O PERIODISMO FEMININO
Um dos veículos dessa emancipação, que possibilitou a divulgação dos textos das mulheres, tanto literários quanto mais propriamente políticos, foi a imprensa. E, dentro da imprensa, o periodismo feminino. O primeiro deles foi provavelmente, segundo Dulcília S. Buitoni, o jornal carioca O Espelho Diamantino, lançado em 1827.[34] Desde então, outros jornais feitos por mulheres foram fundados com a intenção de tratar de questões ligadas às mulheres e, por vezes, problematizando questões importantes de caráter político, incluindo aí o direito ao voto.
Mas a matéria era, em geral, variada. Um dos pioneiros, intitulado Correio das Modas (1839-1841), trazia “bastante literatura, crônica de bailes e teatros e figurinos pintados à mão, vindos da Europa”.[35] E o Jornal das Senhoras, editado no Rio de Janeiro, numa primeira fase, por Joana Paula Manso de Noronha, em 1852 anunciava como objetivo colaborar para a educação da mulher, livrando-a do peso de ser considerada, pelo homem, “como sua propriedade”.[36]
Na década de 70, em 1873, é fundado o primeiro jornal feminista, O Sexo Feminino[37], com o objetivo de defender a educação da mulher. Durante a campanha abolicionista, participaram de sociedades ora simplesmente angariando fundos, ora escrevendo panfletos, ora proferindo palestras, como é o caso da pernambucana Maria Amélia de Queiroz, que em 1887 faz conferência e mais tarde colaborará no jornal A Família, editado e publicado por Josefina Álvares de Azevedo, este, mais firme nas reivindicações, chegando a defender o divórcio. Ligada ao movimento de campanha pelo sufrágio feminino, Josefina Álvares de Azevedo escreveu peça de teatro intitulada O voto feminino, em 1893, que foi representada no Teatro Dramático do Rio de Janeiro.
E tem regularidade também, uma “revista literária” publicada na virada do século, em São Paulo, intitulada A Mensageira, dirigida por Presciliana Duarte de Almeida, de 1897 a 1900.[38] A revista, centrada em questões referentes à mulher, tem como eixo das considerações a necessidade da educação feminina, no sentido de se proclamar, nas palavras da diretora, “a igualdade na diferença”. Traduz posições mais conservadoras, na defesa de uma educação da mulher que não interfira no papel de mãe e esposa, não aceitando, conforme afirmação de um colaborador da revista, “nem a mulher que vota, nem a mulher que mata!”.[39] E insere também artigos mais avançados, que defendem o voto feminino e o trabalho como instrumento de independência econômica. Um deles chega a defender um feminismo político engajado a uma prática socialista, como é o caso do artigo da escritora portuguesa Maria Amália Vaz de Carvalho, escrito e publicado na revista por ocasião do encerramento do Congresso Internacional das Mulheres, em Londres, em agosto de 1899.[40]
A importância dessa revista deve-se, sobretudo, à preocupação com a formação de um grupo ativo de intelectuais e artistas preocupado com a construção de um contexto de cultura literária. E os textos aí publicados tendem, na maioria, para a feição artística, na linha de um sentimentalismo romântico, por vezes eloquente, em sonetos e demais poemas das escritoras; e na linha de estilo leve de crônicas alertas ao cotidiano da vida brasileira e, ao mesmo tempo, à literatura e ao feminismo internacional. Essa visão dupla causa, por vezes, contrastes curiosos. Em seção intitulada “Carta do Rio”, uma colaboradora lamenta, em tom solene, a morte do grande escritor francês Alphonse Daudet e, em seguida, comenta o aparecimento de uma “onça pintada lá para os lados do Irajá”…[41]
A publicação revela a existência de um público feminino não radical, que incorpora na revista colaboradores do sexo masculino que publicam aí textos literários e artigos de opinião. E revela também a existência de um grupo de intelectuais e artistas colaboradores que trazem dados de informação sobre a literatura feminina que se fazia nas várias regiões do Brasil da época, funcionando pois como um centro irradiador de informação a respeito da situação da literatura feminina da época.[42]
O tom da revista é o da literatura da belle-époque brasileira: leve, aparentemente descontraído, por vezes mais crítico e até polêmico, com certa ironia sutil. Os textos literários traduzem esse mesmo tom de época, situando-se entre um sentimentalismo de tradição romântica, um rigor formal de índole parnasiana e uma etereidade diáfana, típica da arte simbolista. No campo político das reivindicações, mostra a mulher entre os ‘novos’ rumos trazidos pelos movimentos emancipatórios liberais, com o abolicionismo e o republicanismo, mas atrelada ainda aos laços fortes de uma tradição burguesa calcada no exclusivismo dos seus papéis sociais domésticos.
Colaboram na revista tanto escritoras da segunda metade do século XIX, provenientes da era romântica, como Narcisa Amália, quanto escritoras que continuarão a escrever pelo início do século XX, até a segunda década, na fase do pré-modernismo brasileiro, como Júlia Lopes de Almeida.
Nesta segunda metade do século XIX, portanto, as mulheres ganham progressivamente espaço cultural, ainda que de modo um tanto acanhado e quase que sem repercussão nacional, sobretudo se se encontram em regiões afastadas da região sudeste (do Rio de Janeiro e de São Paulo, por exemplo). Além disso, a maioria das mulheres escritoras da época acumula à atividade da escrita, um trabalho didático, mais ou menos profissionalizado, e um trabalho jornalístico, na divulgação das propostas de teor feminista, mais ou menos politicamente engajado.
É o caso de, por exemplo, Maria Firmina dos Reis, professora de família humilde, que escandalizou cidade do interior do Estado quando fundou, em 1880, uma sala de aula mista, formada por meninos e meninas. Além de poesia e de romances que tratam da relação entre brancos e índios, publicou também um romance intitulado Úrsula, em 1859, em São Luís (do Maranhão). Se o enredo segue o padrão romântico, de amor, incesto e morte, o romance anuncia uma nova postura da mulher diante de problemas sociais, denunciando, de uma perspectiva abolicionista, os horrores do escravismo. Sob esse aspecto, a escritora avança ao defender certos valores, como por exemplo, a legitimidade da rebelião do filho bacharel em relação ao pai tirano; o seu projeto de se casar com uma jovem sem qualquer dote e a sua amizade por um escravo. E avança também quando atribui ao escravo uma forte personalidade.[43]
Persiste, no entanto, ao longo do século, a ideia preconceituosa de que à mulher não compete interferir nos assuntos de política. Narcisa Amália (de Oliveira Campos), por exemplo, que também foi professora, no Rio de Janeiro, e que publicou seus poemas em 1872, em volume intitulado Nebulosas, defendia ideias liberais democráticas, abolicionistas e republicanas, e por isso recebeu críticas severas. Guimarães Júnior, em carta a amigo, de 1873, referindo-se à escritora, afirma: “em suas composições políticas parece que deixa de lado a alma, para tomar a baioneta, cousa bem pouco feminina”. [44] Também C. Ferreira, no Correio do Brasil, do Rio de Janeiro, em 1872, já se pronunciara: “Mas perante a política, cantando as revoluções (…), endeusando as turbas, acho-a simplesmente fora de lugar (…) o melhor é deixar [o talento da ilustre dama] na sua esfera perfumada de sentimento e singeleza”.[45]
Mas as mulheres consideradas como fora de lugar já haviam, a essa altura, definido uma linha de ocupação do seu espaço próprio. Sob tal perspectiva, Délia, pseudônimo da gaúcha Maria Benedita Bormann, defende as propostas da ‘nova mulher’, naquele momento em voga na Europa e Estados Unidos: sexualmente independente, sem aceitar o casamento como única solução de vida e felicidade, com oportunidades de estudo e de profissionalização, com projetos de satisfação dos próprios desejos. A reação é imediata, por parte de médicos e sanitaristas, por exemplo. Mas a escritora, também abolicionista, tem participação incisiva. E a sua personagem também. No romance Lésbia, a mulher, depois de se separar de marido tirano, escreve sua própria história: emerge a mulher escritora no repertório dos enredos dos romances feitos por mulheres .[46]
A BELLE-ÉPOQUE
No final do século XIX e no início do século XX, em pleno período da belle-époque, tendências de antes (romantismo, realismo, parnasianismo, naturalismo) e tendências mais recentes (simbolismo) misturam-se, num período caracterizado, sobretudo, pela ocorrência simultânea de vários ‘ismos’, sob novas configurações: neo-romantismo, neo-parnasianismo, neo-realismo, neo-simbolismo, pré-modernismo, como num ensaio de concomitância de tendências a serem mais tarde praticadas no corpo mesmo de um só discurso, no período do pós-modernismo.[47]
Encontram-se, pois, nesse período, romances de tradição romântica, na linha folhetinesca da “profusão episódica”, como é o caso de A Divorciada, da cearense Francisca Clotilde, professora, poeta e periodista.[48] Neste, a personagem principal se dilacera em sucessivos sofrimentos, vítima de marido crápula, cujos defeitos justificam a opção da mulher pelo divórcio, com o objetivo de se casar com o homem que ela realmente ama.
No entanto, mais do que a filiação a uma linhagem de folhetins, o que interessa neste romance é justamente a construção da personagem que, premida pela infelicidade, chega a admitir a ideia do divórcio, viabilizando a ruptura de uma linha de relação conjugal formal até então considerada indissolúvel. Mas a liberação do laço matrimonial ainda não é tão simples assim. Como resolver o conflito entre a tradição dos costumes – a união oficial, e o desejo de nova união – a satisfação do desejo da mulher, casando-se com o homem digno do seu amor e que, por feliz coincidência, ela ama? A escritora encontra uma solução: o marido morre e ela, viúva, pode então casar-se com o homem amado.
Nessa linha de enredo traçado nos meandros das miudezas da vida familiar burguesa - na cidade grande ou no meio rural pitoresco - , desenvolve-se a prosa de Júlia Lopes de Almeida (1862-1934), em mais de 40 anos de atividade literária dedicados tanto à ficção quanto ao jornalismo.
Nas dezenas de livros publicados (entre romances, contos, crônicas, literatura infantil e pouco teatro) a escritora nos fala de um lugar cultural já conquistado pela mulher. O tema aparece já nos seus primeiros versos e no primeiro artigo publicado, em 1881, graças ao auxílio do pai, num jornal de Campinas, sobre uma artista de teatro. Mais acentuadamente, desenvolve-o a partir de 1886, quando publica seu primeiro livro, e ao longo de sua colaboração na imprensa, na revista A Semana, no Rio de Janeiro. Engaja-se, a certa altura, na luta pela emancipação da mulher integrando o grupo da Legião da Mulher Brasileira, liderado por Bertha Lutz. Sua atividade intelectual manifesta-se também no território da vida pessoal: casa-se com um escritor português, Filinto de Almeida; participa, com o marido, das reuniões para fundação da Academia Brasileira de Letras, embora o marido para lá entre e ela, não; escreve texto com o marido, usando o pseudônimo de “Filinto”; e terá filhos escritores: Afonso, Albano, poetas; e Margarida Lopes de Almeida, célebre declamadora.
Os romances, narrados com simplicidade e de modo agradável, seguem esquemas de enredo calcados no amor, por vezes trágico: é o caso de A viúva Simões, de 1897, em que duas mulheres, mãe e filha, amam o mesmo homem e enlouquecem. Noutros, aborda pontos que atestam sensibilidade diante da realidade brasileira: “histórias de nossa terra” e da vida rural na roça, por exemplo, ou a expulsão dos pobres das zonas mais centrais da cidade, no Rio de Janeiro.
A sua posição em relação aos papéis sociais da mulher é ambígua: de um lado, defende-a enquanto mãe e esposa[49]; de outro, investe no apoio a sua capacidade de trabalho e a sua força para gerir recursos que lhe garantam uma sobrevivência e autonomia financeira. Embora ciente da encruzilhada de opções da mulher – entre formas mais tradicionais e outras mais inovadoras de atuar profissionalmente - a escritora mais levanta que problematiza tais questões. Mostra, por exemplo, sensibilidade diante das diferenças e discriminações sociais, defendendo o abolicionismo. E realça o contraste cruel entre a riqueza da oligarquia endinheirada do café e a miséria dos escravos e colonos imigrantes, como no romance A família Medeiros, de 1892.
É o caso, também, do volume de crônicas intitulado Eles e Elas, publicado em 1910, significativo enquanto tradução de clima de época, na leveza de tom típico da segunda década do século. Neste, a narradora expõe a relação homem/mulher no território da ordem social brasileira, a partir de um recurso que usa com rara habilidade: o de monólogos e diálogos - recurso que permite a fala, direta, das mulheres e homens a respeito dos seus próprios problemas, na maioria, conjugais.
Partindo sempre de situações banalíssimas do cotidiano, surgem os detalhes de comportamento, em tom bem humorado, usados teatralmente, a garantirem a eficácia do texto como uma espécie de comédia de costumes. Neste contexto é que surge uma de suas personagens, a mulher consciente mas inoperante, que se reconhece como “boneca de carne e osso” e “mais nada”, mas sem força para se livrar dessa dependência. E mais: sem nem mesmo ter palavras para se fazer entender pelo marido…[50] Daí o tom duplo que estes contos/crônicas têm: aparentemente, ligeiros, quase levianos, mas, ao mesmo tempo, um tanto trágicos, já que, por detrás da fala conformada da mulher, que apenas se distrai, entre compras e chás, entre as curvas e ornamentos do cenário belle-époque, pesa uma certa amargura de situação mal resolvida.
O interesse dessa ‘visão de dois’ reside, ainda, no modo como o livro se desenvolve, como se fossem sketches que se sucedem, em diferentes situações, com alternância de pontos de vista: ora é a mulher, ora é o homem que fala. Mas paira a voz da autora-narradora, que usa o ridículo para se manifestar contra certos papéis sociais na relação homem/mulher. Um dos seus personagens, por exemplo, um homem, quando chega em casa e não acha a mulher... clama contra o feminismo. Mas, ao mesmo tempo, ele aparece em cena sendo ridicularizado pelo narrador, que bem poderia ser a mulher escritora Júlia, aí implícita.
A narradora parece seguir o preceito que anuncia logo no início do livro e como epígrafe: no livro o leitor encontrará mínimos detalhes insignificantes, mas a vida compõe-se de detalhes, como a hora se compõe de minutos. E parece praticar o “defeito” de um dos seus personagens: o de “esquadrinhar intenções e ideias através dos ditos mais simples ou das expressões mais banais...”.[51]
Através da simplicidade da narradora, reconhecida pela crítica, e do seu aparente “tom menor”, desenha-se, pois, um diagnóstico de comportamento que se pauta por alegrias leves e também por crueldades e perversões, já que, segundo um dos personagens (e poderia afirmar uma vez mais, segundo a autora implícita) “a educação da mulher só tem servido para a criação de mártires ou de hipócritas”.[52]
Num sistema de constante liberdade vigiada, o homem tenta manter a mulher em zona de segurança. Como articulador da ordem, tenta controlar possíveis desvios. E, por sua vez, resguarda o seu próprio espaço de intimidade e privacidade. Como a experiência clandestina, tanto do homem quanto da mulher, não pode ser ventilada, nas diversas situações da relação, vence a moral da dissimulação necessária. Explicitamente, só resta a máscara. E para a mulher, ela paira, sob o invólucro de chapéus com véus e plumas, que sinalizam uma aparente e boa consciência e o dever também aparente do bem-estar social.
Já na poesia do início do século, pelo menos duas tendências se sobressaem. Na linha da tradição herdada do final do século XIX e que persistem, em alguns casos, até os anos 20 do século seguinte, persiste a poesia que prima pelo acabamento nos moldes parnasianos, na trilha de um dos líderes desse movimento: o poeta Olavo Bilac. É o caso da escritora Francisca Júlia, por exemplo, que mantém repertório temático de gosto greco-latino e cultiva sonetos imitados dos poetas-homens que considerava mestres. Até nos próprios títulos nota-se o aplacamento de ânsias e emoções, que são praticamente domesticadas em favor da objetividade e dos rigorosos compromissos formais. Um dos seus livros de poemas intitula-se Mármore, publicado em 1895; e outro, já de 1920, intitula-se Esfinges. Neste, um dos poemas intitula-se “Musa impassível”...
Mário de Andrade, na célebre série de artigos intitulados “Mestres do Passado” e publicados em São Paulo, no Jornal do Commercio, em 1921, ao criticar os parnasianos Olavo Bilac, Raimundo Correa, Alberto de Oliveira, Vicente de Carvalho, inclui aí sua crítica a Francisca Júlia que, segundo o crítico, era didática e também “gelada”…e sacrificava a poesia à arte de “fazer belos versos”.[53]
Paralelamente, um outro tipo de poesia se instaura: a poesia erótica de Gilka Machado, que foi muito divulgada no seu tempo. Contrariamente a colegas suas que tentavam aplacar sensações e sentimentos e procuravam, ao fazer poesia, não se manifestar enquanto mulheres, Gilka Machado elege o desejo feminino como principal motivo de construção poética.
Aos 22 anos, inicia uma carreira poética marcada por dados de uma sensibilidade íntima da mulher, patente nos títulos de livros de poemas: Cristais partidos, de 1915; Estados de alma, de 1917; Mulher nua, de 1922; Meu glorioso pecado, de 1928. Nesses poemas, embora haja cuidados de teor parnasiano, a poeta adota soluções de teor simbolista, que funcionam como válvulas de escape de suas pulsões sensoriais. Os sentidos são cultivados até com certo requinte, regados a perfumes de sândalo, manacás, rosas, violetas e sempre-vivas. E a sensualidade ganha espaço, em poemas sobre temas até então proibidos: o “cio”, “a volúpia”, por exemplo.[54] Mas as sensações, de caráter liberador, são mobilizadas em poemas de ansiedade e de denúncia social do papel da mulher reprimida.
Além de reivindicar o direito de tomar decisões a respeito do próprio corpo e o direito de sua representação sob a forma poética, a poesia de Gilka Machado vai mais além: acusa os agentes opressores – os homens; e proclama a rejeição dessa forma reprimida de ser mulher.
A crítica, diante dessa escritora forte e decidida, adotou solução curiosa: defendeu a mulher- esposa e mãe. Aliás, Gilka Machado batizou a filha com o nome de Eros Volúsia, menina que haveria de se tornar bailarina famosa, com experimentações na linha da dança de motivos nacionais brasileiros. Assim como a crítica defendeu a mulher-esposa e mãe, separou-a da mulher-artista e poeta.[55] Portanto, incapaz de admitir as duas em uma, dividiu a Gilka Machado em duas. Uma delas é a “poetisa de imaginação ardente, transpirando paixão carnal nos seus nervos”; e a outra é “a mais virtuosa das mulheres e a mais abnegada das mães”.[56] A artista ainda não podia ser socialmente aceita como uma mulher que tem – e que manifesta – seus desejos.
A ECLOSÃO DO MODERNISMO E O ROMANCE SOCIAL
Curiosamente, na década de 20, enquanto as mulheres se notabilizavam pela produção plástica, as escritoras continuavam a escrever como os homens de antes – adotando posturas de um romantismo, um parnasianismo ou um simbolismo tardio. Ou escreviam como mulheres, misturando tendências, mas desbravando um novo repertório temático, marcado pelo sensualismo vigoroso, quando, então, eram vistas com reservas por esse mesmo público.
Embora a literatura feita por mulheres nos anos 20 não tenha ainda sido suficientemente examinada, pode-se, até o presente momento, afirmar, com base nos dados de que dispomos, que a literatura feminina dos anos 20 não teve o mesmo vigor e divulgação que as artes plásticas produzidas pelas mulheres neste mesmo período. Anita Malfatti, em 1917, com suas desenhos e óleos de cunho expressionista/cubista, inaugurava o modernismo, chocando a opinião pública de concepção mais conservadora, de que nos ficou documento primoroso do ponto de vista do registro da recepção: o depoimento de Monteiro Lobato que, surpreso e desorientado, preferia devolver para um outro o que dessa arte recebera, perguntando, desconcertado, se tal pintura seria uma paranóia (loucura que levava o artista a perseguir o espectador) ou seria uma mistificação (fingimento do artista que dava como sendo bom o que era ruim).[57]
Se sua arte não agradou a Lobato, nem mesmo a alguns modernistas, como Tarsila do Amaral, já estava feita a primeira revolução nas artes plásticas brasileiras. A abdicação do figurativismo acadêmico cedia terreno às cores fortes, pinceladas largas, em expressões conturbadas de sofrimentos e anomalias mentais, num tipo de pintura e desenho que valorizava a energia, tanto da musculatura da figura humana, quanto dos elementos que integravam paisagens.
E Tarsila do Amaral inaugurava, a partir de 1925, com seu parceiro e marido Oswald de Andrade, a arte pau-brasil, após célebre viagem passando Semana Santa em Minas Gerais e Carnaval no Rio de Janeiro. Mais tarde, por volta de 1928, o chamado “casal Tarsiwald” (Tarsila e Oswald de Andrade casaram-se em 1926), pratica a arte da antropofagia, inaugurada com quadro de Tarsila do Amaral, intitulado “Abaporu” (o homem que come carne humana), arte que teve manifesto, revista, muitos quadros, poemas, críticas e, nesse mesmo ano, Macunaíma, de Mário de Andrade.
Tanto na fase do pau-brasil quanto na fase da antropofagia, a arte de Tarsila do Amaral inventa um novo modo de olhar a realidade brasileira, pela volta às raízes da sua cultura, relendo toda uma história, retraduzindo-a mediante o desrecalque do que até então era considerado secundário e indigno de entrar no rol dos repertórios plásticos: as cores rosa e azul, por exemplo. Cria um Brasil geometrizado, com cores e formas variadas, de teor infantil e alegre, na fase pau-brasil. Cria um Brasil onírico, com cores fortes e intensas, remetendo a lendas, mistérios e mitos populares, na fase da antropofagia.
Mas na literatura não houve uma manifestação das mulheres correspondente à participação das mulheres nas artes plásticas nesse momento de eclosão modernista. Nenhuma mulher participou, como escritora, da Semana de 22. E as que na época escreviam, na sua maioria filiavam-se a movimentos que provinham do século XIX. No entanto, o modo de participação de tais escritoras na vida cultural brasileira dos anos 20 ainda está para ser devidamente avaliado.
No final da década de 20 surge uma escritora que funcionará como uma espécie de símbolo da ponte entre o grupo modernista dos anos 20, esteticamente inovador, e o grupo dos escritores engajados politicamente que atuarão após a Revolução de 30, a qual põe fim à chamada República Velha dominada pela oligarquia cafeeira.
Patrícia Galvão, chamada Pagu, nos seus dezoito anos, foi recebida pelo casal Tarsila do Amaral e Oswald de Andrade. Pagu seria a próxima mulher de Oswald de Andrade e iria escrever, em 1931, com pseudônimo de Mara Lobo, um romance intitulado Parque Industrial, publicado dois anos mais tarde: em 1933.[58]
Talvez a figura de Pagu, marcada pela militância política, tenha sido o seu traço mais importante, sobretudo com suas crônicas jornalísticas. Estas foram escritas logo depois do seu livro de poemas com arranjo gráfico inovador, o “Album de Pagu - Vida, Paixão e Morte”, de 1919. E ocuparam a coluna “A Mulher do Povo”, em jornal que publicou com Oswald de Andrade em 1931 e que depois de 8 números foi fechado pela polícia, após brigas entre pessoas da redação, em especial, Oswald de Andrade, e estudantes da Faculdade de Direito de São Paulo. Mais tarde a militante Pagu será presa na França. E, de volta ao Brasil, passará cinco anos na cadeia, dos seus 25 aos 30 anos: de 1935 a 1940.
Pagu, neste seu romance dos anos 30 - portanto, dentro do clima literário do momento, que foi o do romance social - toma por fio do enredo a questão trabalhista e a causa revolucionária comunista. Os personagens classificam-se segundo adesão ou não à causa. E, consequentemente, segundo a classe social. Dessa forma, um deles representa a adesão firme: é morto pela polícia em pleno movimento grevista. Outro, da classe alta, abandona seu lugar social em favor do proletariado, mas é expulso do partido, acusado de trotskysta. Dentro dessa perspectiva é que surgem as classes de mulheres. E, sob esse aspecto, a narradora é implacável.
As da classe alta são “éguas do mesmo pedigree”. São elas “meia dúzia de casadas, divorciadas, semi-divorciadas, virgens, semi-virgens, sifilíticas, semi-sifilíticas. Mas de grande utilidade política. Boemiazinhas conhecendo Paris. Histéricas. Feitas mesmo para endoidecer militares desacostumados”.[59] Dentre estas, há mocinhas da Escola Normal, à espera dos futuros maridos. E há madames preocupadas apenas em experimentar vestidos nas modistas de renome, atitude tão inócua quanto a fala dita politizada de uma delas, que pergunta: “ - Como não hei de ser ‘comunista’, se sou ‘moderna’?[60] A crítica ao feminismo burguês incipiente e retrógrado é a marca por excelência da caracterização das personagens femininas no romance.[61]
Defende, pois, um feminismo dependente de reformas mais globais e ligadas a mudanças sociais baseadas em princípios do materialismo histórico, bandeira que carregou também nas colunas críticas “A Mulher do Povo”. Aí faz acusação veemente às mulheres fúteis, que ela chama de “baixa da alta”.[62]
A atitude de consciência política manifesta-se, inclusive, no comportamento afetivo de certa personagem, que, no entanto, deve ceder diante dos compromissos partidários e abdicar da relação amorosa, pondo à prova, assim, suas convicções políticas.
A romancista prima por praticar recursos que favorecem o dinamismo da narrativa, como frases brevíssimas em linguagem telegráfica, imagens-flashes fotográficas e reunidas por colagem, segundo os moldes do modernismo dos anos 20. Mas o romance se sobressai mais pelo seu tom de firme inconformismo, buscando novos caminhos de ação prática e evitando o perigo da simples e passiva constatação da vitimização da mulher e do homem, agora, unidos ou enquanto operários, ou enquanto militantes, diante das circunstâncias nefastas de desigualdade social.
Este também é o eixo central do romance escrito por Rachel de Queiroz em 1937, intitulado Caminho de pedras. Depois de se dedicar ao romance nordestino, abordando o tema da famosa seca de 1915, no romance por isso intitulado O quinze, de 1930, a escritora conta a história de mulher que escolhe o seu companheiro: abandona o marido que ela não ama e se une a um outro homem, enfrentando os preconceitos que tal decisão provoca.
Fica, do romance, uma especial sensibilidade da narradora em relação à personagem feminina, que aparece representada na sua integridade de caráter, marcada pela firmeza e pertinácia nos caminhos políticos e afetivos. O equilíbrio manifesta-se no percurso da ação, entre o comportamento individual e coletivo. Os fatos da intimidade, que afloram e se expandem, revertem em ações práticas de satisfação, equilibrando-se com os da vida social, que se justificam na prática da militância política. De um lado, a paixão. De outro, a revolução. E os dois, unidos nesta dupla e harmoniosa causa. Concluindo: diria que houve, nesse romance, por parte da sua autora, Raquel, a construção de uma feliz coincidência: o homem amado ser também o colega político...até que um final infeliz os separe.
Nesta história, parece haver muito da história da própria autora, que, com seus 27 anos de idade, já havia passado por boa literatura com seu célebre O Quinze, e já havia passado pelo Partido Comunista, de 1931 a 1933; e é presa como trotskysta neste mesmo ano de 1937, justamente no ano da publicação deste romance, o Caminho de pedras.
Mas se existe uma contenção estrutural que assegura permanente equilíbrio entre forças individuais e sociais, tônica dos romances da época, existe também uma argúcia e respeito da autora na construção de estados da intimidade. O engajamento político não reduziu os limites do horizonte das personagens; antes parece haver contribuído para a melhor apreensão da natureza dos sentimentos, como o da paixão, representado na sua complexidade, e acarretando, por vezes, reações insuspeitadas. É o caso do momento em que a personagem feminina, fugindo da estreiteza da vida cotidiana infeliz e mesquinha, se expande pelo imaginário de histórias de mulheres “heróicas, livres e valentes”, embriagada por tais “possibilidades de libertação”.[63]. É o caso também de momentos de sutileza, em que se espera tudo e, aparentemente, nada acontece a não ser o fluxo irremediável do sentimento, simplesmente acontecendo, como se fosse um crime: “essa força invencível arrastando, fazendo agir, e essa lucidez melancólica e impotente constatando”.[64]
Foi justamente esta capacidade de perceber nuances de um comportamento feminino apaixonado que se vê abandonar às suas forças - o que considero, tal como aqui foi construído, uma qualidade - , foi justamente este fato que a crítica não reconheceu, ao elogiar seus valores de escritora. Olívio Montenegro, por exemplo, e justamente no “Prefácio” deste livro, atribui o valor da escritora ao fato de, em nenhum de seus romances, deixar “trair (manifestar) o sentimentalismo do seu sexo”, pois o que a distingue, afirma ele, é ser “uma personalidade viril”...[65]
Uma das boas razões que encontra para elogiar os livros - e talvez tivesse razões para isso - é que a escritora, além de ser homem na escrita, não “se detém tampouco em nenhuma fantasia.” Parece não haver ele lido o trecho em que existe a entrega da personagem feminina principal a um sonho de libertação. E não haveria como executar, na prática, o projeto de libertação do caminho de pedras - individual e coletivo - sem se deixar levar por estes caminhos de areia do imaginário, sacudindo, de vez em quando, os sapatos, na feliz companhia do amante camarada.
Os romances de Lúcia Miguel Pereira, ainda nos anos 30, não têm a tônica da mudança social, com traços de invenção modernista, mas radical nas colocações - como o de Pagu-Mara Lobo. Nem se trata de narrativa mais tradicional, sensível às pulsões da fantasia, como o de Rachel de Queiroz. Centra-se, de acordo com a linhagem dos romances do século passado, no fio das questões da sociedade burguesa, nas suas relações dentro do núcleo familiar. Mantém-se estritamente dentro destas células da família, abrindo apenas este circuito, tenuamente, em função de um ou outro acontecimento, desde que não comprometa as fronteiras internas deste território tão bem delimitado.
Nenhum dos seus três romances publicados nesta década foge a essa regra: Maria Luiza[66], de 1933, conta a história da mulher casada, que comete adultério, sente-se culpada e se refugia na religião. No romance Em Surdina[67], também de 1933, a personagem feminina principal não se casa porque não enfrenta a libertação da autoridade do pai nem reconhece, como válidos, os valores do casamento - como também não se contenta com os valores de solteira com os quais tem de se defrontar. No romance Amanhecer[68], de 1938, a personagem feminina nem se casa, como no primeiro romance; nem fica solteira, como no segundo. Junta-se a um amigo, mas também não é feliz. Assim sendo, nem o casamento, ainda que com adultério, nem o celibato, nem o concubinato, trazem a felicidade para a mulher. Apenas no último romance, de 1954, Cabra-Cega[69], a personagem experimenta um momento de felicidade, quando tem caso com um sujeito que mal conhece e constrói, assim, o seu “segredo”. (Clarice Lispector diria: a sua “felicidade clandestina”.) Que dura, aliás, muito pouco.
A estrutura romanesca traduz, nesse universo fechado e severo, os resultados de uma experiência de vida da autora que se desenvolveu em ambiente de formação católica acentuada, ligada ao grupo Dom Vital, no Rio de Janeiro, a que se somariam outras experiências: a de mulher casada com historiador de renome, Otávio Tarquínio de Sousa; a de mulher de grande atividade intelectual, também funcionária da Secretaria de Educação e Cultura e da Biblioteca de Educação, integrante da comissão Machado de Assis, encarregada da publicação das obras desse autor; a de biógrafa - de Machado de Assis e de Gonçalves Dias; a de tradutora, ensaísta, jornalista, e, sobretudo, crítica.
Os romances trazem as marcas dessa formação. A estrutura do primeiro deles, Maria Luiza, inclui digressões de ordem religiosa, filosófica, moral, voltadas, na maioria, para as fases da experiência da personagem que caminha do dever ao prazer, e do prazer, novamente ao dever, passando, ao final, por toda sorte de mortificações, até a confissão e absolvição. E se a linguagem é bem organizada, sem grandes lances imagísticos, restringe-se ao andamento episódico, com amarração um tanto frouxa entre alguns capítulos. E é no segundo, Em Surdina, que a narradora desenvolve uma verdadeira inquisição a respeito do que é a vida de mulher carioca, com papéis sociais bem demarcados.
Anuncia, pois, e critica, as várias opções de vida da mulher: se casada, escrava, dependente financeiramente e mentirosa; ou casada e mãe, verdadeira criadeira, decadente fisicamente; ou ainda casada e separada tragicamente; ou casada sem afinidade com o marido e infiel a ele. Deste emaranhado de funções, só a solteira se salva, conservando certa dignidade - ainda que sem muita alegria. Este retrato de família brasileira carrega um substrato moralista de crítica à avareza, ao hedonismo, ao adultério, aos prazeres exagerados, ao egoísmo, ao casamento sob variadas formas, ao comportamento estereotipado. E defende a liberdade ainda que relativa e a criação literária.
A autora denuncia, pois, a pressão das convenções de família, a submissão da mulher diante de tal peso e os vícios de uma família aparentemente bem comportada. Não há satisfação pessoal nessas relações convencionais. Simplesmente porque tais relações são convencionais, ou seja, a experiência aparece filtrada pela barreira das regras movidas a hipocrisia de uma sociedade que perdeu o sentido da experiência de sua própria autenticidade. Perdeu-se a própria identidade primitiva, única garantia possível de sobrevivência - diria - criativa e, assim, original.
A constatação dessa perda de identidade e a sua problematização, pela prática de uma linguagem literária, é o que a poesia de Cecília Meireles e a prosa de Clarice Lispector efetivamente executam, nas décadas subsequentes, a partir da década de 40.
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NOTAS
[34] Dulcília Schroeder Buitoni, Imprensa Feminina. São Paulo, Ática, 1986. Cf. Dulcília Schroeder Buitoni, Mulher de papel. A representação da mulher pela imprensa feminina brasileira. São Paulo, Loyola, 1981.
[35] Dulcília Schroeder Buitoni, ob. cit., p. 38.
[36] June E. Hahmer, A mulher brasileira e suas lutas sociais e políticas (1850-1937). São Paulo, Brasiliense, 1981, p. 35.
[37] O Sexo Feminino foi fundado pela professora Francisca Senhorinha da Motta Diniz, em Campanha da Princesa, em Minas Gerais. Cf. June E. Hahmer, ob. cit., p. 52.
[38] A Mensageira. Revista literária dedicada à mulher brazileira, Diretora: Presciliana Duarte de Almeida. Edição fac-similar. 2 v. Comentários: Zuleika Alambert. São Paulo, Imprensa Oficial do Estado, Secretaria de Estado da Cultura, 1987.
[39] J. Vieira de Almeida, “Chronica omnimoda”. A Mensageira, ano I, n. 3, 15 nov. 1897, v. 1, p. 33.
[40] Maria Amália Vaz de Carvalho, “A mulher do futuro”. A Mensageira, ano II, n. 31, 31 ago. 1899, v. II, p. 139.
[41] Maria Clara da Cunha Santos, “Carta do Rio”. A Mensageira, ano I, n. 6, 30 dez. 1897, v. I, p. 82-83.
Irajá é bairro da cidade do Rio de Janeiro.
[42] Interessante observar a menção à então contemporânea produção literária feminina, pela referência a escritoras brasileiras sob a forma de notícias, num relato ‘vivo’, em tom de crônica, da vida cotidiana literária brasileira. É o caso, por exemplo, do artigo de Pelayo Serrano (Nelson Senna), “Intelectualidade feminina brasileira”, publicado em: A Mensageira, ano I, n. 7, 15 jan. 1898, v. I, p. 103-106. As resenhas de livros escritos por mulheres e as referências a obras recebidas pela redação ajudam a compor um perfil de contexto de literatura feita por mulheres na época.
[43] Cf. Norma Telles, “Escritoras, escritas, escrituras”. Em: Mary Del Priore (Org.), História das mulheres no Brasil. 2. ed. São Paulo, Contexto/Editora UNESP, 1997, p. 414. Ver também: Norma Telles, Encantações: Escritoras e imaginação literária no Brasil do Século XIX. São Paulo, NAT Editora, 1998.
[44] Cf. Norma Telles, “Escritoras, escritas, escrituras”, em Mary Del Priore (Org.), ob. cit., p. 423.
[45] Cf. Norma Telles, ob. cit., p. 422.
[46] Cf. Norma Telles, ob. cit., p. 431-435.
[47] Para o estudo da cultura literária da belle-époque, sobretudo no que se refere à participação das mulheres nos salões literários, ver: Jeffrey D. Needell, Belle Époque Tropical: Sociedade e cultura de elite no Rio de Janeiro na virada do século. Trad. Celso Nogueira. São Paulo, Companhia das Letras, 1993.
[48] Francisca Clotilde, A Divorciada. Fortaleza, 1902. Dele há edição recente: Francisca Clotilde, A Divorciada. Romance. 2. ed. atualizada, acrescida de estudos críticos de Otacílio Colares, Angela Barros Leal, Nádia Battella Gotlib. Ceará, Terra Bárbara, 1996.
[49] É o caso do manual em que dá conselhos às noivas, publicado com o título de O livro das noivas em 1896.
[50] Julia Lopes de Almeida, “Cada vez que…”. Em: Eles e Elas. 2. ed. Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1922, p. 21-28.
[51] Julia Lopes de Almeida, ob. cit., p.185.
[52] Julia Lopes de Almeida, ob. cit., p. 169.
[53] Mário de Andrade, “Mestres do Passado”, em: Mário da Silva Brito, História do Modernismo brasileiro: Antecedentes da Semana de Arte Moderna. 4. ed. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1974, p. 259-266.
[54] Gilka Machado, “Nocturno VIII”. Em: Poesias (1915-1917). Rio de Janeiro, Jacintho Ribeiro dos Santos, 1918, p. 13. (Esta edição reúne Cristais Partidos e Estados de alma).
[55] Uma leitura da fortuna crítica de Gilka Machado desenvolvo em: Nádia Battella Gotlib, “Com dona Gilka Machado, Eros pede a palavra. (Poesia erótica feminina brasileira nos inícios do século XX).” Polímica: Revista de crítica e criação. São Paulo, n. 4, 1982, p. 23-47. Ver: Sylvia Paixão, A fala-a-menos: A repressão do desejo na poesia feminina. Rio de Janeiro, Númen, 1991.
[56] Humberto de Campos, Crítica. 2. ed. Rio de Janeiro/São Paulo/Porto Alegre, W. M. Jackson, 1945, p. 400.
[57] Monteiro Lobado, “A propósito da Exposição Malfatti”. O Estado de S. Paulo, 20 dez. 1917. O artigo, que ficaria conhecido através de um outro título, “Paranóia ou Mistificação?”, encontra-se transcrito em: Mário da Silva Brito, História do modernismo brasileiro. I – Antecedentes da Semana de arte Moderna. 4. ed. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1974, p. 52-56.
[58] Mara Lobo (Patrícia Galvão), Parque Industrial. São Paulo, 1933.
[59] Idem, ibidem, p. 86.
[60] Idem, ibidem, p. 38.
[61] Cf. Nádia Battella Gotlib, “A mulher artista, a mulher arteira: Pagu, ou uma certa poética política dos anos 30”. Belo Horizonte, Cadernos do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre a Mulher/ UFMG, n. 6, nov. 1988, p. 63-74.
[62] Pagu, “A Baixa da Alta”. “O Homem do Povo” n. 2, 28 mar. 1931. In Augusto de Campos (Org.), ob. cit., p.82.
[63] Rachel de Queiroz, Caminho de Pedras. 7. ed. Rio de Janeiro, José Olympio, 1979, p.45.
[64] Rachel de Queiroz, ob. cit., p. 69.
[65] Olívio Monenegro, Prefácio. In: Rachel de Queiroz, ob.cit., p.VIII.
[66] Lúcia Miguel Pereira, Maria Luiza. Rio de Janeiro, Schmidt, 1933.
[67] Lúcia Miguel Pereira, Em Surdina. 3. ed. Rio de Janeiro, José Olympio ed., 1979.
[68] Lúcia Miguel Pereira, Amanhecer. Rio de Janeiro, José Olympio ed., 1938.
[69] Lúcia Miguel Pereira, Cabra-Cega. Rio de Janeiro, José Olympio ed., 1954.
Fonte:
http://www.amulhernaliteratura.ufsc.br/artigo_Nadia_Gotlib.htm em 19/02/2012
Um dos veículos dessa emancipação, que possibilitou a divulgação dos textos das mulheres, tanto literários quanto mais propriamente políticos, foi a imprensa. E, dentro da imprensa, o periodismo feminino. O primeiro deles foi provavelmente, segundo Dulcília S. Buitoni, o jornal carioca O Espelho Diamantino, lançado em 1827.[34] Desde então, outros jornais feitos por mulheres foram fundados com a intenção de tratar de questões ligadas às mulheres e, por vezes, problematizando questões importantes de caráter político, incluindo aí o direito ao voto.
Mas a matéria era, em geral, variada. Um dos pioneiros, intitulado Correio das Modas (1839-1841), trazia “bastante literatura, crônica de bailes e teatros e figurinos pintados à mão, vindos da Europa”.[35] E o Jornal das Senhoras, editado no Rio de Janeiro, numa primeira fase, por Joana Paula Manso de Noronha, em 1852 anunciava como objetivo colaborar para a educação da mulher, livrando-a do peso de ser considerada, pelo homem, “como sua propriedade”.[36]
Na década de 70, em 1873, é fundado o primeiro jornal feminista, O Sexo Feminino[37], com o objetivo de defender a educação da mulher. Durante a campanha abolicionista, participaram de sociedades ora simplesmente angariando fundos, ora escrevendo panfletos, ora proferindo palestras, como é o caso da pernambucana Maria Amélia de Queiroz, que em 1887 faz conferência e mais tarde colaborará no jornal A Família, editado e publicado por Josefina Álvares de Azevedo, este, mais firme nas reivindicações, chegando a defender o divórcio. Ligada ao movimento de campanha pelo sufrágio feminino, Josefina Álvares de Azevedo escreveu peça de teatro intitulada O voto feminino, em 1893, que foi representada no Teatro Dramático do Rio de Janeiro.
E tem regularidade também, uma “revista literária” publicada na virada do século, em São Paulo, intitulada A Mensageira, dirigida por Presciliana Duarte de Almeida, de 1897 a 1900.[38] A revista, centrada em questões referentes à mulher, tem como eixo das considerações a necessidade da educação feminina, no sentido de se proclamar, nas palavras da diretora, “a igualdade na diferença”. Traduz posições mais conservadoras, na defesa de uma educação da mulher que não interfira no papel de mãe e esposa, não aceitando, conforme afirmação de um colaborador da revista, “nem a mulher que vota, nem a mulher que mata!”.[39] E insere também artigos mais avançados, que defendem o voto feminino e o trabalho como instrumento de independência econômica. Um deles chega a defender um feminismo político engajado a uma prática socialista, como é o caso do artigo da escritora portuguesa Maria Amália Vaz de Carvalho, escrito e publicado na revista por ocasião do encerramento do Congresso Internacional das Mulheres, em Londres, em agosto de 1899.[40]
A importância dessa revista deve-se, sobretudo, à preocupação com a formação de um grupo ativo de intelectuais e artistas preocupado com a construção de um contexto de cultura literária. E os textos aí publicados tendem, na maioria, para a feição artística, na linha de um sentimentalismo romântico, por vezes eloquente, em sonetos e demais poemas das escritoras; e na linha de estilo leve de crônicas alertas ao cotidiano da vida brasileira e, ao mesmo tempo, à literatura e ao feminismo internacional. Essa visão dupla causa, por vezes, contrastes curiosos. Em seção intitulada “Carta do Rio”, uma colaboradora lamenta, em tom solene, a morte do grande escritor francês Alphonse Daudet e, em seguida, comenta o aparecimento de uma “onça pintada lá para os lados do Irajá”…[41]
A publicação revela a existência de um público feminino não radical, que incorpora na revista colaboradores do sexo masculino que publicam aí textos literários e artigos de opinião. E revela também a existência de um grupo de intelectuais e artistas colaboradores que trazem dados de informação sobre a literatura feminina que se fazia nas várias regiões do Brasil da época, funcionando pois como um centro irradiador de informação a respeito da situação da literatura feminina da época.[42]
O tom da revista é o da literatura da belle-époque brasileira: leve, aparentemente descontraído, por vezes mais crítico e até polêmico, com certa ironia sutil. Os textos literários traduzem esse mesmo tom de época, situando-se entre um sentimentalismo de tradição romântica, um rigor formal de índole parnasiana e uma etereidade diáfana, típica da arte simbolista. No campo político das reivindicações, mostra a mulher entre os ‘novos’ rumos trazidos pelos movimentos emancipatórios liberais, com o abolicionismo e o republicanismo, mas atrelada ainda aos laços fortes de uma tradição burguesa calcada no exclusivismo dos seus papéis sociais domésticos.
Colaboram na revista tanto escritoras da segunda metade do século XIX, provenientes da era romântica, como Narcisa Amália, quanto escritoras que continuarão a escrever pelo início do século XX, até a segunda década, na fase do pré-modernismo brasileiro, como Júlia Lopes de Almeida.
Nesta segunda metade do século XIX, portanto, as mulheres ganham progressivamente espaço cultural, ainda que de modo um tanto acanhado e quase que sem repercussão nacional, sobretudo se se encontram em regiões afastadas da região sudeste (do Rio de Janeiro e de São Paulo, por exemplo). Além disso, a maioria das mulheres escritoras da época acumula à atividade da escrita, um trabalho didático, mais ou menos profissionalizado, e um trabalho jornalístico, na divulgação das propostas de teor feminista, mais ou menos politicamente engajado.
É o caso de, por exemplo, Maria Firmina dos Reis, professora de família humilde, que escandalizou cidade do interior do Estado quando fundou, em 1880, uma sala de aula mista, formada por meninos e meninas. Além de poesia e de romances que tratam da relação entre brancos e índios, publicou também um romance intitulado Úrsula, em 1859, em São Luís (do Maranhão). Se o enredo segue o padrão romântico, de amor, incesto e morte, o romance anuncia uma nova postura da mulher diante de problemas sociais, denunciando, de uma perspectiva abolicionista, os horrores do escravismo. Sob esse aspecto, a escritora avança ao defender certos valores, como por exemplo, a legitimidade da rebelião do filho bacharel em relação ao pai tirano; o seu projeto de se casar com uma jovem sem qualquer dote e a sua amizade por um escravo. E avança também quando atribui ao escravo uma forte personalidade.[43]
Persiste, no entanto, ao longo do século, a ideia preconceituosa de que à mulher não compete interferir nos assuntos de política. Narcisa Amália (de Oliveira Campos), por exemplo, que também foi professora, no Rio de Janeiro, e que publicou seus poemas em 1872, em volume intitulado Nebulosas, defendia ideias liberais democráticas, abolicionistas e republicanas, e por isso recebeu críticas severas. Guimarães Júnior, em carta a amigo, de 1873, referindo-se à escritora, afirma: “em suas composições políticas parece que deixa de lado a alma, para tomar a baioneta, cousa bem pouco feminina”. [44] Também C. Ferreira, no Correio do Brasil, do Rio de Janeiro, em 1872, já se pronunciara: “Mas perante a política, cantando as revoluções (…), endeusando as turbas, acho-a simplesmente fora de lugar (…) o melhor é deixar [o talento da ilustre dama] na sua esfera perfumada de sentimento e singeleza”.[45]
Mas as mulheres consideradas como fora de lugar já haviam, a essa altura, definido uma linha de ocupação do seu espaço próprio. Sob tal perspectiva, Délia, pseudônimo da gaúcha Maria Benedita Bormann, defende as propostas da ‘nova mulher’, naquele momento em voga na Europa e Estados Unidos: sexualmente independente, sem aceitar o casamento como única solução de vida e felicidade, com oportunidades de estudo e de profissionalização, com projetos de satisfação dos próprios desejos. A reação é imediata, por parte de médicos e sanitaristas, por exemplo. Mas a escritora, também abolicionista, tem participação incisiva. E a sua personagem também. No romance Lésbia, a mulher, depois de se separar de marido tirano, escreve sua própria história: emerge a mulher escritora no repertório dos enredos dos romances feitos por mulheres .[46]
A BELLE-ÉPOQUE
No final do século XIX e no início do século XX, em pleno período da belle-époque, tendências de antes (romantismo, realismo, parnasianismo, naturalismo) e tendências mais recentes (simbolismo) misturam-se, num período caracterizado, sobretudo, pela ocorrência simultânea de vários ‘ismos’, sob novas configurações: neo-romantismo, neo-parnasianismo, neo-realismo, neo-simbolismo, pré-modernismo, como num ensaio de concomitância de tendências a serem mais tarde praticadas no corpo mesmo de um só discurso, no período do pós-modernismo.[47]
Encontram-se, pois, nesse período, romances de tradição romântica, na linha folhetinesca da “profusão episódica”, como é o caso de A Divorciada, da cearense Francisca Clotilde, professora, poeta e periodista.[48] Neste, a personagem principal se dilacera em sucessivos sofrimentos, vítima de marido crápula, cujos defeitos justificam a opção da mulher pelo divórcio, com o objetivo de se casar com o homem que ela realmente ama.
No entanto, mais do que a filiação a uma linhagem de folhetins, o que interessa neste romance é justamente a construção da personagem que, premida pela infelicidade, chega a admitir a ideia do divórcio, viabilizando a ruptura de uma linha de relação conjugal formal até então considerada indissolúvel. Mas a liberação do laço matrimonial ainda não é tão simples assim. Como resolver o conflito entre a tradição dos costumes – a união oficial, e o desejo de nova união – a satisfação do desejo da mulher, casando-se com o homem digno do seu amor e que, por feliz coincidência, ela ama? A escritora encontra uma solução: o marido morre e ela, viúva, pode então casar-se com o homem amado.
Nessa linha de enredo traçado nos meandros das miudezas da vida familiar burguesa - na cidade grande ou no meio rural pitoresco - , desenvolve-se a prosa de Júlia Lopes de Almeida (1862-1934), em mais de 40 anos de atividade literária dedicados tanto à ficção quanto ao jornalismo.
Nas dezenas de livros publicados (entre romances, contos, crônicas, literatura infantil e pouco teatro) a escritora nos fala de um lugar cultural já conquistado pela mulher. O tema aparece já nos seus primeiros versos e no primeiro artigo publicado, em 1881, graças ao auxílio do pai, num jornal de Campinas, sobre uma artista de teatro. Mais acentuadamente, desenvolve-o a partir de 1886, quando publica seu primeiro livro, e ao longo de sua colaboração na imprensa, na revista A Semana, no Rio de Janeiro. Engaja-se, a certa altura, na luta pela emancipação da mulher integrando o grupo da Legião da Mulher Brasileira, liderado por Bertha Lutz. Sua atividade intelectual manifesta-se também no território da vida pessoal: casa-se com um escritor português, Filinto de Almeida; participa, com o marido, das reuniões para fundação da Academia Brasileira de Letras, embora o marido para lá entre e ela, não; escreve texto com o marido, usando o pseudônimo de “Filinto”; e terá filhos escritores: Afonso, Albano, poetas; e Margarida Lopes de Almeida, célebre declamadora.
Os romances, narrados com simplicidade e de modo agradável, seguem esquemas de enredo calcados no amor, por vezes trágico: é o caso de A viúva Simões, de 1897, em que duas mulheres, mãe e filha, amam o mesmo homem e enlouquecem. Noutros, aborda pontos que atestam sensibilidade diante da realidade brasileira: “histórias de nossa terra” e da vida rural na roça, por exemplo, ou a expulsão dos pobres das zonas mais centrais da cidade, no Rio de Janeiro.
A sua posição em relação aos papéis sociais da mulher é ambígua: de um lado, defende-a enquanto mãe e esposa[49]; de outro, investe no apoio a sua capacidade de trabalho e a sua força para gerir recursos que lhe garantam uma sobrevivência e autonomia financeira. Embora ciente da encruzilhada de opções da mulher – entre formas mais tradicionais e outras mais inovadoras de atuar profissionalmente - a escritora mais levanta que problematiza tais questões. Mostra, por exemplo, sensibilidade diante das diferenças e discriminações sociais, defendendo o abolicionismo. E realça o contraste cruel entre a riqueza da oligarquia endinheirada do café e a miséria dos escravos e colonos imigrantes, como no romance A família Medeiros, de 1892.
É o caso, também, do volume de crônicas intitulado Eles e Elas, publicado em 1910, significativo enquanto tradução de clima de época, na leveza de tom típico da segunda década do século. Neste, a narradora expõe a relação homem/mulher no território da ordem social brasileira, a partir de um recurso que usa com rara habilidade: o de monólogos e diálogos - recurso que permite a fala, direta, das mulheres e homens a respeito dos seus próprios problemas, na maioria, conjugais.
Partindo sempre de situações banalíssimas do cotidiano, surgem os detalhes de comportamento, em tom bem humorado, usados teatralmente, a garantirem a eficácia do texto como uma espécie de comédia de costumes. Neste contexto é que surge uma de suas personagens, a mulher consciente mas inoperante, que se reconhece como “boneca de carne e osso” e “mais nada”, mas sem força para se livrar dessa dependência. E mais: sem nem mesmo ter palavras para se fazer entender pelo marido…[50] Daí o tom duplo que estes contos/crônicas têm: aparentemente, ligeiros, quase levianos, mas, ao mesmo tempo, um tanto trágicos, já que, por detrás da fala conformada da mulher, que apenas se distrai, entre compras e chás, entre as curvas e ornamentos do cenário belle-époque, pesa uma certa amargura de situação mal resolvida.
O interesse dessa ‘visão de dois’ reside, ainda, no modo como o livro se desenvolve, como se fossem sketches que se sucedem, em diferentes situações, com alternância de pontos de vista: ora é a mulher, ora é o homem que fala. Mas paira a voz da autora-narradora, que usa o ridículo para se manifestar contra certos papéis sociais na relação homem/mulher. Um dos seus personagens, por exemplo, um homem, quando chega em casa e não acha a mulher... clama contra o feminismo. Mas, ao mesmo tempo, ele aparece em cena sendo ridicularizado pelo narrador, que bem poderia ser a mulher escritora Júlia, aí implícita.
A narradora parece seguir o preceito que anuncia logo no início do livro e como epígrafe: no livro o leitor encontrará mínimos detalhes insignificantes, mas a vida compõe-se de detalhes, como a hora se compõe de minutos. E parece praticar o “defeito” de um dos seus personagens: o de “esquadrinhar intenções e ideias através dos ditos mais simples ou das expressões mais banais...”.[51]
Através da simplicidade da narradora, reconhecida pela crítica, e do seu aparente “tom menor”, desenha-se, pois, um diagnóstico de comportamento que se pauta por alegrias leves e também por crueldades e perversões, já que, segundo um dos personagens (e poderia afirmar uma vez mais, segundo a autora implícita) “a educação da mulher só tem servido para a criação de mártires ou de hipócritas”.[52]
Num sistema de constante liberdade vigiada, o homem tenta manter a mulher em zona de segurança. Como articulador da ordem, tenta controlar possíveis desvios. E, por sua vez, resguarda o seu próprio espaço de intimidade e privacidade. Como a experiência clandestina, tanto do homem quanto da mulher, não pode ser ventilada, nas diversas situações da relação, vence a moral da dissimulação necessária. Explicitamente, só resta a máscara. E para a mulher, ela paira, sob o invólucro de chapéus com véus e plumas, que sinalizam uma aparente e boa consciência e o dever também aparente do bem-estar social.
Já na poesia do início do século, pelo menos duas tendências se sobressaem. Na linha da tradição herdada do final do século XIX e que persistem, em alguns casos, até os anos 20 do século seguinte, persiste a poesia que prima pelo acabamento nos moldes parnasianos, na trilha de um dos líderes desse movimento: o poeta Olavo Bilac. É o caso da escritora Francisca Júlia, por exemplo, que mantém repertório temático de gosto greco-latino e cultiva sonetos imitados dos poetas-homens que considerava mestres. Até nos próprios títulos nota-se o aplacamento de ânsias e emoções, que são praticamente domesticadas em favor da objetividade e dos rigorosos compromissos formais. Um dos seus livros de poemas intitula-se Mármore, publicado em 1895; e outro, já de 1920, intitula-se Esfinges. Neste, um dos poemas intitula-se “Musa impassível”...
Mário de Andrade, na célebre série de artigos intitulados “Mestres do Passado” e publicados em São Paulo, no Jornal do Commercio, em 1921, ao criticar os parnasianos Olavo Bilac, Raimundo Correa, Alberto de Oliveira, Vicente de Carvalho, inclui aí sua crítica a Francisca Júlia que, segundo o crítico, era didática e também “gelada”…e sacrificava a poesia à arte de “fazer belos versos”.[53]
Paralelamente, um outro tipo de poesia se instaura: a poesia erótica de Gilka Machado, que foi muito divulgada no seu tempo. Contrariamente a colegas suas que tentavam aplacar sensações e sentimentos e procuravam, ao fazer poesia, não se manifestar enquanto mulheres, Gilka Machado elege o desejo feminino como principal motivo de construção poética.
Aos 22 anos, inicia uma carreira poética marcada por dados de uma sensibilidade íntima da mulher, patente nos títulos de livros de poemas: Cristais partidos, de 1915; Estados de alma, de 1917; Mulher nua, de 1922; Meu glorioso pecado, de 1928. Nesses poemas, embora haja cuidados de teor parnasiano, a poeta adota soluções de teor simbolista, que funcionam como válvulas de escape de suas pulsões sensoriais. Os sentidos são cultivados até com certo requinte, regados a perfumes de sândalo, manacás, rosas, violetas e sempre-vivas. E a sensualidade ganha espaço, em poemas sobre temas até então proibidos: o “cio”, “a volúpia”, por exemplo.[54] Mas as sensações, de caráter liberador, são mobilizadas em poemas de ansiedade e de denúncia social do papel da mulher reprimida.
Além de reivindicar o direito de tomar decisões a respeito do próprio corpo e o direito de sua representação sob a forma poética, a poesia de Gilka Machado vai mais além: acusa os agentes opressores – os homens; e proclama a rejeição dessa forma reprimida de ser mulher.
A crítica, diante dessa escritora forte e decidida, adotou solução curiosa: defendeu a mulher- esposa e mãe. Aliás, Gilka Machado batizou a filha com o nome de Eros Volúsia, menina que haveria de se tornar bailarina famosa, com experimentações na linha da dança de motivos nacionais brasileiros. Assim como a crítica defendeu a mulher-esposa e mãe, separou-a da mulher-artista e poeta.[55] Portanto, incapaz de admitir as duas em uma, dividiu a Gilka Machado em duas. Uma delas é a “poetisa de imaginação ardente, transpirando paixão carnal nos seus nervos”; e a outra é “a mais virtuosa das mulheres e a mais abnegada das mães”.[56] A artista ainda não podia ser socialmente aceita como uma mulher que tem – e que manifesta – seus desejos.
A ECLOSÃO DO MODERNISMO E O ROMANCE SOCIAL
Curiosamente, na década de 20, enquanto as mulheres se notabilizavam pela produção plástica, as escritoras continuavam a escrever como os homens de antes – adotando posturas de um romantismo, um parnasianismo ou um simbolismo tardio. Ou escreviam como mulheres, misturando tendências, mas desbravando um novo repertório temático, marcado pelo sensualismo vigoroso, quando, então, eram vistas com reservas por esse mesmo público.
Embora a literatura feita por mulheres nos anos 20 não tenha ainda sido suficientemente examinada, pode-se, até o presente momento, afirmar, com base nos dados de que dispomos, que a literatura feminina dos anos 20 não teve o mesmo vigor e divulgação que as artes plásticas produzidas pelas mulheres neste mesmo período. Anita Malfatti, em 1917, com suas desenhos e óleos de cunho expressionista/cubista, inaugurava o modernismo, chocando a opinião pública de concepção mais conservadora, de que nos ficou documento primoroso do ponto de vista do registro da recepção: o depoimento de Monteiro Lobato que, surpreso e desorientado, preferia devolver para um outro o que dessa arte recebera, perguntando, desconcertado, se tal pintura seria uma paranóia (loucura que levava o artista a perseguir o espectador) ou seria uma mistificação (fingimento do artista que dava como sendo bom o que era ruim).[57]
Se sua arte não agradou a Lobato, nem mesmo a alguns modernistas, como Tarsila do Amaral, já estava feita a primeira revolução nas artes plásticas brasileiras. A abdicação do figurativismo acadêmico cedia terreno às cores fortes, pinceladas largas, em expressões conturbadas de sofrimentos e anomalias mentais, num tipo de pintura e desenho que valorizava a energia, tanto da musculatura da figura humana, quanto dos elementos que integravam paisagens.
E Tarsila do Amaral inaugurava, a partir de 1925, com seu parceiro e marido Oswald de Andrade, a arte pau-brasil, após célebre viagem passando Semana Santa em Minas Gerais e Carnaval no Rio de Janeiro. Mais tarde, por volta de 1928, o chamado “casal Tarsiwald” (Tarsila e Oswald de Andrade casaram-se em 1926), pratica a arte da antropofagia, inaugurada com quadro de Tarsila do Amaral, intitulado “Abaporu” (o homem que come carne humana), arte que teve manifesto, revista, muitos quadros, poemas, críticas e, nesse mesmo ano, Macunaíma, de Mário de Andrade.
Tanto na fase do pau-brasil quanto na fase da antropofagia, a arte de Tarsila do Amaral inventa um novo modo de olhar a realidade brasileira, pela volta às raízes da sua cultura, relendo toda uma história, retraduzindo-a mediante o desrecalque do que até então era considerado secundário e indigno de entrar no rol dos repertórios plásticos: as cores rosa e azul, por exemplo. Cria um Brasil geometrizado, com cores e formas variadas, de teor infantil e alegre, na fase pau-brasil. Cria um Brasil onírico, com cores fortes e intensas, remetendo a lendas, mistérios e mitos populares, na fase da antropofagia.
Mas na literatura não houve uma manifestação das mulheres correspondente à participação das mulheres nas artes plásticas nesse momento de eclosão modernista. Nenhuma mulher participou, como escritora, da Semana de 22. E as que na época escreviam, na sua maioria filiavam-se a movimentos que provinham do século XIX. No entanto, o modo de participação de tais escritoras na vida cultural brasileira dos anos 20 ainda está para ser devidamente avaliado.
No final da década de 20 surge uma escritora que funcionará como uma espécie de símbolo da ponte entre o grupo modernista dos anos 20, esteticamente inovador, e o grupo dos escritores engajados politicamente que atuarão após a Revolução de 30, a qual põe fim à chamada República Velha dominada pela oligarquia cafeeira.
Patrícia Galvão, chamada Pagu, nos seus dezoito anos, foi recebida pelo casal Tarsila do Amaral e Oswald de Andrade. Pagu seria a próxima mulher de Oswald de Andrade e iria escrever, em 1931, com pseudônimo de Mara Lobo, um romance intitulado Parque Industrial, publicado dois anos mais tarde: em 1933.[58]
Talvez a figura de Pagu, marcada pela militância política, tenha sido o seu traço mais importante, sobretudo com suas crônicas jornalísticas. Estas foram escritas logo depois do seu livro de poemas com arranjo gráfico inovador, o “Album de Pagu - Vida, Paixão e Morte”, de 1919. E ocuparam a coluna “A Mulher do Povo”, em jornal que publicou com Oswald de Andrade em 1931 e que depois de 8 números foi fechado pela polícia, após brigas entre pessoas da redação, em especial, Oswald de Andrade, e estudantes da Faculdade de Direito de São Paulo. Mais tarde a militante Pagu será presa na França. E, de volta ao Brasil, passará cinco anos na cadeia, dos seus 25 aos 30 anos: de 1935 a 1940.
Pagu, neste seu romance dos anos 30 - portanto, dentro do clima literário do momento, que foi o do romance social - toma por fio do enredo a questão trabalhista e a causa revolucionária comunista. Os personagens classificam-se segundo adesão ou não à causa. E, consequentemente, segundo a classe social. Dessa forma, um deles representa a adesão firme: é morto pela polícia em pleno movimento grevista. Outro, da classe alta, abandona seu lugar social em favor do proletariado, mas é expulso do partido, acusado de trotskysta. Dentro dessa perspectiva é que surgem as classes de mulheres. E, sob esse aspecto, a narradora é implacável.
As da classe alta são “éguas do mesmo pedigree”. São elas “meia dúzia de casadas, divorciadas, semi-divorciadas, virgens, semi-virgens, sifilíticas, semi-sifilíticas. Mas de grande utilidade política. Boemiazinhas conhecendo Paris. Histéricas. Feitas mesmo para endoidecer militares desacostumados”.[59] Dentre estas, há mocinhas da Escola Normal, à espera dos futuros maridos. E há madames preocupadas apenas em experimentar vestidos nas modistas de renome, atitude tão inócua quanto a fala dita politizada de uma delas, que pergunta: “ - Como não hei de ser ‘comunista’, se sou ‘moderna’?[60] A crítica ao feminismo burguês incipiente e retrógrado é a marca por excelência da caracterização das personagens femininas no romance.[61]
Defende, pois, um feminismo dependente de reformas mais globais e ligadas a mudanças sociais baseadas em princípios do materialismo histórico, bandeira que carregou também nas colunas críticas “A Mulher do Povo”. Aí faz acusação veemente às mulheres fúteis, que ela chama de “baixa da alta”.[62]
A atitude de consciência política manifesta-se, inclusive, no comportamento afetivo de certa personagem, que, no entanto, deve ceder diante dos compromissos partidários e abdicar da relação amorosa, pondo à prova, assim, suas convicções políticas.
A romancista prima por praticar recursos que favorecem o dinamismo da narrativa, como frases brevíssimas em linguagem telegráfica, imagens-flashes fotográficas e reunidas por colagem, segundo os moldes do modernismo dos anos 20. Mas o romance se sobressai mais pelo seu tom de firme inconformismo, buscando novos caminhos de ação prática e evitando o perigo da simples e passiva constatação da vitimização da mulher e do homem, agora, unidos ou enquanto operários, ou enquanto militantes, diante das circunstâncias nefastas de desigualdade social.
Este também é o eixo central do romance escrito por Rachel de Queiroz em 1937, intitulado Caminho de pedras. Depois de se dedicar ao romance nordestino, abordando o tema da famosa seca de 1915, no romance por isso intitulado O quinze, de 1930, a escritora conta a história de mulher que escolhe o seu companheiro: abandona o marido que ela não ama e se une a um outro homem, enfrentando os preconceitos que tal decisão provoca.
Fica, do romance, uma especial sensibilidade da narradora em relação à personagem feminina, que aparece representada na sua integridade de caráter, marcada pela firmeza e pertinácia nos caminhos políticos e afetivos. O equilíbrio manifesta-se no percurso da ação, entre o comportamento individual e coletivo. Os fatos da intimidade, que afloram e se expandem, revertem em ações práticas de satisfação, equilibrando-se com os da vida social, que se justificam na prática da militância política. De um lado, a paixão. De outro, a revolução. E os dois, unidos nesta dupla e harmoniosa causa. Concluindo: diria que houve, nesse romance, por parte da sua autora, Raquel, a construção de uma feliz coincidência: o homem amado ser também o colega político...até que um final infeliz os separe.
Nesta história, parece haver muito da história da própria autora, que, com seus 27 anos de idade, já havia passado por boa literatura com seu célebre O Quinze, e já havia passado pelo Partido Comunista, de 1931 a 1933; e é presa como trotskysta neste mesmo ano de 1937, justamente no ano da publicação deste romance, o Caminho de pedras.
Mas se existe uma contenção estrutural que assegura permanente equilíbrio entre forças individuais e sociais, tônica dos romances da época, existe também uma argúcia e respeito da autora na construção de estados da intimidade. O engajamento político não reduziu os limites do horizonte das personagens; antes parece haver contribuído para a melhor apreensão da natureza dos sentimentos, como o da paixão, representado na sua complexidade, e acarretando, por vezes, reações insuspeitadas. É o caso do momento em que a personagem feminina, fugindo da estreiteza da vida cotidiana infeliz e mesquinha, se expande pelo imaginário de histórias de mulheres “heróicas, livres e valentes”, embriagada por tais “possibilidades de libertação”.[63]. É o caso também de momentos de sutileza, em que se espera tudo e, aparentemente, nada acontece a não ser o fluxo irremediável do sentimento, simplesmente acontecendo, como se fosse um crime: “essa força invencível arrastando, fazendo agir, e essa lucidez melancólica e impotente constatando”.[64]
Foi justamente esta capacidade de perceber nuances de um comportamento feminino apaixonado que se vê abandonar às suas forças - o que considero, tal como aqui foi construído, uma qualidade - , foi justamente este fato que a crítica não reconheceu, ao elogiar seus valores de escritora. Olívio Montenegro, por exemplo, e justamente no “Prefácio” deste livro, atribui o valor da escritora ao fato de, em nenhum de seus romances, deixar “trair (manifestar) o sentimentalismo do seu sexo”, pois o que a distingue, afirma ele, é ser “uma personalidade viril”...[65]
Uma das boas razões que encontra para elogiar os livros - e talvez tivesse razões para isso - é que a escritora, além de ser homem na escrita, não “se detém tampouco em nenhuma fantasia.” Parece não haver ele lido o trecho em que existe a entrega da personagem feminina principal a um sonho de libertação. E não haveria como executar, na prática, o projeto de libertação do caminho de pedras - individual e coletivo - sem se deixar levar por estes caminhos de areia do imaginário, sacudindo, de vez em quando, os sapatos, na feliz companhia do amante camarada.
Os romances de Lúcia Miguel Pereira, ainda nos anos 30, não têm a tônica da mudança social, com traços de invenção modernista, mas radical nas colocações - como o de Pagu-Mara Lobo. Nem se trata de narrativa mais tradicional, sensível às pulsões da fantasia, como o de Rachel de Queiroz. Centra-se, de acordo com a linhagem dos romances do século passado, no fio das questões da sociedade burguesa, nas suas relações dentro do núcleo familiar. Mantém-se estritamente dentro destas células da família, abrindo apenas este circuito, tenuamente, em função de um ou outro acontecimento, desde que não comprometa as fronteiras internas deste território tão bem delimitado.
Nenhum dos seus três romances publicados nesta década foge a essa regra: Maria Luiza[66], de 1933, conta a história da mulher casada, que comete adultério, sente-se culpada e se refugia na religião. No romance Em Surdina[67], também de 1933, a personagem feminina principal não se casa porque não enfrenta a libertação da autoridade do pai nem reconhece, como válidos, os valores do casamento - como também não se contenta com os valores de solteira com os quais tem de se defrontar. No romance Amanhecer[68], de 1938, a personagem feminina nem se casa, como no primeiro romance; nem fica solteira, como no segundo. Junta-se a um amigo, mas também não é feliz. Assim sendo, nem o casamento, ainda que com adultério, nem o celibato, nem o concubinato, trazem a felicidade para a mulher. Apenas no último romance, de 1954, Cabra-Cega[69], a personagem experimenta um momento de felicidade, quando tem caso com um sujeito que mal conhece e constrói, assim, o seu “segredo”. (Clarice Lispector diria: a sua “felicidade clandestina”.) Que dura, aliás, muito pouco.
A estrutura romanesca traduz, nesse universo fechado e severo, os resultados de uma experiência de vida da autora que se desenvolveu em ambiente de formação católica acentuada, ligada ao grupo Dom Vital, no Rio de Janeiro, a que se somariam outras experiências: a de mulher casada com historiador de renome, Otávio Tarquínio de Sousa; a de mulher de grande atividade intelectual, também funcionária da Secretaria de Educação e Cultura e da Biblioteca de Educação, integrante da comissão Machado de Assis, encarregada da publicação das obras desse autor; a de biógrafa - de Machado de Assis e de Gonçalves Dias; a de tradutora, ensaísta, jornalista, e, sobretudo, crítica.
Os romances trazem as marcas dessa formação. A estrutura do primeiro deles, Maria Luiza, inclui digressões de ordem religiosa, filosófica, moral, voltadas, na maioria, para as fases da experiência da personagem que caminha do dever ao prazer, e do prazer, novamente ao dever, passando, ao final, por toda sorte de mortificações, até a confissão e absolvição. E se a linguagem é bem organizada, sem grandes lances imagísticos, restringe-se ao andamento episódico, com amarração um tanto frouxa entre alguns capítulos. E é no segundo, Em Surdina, que a narradora desenvolve uma verdadeira inquisição a respeito do que é a vida de mulher carioca, com papéis sociais bem demarcados.
Anuncia, pois, e critica, as várias opções de vida da mulher: se casada, escrava, dependente financeiramente e mentirosa; ou casada e mãe, verdadeira criadeira, decadente fisicamente; ou ainda casada e separada tragicamente; ou casada sem afinidade com o marido e infiel a ele. Deste emaranhado de funções, só a solteira se salva, conservando certa dignidade - ainda que sem muita alegria. Este retrato de família brasileira carrega um substrato moralista de crítica à avareza, ao hedonismo, ao adultério, aos prazeres exagerados, ao egoísmo, ao casamento sob variadas formas, ao comportamento estereotipado. E defende a liberdade ainda que relativa e a criação literária.
A autora denuncia, pois, a pressão das convenções de família, a submissão da mulher diante de tal peso e os vícios de uma família aparentemente bem comportada. Não há satisfação pessoal nessas relações convencionais. Simplesmente porque tais relações são convencionais, ou seja, a experiência aparece filtrada pela barreira das regras movidas a hipocrisia de uma sociedade que perdeu o sentido da experiência de sua própria autenticidade. Perdeu-se a própria identidade primitiva, única garantia possível de sobrevivência - diria - criativa e, assim, original.
A constatação dessa perda de identidade e a sua problematização, pela prática de uma linguagem literária, é o que a poesia de Cecília Meireles e a prosa de Clarice Lispector efetivamente executam, nas décadas subsequentes, a partir da década de 40.
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NOTAS
[34] Dulcília Schroeder Buitoni, Imprensa Feminina. São Paulo, Ática, 1986. Cf. Dulcília Schroeder Buitoni, Mulher de papel. A representação da mulher pela imprensa feminina brasileira. São Paulo, Loyola, 1981.
[35] Dulcília Schroeder Buitoni, ob. cit., p. 38.
[36] June E. Hahmer, A mulher brasileira e suas lutas sociais e políticas (1850-1937). São Paulo, Brasiliense, 1981, p. 35.
[37] O Sexo Feminino foi fundado pela professora Francisca Senhorinha da Motta Diniz, em Campanha da Princesa, em Minas Gerais. Cf. June E. Hahmer, ob. cit., p. 52.
[38] A Mensageira. Revista literária dedicada à mulher brazileira, Diretora: Presciliana Duarte de Almeida. Edição fac-similar. 2 v. Comentários: Zuleika Alambert. São Paulo, Imprensa Oficial do Estado, Secretaria de Estado da Cultura, 1987.
[39] J. Vieira de Almeida, “Chronica omnimoda”. A Mensageira, ano I, n. 3, 15 nov. 1897, v. 1, p. 33.
[40] Maria Amália Vaz de Carvalho, “A mulher do futuro”. A Mensageira, ano II, n. 31, 31 ago. 1899, v. II, p. 139.
[41] Maria Clara da Cunha Santos, “Carta do Rio”. A Mensageira, ano I, n. 6, 30 dez. 1897, v. I, p. 82-83.
Irajá é bairro da cidade do Rio de Janeiro.
[42] Interessante observar a menção à então contemporânea produção literária feminina, pela referência a escritoras brasileiras sob a forma de notícias, num relato ‘vivo’, em tom de crônica, da vida cotidiana literária brasileira. É o caso, por exemplo, do artigo de Pelayo Serrano (Nelson Senna), “Intelectualidade feminina brasileira”, publicado em: A Mensageira, ano I, n. 7, 15 jan. 1898, v. I, p. 103-106. As resenhas de livros escritos por mulheres e as referências a obras recebidas pela redação ajudam a compor um perfil de contexto de literatura feita por mulheres na época.
[43] Cf. Norma Telles, “Escritoras, escritas, escrituras”. Em: Mary Del Priore (Org.), História das mulheres no Brasil. 2. ed. São Paulo, Contexto/Editora UNESP, 1997, p. 414. Ver também: Norma Telles, Encantações: Escritoras e imaginação literária no Brasil do Século XIX. São Paulo, NAT Editora, 1998.
[44] Cf. Norma Telles, “Escritoras, escritas, escrituras”, em Mary Del Priore (Org.), ob. cit., p. 423.
[45] Cf. Norma Telles, ob. cit., p. 422.
[46] Cf. Norma Telles, ob. cit., p. 431-435.
[47] Para o estudo da cultura literária da belle-époque, sobretudo no que se refere à participação das mulheres nos salões literários, ver: Jeffrey D. Needell, Belle Époque Tropical: Sociedade e cultura de elite no Rio de Janeiro na virada do século. Trad. Celso Nogueira. São Paulo, Companhia das Letras, 1993.
[48] Francisca Clotilde, A Divorciada. Fortaleza, 1902. Dele há edição recente: Francisca Clotilde, A Divorciada. Romance. 2. ed. atualizada, acrescida de estudos críticos de Otacílio Colares, Angela Barros Leal, Nádia Battella Gotlib. Ceará, Terra Bárbara, 1996.
[49] É o caso do manual em que dá conselhos às noivas, publicado com o título de O livro das noivas em 1896.
[50] Julia Lopes de Almeida, “Cada vez que…”. Em: Eles e Elas. 2. ed. Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1922, p. 21-28.
[51] Julia Lopes de Almeida, ob. cit., p.185.
[52] Julia Lopes de Almeida, ob. cit., p. 169.
[53] Mário de Andrade, “Mestres do Passado”, em: Mário da Silva Brito, História do Modernismo brasileiro: Antecedentes da Semana de Arte Moderna. 4. ed. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1974, p. 259-266.
[54] Gilka Machado, “Nocturno VIII”. Em: Poesias (1915-1917). Rio de Janeiro, Jacintho Ribeiro dos Santos, 1918, p. 13. (Esta edição reúne Cristais Partidos e Estados de alma).
[55] Uma leitura da fortuna crítica de Gilka Machado desenvolvo em: Nádia Battella Gotlib, “Com dona Gilka Machado, Eros pede a palavra. (Poesia erótica feminina brasileira nos inícios do século XX).” Polímica: Revista de crítica e criação. São Paulo, n. 4, 1982, p. 23-47. Ver: Sylvia Paixão, A fala-a-menos: A repressão do desejo na poesia feminina. Rio de Janeiro, Númen, 1991.
[56] Humberto de Campos, Crítica. 2. ed. Rio de Janeiro/São Paulo/Porto Alegre, W. M. Jackson, 1945, p. 400.
[57] Monteiro Lobado, “A propósito da Exposição Malfatti”. O Estado de S. Paulo, 20 dez. 1917. O artigo, que ficaria conhecido através de um outro título, “Paranóia ou Mistificação?”, encontra-se transcrito em: Mário da Silva Brito, História do modernismo brasileiro. I – Antecedentes da Semana de arte Moderna. 4. ed. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1974, p. 52-56.
[58] Mara Lobo (Patrícia Galvão), Parque Industrial. São Paulo, 1933.
[59] Idem, ibidem, p. 86.
[60] Idem, ibidem, p. 38.
[61] Cf. Nádia Battella Gotlib, “A mulher artista, a mulher arteira: Pagu, ou uma certa poética política dos anos 30”. Belo Horizonte, Cadernos do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre a Mulher/ UFMG, n. 6, nov. 1988, p. 63-74.
[62] Pagu, “A Baixa da Alta”. “O Homem do Povo” n. 2, 28 mar. 1931. In Augusto de Campos (Org.), ob. cit., p.82.
[63] Rachel de Queiroz, Caminho de Pedras. 7. ed. Rio de Janeiro, José Olympio, 1979, p.45.
[64] Rachel de Queiroz, ob. cit., p. 69.
[65] Olívio Monenegro, Prefácio. In: Rachel de Queiroz, ob.cit., p.VIII.
[66] Lúcia Miguel Pereira, Maria Luiza. Rio de Janeiro, Schmidt, 1933.
[67] Lúcia Miguel Pereira, Em Surdina. 3. ed. Rio de Janeiro, José Olympio ed., 1979.
[68] Lúcia Miguel Pereira, Amanhecer. Rio de Janeiro, José Olympio ed., 1938.
[69] Lúcia Miguel Pereira, Cabra-Cega. Rio de Janeiro, José Olympio ed., 1954.
Fonte:
http://www.amulhernaliteratura.ufsc.br/artigo_Nadia_Gotlib.htm em 19/02/2012
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