Contexto Histórico
Trovadorismo foi a primeira escola literária portuguesa. Esse movimento literário compreende o período que vai, aproximadamente do século XII ao século XIV.
As atividades literárias em Portugal durante a transição da Alta para Baixa Idade Média, nascem quase que simultaneamente com a consolidação da nação portuguesa como reino independente, num período marcado principalmente pelo Feudalismo (plano político-econômico) e pelo Teocentrismo (poder espiritual do clero).
O Feudalismo foi um sistema político-econômico medieval descentralizado na qual o poder estava diretamente relacionado à posse da terra. A economia era fundamentalmente agrária (subsistência), sem comércio e, portanto, sem intercâmbio cultural. Praticamente todas as mercadorias negociadas nessa época vinham da terra e por isso, a quantidade de terra possuída era a chave da fortuna e do poder, que estava nas mãos da nobreza, representada por senhores feudais ou suseranos. Estes faziam a concessão de pequenos lotes de terra (feudo) a um servo ou vassalo, para que este a cultivasse em troca de proteção. Além da obrigação de cultivar esses lotes, os vassalos tinham que pagar inúmeras taxas impostas pelos donos das terras. Os valores dessas taxas eram tão altos que o dinheiro que restava era apenas o suficiente para a sua subsistência e para o plantio de uma nova safra. Essa relação de dependência entre suserano e vassalo nessa sociedade fortemente hierarquizada era chamada de vassalagem.
Havia ainda uma outra classe social política e economicamente poderosa, detentora de grandes extensões de terras: o clero. A Igreja era a maior Instituição feudal da época, determinando o modo de pensar e viver de uma sociedade fortemente marcada pela idéia de Deus como centro do universo. A própria produção artística vai estar impregnada por esse espírito teocêntrico, numa época em que religião e profano se confundem. Tanto a pintura quanto a escultura procuravam retratar cenas da vida de santos ou episódios bíblicos. A vida do povo lusitano estava voltada para os valores espirituais e a salvação da alma. Emoção e fé regiam as ações, determinando uma visão mais subjetiva do mundo, caracterizando certo irracionalismo. Surge a Escolástica, filosofia medieval que tentava justificar a fé pela lógica. A Igreja pregava a renúncia aos bens materiais e aos prazeres terrenos como condição para salvação eterna. Nessa época, eram freqüentes procissões, romarias, construção de templos religiosos, missas etc.
A influência do clero evidenciou-se principalmente durante as Cruzadas, expedições e batalhas de cunho religioso, entre cristãos e muçulmanos, que tinham como principal objetivo a libertação dos lugares santos, situados na Palestina e venerados pelos cristãos, além da expulsão dos árabes da Península Ibérica.
Tais aspectos sócio-culturais são importantes para entendermos certas características das manifestações literárias desse período. O feudalismo terá reflexos até mesmo na linguagem da poesia lírica. Ademais, as cortes dos reis e dos grandes senhores feudais são os centros de produção cultural e literária. O teocentrismo, por sua vez, vai se refletir tanto nas novelas de cavalaria como na poesia de temática religiosa, nas hagiografias e obras de devoção. Devido às cruzadas, a maioria dos textos líricos demonstrava a saudade da amada pelo amado que foi para lutar em favor da igreja, contra os mouros. Os outros textos líricos demonstravam o amor platônico, amor impossível de se consumar (o que nesse caso é com o casamento), pois o sujeito-lírico desses poemas é um amante de uma escala mais baixa na hierarquia feudal, sempre era um camponês morrendo de amores por uma nobre.
O Trovadorismo vai entrar em declínio durante a crise do feudalismo e as consequentes modificações na maneira de governar de Portugal, incluindo o contexto de conflitos com a Espanha que culminam com a decadência do mecenantismo real.
Muitos marcam o fim do Trovadorismo em 1385, com o fim da dinastia de Borgonha, quando D. João I é aclamado rei de Portugal e inicia-se a dinastia de Avis. Para outros, seu fim é marcado com a nomeação de Fernão Lopes para cronista-mor da torre do Tombo em 1418.
POESIA TROVADORESCA.
Na literatura, o Trovadorismo foi a primeira escola literária portuguesa. Esse movimento compreende o período que vai, aproximadamente, do século XII ao século XIV.
Convencionou-se que o marco inicial do Trovadorismo data da primeira cantiga feita por Paio Soares Taveirós, provavelmente em 1189 (ou 1198?), intitulada Cantiga de Guarvaia, mais conhecida como Cantiga da Ribeirinha. Essa cantiga, originalmente em galego-português, um romanço (língua de origem latina falada na costa da Península Ibérica) - visto que ainda não havia uma unidade lingüística entre Portugal e a Galiza - foi endereçada a Maria Pais Ribeiro (a ribeirinha), uma mulher muito cobiçada na corte portuguesa e que foi amante de D. Sanho I, o segundo rei de Portugal.
Cantiga da Ribeirinha
(Paio Soares de Taveirós)
No mundo non me sei parelha,
mentre me for' como me vai.
ca ja moiro por vos - e ai!
mia senhor branca e vermelha,
queredes que vos retraia
quando vos eu vi en saia!
Mao dia me levantei,
que vos enton non vi fea!
E, mia senhor, des aquel dia, ai!
me foi a mi mui mal,
e vós, filha de don Paai
Moniz, e Ben vos semelha
d'haver eu por vos guarvaia,
pois eu, mia senhor, d'alfaia
nunca de vos houve nen hei
valia d'ua correa.
A poesia trovadoresca era cantada na língua galego-portuguesa e acompanhada por instrumentos musicais, caracterizando-se pela tradição oral e coletiva.
Numa época em que a população era quase toda analfabeta, a cultura era transmitida essencialmente por via oral, o que estabelecia um dualismo lingüístico entre a cultura monástica (escrita e erudita, inicialmente só expressa em latim) e a cultura laica ou profana, transmitida oralmente, em língua galego-portuguesa, onde se inclui a poesia trovadoresca.
A poesia trovadoresca tem origem em duas tradições poéticas fundamentais: a tradição popular da região e a influência direta do "troubadours" provençais. Compreende um conjunto de cerca de 1600 cantigas de caráter profano, com temática pagã, erótica e satírica, a que poderemos acrescentar cerca de 400 poemas de conteúdo religioso. Há um predomínio da literatura oral, associada à música e à dança. A poesia não era escrita para ser lida por um leitor solitário. Os poemas eram cantados e acompanhados de instrumentos musicais, recebendo o nome de cantigas (ou ainda de canções ou cantos), e eram próprias para apresentações coletivas. Seu público não era, portanto, constituído de leitores, mas de ouvintes. Infelizmente, as partituras das músicas se perderam quase todas, sobrando nos dias de hoje apenas cinco, escritas por Martim Codax.
- Trovador: Aquele que escreve as cantigas (geralmente nobres). Cabe lembrar que são sempre homens.
- Menestréis: músicos-poetas sedentários; viviam nas casas de fidalgos.
- Segréis: trovadores profissionais, fidalgos desqualificados que iam de corte em corte, acompanhados por um jogral.
- Jograis: do provençal: joglar = brincar. Cantores e tangedores ambulantes, geralmente de origem plebéia (espécie de bobos da corte, que apenas executavam ou interpretavam as composições alheias).
- Soldadeira ou Jogralesca; moça que dançava e tocava castanholas ou pandeiro.
Esses artistas eram a "alma" das trovas, porque eles as interpretavam e tinham que transmitir todo sentimento passado por seus personagens, suas decepções, saudades, ilusões, sofrimentos e a dor de um amor impossível.
Devido ao fato de serem poesias cantadas, são de tradição popular e são menos sofisticadas em relação à poesia escrita, apresentando simplicidade temática e formal. Quanto à forma, as cantigas dividem-se em:
Cantigas de Maestria: sete versos em cada estrofe, sem refrão, mais difíceis e sofisticadas.
Cantigas de Refrão: quatro versos em cada estrofe, com repetição de um deles (refrão) no final, mais populares.
Cantigas Paralelísticas: há versos encadeados que repetem a mesma estrutura, com pequenas variações, em pares de estrofes consecutivos, com rimas.
Quanto a temática, as cantigas podem ser divididas em dois grandes grupos:
cantigas líricas (cantigas de amor e cantigas de amigo) e
cantigas satíricas (cantigas de escárnio e cantigas de maldizer).
Do ponto de vista literário, as cantigas líricas, nas quais o amor é temática constante, apresentam maior potencial pois formam a base da poesia lírica portuguesa e até brasileira. Já as cantigas satíricas, geralmente, tratavam de personalidades da época, numa linguagem popular e muitas vezes obscena.
Só tardiamente (a partir do final do século XIII) as cantigas foram compiladas em manuscritos chamados cancioneiros. Três desses livros, contendo aproximadamente 1 680 cantigas, chegaram até nós:
Cancioneiro da Ajuda (310 Cantigas).
Cancioneiro da Vaticana (1205 Cantigas).
Cancioneiro da Biblioteca Nacional de Lisboa (1647 Cantigas), também conhecido por
Cancioneiro Colocci-Brancutti.
Continua…
Fonte:
Garganta da Serpente
Trovadorismo foi a primeira escola literária portuguesa. Esse movimento literário compreende o período que vai, aproximadamente do século XII ao século XIV.
As atividades literárias em Portugal durante a transição da Alta para Baixa Idade Média, nascem quase que simultaneamente com a consolidação da nação portuguesa como reino independente, num período marcado principalmente pelo Feudalismo (plano político-econômico) e pelo Teocentrismo (poder espiritual do clero).
O Feudalismo foi um sistema político-econômico medieval descentralizado na qual o poder estava diretamente relacionado à posse da terra. A economia era fundamentalmente agrária (subsistência), sem comércio e, portanto, sem intercâmbio cultural. Praticamente todas as mercadorias negociadas nessa época vinham da terra e por isso, a quantidade de terra possuída era a chave da fortuna e do poder, que estava nas mãos da nobreza, representada por senhores feudais ou suseranos. Estes faziam a concessão de pequenos lotes de terra (feudo) a um servo ou vassalo, para que este a cultivasse em troca de proteção. Além da obrigação de cultivar esses lotes, os vassalos tinham que pagar inúmeras taxas impostas pelos donos das terras. Os valores dessas taxas eram tão altos que o dinheiro que restava era apenas o suficiente para a sua subsistência e para o plantio de uma nova safra. Essa relação de dependência entre suserano e vassalo nessa sociedade fortemente hierarquizada era chamada de vassalagem.
Havia ainda uma outra classe social política e economicamente poderosa, detentora de grandes extensões de terras: o clero. A Igreja era a maior Instituição feudal da época, determinando o modo de pensar e viver de uma sociedade fortemente marcada pela idéia de Deus como centro do universo. A própria produção artística vai estar impregnada por esse espírito teocêntrico, numa época em que religião e profano se confundem. Tanto a pintura quanto a escultura procuravam retratar cenas da vida de santos ou episódios bíblicos. A vida do povo lusitano estava voltada para os valores espirituais e a salvação da alma. Emoção e fé regiam as ações, determinando uma visão mais subjetiva do mundo, caracterizando certo irracionalismo. Surge a Escolástica, filosofia medieval que tentava justificar a fé pela lógica. A Igreja pregava a renúncia aos bens materiais e aos prazeres terrenos como condição para salvação eterna. Nessa época, eram freqüentes procissões, romarias, construção de templos religiosos, missas etc.
A influência do clero evidenciou-se principalmente durante as Cruzadas, expedições e batalhas de cunho religioso, entre cristãos e muçulmanos, que tinham como principal objetivo a libertação dos lugares santos, situados na Palestina e venerados pelos cristãos, além da expulsão dos árabes da Península Ibérica.
Tais aspectos sócio-culturais são importantes para entendermos certas características das manifestações literárias desse período. O feudalismo terá reflexos até mesmo na linguagem da poesia lírica. Ademais, as cortes dos reis e dos grandes senhores feudais são os centros de produção cultural e literária. O teocentrismo, por sua vez, vai se refletir tanto nas novelas de cavalaria como na poesia de temática religiosa, nas hagiografias e obras de devoção. Devido às cruzadas, a maioria dos textos líricos demonstrava a saudade da amada pelo amado que foi para lutar em favor da igreja, contra os mouros. Os outros textos líricos demonstravam o amor platônico, amor impossível de se consumar (o que nesse caso é com o casamento), pois o sujeito-lírico desses poemas é um amante de uma escala mais baixa na hierarquia feudal, sempre era um camponês morrendo de amores por uma nobre.
O Trovadorismo vai entrar em declínio durante a crise do feudalismo e as consequentes modificações na maneira de governar de Portugal, incluindo o contexto de conflitos com a Espanha que culminam com a decadência do mecenantismo real.
Muitos marcam o fim do Trovadorismo em 1385, com o fim da dinastia de Borgonha, quando D. João I é aclamado rei de Portugal e inicia-se a dinastia de Avis. Para outros, seu fim é marcado com a nomeação de Fernão Lopes para cronista-mor da torre do Tombo em 1418.
POESIA TROVADORESCA.
Na literatura, o Trovadorismo foi a primeira escola literária portuguesa. Esse movimento compreende o período que vai, aproximadamente, do século XII ao século XIV.
Convencionou-se que o marco inicial do Trovadorismo data da primeira cantiga feita por Paio Soares Taveirós, provavelmente em 1189 (ou 1198?), intitulada Cantiga de Guarvaia, mais conhecida como Cantiga da Ribeirinha. Essa cantiga, originalmente em galego-português, um romanço (língua de origem latina falada na costa da Península Ibérica) - visto que ainda não havia uma unidade lingüística entre Portugal e a Galiza - foi endereçada a Maria Pais Ribeiro (a ribeirinha), uma mulher muito cobiçada na corte portuguesa e que foi amante de D. Sanho I, o segundo rei de Portugal.
Cantiga da Ribeirinha
(Paio Soares de Taveirós)
No mundo non me sei parelha,
mentre me for' como me vai.
ca ja moiro por vos - e ai!
mia senhor branca e vermelha,
queredes que vos retraia
quando vos eu vi en saia!
Mao dia me levantei,
que vos enton non vi fea!
E, mia senhor, des aquel dia, ai!
me foi a mi mui mal,
e vós, filha de don Paai
Moniz, e Ben vos semelha
d'haver eu por vos guarvaia,
pois eu, mia senhor, d'alfaia
nunca de vos houve nen hei
valia d'ua correa.
A poesia trovadoresca era cantada na língua galego-portuguesa e acompanhada por instrumentos musicais, caracterizando-se pela tradição oral e coletiva.
Numa época em que a população era quase toda analfabeta, a cultura era transmitida essencialmente por via oral, o que estabelecia um dualismo lingüístico entre a cultura monástica (escrita e erudita, inicialmente só expressa em latim) e a cultura laica ou profana, transmitida oralmente, em língua galego-portuguesa, onde se inclui a poesia trovadoresca.
A poesia trovadoresca tem origem em duas tradições poéticas fundamentais: a tradição popular da região e a influência direta do "troubadours" provençais. Compreende um conjunto de cerca de 1600 cantigas de caráter profano, com temática pagã, erótica e satírica, a que poderemos acrescentar cerca de 400 poemas de conteúdo religioso. Há um predomínio da literatura oral, associada à música e à dança. A poesia não era escrita para ser lida por um leitor solitário. Os poemas eram cantados e acompanhados de instrumentos musicais, recebendo o nome de cantigas (ou ainda de canções ou cantos), e eram próprias para apresentações coletivas. Seu público não era, portanto, constituído de leitores, mas de ouvintes. Infelizmente, as partituras das músicas se perderam quase todas, sobrando nos dias de hoje apenas cinco, escritas por Martim Codax.
- Trovador: Aquele que escreve as cantigas (geralmente nobres). Cabe lembrar que são sempre homens.
- Menestréis: músicos-poetas sedentários; viviam nas casas de fidalgos.
- Segréis: trovadores profissionais, fidalgos desqualificados que iam de corte em corte, acompanhados por um jogral.
- Jograis: do provençal: joglar = brincar. Cantores e tangedores ambulantes, geralmente de origem plebéia (espécie de bobos da corte, que apenas executavam ou interpretavam as composições alheias).
- Soldadeira ou Jogralesca; moça que dançava e tocava castanholas ou pandeiro.
Esses artistas eram a "alma" das trovas, porque eles as interpretavam e tinham que transmitir todo sentimento passado por seus personagens, suas decepções, saudades, ilusões, sofrimentos e a dor de um amor impossível.
Devido ao fato de serem poesias cantadas, são de tradição popular e são menos sofisticadas em relação à poesia escrita, apresentando simplicidade temática e formal. Quanto à forma, as cantigas dividem-se em:
Cantigas de Maestria: sete versos em cada estrofe, sem refrão, mais difíceis e sofisticadas.
Cantigas de Refrão: quatro versos em cada estrofe, com repetição de um deles (refrão) no final, mais populares.
Cantigas Paralelísticas: há versos encadeados que repetem a mesma estrutura, com pequenas variações, em pares de estrofes consecutivos, com rimas.
Quanto a temática, as cantigas podem ser divididas em dois grandes grupos:
cantigas líricas (cantigas de amor e cantigas de amigo) e
cantigas satíricas (cantigas de escárnio e cantigas de maldizer).
Do ponto de vista literário, as cantigas líricas, nas quais o amor é temática constante, apresentam maior potencial pois formam a base da poesia lírica portuguesa e até brasileira. Já as cantigas satíricas, geralmente, tratavam de personalidades da época, numa linguagem popular e muitas vezes obscena.
Só tardiamente (a partir do final do século XIII) as cantigas foram compiladas em manuscritos chamados cancioneiros. Três desses livros, contendo aproximadamente 1 680 cantigas, chegaram até nós:
Cancioneiro da Ajuda (310 Cantigas).
Cancioneiro da Vaticana (1205 Cantigas).
Cancioneiro da Biblioteca Nacional de Lisboa (1647 Cantigas), também conhecido por
Cancioneiro Colocci-Brancutti.
Continua…
Fonte:
Garganta da Serpente
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