sexta-feira, 11 de outubro de 2024

Estante de livros (Madame Bovary; A Educação Sentimental; Bouvard e Pécuchet, de Flaubert)


As obras de Gustave Flaubert são marcos do realismo literário, cada uma abordando questões universais de modo profundo e provocativo. Através de sua prosa refinada e personagens complexos, o autor continua a ressoar com leitores contemporâneos, oferecendo reflexões sobre a condição humana e as contradições da sociedade.

1. Madame Bovary
Este livro narra a vida de Emma Bovary, uma mulher que se sente entediada e insatisfeita com sua vida provincial e seu casamento com Charles Bovary, um médico simples e bondoso. Emma anseia por paixão e emoção, inspirada por romances idealizados que leu em sua juventude. Ela busca escapar da monotonia através de relacionamentos extraconjugais com Rodolphe e Léon, além de gastar dinheiro em luxos que não pode pagar.

A busca incessante de Emma por uma vida ideal leva a consequências trágicas. Sua infidelidade e consumismo resultam em dívidas crescentes, e, ao perceber que seus sonhos permanecem inatingíveis, ela se desespera. No final, Emma toma a drástica decisão de se suicidar, deixando Charles devastado e os credores atrás de sua família.

"Madame Bovary" é uma crítica incisiva à sociedade burguesa do século XIX, explorando temas como o descontentamento, a busca por identidade e a ilusão do romance. Flaubert utiliza um estilo de realismo meticuloso, usando detalhes vívidos para retratar a vida cotidiana e as emoções de Emma. A estrutura do romance é notável, com uma narrativa que interliga os pensamentos íntimos de Emma e a percepção externa da sociedade.

O personagem de Emma é complexo; ela simboliza a luta entre a aspiração e a realidade. Sua insatisfação reflete não apenas uma crise pessoal, mas também uma crítica social à falta de opções para as mulheres da época. Flaubert desafia as convenções do romance romântico, subvertendo as expectativas do leitor e apresentando a tragédia de uma mulher que busca algo além do que a vida lhe oferece.

2. A Educação Sentimental
Esta obra acompanha a vida de Frédéric Moreau, um jovem de 18 anos que se muda para Paris em busca de amor e aventura. Frédéric se apaixona por Madame Arnoux, uma mulher casada que representa o ideal romântico que ele busca. Ao longo da narrativa, ele testemunha e participa de eventos políticos e sociais que moldam a França do século XIX, incluindo as revoluções de 1848.

A história explora as desilusões amorosas de Frédéric, suas amizades e seus encontros com uma variedade de personagens que representam diferentes aspectos da sociedade. Apesar de suas aspirações e sonhos, Frédéric acaba se sentindo perdido e incapaz de realizar suas ambições, levando a um sentimento de frustração e desilusão.

"A Educação Sentimental" é uma rica análise da juventude, do amor e das transformações sociais. Flaubert utiliza uma narrativa fragmentada e um estilo de prosa altamente detalhado para capturar a complexidade da vida parisiense e a confusão emocional de Frédéric. O romance é também uma crítica à superficialidade da sociedade burguesa e das convenções sociais que limitam a liberdade individual.

Os personagens de Flaubert são multifacetados, refletindo a diversidade da experiência humana. Frédéric, em particular, é um anti-herói que encarna a incerteza da geração que viveu durante períodos de grande mudança. Sua incapacidade de agir e sua busca por significado ressaltam a alienação e o desencanto que permeiam a obra.

3. Bouvard e Pécuchet
Segue a história de dois copistas, Bouvard e Pécuchet, que, após herdarem uma pequena fortuna, decidem buscar conhecimento e se aventurar em várias disciplinas, incluindo a medicina, a agricultura e a filosofia. No entanto, suas tentativas de aprender e aplicar novos conhecimentos são tratadas com um tom de ironia e sátira, pois eles rapidamente se tornam obcecados e desiludidos.

A história é marcada por uma série de fracassos e mal-entendidos, levando Bouvard e Pécuchet a perceber que o desejo de conhecimento muitas vezes é fútil. Ao final, eles retornam a suas vidas simples de copistas, sem realmente compreenderem as lições que tentaram aprender.

"Bouvard e Pécuchet" é uma crítica mordaz à superficialidade do conhecimento e ao entusiasmo irracional pela ciência e pela educação. Flaubert explora a ideia de que o saber não é suficiente para garantir a sabedoria ou a felicidade. A obra aborda as limitações do conhecimento humano e as armadilhas do empirismo.

O estilo de Flaubert é caracterizado por uma ironia sutil, e ele utiliza o humor para expor a tolice de seus personagens. Bouvard e Pécuchet representam a busca incessante da humanidade por compreensão e controle, enquanto suas falhas ilustram a fragilidade da condição humana. Flaubert, com seu olhar crítico, questiona a validade da aquisição de conhecimento sem entendimento profundo e reflexão.

Fonte: José Feldman. Estante de livros. Maringá/PR: IA Poe. Biblioteca Voo da Gralha Azul, 2024.

Recordando Velhas Canções (Os olhos dela)

(xote, 1906) 

Compositores: Catulo da Paixão Cearense e Irineu de Almeida

Eu sou capaz de confessar 
Aos pés de Deus 
Que eu nunca vi em mundo algum 
Uns olhos como os teus! 
Eu não sei mesmo 
Como os hei de comparar, não sei 
Eu já tentei cantar 
O teu divino olhar

Depois de tanto versejar 
Debalde em vão 
Depois de tanto apoquentar 
A minha inspiração 
Cheguei à triste conclusão 
De que eu só sei sofrer 
E o que teus olhos são 
Não sei dizer

Deixa-te estar que quando eu morrer 
Irei verter os prantos meus nos céus 
Hei de contar em segredo a Deus 
As travessuras desses olhos teus 
Hei de mostrar ao Senhor Jesus 
Ao Pai nos céus, apiedado 
Meu coração crucificado 
Nos braços teus de luz

Os olhos teus são lágrimas do amor 
Os olhos teus são dois suspiros de uma flor 
São dois soluços d’alma 
São dois cupidos de poesia 
Que sinfonia tem o teu olhar 
Que até às vezes já nos faz chorar! 
Ai, quem me dera me apagar assim 
À luz do teu olhar!

Os olhos teus 
Quando nos querem castigar 
Parecem dois astros de gelo 
Que nos vêm gelar 
Mas quando querem nos ferir 
Direito o coração 
Eu não te digo não 
O que os teus olhos são

Pois quando o mundo quiser 
De vez findar 
Basta acendê-lo com um raio 
Desse teu olhar 
Que os olhos todos das mulheres 
Que mais lindas são 
Dos olhos teus 
Não têm a irradiação

A Fascinação e o Mistério dos Olhos Dela
A música "Os Olhos Dela" é uma ode à beleza e ao mistério dos olhos de uma mulher amada. Desde o início, o eu lírico confessa que nunca viu olhos tão impressionantes em toda a sua vida, comparando-os a algo divino e inigualável. A dificuldade em descrever a profundidade e o impacto desses olhos é evidente, pois ele admite que, apesar de seus esforços poéticos, não consegue encontrar palavras adequadas para expressar o que sente.

A letra explora a dualidade dos olhos da amada, que podem tanto castigar quanto ferir o coração do eu lírico. Essa ambiguidade é uma metáfora para a complexidade das emoções humanas e a capacidade do olhar de transmitir sentimentos contraditórios. Os olhos são descritos como astros de gelo que podem gelar, mas também como algo que pode ferir profundamente, mostrando a intensidade do amor e da dor que eles podem causar.

No final, o eu lírico eleva os olhos da amada a um nível quase sagrado, comparando-os aos de Maria, a mãe de Jesus. Essa comparação não só exalta a pureza e a santidade dos olhos, mas também sugere um amor que transcende o mundano e se aproxima do divino. A música, portanto, é uma celebração da beleza, do mistério e da complexidade das emoções humanas, encapsuladas no olhar de uma mulher.
Fonte: https://www.letras.mus.br/vicente-celestino-musicas/os-olhos-dela/significado.html

quinta-feira, 10 de outubro de 2024

Daniel Maurício (Poética) 78

 

José Feldman (Pafúncio no campo de futebol)

Era uma tarde ensolarada em uma cidade onde o futebol era quase uma religião. O clima estava eletrizante, pois o grande jogo da final do campeonato nacional se aproximava. A revista “Fuxicos & Fofocas”, sempre em busca de uma boa história, decidiu que era hora de fazer uma cobertura especial do evento, e, claro, o jornalista Pafúncio Epaminondas foi escolhido para entrevistar os jogadores.

O problema? Pafúncio não entendia nada de futebol. Ele sabia que a bola era redonda e que o objetivo era fazer gols, mas isso era tudo. No entanto, seu editor acreditava que sua habilidade de fazer perguntas poderia resultar em algumas respostas memoráveis. E assim, ele se preparou para a missão.

Chegando ao estádio, Pafúncio vestia uma camisa de um time que ele nem sabia qual era — ele simplesmente pegou a primeira que viu no armário. O ambiente estava repleto de torcedores animados, bandeiras tremulando e gritos de incentivo. Ele se sentiu um pouco deslocado, mas decidiu seguir em frente.

Com seu bloco de notas e caneta em mãos, o jornalista se dirigiu à área de entrevistas, onde os jogadores estavam se preparando para falar com a imprensa. Ele avistou o famoso atacante da equipe, um homem musculoso chamado “Marco Gol”, e foi em sua direção.

“Oi, Marco! Se você fosse um animal, qual seria e por quê?” Pafúncio perguntou, com um sorriso que revelava sua total falta de noção. O jogador, surpreso, olhou para ele e respondeu: “Um leão, porque sou o rei do campo!”

Pafúncio, sem perder tempo, anotou: “Marco Gol se vê como um leão! O rei do campo!” Em sua mente, isso era ouro puro para a revista.

Mas ele não parou por aí. Em seguida, decidiu entrevistar a goleira da equipe, uma mulher chamada “Tana Defesa”. Ele chegou perto e, sem pensar, disparou: “Tana, se você tivesse que escolher entre salvar um gol ou comer um bolo de chocolate, o que escolheria?”

Tana, com uma expressão de espanto e riso, respondeu: “Bom, eu sempre escolheria salvar o gol, mas um bolo de chocolate depois do jogo é tentador!”

“Então, o segredo de uma grande goleira é um bom bolo!” Pafúncio anotou, divertindo-se com sua própria lógica.

Depois de algumas entrevistas absurdas, Pafúncio se sentia cada vez mais confiante, mesmo que não entendesse nada do que estava acontecendo. Ele viu uma oportunidade de ouro ao avistar o técnico da equipe, um homem sério chamado “Armando Tática”. Pafúncio se aproximou, tentando parecer profissional, e perguntou: “Armando, se o futebol fosse uma dança, qual seria e por quê?”

Armando, que não esperava essa pergunta, hesitou e respondeu: “Talvez um tango, porque é preciso muito trabalho em equipe.”

Pafúncio, anotando tudo, pensou em como poderia transformar isso em uma matéria divertida. “Armando Tática diz que o futebol é um tango! Preparem-se para a dança do campeonato!”

Enquanto isso, a atmosfera do estádio estava se aquecendo, e Pafúncio decidiu que precisava fazer mais perguntas. Ele encontrou um jogador que estava se alongando e perguntou: “Se você fosse um super-herói, qual seria seu poder durante uma partida?” O jogador, já acostumado com perguntas estranhas, respondeu: “Super velocidade, claro!”

Pafúncio, animado, exclamou: “Então, você corre mais rápido do que a fofoca na redação!” O jogador riu, mas Pafúncio não percebeu que estava começando a perder a noção da situação.

Ao longo do dia, ele continuou a fazer perguntas absurdas, como: “Se você pudesse trocar de lugar com a bola durante um jogo, o que diria a ela?” e “Qual música você cantaria se estivesse em campo, e por que seria uma balada romântica?” Os jogadores, embora confusos, se divertiram.

Finalmente, chegou a hora do grande jogo. Pafúncio, agora um pouco mais confortável, decidiu que precisava fazer uma última pergunta para o capitão da equipe, um homem carismático chamado “Lino Capitão”. Ele se aproximou e, em um momento de pura inspiração, soltou: “Lino, se a vitória fosse um sabor de sorvete, qual seria e por quê?”

Lino, sem saber se ria ou se ficava sério, respondeu: “Chocolate, porque é sempre a escolha certa!” Pafúncio, radiante, gritou: “Vitória é chocolate! Preparem-se para a taça mais doce da história!”

O jogo começou, e Pafúncio, agora como um verdadeiro comentarista, decidiu que tinha que fazer uma análise ao vivo. Ele começou a gritar coisas como: “Olhem! O leão está correndo para o gol!” e “Tana vai guardar o gol como uma mãe guarda seu filho!” As pessoas ao seu redor riam da sua empolgação, e até alguns torcedores começaram a aplaudir suas observações absurdas.

Ao final do jogo, que terminou em uma vitória emocionante para a equipe de Pafúncio, ele se sentiu como o verdadeiro herói da história. Embora não tivesse entendido nada do que aconteceu em campo, ele conseguiu capturar a essência do evento com suas perguntas inusitadas e seu jeito descontraído.

De volta à redação, Pafúncio escreveu uma matéria que misturava futebol com humor, destacando a visão única que ele trouxe ao evento. E assim, com risadas e trapalhadas, ele provou que, mesmo sem entender o jogo, ainda era capaz de fazer uma cobertura inesquecível e divertida. Afinal, no mundo do futebol, o mais importante é saber aproveitar a alegria do momento — e, se possível, comer um bom bolo de chocolate depois!

Fonte: José Feldman. Peripécias de um jornalista de fofocas & outros contos. Maringá/PR: IA Poe. Biblioteca Voo da Gralha Azul, 2024.

Vereda da Poesia = 129 =


Soneto de
VANDA FAGUNDES QUEIROZ
Curitiba/PR

Síntese

A rosa, flor rainha do canteiro,
jamais força a exclusão do rude espinho
que, em vez de ter bem longe o próprio ninho,
da flor se faz constante companheiro.

A luz divide o seu próprio roteiro
com a sombra, que percorre igual caminho,
enquanto o bem consiste em ser vizinho
do mal, no mesmo espaço, o tempo inteiro.

A vida, amplo mosaico deslumbrante,
condensa eternidade em breve instante,
combina em mil nuances tons diversos.

Sem excluir parcelas da verdade,
mas abraçando a vasta humanidade,
o poeta sente... e expõe o mundo, em versos!
= = = = = = 

Trova de
IZO GOLDMAN
Porto Alegre/RS, 1932 – 2013, São Paulo/SP

Coração não tem idade
quando vive de lembrança;
se a lembrança tem saudade,
faz, da saudade, "esperança''!
= = = = = = 

Poema de
LUIZ POETA
(Luiz Gilberto de Barros)
Rio de Janeiro/RJ

Vale a pena valer a pena

Vale a pena ser feliz a cada instante
que se viva, quando a dor não está por perto,
pois se o Sol machuca a pele do deserto,
num oásis, o amor é verdejante.

Quando a lágrima é salgada... e cristalina...
na retina, os sonhos teimam em brilhar
e se há sonhos numa gota pequenina,
é nos sonhos que o amor quer se abrigar.

Vale a pena não ter pena do que é triste,
não existe solidão, se a fantasia
faz poesia com a tristeza, se ela insiste
em matar o amor que existe na alegria.

Vale a pena, entretanto, a esperança
de viver e de sentir felicidade,
resgatando a emoção de uma criança
que carece de um sorriso em liberdade.

Pois se o riso se sublima na alma pura,
cada lágrima constrói seu próprio encanto,
e se o canto não faz coro com a amargura,
a ternura é sempre a voz do acalanto.

Vale a vida... o que é triste, o tempo leva...
se são pétalas, o vento as poliniza,
se são folhas, se desprendem... quando neva...
se são bolhas, duram o tempo da brisa.

Vale a pena eu te amar e tu me amares,
nem que seja por um tempo... vale a pena!
... porque quando eu te deixar... ou me deixares,
a saudade há de brotar sempre serena.

Vale a pena agradecer todos os dias
a alegria de se ter uma história,
pois se a vida se dilui em fantasias,
a poesia se eterniza na memória.
= = = = = = 

Trova Humorística Premiada em Irati/PR, 2023
JOSÉ OUVERNEY 
Pindamonhangaba / SP

- Sem "cascalho", uma beldade
hoje investe em peça antiga.
- Compra e vende antiguidade?
- Não. Namora o avô da amiga!
= = = = = = 

Glosa de
NEMÉSIO PRATA
Fortaleza/CE

MOTE... 
Minha vida é qual navio 
que navega pelo mar... 
Ora contra um mar bravio, 
ora mero devanear. 
José Feldman
Campo Mourão/PR

GLOSA... 
Minha vida é qual navio, 
avião, trem, caminhão; 
porém o meu desafio 
é andar a pé... no chão! 

Se você tem um transporte 
que navega pelo mar... 
digo que você tem sorte 
se o dito nunca afundar! 

Sempre foi um desafio 
para um navio... singrar; 
Ora contra um mar bravio, 
ora ao sabor de um bom mar! 

Pra quem sai ao mar diria: 
é bom, cuidados, tomar; 
pois ora vem ventania, 
ora, mero devanear.
= = = = = = 

Trova Popular

Amar e saber amar               
são dois pontos delicados:      
os que amam, são sem conta:
os que sabem, são contados.     
= = = = = = 

Soneto de
EDUARDO A. O. TOLEDO
Pouso Alegre/MG

Exclusão

Quando o dia abre o céu e o sol desperta,
dourando as relvas do jardim florido,
em meio a uma esperança descoberta,
às vezes amanheço deprimido...

Já, pela tarde, que se faz aberta
às cigarras em límpido alarido,
onde se afaga uma ilusão incerta,
às vezes entardeço sem sentido...

E quando a noite vem, presa em luares,
na própria exaltação dos avatares,
às vezes anoiteço na exclusão...

No entanto, quando chega a madrugada,
meus sonhos se libertam e , em revoada,
vão desenhando versos na amplidão!!!
= = = = = = 

Trova de
ILZA MONTENEGRO
Queluz /SP (1912 – ????) Guaratinguetá/SP

Devemos o amor buscar
se a mocidade em nós arde.
Para quem fica a esperar,
ele sempre chega tarde!...
= = = = = = 

Décima de
FRANCISCO JOSÉ PESSOA
Fortaleza/CE, 1949 - 2020

Aos Poetas de Caicó

Eu queria escrever meu sentimento
Mas não sai, a não ser este prospecto
Ou sou eu um carente de intelecto
Pra mostrar o meu agradecimento
Pode até ser falta de talento
Pra exprimir o que sinto por vocês
Aturando o Pessoa uma outra vez
Nessa nossa querida Caicó
A rainha de todo Seridó
Quem me dera voltar no outro mês!!!
= = = = = = 

Trova de
ISAÚ ALMEIDA LOLA
Senhor do Bonfim/BA

O coração tem razão
quando pensa que morrendo
fica em outro coração
e continua vivendo.
= = = = = = 

Soneto de 
AMILTON MACIEL MONTEIRO
São José dos Campos/SP

Jardim secreto

Eu também tenho o meu jardim secreto,
tal qual o mundo inteiro, com certeza...
Mas só porque não sou nada discreto,
o meu “secreto” some na esperteza...

Quem lê meus versos tudo sabe, exceto,
talvez o que eu não disse por lerdeza,
porque o que escrevo eu mesmo interpreto
no meu viver de inteira singeleza.

Se eu disse que te amei, também te disse
que tudo o mais que eu fiz foi só tolice,
pois nunca mais eu tive um outro amor.

O que faltou dizer, eu digo agora:
eu sonho com teus beijos toda hora;
és a razão de eu ser um sonhador!

= = = = = = 

Trova do 
Príncipe dos Trovadores
LUIZ OTÁVIO
Rio de Janeiro/RJ (1916 -1977) Santos/SP

Ó vento que tudo pegas,
que arrancas flores e palmas,
por que também não carregas
as dores de nossas almas?!...
= = = = = = 

Poema de
PAULO LEMINSKI
Curitiba/PR, 1944 – 1989

Dor elegante

Um homem com uma dor
É muito mais elegante
Caminha assim de lado
Com se chegando atrasado
Chegasse mais adiante

Carrega o peso da dor
Como se portasse medalhas
Uma coroa, um milhão de dólares
Ou coisa que os valha

Ópios, édens, analgésicos
Não me toquem nesse dor
Ela é tudo o que me sobra
Sofrer vai ser a minha última obra
= = = = = = 

Trova Funerária Cigana

Eu sou a tocha do morto,
com a luz já quase extinta,
ou qual a negra mortalha
que por preta não se pinta.
= = = = = = 

Soneto de 
JOSÉ MESSIAS BRAZ
Juiz de Fora/MG

Encantos da tarde

Explode a tarde rubra e refulgente,
na primavera exuberante em cores,
aos olhos do roceiro indiferente
e aos gorjeios dos pássaros cantores...

Alegre, a tarde entrega-se ao poente
abrindo em leque os últimos fulgores
e em seus rastros deixando, lentamente,
que a noite acenda a luz dos refletores.

- Feliz eu morreria à luz da tarde...
espargindo meus versos sem alarde,
no encanto deste adeus crepuscular,

se pudesse voltar em outra vida,
aos braços da pessoa mais querida,
em primorosa noite de luar!..
= = = = = = 

Trova de
BRANDINA ROCHA LIMA
Recife/PE, 1916 – 1999, Moreno/PE

Fui sempre um pobre palhaço
no circo do meu viver,
rindo do próprio fracasso,
tentando a dor esconder…
= = = = = = 

Poema de 
ANTONIO CARLOS DE PAULA
São Paulo/SP

Beijo Quebrado!

Já tive sonho perdido,
já tive um amor sonhado,
fui flor de um vaso partido,
cacos de um beijo quebrado,
eu já rimei contra o vento,
versejei contra a maré,
machuquei meus sentimentos,
tropecei na própria fé!

Entreguei-me apaixonado,
quebrei o sonho e a ilusão,
por isso, hoje o cuidado
com o meu pobre coração,
que sobre as ondas do destino
está vacilando outra vez
levando-me ao desatino,
veja o que a vida me fez!

O sol deste teu sorriso
e a ternura em teu olhar,
me dizem que é preciso
perder o medo de amar!
= = = = = = 

Trova Humorística de
THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA
São Paulo/SP

Vendo a fera, fica “um gelo”...
retira a cruz do pescoço.
Mas, o leão, ante o apelo:
“Só rezo... depois do almoço!”
= = = = = = 

Soneto de 
MARIA MADALENA FERREIRA
Magé/RJ

Amor à Vida

Levei uma “palmada”... ao “pôr os pés”... na vida..
E logo desatei um choro alucinante!
Porém, a minha mãe beijou-me – enternecida! – 
e ao seio me achegou! – Sorri no mesmo instante!!!

De barriguinha cheia – e, tendo por guarida
uns braços, e uma voz serena e repousante,
eu me senti – de pronto! – amada e protegida!
E adormeci, pensando: - “A vida é fascinante!!!”

Se é certo que, ao passar por todos estes Anos,
sofri desilusões, desgostos, desenganos,
também usufruí momentos de prazer!!!

Vivendo, eu me apeguei à vida, de tal jeito,
que a Angústia que ora sinto – aqui, dentro do peito,
não é medo da morte! – É pena de morrer!!!...
= = = = = = 

Trova de
A. A. DE ASSIS
Maringá/PR

A vida jamais se encerra... 
e é bom sermos imortais. 
– Amar você só na Terra 
seria pouco demais!
= = = = = = 

Poema de
ANTONIO M. A. SARDENBERG
São Fidélis/RJ

Alma

Quando a vida vem sussurrar baixinho
Dizendo coisas que se quer ouvir,
Deixe o recado chegar de mansinho,
Que toda a alma também quer sentir.

Prepare o peito para uma festa,
Faça um convite para ela entrar,
Reparta o resto todo que inda resta,
Pois dividir é muito mais que dar.

E deixe o amor enaltecer a vida
Dando guarida ao pobre coração.
Quando chegar a hora da partida,
Que nos sussurre a voz da emoção.
 
E que o acalanto de linda cantiga
Deixe que venha a paz que tanto acalma
Trazendo junto a esperança antiga
Que ainda vive dentro dessa alma.
= = = = = = 

Trova da
Princesa dos Trovadores
CAROLINA RAMOS
Santos/SP

A penumbra da saudade
torna os meus dias tristonhos
e eu bendigo a claridade
das estrelas dos meus sonhos!
= = = = = = 

Hino de 
Garanhuns/PE

Filhos da Terra, oh! gente,
Ergam a voz, brilhem as frontes,
cantando com a alma que sente
e que vai nas brisas dos montes.

Salve Garanhuns!
Os jardins, as palmeiras e alguns
pedaços do céu... mão divinas!
Salve as sete colina!

Estribilho
Nos anais, "Florescente e garbosa
Garanhuns", fostes sempre assim.
A elegância, a beleza da rosa,
as paisagens, estesias sem fim.

Os teus vales bravios outrora
esconderam fugitivos de cor...
A liberdade da Terra arvora
Estes homens de novo pendor.

E o lema "Ad Altiora Tendere"
é o mais fervoroso ideal.
A bandeira, sagrada e serena,
e Simôa da história fanal.

Tuas belezas - cidade das flores
e os ares - poema acolhedor...
Ai! Suspiros! Que vida, que amores
neste hino, que fulge esplendor!
= = = = = = 

Trova Humorística de 
LEILA MICCOLIS
Rio de Janeiro/RJ

Conserta o cano que vaza,
encera o chão, lava a pia,
e aos amigos diz: "Lá em casa
eu uso muita energia..."
= = = = = = 

Sonetilho de 
OLIVALDO JUNIOR
Mogi-Guaçu/SP

Tão somente sobre o adeus

De minh’alma preta e branca,
vivo, em cores, surge o adeus,
que a saudade é muito franca
com quem vive sem os seus!...

De uma perna meio manca,
parto sempre em triste adeus,
que essa vida é quem arranca
de um amigo os outros eus.

Hoje o peito já não chora,
choro a seco neste quarto
que a saudade já penhora.

Hoje eu digo adeus, é hora,
pois o tenho quando parto,
quando parte e quando ora.
= = = = = = 

Trova de
RENATA PACCOLA
São Paulo/SP

No pode existir quem negue
que em apenas quatro versos
a trova sempre consegue
conter vários universos!
= = = = = = 

Fábula em Versos de
JEAN DE LA FONTAINE
Château-Thierry/França, 1621 – 1695, Paris/França

A dama desdenhosa

Uma mui nobre — rica donzela,
Airosa e bela,
Fez a cidade — alvoroçar.

Nas sociedades — mui bem cantava,
Mui bem dançava,
Queriam todos — ser o seu par.

As outras damas — ao seu aspeito*,
Cruel despeito
Na alma sentiam — de as eclipsar.

Rica e formosa — nobre e prendada,
Faltava nada,
Para partidos — ter a fartar.

Já dos mancebos — a estreia toda
Dela anda em roda,
Cada um procura — de a desposar!

Mas desdenhosa — dando à cabeça,
«Não tenho pressa —
Dizia ufana — de me casar!»

Depois severa — cada conquista
Passa em revista,
E em todos acha — que censurar,

Um, nímio* branco — outro é trigueiro,
Outro grosseiro,
Outro mui velho — para a igualar.

No entanto os anos — vão de corrida;
Não pressentida,
Sua beleza — entra a baixar.

Roda somenos — de pretendentes,
Ainda decentes,
Os seus obséquios — vem ofertar.

Mas segue a louca — sua mania:
«Ora — dizia —
Se de tais monos — me hei de agradar!

Fidalgos pobres! — ricos plebeus!
Sem tais sandeus,
Posso contente — vida passar».

Os galãs vão-se — dela zombando;
Até que chegando
O seu espelho — a consultar,

Viu, que desgosto! — que entre os cabelos
Louros e belos,
Alguns começam — a branquejar!

Então ansiosa — busca um marido,
Mas um partido
Sequer mediano — não pôde achar.

E quem rendera — cidade e corte,
Por grande sorte,
Com um corcunda — teve o casar.
= = = = = = = = = 
* Vocabulário:
Aspeito: aspecto
Nímios: demasiados