entretanto, cerca de um século.

Portugal

Em Portugal, a imprensa foi introduzida no tempo do rei D. João II. O primeiro livro impresso em território nacional foi o Pentateuco, impresso em Faro em caracteres hebraicos no ano de 1487. Em 1488 foi impresso em Chaves o Sacramental de Clemente Sánchez de Vercial, considerado o primeiro livro impresso em língua portuguesa, e em 1489 e na mesma cidade, o Tratado de Confissom. A impressão entrava em Portugal pelo nordeste transmontano. Só na década de noventa do século XV é que seriam impressos livros em Lisboa, no Porto e em Braga.

Na idade Moderna aparecem livros cada vez mais portáteis, inclusive os livros de bolso. Estes livros passam a trazer novos gêneros: o romance, a novela, os almanaques.

Idade Contemporânea

Cada vez mais aparece a informação não-linear, seja por meio dos jornais, seja da enciclopédia. Novas mídias acabam influenciando e relacionando-se com a indústria editoral: os registros sonoros, a fotografia e o cinema.

O acabamento dos livros sofre grandes avanços, surgindo aquilo que conhecemos como edições de luxo.

Livro eletrônico

De acordo com a definição dada no início deste artigo, o livro deve ser composto de um grupo de páginas encadernadas e ser portável. Entretanto, mesmo não obedecendo a essas características, surgiu em fins do século XX o livro eletrônico, ou seja, o livro num suporte eletrônico, o computador. Ainda é cedo para dizer se o livro eletrônico é um continuador do livro típico ou uma variante, mas como mídia ele vem ganhando espaço, o que de certo modo amedronta os amantes do livro típico - os bibliófilos.

Existem livros eletrônicos disponíveis tanto para computadores de mesa quanto para computadores de mão, os palmtops. Uma dificuldade que o livro eletrônico encontra é que a leitura num suporte de papel é cerca de 1,2 vez mais rápida do que em um suporte eletrônico, mas pesquisas vêm sendo feitas no sentido de melhorar a visualização dos livros eletrônicos.

A produção do livro

A criação do conteúdo de um livro pode ser realizada tanto por um autor sozinho quanto por uma equipe de colaboradores, pesquisadores, co-autores e ilustradores. Tendo o manuscrito terminado, inicia a busca de uma editora que se interesse pela publicação da obra (caso não tenha sido encomendada). O autor oferece ao editor os direitos de reprodução industrial do manuscrito, cabendo a ele a publicação do manuscrito em livro. As suas funções do editor são intelectuais e econômicas: deve selecionar um conteúdo de valor e que seja vendável em quantidade passível de gerar lucros ou mais-valias para a empresa. Modernamente o desinteresse de editores comerciais por obras de valor mas sem garantias de lucros tem sido compensado pela atuação de editoras universitárias (pelo menos no que tange a trabalhos científicos e artísticos).

Cabe ao editor sugerir alterações ao autor, com vista a ajustar o livro ao mercado. Essas alterações podem passar pela editoriação do texto, ou pelo acréscimo de elementos que possam beneficiar a utilização/comercialização do mesmo pelo leitor. Uma editora é composta pelo Departamento editorial, de produção, comercial, de Marketing, assim como vários outros serviços necessários ao funcionamento de uma empresa, podendo variar consoante as funções e serviços exercidos pela empresa. Na mesma trabalham os editores, revisores, gráficos e designers, capistas, etc. Uma editora não é necessariamente o produtor do livro, sendo que quase sempre essa função de reprodução mecânica de um original editado é feita por oficinas gráficas em regime de prestação de serviço. Dessa forma, o trabalho industrial principal de uma editora é confeccionar o modelo de livro-objeto, trabalho que se dá através dos processos de edição e composição gráfica/digital.

A fase de produção do livro é composta pela impressão (posterior à imposição e montagem em cadernos - hoje em dia digital), o alceamento e o encapamento. Podendo ainda existir várias outras funções adicionais de acréscimo de valor ao produto, nomeadamente à capa, com a plastificação, relevos, pigmentação, e outros acabamentos.

Terminada a edição do livro, ele é embalado e distribuido, sendo encaminhado para os diferentes canais de venda, como os livreiros, para daí chegar ao público final.
Pelo exposto acima, talvez devessemos considerar que a categoria livro seja a concepção de uma coleção de registros em algum suporte capaz de transmitir e conservar noções abstratas ou valores concretos. No início de 2007, foi noticiada a invenção e fabricação, na Alemanha, de um papel eletrônico, no qual são escritos livros.

Classificação dos livros

Os livros atualmente podem ser classificados de acordo com seu conteúdo em duas grandes categorias: livros de leitura seqüencial e obras de referência.

Cânones da literatura ocidental

Não é raro que se procure uma indicação de clássicos da literatura. Em 1994, o crítico americano Harold Bloom publicou a obra O Cânone Ocidental, em que discutia a influência dos grandes livros na formação do gosto e da mentalidade do ocidente. Bloom considera a tendência de se abandonar o esforço em se criar cânones culturais nas universidades, para evitar problemas ideológicos, problemática para o futuro da educação.

Editora

Uma editora ou casa editorial é uma organização que coordena a publicação de obras literárias, discográficas e impressos, como jornais e revistas. Em geral as editoras se especializam em um tipo de publicação e área: livros, partituras, livros didáticos, obras de referência, jornais, discos ou outros. Em geral também é a editora que arca com os custos de produção, divulgação e distribuição.

O termo correspondente a "editora" em inglês é publisher (livros) ou record label (discos). Uma das etapas de produção do texto é a edição, e o profissional encarregado também é chamado de editor ou editor de texto.

A editora contrata os profissionais de texto e arte para produção dos livros, custeia a impressão (gráfica), faz a divulgação e contrata uma distribuidora para colocar os livros nas livrarias, e media a interação dos leitores com autores.

Etapas da produção de um livro

As etapas, tarefas e agentes são:

Os autores, que criam o conteúdo e em geral também a versão de texto chamada original do autor.

Os escritores, redatores e pessoal de texto podem desenvolver a idéia do autor e redigir a primeira versão do texto a publicar, como em enciclopédias, biografias, manuais, livros didáticos. Segue-se a revisão do texto original, feita por editores de texto, revisores, copidesques, preparadores e outros que fazem o texto final.

Criação das elementos gráficos, ou imagens, chamadas genericamente de ilustrações: desenhos, fotografias, gráficos, tabelas.

O projeto gráfico (também chamado programação visual e design gráfico) determina como texto e elementos. Tal projeto varia do meramente funcional às criações artísticas, com qualidades também muito variadas.

Segue-se a etapa de paginação e revisão de provas, em que teoricamente o conteúdo não seria alterado mas dependendo do responsável pela revisão são feitas melhorias e/ou piorias.

Após o fechamento do arquivo e seu envio para gráfica, ocorre a impressão.

Divulgação, distribuição e venda

Antes de chegar ao leitor, o livro tem de ser divulgado, o que em geral é feito por jornalistas contratados pela editora, e distribuído. A editora pode fazer a distribuição mas as pequenas e médias costumam contratar distribuidores, que recebem porcentagem do preço de capa do livro (em torno de 20%).

A venda pode ser feita pela editora (por exemplo para o governo brasileiro, o maior comprador de didáticos) ou através de livrarias, que recebem os livros em consignação e os expõem para compradores e leitores.

Fontes:
FEBVRE, Lucien. O aparecimento do livro. São Paulo : Unesp, 1992.
KATZENSTEIN, Ursula. A origem do livro. Sao Paulo : Hucitec, 1986.
SCORTECCI, João. Guia do Profissional do Livro. São Paulo : Scortecci, 2007.
Disponível em

Carlos Heitor Cony (Cronica: Mila)

Era pouco maior do que minha mão: por isso eu precisei das duas para segurá-la, 13 anos atrás. E, como eu não tinha muito jeito, encostei-a ao peito para que ela não caísse, simples apoio nessa primeira vez. Gostei desse calor e acredito que ela também. Dias depois, quando abriu os olhinhos, olhou-me fundamente: escolheu-me para dono. Pior: me aceitou.

Foram 13 anos de chamego e encanto. Dormimos muitas noites juntos, a patinha dela em cima do meu ombro. Tinha medo de vento. O que fazer contra o vento?
Amá-la — foi a resposta e também acredito que ela entendeu isso. Formamos, ela e eu, uma dupla dinâmica contra as ciladas que se armam. E também contra aqueles que não aceitam os que se amam. Quando meu pai morreu, ela se chegou, solidária, encostou sua cabeça em meus joelhos, não exigiu a minha festa, não queria disputar espaço, ser maior do que a minha tristeza.
Tendo-a ao meu lado, eu perdi o medo do mundo e do vento. E ela teve uma ninhada de nove filhotes, escolhi uma de suas filhinhas e nossa dupla ficou mais dupla porque passamos a ser três. E passeávamos pela Lagoa, com a idade ela adquiriu "fumos fidalgos'; como o Dom Casmurro, de Machado de Assis.

Era uma lady, uma rainha de Sabá numa liteira inundada de sol e transportada por súditos imaginários.

No sábado, olhando-me nos olhos, com seus olhinhos cor de mel, bonita como nunca, mais que amada de todas, deixou que eu a beijasse chorando. Talvez ela tenha compreendido. Bem maior do que minha mão, bem maior do que o meu peito, levei-a até o fim.

Eu me considerava um profissional decente. Até semana passada, houvesse o que houvesse, procurava cumprir o dever dentro de minhas limitações. Não foi possível chegar ao gabinete onde, quietinha, deitada a meus pés, esperava que eu acabasse a crônica para ficar com ela.

Até o último momento, olhou para mim, me escolhendo e me aceitando. Levei-a, em meus braços, apoiada em meu peito. Apertei-a com força, sabendo que ela seria maior do que a saudade.

Fonte: jornal "Folha de São Paulo" , edição de 04-06-1995, e livro "Figuras do Brasil – 80 autores em 80 anos de Folha", Publifolhas – São Paulo, 2001, pág. 318, organização de Arthur Nestrowski. http://www.releituras.com/i_neves_cony.asp

Carlos Heitor Cony (Cronica: O Suor e a Lágrima)

Fazia calor no Rio, 40 graus e qualquer coisa, quase 41. No dia seguinte, os jornais diriam que fora o mais quente deste verão que inaugura o século e o milênio. Cheguei ao Santos Dumont, o vôo estava atrasado, decidi engraxar os sapatos. Pelo menos aqui no Rio, são raros esses engraxates, só existem nos aeroportos e em poucos lugares avulsos.

Sentei-me naquela espécie de cadeira canônica, de coro de abadia pobre, que também pode parecer o trono de um rei desolado de um reino desolante.

O engraxate era gordo e estava com calor — o que me pareceu óbvio. Elogiou meus sapatos, cromo italiano, fabricante ilustre, os Rosseti. Uso-o pouco, em parte para poupá-lo, em parte porque quando posso estou sempre de tênis.

Ofereceu-me o jornal que eu já havia lido e começou seu ofício. Meio careca, o suor encharcou-lhe a testa e a calva. Pegou aquele paninho que dá brilho final nos sapatos e com ele enxugou o próprio suor, que era abundante.

Com o mesmo pano, executou com maestria aqueles movimentos rápidos em torno da biqueira, mas a todo instante o usava para enxugar-se — caso contrário, o suor inundaria o meu cromo italiano.

E foi assim que a testa e a calva do valente filho do povo ficaram manchadas de graxa e o meu sapato adquiriu um brilho de espelho à custa do suor alheio. Nunca tive sapatos tão brilhantes, tão dignamente suados.

Na hora de pagar, alegando não ter nota menor, deixei-lhe um troco generoso. Ele me olhou espantado, retribuiu a gorjeta me desejando em dobro tudo o que eu viesse a precisar nos restos dos meus dias.

Saí daquela cadeira com um baita sentimento de culpa. Que diabo, meus sapatos não estavam tão sujos assim, por míseros tostões, fizera um filho do povo suar para ganhar seu pão. Olhei meus sapatos e tive vergonha daquele brilho humano, salgado como lágrima.

Fonte: jornal “Folha de São Paulo”, edição de 19/02/2001, e livro “Figuras do Brasil – 80 autores em 80 anos de Folha”, Publifolhas – São Paulo, 2001, pág. 319, organização
http://www.releituras.com/i_neves_cony.asp

FC, evolução genética e o cinema (André Carneiro)

A tecnologia evolui em progressão geométrica. A aceitação ou adaptação do ser humano às comodidades cibernéticas etc., ocorre pacificamente, quase sem surpresas. Há pouco tempo atrás, “falar sozinho” significava alguém desesperado ou psicótico. O aumento repentino de pessoas nas ruas aparentemente “falando sozinhas” é surpreendente. No Brasil são agora milhões, colidem umas com as outras, com celulares nos ouvidos. .

A maioria confunde o contínuo melhoramento de nosso cenário com a nossa evolução genética, estacionária, pelo menos há trinta mil anos, quando inteligentes “primatas” desenhavam nas paredes de suas cavernas, sem banheiros, cozinhas e portas.

Mesmo entre universitários, alguns duvidam, quase ofendidos, quando se afirma: um bebê daquela época, se pudesse ser transportado para hoje, se desenvolveria em igualdade de condições mentais e físicas, semelhantes a um bebê das nossas maternidades. Um bebê de hoje, fosse criado em uma caverna daquele tempo, não se distinguiria dos outros. Alguns cientistas ousam a hipótese perturbadora: o gênero humano está em decadência, enxerga, ouve e sente menos odores do os nossos ancestrais. Não somos mais fortes, nem mais inteligentes, honestos e bondosos do que eles foram. Nossa violência, até parece ter crescido, se observarmos as manchetes diárias.

É interessante analisar a discrepância entre o valor das obras de Arte e o nosso contínuo aperfeiçoamento instrumental. Uma criação destinada a nos dar mais comodidade ou possibilidades, como qualquer parafernália industrial, tem uma vida eficiente muito curta. Objetos funcionais são logo ultrapassados e substituídos por outros mais aperfeiçoados. Isso não ocorre nas criações artísticas, de qualidades subjetivas, emocionais. Um retrospecto sobre as artes plásticas, música, literatura, mostra como elas mantêm suas qualidades através do tempo. As chamadas obras primas continuam emocionando e atraindo a admiração através dos anos. Citamos o desenho das cavernas. Até hoje seus traços sintéticos, seu valor artístico continuam no mesmo nível dos melhores desenhos contemporâneos.

Bosh, Bach, Leonardo, Picasso, atravessam os séculos, são os chamados clássicos, se mantêm na escala mais alta, sempre. Sade, Shakespeare, Kafka, tratam os temas essenciais e permanentes da humanidade, que permanecem os mesmos.

É dispensável citar outros exemplos. A razão das obras “eternas” serem assim chamadas é simples. O ser humano não evoluiu geneticamente. Com pedras, espadas ou metralhadoras nas mãos, somos os mesmos. A única diferença é que a espada primitiva matava um de cada vez, e as novas armas liquidam dezenas, ou milhares.

O Cinema, inventado dentro da revolução industrial, é a primeira arte nascida como um fruto da moderna ciência tecnológica. Ela manobra uma ilusão ótica para um resultado dinâmico que originou uma nova linguagem de grande poder comunicativo. É bom não olvidar que o ser humano é um animal racional tecnológico. Pinceis, telas para a pintura, caneta, livros na literatura, são instrumentos ou suportes tecnológicos.

O que torna o Cinema um típico filho da máquina é que ele fixa as suas imagens com um aparelho (tradicional ou digital) e necessita de outro aparelho para a obra ser visualizada.

Uma realidade estatística pouco conhecida é que a temática da ficção científica, não por mera coincidência, teve um destaque quantitativo surpreendente desde os primeiros anos da arte cinematográfica. Nos Estados Unidos, de 1897 até 1910 produziram mais de 50 filmes de ficção científica, projeções futuras do ser humano manobrando novas tecnologias. “Metrópolis”, “Frankenstein”, Solaris”, 2001”, as vezes são citados como predecessores, esquecidas as centenas que os precederam. Qualquer obra criativa artística, mesmo as de menor valor estético, refletem uma vivência humana, suas características e ideologias, sejam as chamadas reais, do nosso tempo ou as utópicas, que pretendam adivinhar um mundo futuro. A impropriamente chamada ficção científica, embora possa ser encontrada na poesia, dramaturgia e em outras artes, ocupa na literatura e na produção cinematográfica uma grande porcentagem temática.

O “leit-motiv” principal do cinema de FC é a violência do “homem” ou de um imaginado alienígena. Alguns termos, como “judiar”, provocam justas campanhas, neste caso, da comunidade judaica, por óbvias razões. A palavra “homem” é geralmente usada como sinônimo de “ser humano”. Ignoro se já se fez uma pesquisa ou tese sobre esse fato, analisando um evidente preconceito contra o sexo feminino, embora seja comum mulheres, até eruditas, usarem o Homem como sinônimo de Humanidade. Quando se fala na violência do homem, será que as mulheres estão ou não incluídas? Talvez a sub liminar desimportância das mulheres tenha se acentuado com os filósofos gregos, amplamente citados até hoje e que deixavam as mulheres completamente fora das elocubrações do Homem.

Para não ser dubitativo, posso afirmar que a violência do ser humano até este começo do terceiro milênio, é uma verdade incontestável. Esse fato é até defendido, argumenta-se que a violência, o egoísmo, a ganância movimentam as disputas, as guerras tem sido provocadoras do progresso, e até a tecnologia criada para a fabricação das bombas definitivas tem ajudado o desenvolvimento... do “homem”. As religiões pregam o amor, à solidariedade e outras qualidades adicionais.
Estatisticamente, não parece causar nenhum efeito, protestantes e católicos se assassinam na Irlanda e na Terra Santa, a mortalidade causada pelas crenças é terrível. Não é preciso buscar o velho Freud para explicar inutilmente a violência do ser humano. Vivemos nos esgueirando dentro dessa realidade. Também nós todos sabemos que o ser humano se deleita com a notícia, a descrição sangrenta dos crimes diários. Os protestos furiosos contra os crimes hediondos, não convencem os legisladores a elaborar leis mais eficientes. Assim como uma grande porcentagem dos que bradam contra as drogas ou contra o jogo, são usuários ou freqüentadores das casas lotéricas, lentamente se transformando em bancos ou repartições publicas, pois aceitam pagamentos de impostos etc. Tudo isso, costuma-se dizer, é feito pelo homem. Se a Academia Brasileira de Letras resolvesse oficializar também o termo “mulher” como sinônimo de humanidade, o que aconteceria?

A violência do ser humano poderá ser controlada, haverá meios de convencer homens e mulheres que não basta freqüentar igrejas, ouvir padres ou pastores pregarem o que ninguém segue, século adiante de século?

A resposta (não a solução) é muito fácil.

É preciso que haja mutação genética para o ser humano se transformar em coisa melhor. Baseando-se na ciência, a mutação natural, fruto do ambiente ou de alguma inexplicável reação, pode demorar séculos, ou milênios. Os relógios cósmicos são desanimadores. Nossa galáxia leva 250 milhões de anos para dar uma só volta. Por isso é razoável admitir que a violência ainda vá se repetir com trinetos dos trinetos dos trinetos em anos luz.

Há outra solução? Sim, já se começa a discuti-la, e a possibilidade está provocando um movimento internacional contrário. A ciência, desbravando o DNA, já é capaz de provocar mutações artificiais, embora ainda não consiga fazê-las com um receituário somente favorável. Os religiosos não admitem que se toque ou se manipule embriões humanos, ou se empregue órgãos dos falecidos em experiências laboratoriais, nem querem uma gestação fora do útero. Talvez temam qual seria a reação dos demônios quando o ser humano, geneticamente honesto, não mais ligasse para as tentações.
Se as normas éticas cristãs forem todas naturalmente obedecidas por um ser humano “modificado” cientificamente, as igrejas e intermediários entre Deus e os seres humanos seriam dispensáveis. O que é difícil de prever é qual seria a moral sexual desse (ou dessa) admirável “homem” ou “mulher” nova sem pecado.

Analisando a enorme criação cinematográfica dentro da FC. pode-se observar, praticamente, uma ausência de historias onde humanos ou alienígenas sejam pacíficos. Ou somos atacados e brilhantemente reagimos, como demonstra patrioticamente o cinema americano, ou...a violência dos nossos micróbios resolve a luta.
Se daqui a 50, 500 ou 5.000 anos, planetas civilizados desta galáxia confessarem ter desprezado ou sabotado contatos conosco, baseados na análise dos filmes aqui produzidos, bem... teremos de concordar com essa prudência. Não se pode confiar no homem. E a mulher? Gostaria de saber o que elas pensam.

Fonte:
artigo enviado por e-mail por André Carneiro

quarta-feira, 2 de janeiro de 2008

Curiosidades Literárias

  1. O escritor Wolfgang von Goethe escrevia em pé. Ele mantinha em sua casa uma escrivaninha alta.
  2. O escritor Pedro Nova parafusava os móveis de sua casa a fim que ninguém o tirasse do lugar.
  3. Gilberto Freyre nunca manuseou aparelhos eletrônicos. Não sabia ligar sequer uma televisão. Todas as obras foram escritas a bico-de-pena, como o mais extenso de seus livros, Ordem e Progresso, de 703 páginas.
  4. Euclides da Cunha, Superintendente de Obras Públicas de São Paulo, foi engenheiro responsável pela construção de uma ponte em São José do Rio Pardo (SP). A obra demorou três anos para ficar pronta e, alguns meses depois de inaugurada, a ponte simplesmente ruiu. Ele não se deu por vencido e a reconstruiu. Mas, por via das dúvidas, abandonou a carreira de engenheiro.
  5. Machado de Assis, nosso grande escritor, ultrapassou tanto as barreiras sociais bem como físicas. Machado teve uma infância sofrida pela pobreza e ainda era míope, gago e sofria de epilepsia. Enquanto escrevia Memórias Póstumas de Brás Cubas, Machado foi acometido por uma de suas piores crises intestinais, com complicações para sua frágil visão. Os médicos recomendaram três meses de descanso em Petrópolis. Sem poder ler nem redigir, ditou grande parte do romance para a esposa, Carolina.
  6. Graciliano Ramos era ateu convicto, mas tinha uma Bíblia na cabeceira só para apreciar os ensinamentos e os elementos de retórica. Por insistência da sogra, casou na igreja com Maria Augusta, católica fervorosa, mas exigiu que a cerimônia ficasse restrita aos pais do casal. No segundo casamento, com Heloísa, evitou transtornos: casou logo no religioso.
  7. Aluísio de Azevedo tinha o hábito de, antes de escrever seus romances, desenhar e pintar, sobre papelão, as personagens principais mantendo-as em sua mesa de trabalho, enquanto escrevia.
  8. José Lins do Rego era fanático por futebol. Foi diretor do Flamengo, do Rio, e chegou a chefiar a delegação brasileira no Campeonato Sul-Americano, em 1953.
  9. Aos dezessete anos, Carlos Drummond de Andrade foi expulso do Colégio Anchieta, em Nova Friburgo (RJ), depois de um desentendimento com o professor de português. Imitava com perfeição a assinatura dos outros. Falsificou a do chefe durante anos para lhe poupar trabalho. Ninguém notou. Tinha a mania de picotar papel e tecidos. "Se não fizer isso, saio matando gente pela rua". Estraçalhou uma camisa nova em folha do neto. "Experimentei, ficou apertada, achei que tinha comprado o número errado. Mas não se impressione, amanhã lhe dou outra igualzinha."
  10. Numa das viagens a Portugal, Cecília Meireles marcou um encontro com o poeta Fernando Pessoa no café A Brasileira, em Lisboa. Sentou-se ao meio-dia e esperou em vão até as duas horas da tarde. Decepcionada, voltou para o hotel, onde recebeu um livro autografado pelo autor lusitano. Junto com o exemplar, a explicação para o "furo": Fernando Pessoa tinha lido seu horóscopo pela manhã e concluído que não era um bom dia para o encontro.
  11. Érico Veríssimo era quase tão taciturno quanto o filho Luís Fernando, também escritor. Numa viagem de trem a Cruz Alta, Érico fez uma pergunta que o filho respondeu quatro horas depois, quando chegavam à estação final.
  12. Clarice Lispector era solitária e tinha crises de insônia. Ligava para os amigos e dizia coisas perturbadoras. Imprevisível, era comum ser convidada para jantar e ir embora antes de a comida ser servida.
  13. Monteiro Lobato adorava café com farinha de milho, rapadura e içá torrado (a bolinha traseira da formiga tanajura), além de Biotônico Fontoura. "Para ele, era licor", diverte-se Joyce, a neta do escritor. Também tinha mania de consertar tudo. "Mas para arrumar uma coisa, sempre quebrava outra."
  14. Manuel Bandeira sempre se gabou de um encontro com Machado de Assis, aos dez anos, numa viagem de trem. Puxou conversa: "O senhor gosta de Camões?" Bandeira recitou uma oitava de Os Lusíadas que o mestre não lembrava. Na velhice, confessou: era mentira. Tinha inventado a história para impressionar os amigos.
  15. Fernando Sabino foi escoteiro dos nove aos treze anos. Nadador do Minas Tênis Clube, ganhou o título de campeão mineiro em 1939, no estilo costas.
  16. Guimarães Rosa, médico recém-formado, trabalhou em lugarejos que não constavam no mapa. Cavalgava a noite inteira para atender a pacientes que viviam em longínquas fazendas. As consultas eram pagas com bolo, pudim, galinha e ovos. Sentia-se culpado quando os pacientes morriam. Acabou abandonando a profissão. "Não tinha vocação. Quase desmaiava ao ver sangue", conta Agnes, a filha mais nova.
  17. Mário de Andrade provocava ciúmes no antropólogo Lévi-Strauss porque era muito amigo da mulher dele, Dina. Só depois da morte de Mário, o francês descobriu que se preocupava em vão. O escritor era homossexual.
  18. Vinicius de Moraes, casado com Lila Bosco, no início dos anos 50, morava num minúsculo apartamento em Copacabana. Não tinha geladeira. Para agüentar o calor, chupava uma bala de hortelã e, em seguida, bebia um copo de água para ter sensação refrescante na boca.
  19. José Lins do Rego foi o primeiro a quebrar as regras na ABL, em 1955. Em vez de elogiar o antecessor, como de costume, disse que Ataulfo de Paiva não poderia ter ocupado a cadeira por faltar-lhe vocação.
  20. Rodaram o videoteipe para confirmar a validade de um lance contra o seu Fluminense. Foi unanimidade: pênalti claro. Nelson Rodrigues gritou: "Câmera em mim! Se o videoteipe diz que foi pênalti, pior para ele. O videoteipe é burro! E é só o que tenho a dizer."
  21. Para agradar ao poeta, Chico Buarque "escalou" um jogador do Náutico na Seleção Brasileira, de brincadeirinha. João Cabral de Melo Neto agradeceu a homenagem, com uma ressalva: "Meu time é o América do Recife".
  22. Castro Alves morreu com apenas 24 anos, nasceu em 1847 vindo a falecer em 1871.
  23. J.K Roling (Escritora de Harry Potter) começou a escrever seu primeiro livro Harry Potter e a Pedra Filosofal, em guardanapos em um bar que freqüentava, e ao terminar o livro ficou com uma terrível dúvida: escolher se comprar leite para sua filha ou mandava seu livro pra editora, hoje ela é milionária !
  24. Jorge Amado para autorizar a adaptação de Gabriela para a tevê, impôs que o papel principal fosse dado a Sônia Braga. "Por quê?", perguntavam os jornalistas, Jorge respondeu: "O motivo é simples: nós somos amantes." Ficou todo mundo de boca aberta. O clima ficou mais pesado quando Sônia apareceu. Mas ele se levantou e, muito formal disse: "Muito prazer, encantado." Era piada. Os dois nem se conheciam até então.)

    Fonte: http://www.aliteratura.kit.net/resumo/curiosidades.html

Lygia Fagundes Telles (Conto: O Moço do Saxofone)

Eu era chofer de caminhão e ganhava uma nota alta com um cara que fazia contrabando. Até hoje não entendo direito por que fui parar na pensão da tal madame, uma polaca que quando moça fazia a vida e depois que ficou velha inventou de abrir aquele frege-mosca. Foi o que me contou o James, um tipo que engolia giletes e que foi o meu companheiro de mesa nos dias em que trancei por lá. Tinha os pensionistas e tinha os volantes, uma corja que entrava e saía palitando os dentes, coisa que nunca suportei na minha frente. Teve até uma vez uma dona que mandei andar só porque no nosso primeiro encontro, depois de comer um sanduíche, enfiou um palitão entre os dentes e ficou de boca arreganhada de tal jeito que eu podia ver até o que o palito ia cavucando. Bom, mas eu dizia que no tal frege-mosca eu era volante. A comida, uma bela porcaria e como se não bastasse ter que engolir aquelas lavagens, tinha ainda os malditos anões se enroscando nas pernas da gente. E tinha a música do saxofone.

Não que não gostasse de música, sempre gostei de ouvir tudo quanto é charanga no meu rádio de pilha de noite na estrada, enquanto vou dando conta do recado. Mas aquele saxofone era mesmo de entortar qualquer um. Tocava bem, não discuto. O que me punha doente era o jeito, um jeito assim triste como o diabo, acho que nunca mais vou ouvir ninguém tocar saxofone como aquele cara tocava.
— O que é isso? — eu perguntei ao tipo das giletes. Era o meu primeiro dia de pensão e ainda não sabia de nada. Apontei para o teto que parecia de papelão, tão forte chegava a música até nossa mesa. Quem é que está tocando?
— É o moço do saxofone.

Mastiguei mais devagar. Já tinha ouvido antes saxofone, mas aquele da pensão eu não podia mesmo reconhecer nem aqui nem na China.
— E o quarto dele fica aqui em cima?

James meteu uma batata inteira na boca. Sacudiu a cabeça e abriu mais a boca que fumegava como um vulcão com a batata quente lá no fundo. Soprou um bocado de tempo a fumaça antes de responder.
— Aqui em cima.

Bom camarada esse James. Trabalhava numa feira de diversões, mas como já estivesse ficando velho, queria ver se firmava num negócio de bilhetes. Esperei que ele desse cabo da batata, enquanto ia enchendo meu garfo.
— É uma música desgraçada de triste — fui dizendo.

— A mulher engana ele até com o periquito — respondeu James, passando o miolo de pão no fundo do prato para aproveitar o molho. — O pobre fica o dia inteiro trancado, ensaiando. Não desce nem para comer. Enquanto isso, a cabra se deita com tudo quanto é cristão que aparece.

— Deitou com você?

— É meio magricela para o meu gosto, mas é bonita. E novinha. Então entrei com meu jogo, compreende? Mas já vi que não dou sorte com mulher, torcem logo o nariz quando ficam sabendo que engulo gilete, acho que ficam com medo de se cortar...

Tive vontade de rir também, mas justo nesse instante o saxofone começou a tocar de um jeito abafado, sem fôlego como uma boca querendo gritar, mas com uma mão tapando, os sons espremidos saindo por entre os dedos. Então me lembrei da moça que recolhi uma noite no meu caminhão. Saiu para ter o filho na vila, mas não agüentou e caiu ali mesmo na estrada, rolando feito bicho. Arrumei ela na carroceria e corri como um louco para chegar o quanto antes, apavorado com a idéia do filho nascer no caminho e desandar a uivar que nem a mãe. No fim, para não me aporrinhar mais, ela abafava os gritos na lona, mas juro que seria melhor que abrisse a boca no mundo, aquela coisa de sufocar os gritos já estava me endoidando. Pomba, não desejo ao inimigo aquele quarto de hora.

— Parece gente pedindo socorro — eu disse, enchendo meu copo de cerveja. — Será que ele não tem uma música mais alegre?

James encolheu o ombro.
— Chifre dói.

Nesse primeiro dia fiquei sabendo ainda que o moço do saxofone tocava num bar, voltava só de madrugada. Dormia em quarto separado da mulher.
—- Mas por quê? — perguntei, bebendo mais depressa para acabar logo e me mandar dali. A verdade é que não tinha nada com isso, nunca fui de me meter na vida de ninguém, mas era melhor ouvir o tro-ló-ló do James do que o saxofone.

— Uma mulher como ela tem que ter seu quarto — explicou James, tirando um palito do paliteiro. — E depois, vai ver que ela reclama do saxofone.

— E os outros não reclamam?

— A gente já se acostumou.

Perguntei onde era o reservado e levantei-me antes que James começasse a escarafunchar os dentões que lhe restavam. Quando subi a escada de caracol, dei com um anão que vinha descendo. Um anão, pensei. Assim que saí do reservado dei com ele no corredor, mas agora estava com uma roupa diferente. Mudou de roupa, pensei meio espantado, porque tinha sido rápido demais. E já descia a escada quando ele passou de novo na minha frente, mas já com outra roupa. Fiquei meio tonto. Mas que raio de anão é esse que muda de roupa de dois em dois minutos? Entendi depois, não era um só, mas uma trempe deles, milhares de anões louros e de cabelo repartidinho do lado.
— Pode me dizer de onde vem tanto anão? — perguntei à madame, e ela riu.

— Todos artistas, minha pensão é quase só de artistas...

Fiquei vendo com que cuidado o copeiro começou a empilhar almofadas nas cadeiras para que eles se sentassem. Comida ruim, anão e saxofone. Anão me enche e já tinha resolvido pagar e sumir quando ela apareceu. Veio por detrás, palavra que havia espaço para passar um batalhão, mas ela deu um jeito de esbarrar em mim.

— Licença?

Não precisei perguntar para saber que aquela era a mulher do moço do saxofone. Nessa altura o saxofone já tinha parado. Fiquei olhando. Era magra, sim, mas tinha as ancas redondas e um andar muito bem bolado. O vestido vermelho não podia ser mais curto. Abancou-se sozinha numa mesa e de olhos baixos começou a descascar o pão com a ponta da unha vermelha. De repente riu e apareceu uma covinha no queixo. Pomba, que tive vontade de ir lá, agarrar ela pelo queixo e saber por que estava rindo. Fiquei rindo junto.

— A que horas é a janta? — perguntei para a madame, enquanto pagava.

— Vai das sete às nove. Meus pensionistas fixos costumam comer às oito — avisou ela, dobrando o dinheiro e olhando com um olhar acostumado para a dona de vermelho. — O senhor gostou da comida?

Voltei às oito em ponto. O tal James já mastigava seu bife. Na sala havia ainda um velhote de barbicha, que era professor parece que de mágica e o anão de roupa xadrez. Mas ela não tinha chegado. Animei-me um pouco quando veio um prato de pastéis, tenho loucura por pastéis. James começou a falar então de uma briga no parque de diversões, mas eu estava de olho na porta. Vi quando ela entrou conversando baixinho com um cara de bigode ruivo. Subiram a escada como dois gatos pisando macio. Não demorou nada e o raio do saxofone desandou a tocar.

— Sim senhor — eu disse e James pensou que eu estivesse falando na tal briga.

— O pior é que eu estava de porre, mal pude me defender!

Mordi um pastel que tinha dentro mais fumaça do que outra coisa. Examinei os outros pastéis para descobrir se havia algum com mais recheio.

— Toca bem esse condenado. Quer dizer que ele não vem comer nunca?

James demorou para entender do que eu estava falando. Fez uma careta. Decerto preferia o assunto do parque.

— Come no quarto, vai ver que tem vergonha da gente — resmungou ele, tirando um palito. — Fico com pena, mas às vezes me dá raiva, corno besta. Um outro já tinha acabado com a vida dela!

Agora a música alcançava um agudo tão agudo que me doeu o ouvido. De novo pensei na moça ganindo de dor na carroceria, pedindo ajuda não sei mais para quem.

— Não topo isso, pomba.

— Isso o quê?

Cruzei o talher. A música no máximo, os dois no máximo trancados no quarto e eu ali vendo o calhorda do James palitar os dentes. Tive ganas de atirar no teto o prato de goiabada com queijo e me mandar para longe de toda aquela chateação.

— O café é fresco? — perguntei ao mulatinho que já limpava o oleado da mesa com um pano encardido como a cara dele.

— Feito agora.

Pela cara vi que era mentira.

— Não é preciso, tomo na esquina.

A música parou. Paguei, guardei o troco e olhei reto para aporta, porque tive o pressentimento que ela ia aparecer. E apareceu mesmo com o aninho de gata de telhado, o cabelo solto nas costas e o vestidinho amarelo mais curto ainda do que o vermelho. O tipo de bigode passou em seguida, abotoando o paletó. Cumprimentou a madame, fez ar de quem tinha muito o que fazer e foi para a rua.

— Sim senhor!

— Sim senhor o quê? — perguntou James.

— Quando ela entra no quarto com um tipo, ele começa a tocar, mas assim que ela aparece, ele pára. Já reparou? Basta ela se enfurnar e ele já começa.

James pediu outra cerveja. Olhou para o teto.

— Mulher é o diabo...

Levantei-me e quando passei junto da mesa dela, atrasei o passo. Então ela deixou cair o guardanapo. Quando me abaixei, agradeceu, de olhos baixos.

— Ora, não precisava se incomodar...

Risquei o fósforo para acender-lhe o cigarro. Senti forte seu perfume.

— Amanhã? — perguntei, oferecendo-lhe os fósforos. — Às sete, está bem?

— É a porta que fica do lado da escada, à direita de quem sobe.

Saí em seguida, fingindo não ver a carinha safada de um dos anões que estava ali por perto e zarpei no meu caminhão antes que a madame viesse me perguntar se eu estava gostando da comida. No dia seguinte cheguei às sete em ponto, chovia potes e eu tinha que viajar a noite inteira. O mulatinho já amontoava nas cadeiras as almofadas para os anões. Subi a escada sem fazer barulho, me preparando para explicar que ia ao reservado, se por acaso aparecesse alguém. Mas ninguém apareceu. Na primeira porta, aquela à direita da escada, bati de leve e fui entrando. Não sei quanto tempo fiquei parado no meio do quarto: ali estava um moço segurando um saxofone. Estava sentado numa cadeira, em mangas de camisa, me olhando sem dizer uma palavra. Não parecia nem espantado nem nada, só me olhava.

— Desculpe, me enganei de quarto — eu disse, com uma voz que até hoje não sei onde fui buscar.

O moço apertou o saxofone contra o peito cavado.

— É na porta adiante — disse ele baixinho, indicando com a cabeça.

Procurei os cigarros só para fazer alguma coisa. Que situação, pomba. Se pudesse, agarrava aquela dona pelo cabelo, a estúpida. Ofereci-lhe cigarro.

— Está servido?

— Obrigado, não posso fumar.

Fui recuando de costas. E de repente não agüentei. Se ele tivesse feito qualquer gesto, dito qualquer coisa, eu ainda me segurava, mas aquela bruta calma me fez perder as tramontanas.

— E você aceita tudo isso assim quieto? Não reage? Por que não lhe dá uma boa sova, não lhe chuta com mala e tudo no meio da rua? Se fosse comigo, pomba, eu já tinha rachado ela pelo meio! Me desculpe estar me metendo, mas quer dizer que você não faz nada?

— Eu toco saxofone.

Fiquei olhando primeiro para a cara dele, que parecia feita de gesso de tão branca. Depois olhei para o saxofone. Ele corria os dedos compridos pelos botões, de baixo para cima, de cima para baixo, bem devagar, esperando que eu saísse para começar a tocar. Limpou com um lenço o bocal do instrumento, antes de começar com os malditos uivos.

Bati a porta. Então a porta do lado se abriu bem de mansinho, cheguei a ver a mão dela segurando a maçaneta para que o vento não abrisse demais. Fiquei ainda um instante parado, sem saber mesmo o que fazer, juro que não tomei logo a decisão, ela esperando e eu parado feito besta, então, Cristo-Rei!? E então? Foi quando começou bem devagarinho a música do saxofone. Fiquei broxa na hora, pomba. Desci a escada aos pulos. Na rua, tropecei num dos anões metido num impermeável, desviei de outro, que já vinha vindo atrás e me enfurnei no caminhão. Escuridão e chuva. Quando dei a partida, o saxofone já subia num agudo que não chegava nunca ao fim. Minha vontade de fugir era tamanha que o caminhão saiu meio desembestado, num arranco.

FONTE:
O texto acima foi publicado no livro "Antes do Baile Verde", José Olympio Editores - Rio de Janeiro, 1979, e relacionado entre "Os cem melhores contos brasileiros do século", uma seleção de Ítalo Moriconi, Editora Objetiva - Rio de Janeiro, 2000, pág. 233.

Disponível em http://www.releituras.com/lftelles_menu.asp