quarta-feira, 5 de junho de 2024

Vereda da Poesia = 25 =


Trova Humorística de Miguel Couto/RJ

EDMAR JAPIASSÚ MAIA

Ela engana o marinheiro
que sempre lhe afoga a mágoa.
Também engana o padeiro...
e vai vivendo a pão e água!
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Poema de Porto União/SC

BENJÚNIOR
(Benevides Garcia Barbosa Júnior)

TARDE AZUL

Olhando por esta janela antiga,
Nem mais sei 
O que eu sou.
Já não ouço mais
Meus blues,
Nem tenho tempo
Para ver o sol nascer.
Só restam lamentos
Nas minhas tardes azuis,
Uma tristeza profunda, 
Vontade de não mais ser...
Como um espantalho
levado pelo vento
vou seguindo a vida,
esquecido dos deuses,
ermo de amores,
carente de pensamentos,
distante de tudo,
crivado de dores...
Sou agora aquele que nunca foi.
Aquele que nunca ousou,
alguém que nunca amou...
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Aldravia de Juiz de Fora/MG

CECY BARBOSA CAMPOS

na
orquestra
da
vida
sons
dissonantes
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Soneto de Vitória/ES

BERNARDO TRANCOSO
(Bernardo Sá Barreto Pimentel Trancoso)

LOUCURAS DE AMOR (I)

Torcer por um amor insano, incerto,
É ser um sonhador, ter peito aberto
Pra suportar a dor, infernizante,
Que a insegurança traz a cada instante.

É ver a alma perdida num deserto,
Sedenta e entristecida; é estar tão perto
De ser feliz na vida e tão distante
Desta felicidade, desta amante.

Passa o tempo e o desejo permanece,
Mas o corpo envelhece. Penso, então,
Que a alegria se encontra em outro plano.

Sabendo disso, um ser novo aparece
E, pretendendo alçar seu coração,
Arrisco um novo amor incerto, insano. 
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Trova Premiada  em Montes Claros/MG , 2010

OLGA AGULHON 
(Maringá/PR)

Mesmo das lutas vencidas,
restou-me tanto cansaço,
que nas armas recolhidas
só vi renúncia e fracasso.
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Poema de Évora/Portugal

POETA SILVAIS
(Manuel Joaquim Frades Carvalhal)

DEDICADO AO MENSAGEIRO
  
Mensageiro a Poesia
Está-te muito agradecida
E o Poeta dia a dia
Dá-te rimas que são vida
 
De tristeza já esquecida
Por carinho e simpatia
A pobreza enriquecida
Dá-te amor por cortesia
 
Do pai da mãe e da tia
Do primo do neto e avô
Quero que siga a “Dinastia”
Desta herança que te dou
 
O amar a quem te amou
E amanhã quem te amará
Daquilo que não estimou
Nunca nada te dará
 
Qualquer dia venho cá
E não é pra te agradar
Quem critica ajudará
Tua vida a melhorar
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Quadra Popular de Faro/Portugal

ISIDORO CAVACO
(Antonio Isidoro Viegas Cavaco)

Dando aos sonhos mais diversos,
forma, pureza e encanto,
apenas em quatro versos
os poetas dizem tanto!...
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Soneto de Lisboa/ Portugal

JOAQUIM EVÓNIO
(Joaquim Evónio Rodrigues de Vasconcelos)
(Funchal/Ilha da Madeira/Portugal, 1938 – 2012, Lisboa)

NOTURNO EM SETEMBRO

Hoje a lua nasce muito mais tarde
Nesta tristeza que trago comigo
Rompe farrapos do céu sem estrelas
Prata que não tange os sinos da aldeia

Dormem os poetas da minha rua
E os cães ladram sem saber porquê
Enquanto mais além é o silêncio
Que governa o tempo e o espaço

E eu observador intemporal
Prisioneiro de minhas verdades
Deitei-me logo a adivinhar

Se mais tarde quando o sol nascer
A lua lhe vai dizer em segredo
A solidão que passou esta noite
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Trova de Natal/RN

JOSÉ LUCAS DE BARROS
(Serra Negra do Norte/RN, 1934 – 2015, Natal/RN)

Zarpei ao romper do dia,
no meu barco, a velejar,
para "pescar" a poesia
que a Lua escondeu no mar.
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Poema de Alegrete/RS

MARIO QUINTANA
(Mário de Miranda Quintana)
(Alegrete/RS, 1906 – 1994, Porto Alegre/RS)

DATA E DEDICATÓRIA

Teus poemas, não os dates nunca... Um poema
Não pertence ao Tempo... Em seu país estranho
Se existe hora, é sempre a hora extrema
Quando o Anjo Azrael nos estende ao sedento
Lábio o cálice inextinguível...
O que tu fazes hoje é o mesmo poema
Que fizeste em menino,
É o mesmo que,
Depois que tu te fores,
Alguém lerá baixinho e comovidamente,
A vivê-lo de novo...
A esse alguém,
Que talvez nem tenha ainda nascido,
Dedica, pois, teus poemas,
Não os date, porém:
As almas não entendem disso…
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Triverso de São Paulo/SP

CARLOS SEABRA

que flor é esta,
que perfuma assim
toda a floresta?
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Sextilha de Fortaleza/CE

NEMÉSIO PRATA
(Nemésio Prata Crisóstomo)

POEMA DO ESQUECIMENTO... 

Quando o tempo passa, a gente 
passa a se esquecer "tudo", 
uns dizem: "tá é demente!"; 
discordo..., porém, contudo, 
entretanto, todavia..., 
já esqueci o que escrevia: 
mas comigo é diferente!
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Trova de Mangualde/Portugal

ELISABETE DO AMARAL
(Elisabete do Amaral Albuquerque Freire Aguiar)

A vida é feita de nadas,
enganando muita gente
que julgando águas paradas
vai ao sabor da corrente.
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Glosa de Porto Alegre/RS

GISLAINE CANALES
Herval/RS, 1938 – 2018, Porto Alegre/RS

AO AMOR

Mote:
Em ternura plena e extrema,
nossos sonhos se cruzaram!
E a noite se fez poema...
E os versos também se amaram!...
FLÁVIO ROBERTO STEFANI
(Porto Alegre/RS)

Glosa:
Em ternura plena e extrema,
nos entregamos os dois,
numa carícia suprema,
sem antes e sem depois.

Nesse momento tão lindo,
nossos sonhos se cruzaram,
vivemos o amor, sorrindo,
por todos que já se amaram.

De amor, então, fiz meu lema.
Em beijos eu li teus versos,
e a noite se fez poema...
Unindo os sonhos dispersos.

Poesia, carinho e amor
abraçados, se irmanaram...
Nos amamos com fervor,
e os versos também se amaram!...
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Epigrama de Portugal

BOCAGE
(Manuel Maria de Barbosa l'Hedois du Bocage)
(Setúbal, 1765 – 1805, Lisboa)

A UMA VELHA MUITO FEIA

Não veio a morte buscar-te
Com o seu chamante robusto,
Porque receia ao encarar-te
Morrer a Morte de susto.
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Soneto de Curitiba/PR

EMÍLIO DE MENESES
(Emílio Nunes Correia de Meneses
(Curitiba/PR, 1866 – 1918, Rio de Janeiro/RJ)

NUMA LÁPIDE

Qual se teu filho fora, eu me acabrunho
E, de mágoa, a falar-te mal me atrevo.
Aceita, entanto, o humilde testemunho
De quanto foste meu sagrado enlevo.

Fosse-me dado, de cinzel em punho,
Talhar o liso mármore em relevo,
E eu daria da pedra o eterno cunho
Às estrofes que em pranto e sangue escrevo:

Sei que não cabem nestes sons dispersos
O pranto em que esta angústia não se acalma,
E o sangue em que tais sons morrem imersos.

Não cabe dentro de votiva palma
Nem na estreiteza de mesquinhos versos
O infinito de dor que tenho na alma.
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Trova Premiada  em Nova Friburgo/RJ, 1995

RITA MOURÃO
(Rita Marciano Mourão)
(Ribeirão Preto/SP)

Quando esta lua indiscreta, 
me traz lembranças sem fim 
eu choro o velho poeta 
que morreu dentro de mim. 
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Spina de São Paulo/SP

ARTUR JOSÉ CARREIRA

AMORES

Amores são diferentes
Amores são diversos:
Inversos são rancores.

Seus versos rimam meio assim,
Nos perplexos olhares, não sós,
Se prestam pelos seus favores.
Amores são divinos, sem alarde
Apenas pétalas ao chão, flores.
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Trova de São Paulo/SP

ELIAS PESCADOR
(Aparecido Elias Pescador)

Tropeiro da mocidade
galopando a solidão,
foste conquista, e és saudade
que deixa rastro em meu chão...
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Poema de Maia/Portugal

JOSÉ CARLOS MOUTINHO

MURMÚRIOS DISTANTES

Sufocam-me os dias do meu estar,
Aperta-se-me o peito angustiado pelo nada;
Solta-se-me um grito estrangulado
Que voa, pelos vales da esperança,
E é a tua voz, que no eco, me responde,
Palavras de amor e arrependimento;
Mas estão longe, muito longe,
E chegam-me num murmúrio…
Perdem-se na distância dos erros cometidos
E momentos sofridos,
Que nem os místicos luares sararam;
Tampouco as estrelas que nos iluminavam,
Te mostraram a luz do nosso caminho;
Desperdiçaste a felicidade que se te oferecia,
De um coração aberto e uma alma transbordante,
De alegria constante!
Recusaste o sol que aqueceria a tua frieza,
Renegaste até os perfumes que a natureza,
Te colocou na floreira da tua vida,
Na forma de belas rosas vermelhas,
Oferecidas em instantes de êxtase

Agora o Universo gira num desatino,
Descontrolado pela razão da inconsciência,
Que me leva a uma irónica saudade,
Que não faz mais sentido,
Metamorfoseada por outras razões.
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Poetrix do Rio de Janeiro/RJ

LÍLIAN MAIAL

violoncelo plangente
(o arco arranca sustenidos):
sinfonia pelo chão
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Poema de Curitiba/PR

DANIEL MAURÍCIO

Com a porta
entreaberta
Deixei que entrasses
No meu céu.
E no céu da tua boca
A lua procurei.
Mas pra
Surpresa minha,
Quando estava
De olhos fechados,
Estrelas
Tu me fizeste ver.
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Trova de Sorocaba/SP

TAPAJÓS DE ARAÚJO
(Raimundo de Araujo Chagas)
(Sorocaba/SP, 1894 – 1969)

Nesse amor aberto em palmas,
espero encontrar depois
um céu para duas almas
e um sonho para nós dois.
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Triolé* do Rio de Janeiro/RJ

MACHADO DE ASSIS
(Joaquim Maria Machado de Assis)
(1839 – 1908)

FLOR DA MOCIDADE

Eu conheço a mais bela flor:
És tu, rosa da mocidade,
Nascida, aberta para o amor.
Eu conheço a mais bela flor:
Tem do céu a serena cor
E o perfume da virgindade.
Eu conheço a mais bela flor:
És tu, rosa da mocidade.
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* Triolé, pequeno poema de forma fixa. Originário da França (triolet), ao mesmo tempo em que o rondel e o rondó, com os quais é confundido; o triolé tem sua própria estrutura poética. Deschamps, poeta francês medieval, julgava-o igual ao rondel, e assim há quem o considere até hoje. Caiu em desuso (completo) no século XVI e foi reerguido, na metade do século XIX, pelos poetas parnasianos. Dentre os nossos que experimentaram o triolé, destaca-se um nome ilustre, Machado de Assis.

A estrutura do triolé consta do seguinte: uma oitava, ou mais, com duas rimas apenas, de modo que o primeiro verso repete no quarto, e os dois primeiros fecham a estrofe, como o sétimo e oitavo, assim: ABaAabAB (as maiúsculas representam os versos que são repetidos como estribilho).

Consta de estrofes de oito versos, em duas rimas, com a seguinte disposição: abaaabab. O 1.º, o 4.º e o 7.º versos são iguais.

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