segunda-feira, 2 de setembro de 2024

Monsenhor Orivaldo Robles (Eu desisto)

Afirmação até certo ponto ufanista assegura: “Eu sou brasileiro; não desisto nunca”. Tentei levá-la à prática. Foi quando apareceram as faixas de pedestres nas ruas (sinalização horizontal) e, ao lado, placas de advertência (sinalização vertical). Em país civilizado tais placas são dispensáveis. Basta a sinalização horizontal. Mas nós somos diferentes. Abracei a quixotesca tarefa de ajudar pessoas a atravessar a rua. Contribuiria para criar entre nós um clima urbano mais cortês. Do que, aliás, Maringá precisa. Tolo que sou e cabeçudo, ainda por cima, comecei a solitária campanha de levar à observância da faixa de pedestres. Andando a pé por onde não havia sinal luminoso, eu levantava um braço para indicar minha intenção de cruzar a rua, enquanto, com a outra mão, apontava as listras brancas no asfalto. Ocasiões houve em que motoristas educadamente me cederam a preferência. Noutras, a reação foi menos amigável. Dirigiram-me buzinadas raivosas. Ou me homenagearam com gentilezas do tipo “Quer morrer, seu louco?” ou “Está bêbado”?

Quando ao volante ou guidão de veículo motorizado, sentimo-nos donos do mundo. A cidade toma contornos de nosso quintal. Dela desfrutamos conforme nosso alvedrio. Admito que por descuido já invadi faixa de pedestres. Estou-me esforçando para não repetir. Procuro não esquecer que nascemos pedestres, não motorizados. Não é justo entregar a cidade aos carros tornando um inferno a vida das pessoas. Estas são anteriores a eles. Quem chegou primeiro tem direito assegurado.

Por algum tempo sustentei uma inútil disputa. Não contra moinhos de vento, mas contra bólidos motorizados capazes de levar à morte ou ferir com gravidade. Reconheço que me comportei ingenuamente. Não pretendo engrossar com meu nome a extensa lista de vítimas. Cansei. Venho honestamente depor as armas. Aceito a derrota. Sou brasileiro, mas eu desisto.

A gota d’água, que fez entornar o copo, foi vertida por bela e desconhecida jovem, semana passada, numa avenida binária. Ela vinha a uma distância de bons vinte metros. Quatro placas (uma de cada lado de ambas as vias) apontavam-lhe a faixa de pedestres. Pouco antes, dois avisos. Um tinha alertado: “50 km”. A seguir, outro: “Pare”. Ergui bem alto um pacote branco que tinha na mão e entrei na faixa. Julguei seguro. Tanto que um furgão se deteve. Impossível não me ver. A moça – não acredito que nos 50 km/h recomendados – não aliviou. Para não me ferir, teve que frear. Mas parou em cima da faixa; eu passei na beiradinha. Com a face rubra de susto e raiva, me repreendeu gritando: “O senhor não pode ir-se jogando na faixa. Uma hora, o senhor vai morrer por causa disso”. Foi o que falou, mas inconscientemente talvez pensasse outra coisa. Assim como: “Eu sou jovem, bonita, rica e dirijo um carro novo. Você é velho, feio, pobre e anda a pé. Eu sou mais importante do que você. Como ousa atrapalhar minha passagem”?

Não me joguei, apenas passei sobre a faixa, que não é nenhuma Brastemp, mas ainda está visível no asfalto. Se bem que umas mãos de tinta não lhe fariam mal. E não custam nenhuma fortuna.

Desculpe, moça bonita. Você está certa. Pedestre tem mesmo que sempre dar a vez para os veículos. Dirija seu precioso carro como quiser. Para que encher sua elegante cabecinha com ridículas normas de trânsito, não é mesmo?

Vereda da Poesia = 101 =

                   

Trova Paranaense

HELENA KOLODY
Cruz Machado, 1912 – 2004, Curitiba

Para muitos, a ventura
é clarão que vem e passa,
um sorriso que não dura,
um reflexo na vidraça.
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Poema de Huambo/Angola

MARIA ALEXANDRE DÁSKALOS

O garoto corria corria
não podia saber
da diferença entre as flores.
0 garoto corria corria
não podia saber
que na sua terra há
morangos doces e perfumados,
o garoto corria corria
fugia.

Ninguém lhe pegou ao colo
ninguém lhe parou a morte.
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Trova de Uruguaiana/RS

LUIZ STABILE

Sou da estirpe farroupilha
e sei desde pequerrucho
que na luta e na guerrilha
moldou-se o homem gaúcho.
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Soneto do Rio de Janeiro/RJ

J. G. DE ARAÚJO JORGE
(José Guilherme de Araújo Jorge)
Tarauacá/AC (1914 – 1987) Rio de Janeiro/RJ

Dedicatória

Este meu livro é todo teu, repara
que ele traduz em sua humilde glória
verso por verso, a estranha trajetória
desta nossa afeição ciumenta e rara!

Beijos! Saudades! Sonhos! Nem notara
tanta coisa afinal na nossa história...
E este verso - é a feliz dedicatória...
onde a minha alma inteira se declara...

Abre este livro... E encontrarás então
teu coração, de amor, rindo e cantando,
cantando e rindo com o meu coração...

E se o leres mais alto, quando a sós,
é como se estivesses me escutando
falar de amor com a tua própria voz!
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Trova Premiada em Saquarema/RJ, 2015

JOÃO BATISTA VASCONCELLOS 
Nova Friburgo/RJ

Águas límpidas e mansas...
Lagoa envolta em luar...
E um passado de lembranças
goteja do meu olhar!...
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Poema de Catanduva/SP

ÓGUI LOURENÇO MAURI

Solitários Passos

Pra mim, és agasalho das Alturas,
Que chegou à metade do caminho.
Contigo, jamais estarei sozinho,
Pois somos cúmplices nas horas duras. 

Teus olhos reergueram minha autoestima;
A mando dEle, na raia tu entraste.
De minha vida, tu foste o guindaste;
De Deus, para eu dar a volta por cima. 

Hoje; estar só, não passa de lembrança,
Solitários passos foram de vez.
No mar bravio, o tempo se refez;
Finda a tempestade, veio a bonança. 

Foste o bálsamo pra minha ferida,
Que surgira em meus passos solitários.
Trouxeste os ingredientes necessários
Ao amor, em retomada de vida. 

És mais um anjo do que uma mulher.
E teu aconchego, igual nunca vi.
Dos reclusos passos antes de ti,
Não tenho saudade, um pingo sequer…
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Trova Popular

Sonhei contigo esta noite,
mas oh! Que sonho atrevido!
Sonhei que estava abraçado
à  forma  do  teu  vestido!
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Soneto de São Paulo/SP

HUMBERTO RODRIGUES NETO

Bentinho e Capitu

Oh! Flor do céu! Oh! Flor cândida e pura,
em cujos lábios demorou meu beijo,
se ontem foste a razão do meu desejo,
hoje és causa da dor que em mim perdura!

Eu fui o teu Bentinho de alma impura
que fez de ti, em juízo malfazejo,
a fonte da vergonha e do meu pejo,
a causa, enfim, da minha desventura!

Foi preciso que ao roxo da mortalha
na tua mudez me desses a entender
por quanta vez a nossa mente falha!

E hoje distante, esse teu meigo ser
parece das alturas me dizer:
¨perde-se a vida, ganha-se a batalha¨!
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Trova do Rio de Janeiro/RJ

LUIZ POETA
Luiz Gilberto de Barros

Afasto-me de quem sou,
quando quem sou não me basta,
sou os sonhos que me dou,
meus sonhos não têm nem casta.
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Poema do Rio de Janeiro/RJ 

CATULO DA PAIXÃO CEARENSE
São Luís/MA, 1863 — 1946, Rio de Janeiro/RJ

O azulão e os tico-ticos

Do começo ao fim do dia,
um belo azulão cantava,
e o pomar que atento ouvia
os seus trilos de harmonia
cada vez mais se enflorava.

Se um tico-tico e outros bobos
vaiavam sua canção,
mais doce ainda se ouvia
a flauta desse azulão.

Um papagaio, surpreso
de ver o grande desprezo
do azulão, que os desprezava,
um dia em que ele cantava
e um bando de tico-ticos
numa algazarra o vaiava,
lhe perguntou: " Azulão,
olha, diz-me a razão
por que, quando estás cantando
e recebes uma vaia
desses garotos joviais,
tu continuas gorjeando,
e cada vez cantas mais?!"

Numas volatas sonoras,
o azulão lhe respondeu:
"meu amigo, eu prezo muito
esta garganta sublime,
este dom que Deus me deu!

Quando há pouco, eu descantava,
pensando não ser ouvido
nestes matos, por ninguém,
um sabiá que me escutava,
num capoeirão, escondido,
gritou de lá: "meu colega,
bravo!....Bravo!...Muito bem!"

Queira agora me dizer: -
quem foi um dia aplaudido
por um dos mestres do canto,
um dos cantores mais ricos
que caso pode fazer
das vaias dos tico-ticos?!"
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Trova Humorística de São Paulo/SP

THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA

No açougue foi tal o susto
ante o preço do filé,
que a peruca do "seu" Justo
ficou de cabelo em pé!
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Dobradinha Poética de Bandeirantes/PR

LUCÍLIA ALZIRA TRINDADE DECARLI

Quero…

Constato ao alvorecer,
também ao clarão da lua:
mesmo depois de morrer
quero ser somente tua!

Quero sentir de novo as tuas mãos
a tatear meu corpo, docemente…
Quero apagar meus pensamentos vãos
para entregar-me a ti, confiantemente.

Quero pisar sem medo em quaisquer chãos,
seguir feliz na estrada à minha frente.
Quero a renúncia pronta dos meus nãos,
dar-te o meu sim, sonoro e ardentemente!

Porque quem ama sempre retrocede,
porém as consequências nunca mede,
quando a paixão reinflama o coração...

Por isso eu quero tudo o que quiseres,
ser a  mais tua dentre outras mulheres:
— aquela que te amou... sem restrição!
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Trova Carioca

ELEN DE NOVAES FÉLIX
Barra do Piraí/RJ,  1946 - 2015, Niterói/RJ

No sertão pobre e carente
chuva é a mão que Deus descerra
e apaga a fogueira ardente
que queima a face da terra.
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Poema de Vila Velha/ES

APARECIDO RAIMUNDO DE SOUZA

Prelúdio 4

Hoje eu soube apreciar com emoção
O feliz casal que despertou sorrindo...
A MANHÃ e o SOL!
Ambos com um misto de beleza e esplendor
Num canto primaveril de amor infindo…

Senti-me também assim,
Como eles, feliz e esplendoroso
todo cheio e orgulhoso
Com o coração a cantar em mim!...

É porque hoje... hoje irei vê-la
Com o seu sorriso de criança
Falando-me de carinho e paixão
E de nós dois...

Sem mais receios, ou embaraços...

Hoje, serei o SOL e ela, a MANHÃ,
Feliz e envolta
Bem solta
Em meus braços!...
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Trova de Campinas/SP

ARTHUR THOMAZ

A lágrima, pura e bela,
tão límpida e transparente,
que se enxerga através dela
a dor que a pessoa sente.
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Soneto do Rio de Janeiro/RJ 

RITA MOUTINHO

Soneto da ausência seleta

A saudade, hoje, é alvo da pungência
e certa flecha bêbada vagueia
na aura da chama anil da inconsciência,
porque a verdade de hoje escamoteia

realidade avessa, de carência,
que não quero entender porque a meia
estadia na vida, por sua ausência,
faz-me vítima, abate-me e fundeia.

O que queria ver é o que vês,
o que queria ser é o que és,
o que queria ter é o que tens.

Mas nunca para isso haverá vez:
somos aos nossos, não a nós, fiéis
e seleta é a sensata insensatez.
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Trova Premiada em Saquarema/RJ, 2015

MILTON S. SOUZA   
Porto Alegre/RS, 1945 – 2018, Cachoeirinha/RS

Velha lagoa... drenaram
o teu leito cristalino...
e ao te matarem, mataram
meu brinquedo de menino...
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Poema de Maringá/PR

ARMANDO BETTINARDI

Caminhando

Por que o sol,
a praça,
o burburinho da cidade
estão aqui?

Por que: a luz
o dia aberto diante de mim,
o convite à vida,
se eu estou sozinho?

Sem você, o momento
passa como o vento,
sem consumação,
naturalmente, inutilmente.

Não entendo momento,
só momento, sem ação,
sem movimento,
sem nós dois
que juntos somos vida.

Só aceito momento,
que não seja fugaz nem
efêmero;
- que seja total completamente.

Então, seremos nós
eu e você,
caminhando juntos,
de mãos dadas
rasgando a luz da tarde;
rumo ao crepúsculo.

Agora, o dia ainda está todo
aberto diante de nós;
e, é um convite à vida.

Vamos pois, inebriados
beber a vida, gota a gota
até o fim, enquanto,
juntos caminhamos.
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Trova de Maringá/PR

A. A. DE ASSIS

A prata, em nosso cabelo, 
faz ninho se a idade vem... 
Que pena ela não fazê-lo 
em nossos bolsos também!
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Décima de Fortaleza/CE

FRANCISCO JOSÉ PESSOA
1949 – 2020

Meu sertão sou teu pedaço
Berço de gente feliz
Que dança ao som de Luiz
no escurinho do terraço.
Tem sol quente tem mormaço,
Tem ave de arribação,
Xaxado xote e baião
Tem um Santo Padim Ciço.
Quem nunca viu tudo isso 
Não sabe o que é sertão. 
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Trova da Princesa dos Trovadores

CAROLINA RAMOS
Santos/SP

Esse que vive algemado
às paixões, odiando a esmo,
mesmo sendo alforriado,
segue escravo de si mesmo!
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Hino de Feira de Santana/BA

Salve ó terra formosa e bendita
Paraíso com o nome de Feira
Toda cheia de graça infinita
És do norte a princesa altaneira

Bem nascida entre verdes colinas
Sob o encanto de um céu azulado
Ao estranho tu sempre dominas
Com o poder do teu clima sagrado

Sorridente como uma criança
Descuidosa da sua beleza
Do futuro és a linda esperança
Terra moça de sã natureza

Poetisa do branco luar
Pelas noites vazias de agosto
Fiandeira que vive a fiar
A toalha de luz de sol posto

De Santana és a filha querida
Noite e dia por ela velada
E o teu povo tão cheio de vida
Só trabalha por ver-te elevada
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Trova de São Mateus do Sul/PR

GÉRSON CÉSAR SOUZA

Bondade, segundo eu penso,
é a peça que está perdida
do quebra-cabeça imenso
que nós chamamos de vida.
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Dobradinha Poética de Campo Mourão/PR

JOSÉ FELDMAN

Sonhos

Vejo uma luz no horizonte,
a paz no mundo a brilhar.
Pode ser sonho distante...
Um dia ele irá vingar...

Sempre quis pintar um mundo encantado,
com tintas da aquarela de meus sonhos,
Pintar na tela um céu todo estrelado,
e lá no fundo, corações risonhos.

Sempre quis espargir versos no mundo,
perfumá-lo com aura de esperança,
plantando sementes em chão fecundo,
qual o amor num coração de criança.

A vida é um caminho de idas e vindas,
momentos de alegria e de tristeza,
no anseio de encontrar paisagens lindas,

anda-se encruzilhadas da incerteza,
fazendo o destino em ruas infindas,
com toda a força de nossa grandeza.
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Trova Paulista

CLÁUDIO DE CÁPUA
São Paulo/SP, 1945 – 2021, Santos/SP

Nesta noite prateada
minha sombra, junto à tua,
vai trilhando a mesma estrada,
tendo por cúmplice a lua.
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Fábula em Versos da França

JEAN DE LA FONTAINE
Château-Thierry, 1621 – 1695, Paris

O marido, a mulher e o ladrão

Um marido extremoso,
Que adorava a mulher
Sendo, embora, feliz — julgava-se inditoso.
Dos olhos dela nunca um só fugaz volver,
Um modo gracioso,
Uma frase de amiga, um lânguido sorrir,
Mil expressões gentis, rápidas, mas sinceras,
Lisonjeando o descrido,
Conseguiram jamais de leve persuadir
Que era amado deveras.
Enfim... era um marido!

Se amor neste himeneu,
Como bênção divina,
Mudado lhe tivesse a tão estéril sina...
Mas... tal não sucedeu!
Batida pela sorte,
Sem mais um desafogo,
Nem mimos para o triste e mísero consorte,
Esta esquiva mulher
Ouvia-lhe uma noite o lamentar de fogo,
Sem um suspiro só de todo compreender,
Quando surge um ladrão,
E interrompe o queixume acerbo e dolorido.

Ela sente do susto a fria contorção...
Procura amparo e cai... nos braços do marido!.

«Amigo, exclama então
O jubiloso amante,
Ao pérfido ladrão:
Foram-se os meus pesares!
Sem ti, eu não teria um tão gostoso instante!
Ventura tão intensa!
Toma, leva, arrecada aquilo que encontrares,
Leva a casa também... É justa a recompensa!»

Não se perdem ladrões por homens delicados,
E a crer ninguém se inclina
Que eles sejam um pouco honestos ou vexados:
Este, pois, atirou-se impávido à rapina!

Deste conto se infere
Que o medo é das paixões a que mais largo fere;
Pois quando audaz assoma,
Como vence a aversão,
Algumas vezes doma
O amor que avassalou de todo um coração.

Tu bem viste, leitor,
Somente para ter
Nos braços a mulher...
Um marido o que fez! Foi vítima do amor!

Eu gosto deste amor altivo e temerário
Que brilha e não se estiola,
Que cresce e não se apouca!
O conto me agradou de um modo extraordinário:
Ele bem diz numa alma indômita, espanhola,
Mais sublime que louca!

O nosso português de cada dia (Expressões) = 6


(SABER) DE COR

Expressão usada quando alguém tem um assunto claramente guardado na memória.

Tem origem no latim “cor” que quer dizer coração. Portanto, saber de cor é saber pelo coração, pelos sentidos. Em francês diz-se savoir par coeur, literalmente saber pelo coração.

DEEM-ME UMA ALAVANCA E EU ERGUEREI O MUNDO

A frase é do sábio Arquimedes, 287 - 212 a. C. Foi ele um dos primeiros pensadores que começou a compreender a importância das máquinas para realização de trabalhos, lembrando que o esforço físico era considerado indigno de cidadãos livres no Mundo Antigo. Ele estudou , descobriu e formalizou as leis da mecânica, tendo inventado o sistema de roldanas, a alavanca e muitas outras máquinas. Certa feita, querendo ser compreendido no alcance de seus inventos, disse: "Deem-me um outro lugar onde eu possa colocar-me, e uma alavanca de tamanho adequado, e eu deslocarei a Terra". Baseado no princípio da alavanca, ele inventou a catapulta, que acabou por ajudar, e muito, o seu povo a resistir à invasão dos romanos.

DEITAR E ROLAR

Fazer a festa, divertir-se a valer sem nenhuma preocupação, aproveitar a situação da melhor maneira possível.

A expressão é nórdica. Está ligada às antigas tradições pré-natalinas. Muitos costumes têm a sua origem em antigas festas populares pagãs, quando as celebrações realizadas ao romper do inverno rogavam aos deuses a volta plena da natureza "adormecida" na próxima primavera. Um cortejo - bem barulhento -, se formava para afastar os maus espíritos e os fantasmas. As crianças desejavam que nesta data a cidade estivesse coberta de neve para que pudessem construir bonecos de neve, traçar batalhas brancas ou, simplesmente, deitar e rolar sob os flocos frescos, num cenário feito conto de fadas que modificava radicalmente a paisagem urbana, normalmente cinza e sem graça.

DE VENTO EM POPA

Usada quando as coisas vão muito bem, tudo está favorável.

A metáfora é quase literal. Popa é a parte de trás dos navios. Se imaginarmos um barco a velas, numa época em que a propulsão de barcos grandes era apenas assim, será fácil entender o que significava ter o vento a favor, de trás para diante. Os ventos favoráveis são chamados de barlaventos.

DIABO A QUATRO

Confusão generalizada, várias pessoas falando e/ou fazendo muitas coisas ao mesmo tempo sem que ninguém se entenda.

Nos antigos autos medievais (peças de teatro simples, de um só conflito - normalmente o bem contra o mal - de caráter religioso e moralizante e feita em versos), apareciam normalmente quatro personagens vestidas de diabos fazendo horríveis barulhos com o intuito de aterrorizar os espectadores, alertando-os sobre as penas infernais a que todos estavam sujeitos.

DIAS DA SEMANA

Por que os dias da semana são chamados de segunda, terça, quarta, quinta e sexta-feira, sábado e domingo? Esta, talvez, seja uma pergunta feita por quase todo mundo.

A origem dos nomes em português é essencialmente religiosa:

Domingo: vem do latim Dominus, o dia do Senhor, seria então o primeiro dia de festividade religiosa, da feria, para nós a primeira feira; segunda a sexta, as outras feiras ordenadas; e sábado viria do latim sabbatu, que, por sua vez, viria do hebraico shabbath, significando descanso semanal.

As outras línguas europeias deram aos dias origem pagãs, relacionando os nomes aos astros.

Fonte: Nailor Marques Jr. Será o Benedito?: Dicionário de origens de expressões. Maringá/PR: Liceu, 2002.

Recordando Velhas Canções (Máscara negra)


(Marcha/carnaval, 1967)

Compositores: Zé Keti e Pereira Matos

Tanto riso, oh quanta alegria
Mais de mil palhaços no salão
Arlequim está chorando pelo amor da Colombina
No meio da multidão

Foi bom te ver outra vez
Tá fazendo um ano
Foi no carnaval que passou
Eu sou aquele pierrô
Que te abraçou
Que te beijou, meu amor
Na mesma máscara negra
Que esconde o teu rosto
Eu quero matar a saudade
Vou beijar-te agora
Não me leve a mal
Hoje é carnaval
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A Saudade e o Carnaval: A História por Trás de 'Máscara Negra'
A canção 'Máscara Negra', interpretada pelo icônico sambista Zé Keti, é um clássico do carnaval brasileiro que traz em sua essência a mistura de alegria e melancolia tão característica dessa festa popular. A letra da música descreve o cenário de um baile de carnaval, onde a figura do Arlequim chora por seu amor não correspondido pela Colombina, personagens tradicionais da Commedia dell'arte italiana que foram incorporados ao carnaval.

O eu lírico da canção se identifica como um pierrô, outro personagem clássico, que relembra um encontro amoroso ocorrido no carnaval do ano anterior. A 'máscara negra' que dá título à música pode ser interpretada tanto literalmente, como parte do disfarce carnavalesco, quanto metaforicamente, representando os sentimentos ocultos e a saudade que o narrador sente. A máscara serve como um elemento de anonimato que permite ao pierrô expressar seu amor e matar a saudade através de um beijo, aproveitando a liberdade que o carnaval proporciona.

A música, portanto, captura a dualidade do carnaval: a euforia coletiva e a intimidade dos encontros fugazes. 'Máscara Negra' é um retrato da efemeridade das relações humanas, da alegria passageira e da saudade que permanece, tudo sob o véu da festividade e do anonimato que o carnaval oferece.

Ainda prestigiado pelo sucesso do show “Opinião”, Zé Kéti ganhou o carnaval de 67 com a marcha-rancho “Máscara Negra”. Reproduzindo o lirismo suave que caracteriza o gênero, a composição trata do reencontro de um Pierrô com uma Colombina que conhecera no carnaval anterior.

E, ao contrário de outras canções inspiradas na commedia dell’arte, aqui é o Arlequim quem chora pelo amor de colombina. Tendo acontecido numa época em que a música carnavalesca tradicional saía de moda, o sucesso de “Máscara Negra” pode ser considerado uma façanha.

A propósito, este sucesso chegou a gerar uma polêmica sobre a co-autoria da composição, que seria de Deusdedith Pereira Matos e não de seu irmão Hildebrando, conforme consta na edição. Mas, como os dois já haviam morrido na ocasião, a questão não teve maiores consequências, entrando “Máscara Negra” para o repertório de Dalva de Oliveira como um de seus últimos sucessos 
Fontes:
A Canção no Tempo – Vol. 2 – Jairo Severiano e Zuza Homem de Mello – Editora 34.