sábado, 5 de julho de 2025

Asas da Poesia * 45 *


Poema (Madrigal) de 
LAIRTON TROVÃO DE ANDRADE
Pinhalão/PR

Rainha do abismo

"Eis que o meu amado vem aí, saltando sobre
os montes, pulando sobre as colinas."
(Ct. 2.8)

Solitária orquídea do rochedo altivo,
Que o penhasco alegras com teu magnetismo;
Tens a pedra tosca, por trono cativo,
Onde vives presa, rainha do abismo.

Muito maravilhas o penhasco feio,
Do surgir da aurora até ao entardecer;
Mas teu coração está de angústia cheio
Por não ter aquele que desejas ter.

Que vale o sorrir da brisa em teu semblante,
Que se faz presente pra te acariciar?
Sem meigos carinhos deste amor distante,
Tudo isso só pode te fazer penar.

O que mais fazer para te libertar?
Escalar montanha, além do abismo o horror?
Arriscarei tudo - quero te buscar!
Dar-te-ei uma vida repleta de amor.

Arriscarei tudo - vencerei o dragão!
Galgarei a escarpa - direção do norte;
Lutarei co'o vento - vencerei o tufão...
Vou salvar o amor - libertar-te-ei da morte!
= = = = = = = = =  

Trova Premiada de
RITA MOURÃO
Ribeirão Preto/ SP

Desbravando o chão mineiro, 
com brio, amor e esperança, 
de um pai humilde e guerreiro 
me veio a maior herança!
= = = = = = = = =

Soneto de
EDY SOARES
Vila Velha/ES

Parafraseando Bilac

Ouvem estrelas, falam com as flores,
e tantas vezes sofrem dores vãs;
dizem sentir o cheiro das manhãs... 
Haverá loucos, aonde quer que fores!

Fazem dos versos, sempre, os seus divãs,
falam de tédio, mortes, desamores...
e tantas vezes atribuem cores 
aos quadros de floradas temporãs.

São sensacionalistas desvairados
buscando, na poesia os verdes prados,
o bucolismo, a paz o, amor profundo...

Podem pensar que somos masoquistas
ou legião de loucos alquimistas...
Mas os poetas vão salvar o mundo!
= = = = = = = = =  

Quadra Popular de
AUTOR ANÔNIMO

O teu rosto de morena
levemente tem a cor;
para poder compará-lo
não encontro uma só flor.
= = = = = = = = =  

Poema de
ANTERO JERÓNIMO
Lisboa/ Portugal

Máscara

Maquilha a preceito os traços do seu rosto invisível
para cada ocasião há sempre uma máscara disponível
Frente ao toucador ilude na displicência
sabe embelezar-se com finas vestes d'aparência
Surge em palco, glamorosa! Não tem hora marcada
dispensa convite e não precisa ser anunciada
Conhece de cartilha os dotes da insinuação
assemelha-se à verdade pela força da convicção
Bamboleando-se audaz observa os presentes
vai distribuindo vénias e olhares reluzentes
O sorriso é fácil, a confusão o seu sustento
é exímia a eleger o espectador mais desatento
Pompa, circunstância, a festa vai no seu apogeu
focam-se as atenções na realidade que se esqueceu
Continua a menear-se, coreografia mil vezes ensaiada
tropeça, cai a máscara, foge em debandada
Cessam os aplausos, pois a festa já terminou
falsas vestes em beco escuro alguém abandonou.
= = = = = = = = =  

Haicai do
PROFESSOR GARCIA
Caicó/RN

A luz do luar,
vejo arabescos na areia
de espumas do mar!
= = = = = = = = =

Poema de
DOMINGOS FREIRE CARDOSO
Ilhavo/ Portugal

Que nem um rasto fique no caminho
(Manuel Lima Monteiro Andrade in "Mãos abertas" p. 122)

Que nem rasto fique no caminho
Por onde me perdi, errando os passos
E os meus pés possam ter deixado traços
Quando avançavam sós e em desalinho.

Por mim acompanhado andei sozinho
Com glória diminuta e bens escassos
Cingi os grandes nadas com meus braços
Plantei agrura e quis colher carinho.

Em vão tentei encher meu ser de bem
Degustar o melhor que a vida tem
Mas o meu peito a graça não achou.

Fugaz e pouca foi a rainha vida
Uma estrela cadente que, perdida
Riscou o céu e logo se esfumou...
= = = = = = = = = 

Limerique de
NILTON MANOEL
Ribeirão Preto/SP, 1945 – 2024

Limeriques urbanos III

Professor, é com letra de mão?
Sim! cursiva nesta lição.
Quem escreve de pé
tendo no aluno fé,
é professor de profissão.
= = = = = =

Poema de
ANDRÉ GRANJA CARNEIRO
Atibaia/SP, 1922 – 2014 , Curitiba/PR

Quântica realidade

Na pequena morte
ressuscito o mundo estranho
da minha cabeça.
Sou o mandarim no sonho da borboleta.
Vivo a irrealidade dos fatos
sem a memória acordada.
Neste próximo milênio
faço 15 bilhões de anos.
Ainda tenho na ponta do dedo
um átomo girando do big-bang.
A cobra,
desesperada
com a falta dos braços,
abraça Eva com o corpo inteiro.
Os avós peixes não se lembram
quando saíram da água.
Não há mais opostos:
real e imaginário,
passado e futuro,
vida e morte.
As palavras caíram
no lago global do esquecimento,
a quântica relatividade dança conosco
no espaço curvo deste planeta redondo.
= = = = = = 

Lengalenga de Portugal
O BENTO
  
 Lengalenga inerente aos jogos de “o mestre manda”, em que uns têm de seguir tudo o que o mestre mandar fazer.
   
- Bento que bento é o frade!
- Frade!
- Na boca do forno!
- Forno!
- Cozinhando um bolo!
- Bolo!
- Fareis tudo o que o mestre mandar?
- Faremos todos!
= = = = = = = = =

Poema de
FILEMON MARTINS
São Paulo/ SP

Coisas de amor

É noite calma. A lua está brilhando,
namorados passeiam pela rua,
enquanto aqui a sós fico sonhando,
- como dói no meu peito a ausência tua.

Quisera, nesta noite, estar amando
tranquilo a contemplar a luz da lua
e seguirmos, unidos, procurando
novos sonhos, que a vida continua...

Meu coração, porém, desconfiado,
parece reviver triste passado,
— não acredita mais nesta emoção. '

Se a vida não perdeu o encantamento
desse sonho de amor, desse momento,
— coisas de amor não têm explicação.
= = = = = = = = =  

Trova de
FRANCISCO JOSÉ PESSOA
Fortaleza/CE, 1949 - 2020

Feldman, amigo, eu desejo
tudo aquilo que te apraz...
viver a vida sem pejo, 
porém envolta na paz!
= = = = = =

Poema de
THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA
São Paulo/SP

A idade do olhar

O teu olhar me convida
ao amor... e, ainda que evite,
no meu delírio, atrevida,
eu aceito o teu convite.

O olhar de espanto
diante do mundo.
O primeiro brinquedo, Papai Noel, a escola...
A vida correndo sem parar
e eu a brincar
indiferente...
Meu tempo é o presente.

O olhar sem medo
diante do mundo.
O primeiro amor, a faculdade, o emprego...
Em busca dos sonhos, o adeus, o desapego.
Vencendo distâncias, transpondo fronteiras
eu procuro...
Meu tempo é o futuro.

O olhar sereno
diante do mundo.
Os primeiros sonhos sendo refeitos...
Sobre o livro de orações, os óculos
e sobre a folha de papel, em branco, a caneta
à espera da inspiração para a poesia.
A visita, a carta, o telefone,
o enfado...
Meu tempo é o passado.
= = = = = = = = =  

Trova de
DOROTHY JANSSON MORETTI 
Três Barras/SC, 1926 – 2017, Sorocaba/SP

Do coveiro, a noiva, rente 
é tão magra o estrupício, 
que ele diz, literalmente: 
– Casei com os ossos do ofício. 
= = = = = =

Soneto de
MIGUEL RUSSOWSKY
Santa Maria/RS (1923 – 2009) Joaçaba/SC

Joia maior!…

Começo por supor, nos ares, o desenho
De um verso magistral procurando agasalho.
Cabe a mim (sou poeta) encontrar um atalho
Para vê-lo nascer nos recursos que tenho.

Com as rimas gentis nas estrofes, me empenho
Em ser original, (Poucas vezes eu falho),
Já nem ouso explicar se é prazer ou trabalho
Exibir ao leitor as farturas do engenho.

O esmeril dá-lhe o brilho e lhe poda as arestas…
Assim é que se faz um soneto bonito,
Para ser declamado em saraus ou em festas.

Ninguém pode dizer o valor de uma joia,
Se polida não foi pela mão do perito.
É na lapidação que a beleza se apoia.
= = = = = = = = =  

Trova de
EDNA GALLO
Santos/SP

O meu coração cansado,
nas andanças da emoção,
hoje está triste, ancorado,
no porto da solidão.
= = = = = = = = =  

Poema de
SEBAS SUNDFELD
Pirassununga/SP, 1924 – 2015, Tambaú/SP

Devaneio

Sua imagem visita
a madrugada do meu sonho.
Recebo-a com a carícia da saudade,
A penumbra da sala
tem o aconchego do seu abraço
e as rosas ainda guardam
o perfume do seu corpo.
Reclino lembranças
sobre a almofada de veludo,
onde nossas mãos se encontraram
ainda há pouco,
no adeus das nossas esperanças.
Para brindar sua presença
retida em meus sentidos,
experimento o sabor de beijos
no vinho que você deixou
na taça de cristal.
E o silêncio dos meus lábios
recita a poesia do seu nome,
= = = = = = = = =  

Epigrama de
ANTONIO DINIS DA CRUZ E SILVA
Lisboa/Portugal, 1731 – 1799, Rio de Janeiro/RJ

Quando, Laurindo, sais tão penteado,
Tão nédio, tão gentil e tão rosado,
Da matreira raposa num momento
Logo me vem o dito ao pensamento:
Oh que bela cabeça por Apolo!
Mas que prol! Se não tem dentro miolo

(evocando a fábula da raposa e da máscara)
= = = = = = = = =  

Poema de
LUCIANA SOARES CHAGAS
Rio de Janeiro/RJ

O vento

O vento canta entre as árvores,
seu som desliza sobre as folhas,
o mar sereno, em ondas calmas,
enquanto a lua acende a noite.

A chuva cai sem pressa,
beija o chão em gotas frias,
desenha rios nos caminhos,
abraça o tempo sem destino.

O sol desperta em luz dourada,
veste o dia em fogo e sombra,
banha rostos, veste sonhos,
espalha vida pelo ar.

Um olhar faceiro brilha leve,
segue o vento em seus mistérios,
folhas dançam nos cabelos,
o silêncio esconde um susto breve.

No horizonte, o dia espera,
o tempo e o vento são passagem,
o vestido da moça esvoaça,
mostrando as curvas... da paisagem.
= = = = = = = = =  

Quadra Popular
AUTOR ANÔNIMO

A fita do teu cabelo
dá o nó, não chega a laço;
não faças conta comigo,
que eu contigo não a faço.
= = = = = = = = =  

Poema de
APARECIDO RAIMUNDO DE SOUZA
Vila Velha/ES

Decisão

Parei de correr atrás da saudade
que ficou de você...
Agora não me acho em mim
Acredite! É a mais pura verdade…
= = = = = = = = =  

 Poetrix de
REGINALDO COSTA DE ALBUQUERQUE
Campo Grande/ MS

Príncipe moderno

Na dúvida,
anunciou o sapatinho de cristal
nos classificados do jornal.
= = = = = = = = =

Soneto de
JOAQUIM EVÓNIO
(Joaquim Evónio Rodrigues de Vasconcelos)
Funchal/Ilha da Madeira/Portugal, 1938 – 2012, Lisboa/Portugal

Noturno em setembro

Hoje a lua nasce muito mais tarde
Nesta tristeza que trago comigo
Rompe farrapos do céu sem estrelas
Prata que não tange os sinos da aldeia

Dormem os poetas da minha rua
E os cães ladram sem saber porquê
Enquanto mais além é o silêncio
Que governa o tempo e o espaço

E eu observador intemporal
Prisioneiro de minhas verdades
Deitei-me logo a adivinhar

Se mais tarde quando o sol nascer
A lua lhe vai dizer em segredo
A solidão que passou esta noite
= = = = = = = = =  

Sextilha de
NEMÉSIO PRATA
Fortaleza/CE

Poema do esquecimento... 

Quando o tempo passa, a gente 
passa a se esquecer "tudo", 
uns dizem: "tá é demente!"; 
discordo..., porém, contudo, 
entretanto, todavia..., 
já esqueci o que escrevia: 
mas comigo é diferente!
= = = = = = = = =  

Glosa de
GISLAINE CANALES
Herval/RS, 1938 – 2018, Porto Alegre/RS

Ao amor

Mote:
Em ternura plena e extrema,
nossos sonhos se cruzaram!
E a noite se fez poema...
E os versos também se amaram!...
FLÁVIO ESTEFANI
(Porto Alegre/RS)

Glosa:
Em ternura plena e extrema,
nos entregamos os dois,
numa carícia suprema,
sem antes e sem depois.

Nesse momento tão lindo,
nossos sonhos se cruzaram,
vivemos o amor, sorrindo,
por todos que já se amaram.

De amor, então, fiz meu lema.
Em beijos eu li teus versos,
e a noite se fez poema...
Unindo os sonhos dispersos.

Poesia, carinho e amor
abraçados, se irmanaram...
Nos amamos com fervor,
e os versos também se amaram!…
= = = = = = = = =  

Triverso de
MILLOR FERNANDES
Rio de Janeiro/RJ, 1923- 2012

A palmeira e sua palma
Ondulam o ideal
Da calma.
= = = = = =

Poema de
DANIEL MAURÍCIO
Curitiba/PR

Com a porta
entreaberta
Deixei que entrasses
No meu céu.
E no céu da tua boca
A lua procurei.
Mas pra
Surpresa minha,
Quando estava
De olhos fechados,
Estrelas
Tu me fizeste ver.
= = = = = = = = =  

José Feldman (Os Rabugentos e a Tecnologia Moderna)


Na praça central de Velharruda, Arlindo e Eulália estavam novamente em seu banco, prontos para mais uma discussão acalorada. Desta vez, o assunto era a tecnologia moderna, especialmente os smartphones.

— Você viu, Arlindo? — começou Eulália, balançando a cabeça. — As pessoas estão tão grudadas nesses smartphones que parecem zumbis! Não conseguem nem olhar para o lado!

— Zumbis, realmente! — Arlindo concordou, fazendo uma careta. — No meu tempo, a gente conversava cara a cara! Agora, tudo é emoji e mensagens de texto! Que tipo de comunicação é essa?

— E o pior é que não sabem nem escrever! — Eulália exclamou. — Você já viu as mensagens? “Vc é mt legal” e “bjs”! Onde foi parar o português?

— Ah, o português! — Arlindo riu, balançando a cabeça. — Eu estava lendo um livro, e a autora escreveu “k” em vez de “que”! Se fosse no meu tempo, ela teria sido expulsa da escola!

— E agora, se você não estiver nas redes sociais, é como se não existisse! — Eulália continuou, indignada. — O que aconteceu com a privacidade? Ninguém mais sabe o que é isso!

— Exato! — Arlindo concordou. — No meu tempo, a gente contava os segredos para os amigos, não para um aplicativo que pode ser raqueado! Malditos celulares!

— E você percebeu que as crianças não brincam mais na rua? — Eulália disse, gesticulando. — Elas ficam trancadas em casa, jogando e olhando para a tela! Eu não sei como eles conseguem!

— Pois é! — Arlindo concordou, com um sorriso irônico. — Eu costumava ficar horas jogando bola, não “jogando” só no celular! Se eu tivesse um celular na minha infância, acho que teria esquecido até como andar!

— E se você tivesse um smartphone na sua juventude, Arlindo? — Eulália perguntou, divertida. — Você teria tirado fotos do seu famoso “passo do relógio” e postado na internet? “Olha como eu danço, pessoal!”

— Ah, para com isso! — Arlindo riu. — Eu seria uma sensação! Mas, pensando bem, você teria sido a primeira a comentar: “Arlindo, isso é um desastre!” 

— Eu só estaria sendo honesta! — Eulália defendeu-se, com uma risada. — E você sabe que eu teria razão!

— E quem precisa de razão quando se tem um smartphone? — Arlindo disse, sarcástico. — Hoje em dia, a verdade é o que mais se “curte”!

— E não me fale dos vídeos! — Eulália exclamou. — Todo mundo quer ser “influencer”! Você já viu como eles se comportam? Fazem dancinhas ridículas e acham que são artistas!

— E o que você prefere? — Arlindo provocou. — Um vídeo de dancinha ou ouvir você cantar “Asa Branca” no karaokê?

— Ah, você sabe que eu canto bem! — Eulália respondeu, rindo. — Mas se eu fosse uma influencer, eu teria mais fãs!

— Isso se eles soubessem o que é um karaokê! — Arlindo disparou. — Dificilmente alguém hoje em dia saberia o que é se divertir sem uma tela na frente!

— E você já reparou que eles não conseguem ficar sem seus telefones por um minuto? — Eulália continuou. — Se você pedir para alguém desligar o celular, é como se pedisse para desligar a vida!

— Pois é! — Arlindo completou, balançando a cabeça em reprovação. — No meu tempo, a gente ficava horas sem precisar de nada além de uma boa conversa!

— E uma boa xícara de café! — Eulália acrescentou, com um brilho nos olhos. — Ah, como eu sinto falta das nossas conversas longas e do cheiro do café fresco!

— Então, vamos fazer isso! — Arlindo sugeriu, com um sorriso. — Vamos deixar esses smartphones de lado e tomar um café de verdade!

— Combinado! — Eulália concordou, animada. — E quem sabe, se tivermos sorte, não encontramos um zumbi ou outro pelo caminho!

Os dois velhos rabugentos riram, levantaram-se do banco e caminharam juntos em direção à cafeteria, prontos para celebrar a amizade e as boas conversas, longe das telas e da tecnologia moderna.
* * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * 
JOSÉ FELDMAN nasceu na capital de São Paulo. Poeta, trovador, escritor e gestor cultural. Formado em patologia clínica trabalhou por mais de uma década no Hospital das Clínicas. Foi enxadrista, professor, diretor, juiz e organizador de torneios de xadrez a nível nacional durante 24 anos; como diretor cultural organizou apresentações musicais. Casado em 1994 com a escritora, poetisa, tradutora e professora da UEM, Alba Krishna, mudou-se em 1999 para o Paraná, morou em Curitiba e Ubiratã, e depois em Maringá/PR em 2011. Consultor educacional junto a alunos e professores do Paraná e São Paulo. Pertence a diversas academias de letras, como Academia Rotary de Letras, Academia Internacional da União Cultural, Confraria Luso-Brasileira de Trovadores, Academia de Letras de Teófilo Otoni, etc, possui os blogs Singrando Horizontes desde 2007, e Pérgola de Textos, um blog com textos de sua autoria, Voo da Gralha Azul e Gralha Azul Trovadoresca. Dezenas de premiações em poesias e trovas no Brasil e exterior. Assina seus escritos por Floresta/PR. 
Publicações de sua autoria “Labirintos da vida” (crônicas e contos); “Peripécias de um Jornalista de Fofocas & outros contos” (humor); “35 trovadores em Preto & Branco” (análises); e “Canteiro de trovas”.. No prelo: “Pérgola de textos” (crônicas e contos) e “Asas da poesia”

Fontes:
José Feldman. Pérgola de Textos. Floresta/PR: Plat. Poe. Biblioteca Voo da Gralha Azul.
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing

Eduardo Martínez (Doutor em tudo)


Dizem que aquele advogado, chamado de Doutor pra cá e pra lá, era a maior autoridade da região. Se alguém estivesse com qualquer problema, seja até mesmo picada de cobra, já corria lá na propriedade do Doutor. Para que médico, quando ali mesmo morava o Doutor?

Ele resolvia disputas de terras, reconciliava casais que já não se bicavam, até era capaz de fazer as pazes entre atleticanos e cruzeirenses. No entanto, havia uma situação que, talvez, fosse demais para o tal Doutor.

Um menino esbaforido de tanto correr chegou ao sítio do advogado, passou pela porteira, sempre aberta aos visitantes, e foi direto para a enorme varanda. Estirado numa rede, lá estava o Doutor, que quase não demonstrou reação, apenas observou o garoto.

– Doutor, o pai quer se separar da mãe!

Sem muita pressa, o homem se levantou da rede, pegou a garrafa de café posta à mesa ao lado, derramou um pouco numa xícara de louça colorida. O menino, ciente de que estava diante da autoridade máxima da região, apenas olhava com aqueles olhos maiores que a própria face. O Doutor sorveu um pouco do café, ao mesmo tempo em que olhava aquele menino mais magro que o gado em tempo de seca.

– Chame seus pais aqui agora.

O menino apenas assentiu com a cabeça e voltou correndo para a casa. Pouco tempo depois, lá estava ele com os pais, a mulher chorosa, o pai mais bravo que burro chucro.

– O que está acontecendo?

– Ela me traiu!

– Não traí não, Doutor!

– Por que você tá falando que ela te traiu, se ela está dizendo que não traiu?

– Olha esse menino, Doutor! Ele tem a pele mais escura que a minha e a dela. Ele não é meu filho!

O sábio observou com seus olhos atentos aquela situação. Pensou por um breve momento e, então, voltou-se para o homem queixoso.

– Quero que você e o menino andem até ali naquela jaqueira e voltem para mim, lado a lado.

O marido e o menino foram andando, enquanto o Doutor apenas observava. Assim que os dois cumpriram a ordem do advogado, este disse:

– Vocês dois andam mancando da mesma perna. Esse menino é seu filho! A sua mulher não te traiu!

– Tem certeza, Doutor?

– Claro que sim! Acabei de fazer o teste de DNA!
* * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * 
Eduardo Martínez possui formação em Jornalismo, Medicina Veterinária e Engenharia Agronômica. Editor de Cultura e colunista do Notibras, autor dos livros "57 Contos e crônicas por um autor muito velho", "Despido de ilusões", "Meu melhor amigo e eu" e "Raquel", além de dezenas de participações em coletânea. Reside em Porto Alegre/RS.

Fontes:
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing  

Sammis Reachers (Nau de Versos) – 2


202x

há rachaduras no fortim do azul 
cicatrizes nascidas antes do talho

já não há asas no pégaso 
nem canto na sereia

a própria morte 
nega seu beneplácito
= = = = = = = = =  

Adverbários

As maiores aventuras da Água 
são contadas pelo Fogo 
em noites de bebedeira
= = = = = = = = =  

Paz para praticar meu perenal ofício

Visto este andrajo de leão lá fora
Simulo humores em que ajo e interajo
E suores realizo, rito no qual contas quito.

Chegar em casa é meu fulcral laurel.
Revolucionário, mestre, pregador, menestrel?
Sou o que disso vai no interstício.

Sarau, academia, sodalício? Solitude almejo.
Cego, só por livros vejo: sou tatu cavoucando
Paz para praticar meu perenal ofício.
= = = = = = = = =  

mandibular

Há quem, no entretecido 
Das trevas,
Logre ver a luz.

Há ainda quem, 
Sequioso, 
A toque.

Há mesmo quem, 
Ferido de Deus, 
A reflita.

E há quem a mastigue: 
Este, símile dum cão, 
É poeta.
= = = = = = = = =  

poema é poeta após aventurado

o que o poeta é em potência
o poema é em ato
poeta a reticência
poema o espalhafato
= = = = = = = = =  

Aldra via

palavras
me 
aconteceram:
estradas 
de 
mim.
= = = = = = = = =  

Nos corres de Calebe, o rapaz do café

No corre de pagar boletos 
Quem ‘guenta’ performar?

Atarefado em varrer o chão 
Ninguém salta do sexto andar

Não faz guilda com morcegos 
Quem tem hora pra acordar

Nem anda só & cheio do cão 
Quem tem Deus em seu lugar
= = = = = = = = =  

Dia do Senhor, dia de milagres

O sol que nasce 
A dália que se abre
Eu não ter sido fulminado à porta
* * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * 
Sammis Reachers Cristence Silva nasceu em 1978, em Niterói/RJ, mas desde sempre morador de São Gonçalo/RJ, ambos municípios fluminenses. Sammis é poeta, escritor, antologista e editor. Membro da Confraria Brasileira de Letras. Licenciado em Geografia atua em redes públicas de ensino de municípios fluminenses. É autor de dez livros de poesia, três de contos/crônicas e um romance, e organizador de mais de cinquenta antologias.  Aos 16 anos inicia seus escritos e logo edita fanzines, participando do assim chamado circuito alternativo da poesia brasileira, com presença em jornais e informativos culturais. Possui contos e poemas premiados em concursos do Brasil, bem como textos publicados em antologias e renomadas revistas de literatura.

Fontes:
Sammis Reachers. Primeiressências. São Gonçalo/RJ: Edição do autor, 2025.. Enviado pelo poeta.
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing