sábado, 7 de maio de 2011

Nilto Maciel (O Escritor em Xeque)


Entrevista publicada, em 30/4/2011, na revista cultural eletrônica Diversos Afins (www.diversos-afins.blogspot.com), dirigida por Fabrício Brandão e Leila Andrade)

Para definir um bom prosador, são necessárias palavras que se proponham a extrapolar os limites meramente expositivos de qualquer cenário narrativo. Contentemo-nos, pois, numa análise que sabe ir além de um simples artifício de contar histórias. Numa acepção densamente significativa, um contista, mais do que apresentar situações e tramas, deve ser capaz de dissecar o âmago dos seres apresentados. A partir daí, ganha corpo vigoroso uma noção de interioridade que sabe ser ingrediente fundamental de uma proposta textual rica e consistente. E tal perspectiva encontra abrigo no modo de pensar e agir do escritor cearense Nilto Maciel. Detentor de uma trajetória que contempla incursões predominantes na seara da prosa, o autor, natural de Baturité, revela-se um alguém peculiarmente envolvido de modo especial no fazer literário, qual seja o de se apropriar de modo pungente dos elementos presentes em seu espaço íntimo de abstração para depois transformá-los em matéria viva vertida em palavras e outros tantos signos. Nesse processo, Nilto mergulha no universo de sua catarse pessoal, convivendo de frente com a necessidade primeira de isolar-se do mundo até que o produto de sua viagem ao centro de si mesmo seja expelido sob a forma de texto. Alguns de seus livros renderam-lhe premiações de destaque em concursos nacionais e regionais. Sua obra contempla, dentre outros, Itinerário (contos, 1974, Scortecci Editora), Tempos de Mula Preta (contos, 1981, Papel Virtual Editora), Punhalzinho Cravado de Ódio (contos, 1986, Secretaria da Cultura do Ceará), A Última Noite de Helena (romance, 2003, Editora Komedi) e Carnavalha (romance, 2007, Bestiário). Durante o diálogo do escritor com a Diversos Afins, foi possível compreender certas razões capazes de justificar as imagens que cercam o engenhoso ofício da escrita. Em Nilto Maciel, temos o exemplo vivo e atinente de que escrever, acima de tudo, envolve um criterioso ritual de entrega humana, tudo compreendido num lapso que sabe a desvãos da alma.

A entrevista


DA - Muita gente acredita que a única função do conto é a de relatar uma história, aspecto que negligencia a capacidade de transcendência de um texto. Enquanto autor, como você percebe tal discussão?

NILTO MACIEL – É verdade: tanto leitores (é só ver na Internet o número de leitores de sítios de contos lineares, de formato tradicional) como escritores ainda veem na história com começo, meio e fim, enredo claro, narração e diálogo (os velhos travessões e verbos dicendi a torto e a direito), personagens bem delineados, etc, o único ou o verdadeiro modelo de conto. Não sei se se discute isso. Não conheço artigos ou ensaios que tratem desse assunto. Para mim, o conto pode ser elaborado a partir de um modelo. E os modelos são muitos: o de Tchekhov, o de Poe, o de Maupassant, o de Joyce, o de Cortázar. No Brasil temos novo modelo (não tão novo, vem de Rubem Fonseca), que é o conto que tem como assunto a violência urbana. Transposto para o cinema, virou febre. É um filme atrás de outro, com a mesma receita e os mesmos ingredientes: muita bala, muita matança, muito morro, muito bandido, muito policial, muito ódio. Na literatura significa cópia de reportagens. Por isso, os escritores dessas histórias não se preocupam com literariedade. Para eles, literatura é arte de escrever. Se assim é, nem precisa estudar, ler, pesquisar. O computador se encarrega de registrar a fala e corrigir o óbvio. Só isso. Basta ter coragem de expor as mazelas do homem e da sociedade. O resto que se dane.

DA – Subjetivamente falando, é possível conceber o contista como sendo um verdadeiro engenheiro de ilusões?

NILTO MACIEL – O contista, como o romancista, é, sim, um engenheiro de ilusões. Não apenas das ilusões contidas nos enredos, nas tramas. Mas das ilusões escondidas nas entrelinhas, atrás de véus, debaixo de panos ou papéis. Não a ilusão palpável da vida, do viver, mas a ilusão diáfana da poesia. Sim, sem poesia o conto não se faz arte; amolda-se ao método da reportagem, da informação, do jornalismo. Falo de aparência e exterioridade. Sem ambiguidade e interioridade não há arte, não há conto. Contar, apenas, é fácil. Compor um conto é outra história (desculpe o trocadilho).

DA - Talvez não seja tarefa fácil absorver os excessos contidos na pós-modernidade, algo que poderia até mesmo escamotear sentidos essenciais. Nesse aspecto, como o torvelinho de imagens de mundo movimenta seu processo criativo?

NILTO MACIEL – Tenho falado muito de memória. Não sei se estou certo, mas acredito que obra de arte nasce na memória. Sendo assim, pergunta-se: Como teria sido nos primórdios? Ora, a memória literária não vem apenas dos livros, das inscrições rupestres, dos papiros, dos palimpsestos. Há também a memória oral. Tenho certeza de que só escrevo o que vi, ouvi, li, senti. Nada invento. A criatividade não vem de geração espontânea. Por isso, é preciso ter tido infância. Dirão: todos tivemos infância. Sim, mas nem todos conseguem abrir o baú e dele retirar quinquilharias, pedacinhos de pano, pó invisível. E é preciso ter lido muito. Borges recomendava a leitura de apenas cem livros essenciais. Não se referia, porém, à memória. Porque a cartilha é tão essencial como um tratado de filosofia. A imagem no cinema, na televisão, no computador é apenas estopim para mostrar imagens apagadas, soterradas, esquecidas. Não sou teórico, sou apenas escritor. E escritor é aquele que não conseguiu ser cientista, pesquisador, inventor. O que não sabe explicar porque a aranha tece a teia. Alguns não se aceitam tão pequenos e escrevem ficção científica. Acham que são, sim, cientistas.

DA - Acredita que para um autor há limites na utilização dos recursos da memória afetiva?

NILTO MACIEL - Os limites existem, porque somos limitados. Se pudéssemos utilizar todos os recursos da memória afetiva, a obra de arte seria muito mais vertical. Escritores verticais são Dostoievski, Machado, Kafka, Virginia Woolf, Clarice Lispector. Outros, os que se esmeram na horizontalidade da fala e dos atos, são meros descritores de paisagens e narradores de movimentos sempre repetidos dos seres que povoam as paisagens. São apenas cronistas de seu tempo. Pois cronistas todos o são. Machado é o cronista vertical do Rio de Janeiro do século XIX.

DA - No romance Carnavalha, você explora com densidade traços que ajudam a mostrar um painel de nossa contraditória brasilidade. Como surgiu a ideia de construir uma narrativa que, mesclando elementos trágicos e cômicos, provoca-nos a todo instante?

NILTO MACIEL – Todo escritor acalenta o sonho de erigir uma obra monumental. Alguns não perdem tempo com acalantos e desde cedo iniciam a construção de suas pirâmides de Gizé. Faraós da palavra, chamam-se Cervantes, Dante, Shakespeare e outros. Eu bem que tentei, sonhei, fiz escavações. Não consegui, como a maioria. Carnavalha foi uma das últimas tentativas de levantar pequenas tumbas para meus pequeninos personagens, saídos do fundo da memória. Palma já existia e está em quase todas as minhas narrativas, principalmente as mais longas. Os seres que a habitaram são mortos sem tumbas. Carnavalha (carnaval em Palma) é também um pouco de tragédia, um pouco de comédia. Um pouco do Brasil, um pouco de mim.

DA - Mas será que é realmente importante construir uma obra monumental?

NILTO MACIEL – Na pergunta, dois adjetivos equivalentes. Ser importante é ser fundamental, básico, necessário. Acho que é nesse sentido a questão. Dizem alguns teóricos que tudo é importante, toda obra literária é necessária, mesmo a mais rudimentar, a mais medíocre. Porque é dela que surgirá a obra maior. Sem as novelas de cavalaria não existiria Dom Quixote. No entanto, vem mais uma pergunta: Não estariam os autores daquelas histórias também imbuídos da vontade de erigir castelos monumentais? João de Lobeira (ou quem quer que tenha sido o autor do Amadis de Gaula) certamente se sentia um criador de mundos. E o foi, em certo sentido. Quem sabe, um dia surgirá o Cervantes que irá recriar Palma e escrever um romance monumental.

DA - Ao mesmo tempo em que trouxeram facilidades, as mídias eletrônicas externaram também uma verdadeira obsessão de muitos autores em serem reconhecidos, lidos, comentados a qualquer custo. Essa dinâmica frenética não acaba criando um relativismo conceitual e estético um tanto perigoso no que tange às criações?

NILTO MACIEL – É muito natural a vontade (mesmo que obsessiva) de ser lido, comentado e reverenciado. Quem não quer? Até aqueles que se fazem reclusos em casa e se dizem avessos a entrevistas, “badalações”, festinhas literárias como lançamento de livro, feira, simpósio, seminário, etc, até esses, no fundo, querem mesmo é fama. Ocorre que quem vive em salões (bares, clubes sociais, academias, redações de jornais) termina se esquecendo de ler e escrever. Se já não é tão talentoso (usarei este adjetivo para não estender demais minha opinião), vivendo essa vida de cortesã ou cortesão, sua literatura será como a bolha que escapa do chope. Em alguns, essa neurose os torna até perigosos. São como aqueles loucos das piadas que se dizem Napoleão Bonaparte.

DA - Com o advento da internet, o seu fazer literário mudou bastante ou ainda preserva hábitos marcantes de outrora?

NILTO MACIEL – Sim, meu fazer literário mudou muito desde os anos 80, quando adquiri um computador doméstico. Quase nada restou do meu modo de ser leitor/escritor. Antigamente (parece que faz tanto tempo!), eu escrevia em folhas de papel e cadernos. Uma loucura. Sobre a mesa, tudo espalhado. Anotava ideias separadamente. Uma frase aqui, uma ideia ali, um nome de personagem acolá. Porque o pensamento é lépido demais. E temos apenas duas mãos (só uso a esquerda). Agora está melhor, porque digito com as duas. Mas a memória ainda é o baú principal. Costumo escrever quando me deito para dormir. Porque não me deito para repousar ou descansar. Isto é para cavalos, jumentos, cachorros, gatos, leões. Deito-me para pensar e, em seguida, dormir. Às vezes, não consigo dormir. Passo a noite a pensar (escrever mentalmente). Quando acordo, imagino que sonhei. Mas não foi sonho, foi elaboração mental consciente. Acordado, relembro tudo (ou quase tudo) o que imaginei (escrevi) e digito sob um título provisório: “Conto do homem que olhava formigas”. São dois tipos de anotações: o como será o conto (na primeira ou na terceira pessoa, dois ou três personagens, com ou sem diálogos, etc) e a própria história. Muitas vezes não consigo me libertar daquele conto e passo o dia a elaborá-lo. Em dias assim, não me alimento, não me banho, não atendo chamados, não saio de casa, não ligo televisão. Quando cuido, estou caído no meio da sala, morto de fome, sujo, completamente envolto na loucura, a delirar. Por isso, preciso viver só. Quando vivia com mulher e filhos, precisava me controlar, me policiar, ser normal. Agora posso assumir minha anormalidade, sem medo.

DA - E como andam as perspectivas atuais? Está trabalhando em alguma obra nova?

NILTO MACIEL – Quem escreve só deixa de escrever quando morre. Alguns continuam escrevendo até depois da morte (dizia Chico Xavier). Se algum médium puder copiar meus ditados, prometo ditar com paciência. Há um ano, mais ou menos, rabisco um romance. Está todo arquitetado, mas poderá se modificar. Como dizem, alguns personagens costumam crescer; outros, minguar. Voltei à primeira pessoa. Os leitores poderão até dizer: O narrador é o próprio autor. Não deixa de ser.

DA - Afinal, o que se busca com o ato de escrever?

NILTO MACIEL – Uns buscam fama, dinheiro, reconhecimento. Outros querem dizer: eis-me, existo, existi. E tudo passa, passará. A fama poderá resistir ao tempo, até depois da morte. Para quê? O dinheiro virará fumaça. Os escritores morrem, seus nomes viram verbete. Algumas obras ficaram e ficarão. Até quando? Depois a humanidade desaparecerá e a Terra será habitada apenas pelos “seres inferiores” que não leem e não lerão. Portanto, o que se busca não passa de pó. E, quando Deus der o sopro final, todo o pó voará pelos ares e se perderá na imensidão das galáxias. Na verdade, não acredito na existência de Deus. Se existe, existirá para sempre. Sem literatura, porém.

Fonte: Colaboração do autor em Artigo Pequena sabatina ao artista (Nilto Maciel e Fabrício Brandão), obtida em Literatura sem Fronteiras

sexta-feira, 6 de maio de 2011

A. A. de Assis (Mãe Postiça)


Numa reunião de senhoras, foi solicitado que cada uma que se levantasse e fizesse a autoapresentação. Uma delas causou impacto, ao dizer que tinha 122 filhos.

Era uma freira vestida em roupas comuns. Explicou: "Dirijo um orfanato, sou mãe postiça de todas aquelas crianças, que não têm mais suas mães de verdade".

A mãe postiça (usemos o termo carinhosamente escolhido pela freirinha) exerce intensamente a função maternal, mesmo que jamais tenha gerado um filho. E no momento em que assume a responsabilidade de proteger e orientar uma criança ela se realiza, a ponto de nem sentir falta da maternidade biológica.

Estão nesse caso não apenas as religiosas que trabalham em orfanatos, mas também todas aquelas que, sem terem casado, ajudam a criar os irmãos menores e os sobrinhos.

Em quase todas as famílias existe uma dessas maravilhosas mães postiças. E quase todos tivemos uma irmã ou uma tia que completou o zelo que recebemos de nossa mãe. Eu tive minha Didinha, minhas filhas e netos têm a sua Deda, e é bastante provável que também você tenha tido e tenha ainda a sua.

Na maioria dos casos, a mãe postiça acaba sendo mais que mãe. Era vive para aqueles que se tornaram seus filhos pelo amor. Toda a sua preocupação é com eles. Chora por eles, sorri com eles, vive a vida deles.

É o mistério da maternidade espiritual. A mãe postiça se realiza amando filhos alheios, e com isso prova que ser mãe é muito mais do que simplesmente gerar uma vida.

Aquela freirinha não estava brincando ao dizer que tem 122 filhos. Ela vive para todas aquelas crianças. Dedica a cada uma delas o seu total amor. É mãe sim. E que mãe!

É mais que um beijo, é uma prece,
aquele beijo miudinho
com que a mãe afaga e aquece
os seus filhotes no ninho!

Fonte:
ASSIS, A. A. de. Vida, verso e prosa. Maringá: EDUEM, 2010.

Carolina Ramos (Mãe)

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Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 207)


Uma Trova Nacional

Hoje minha vida insiste
neste silêncio sem fim,
como se tudo que é triste
chorasse dentro de mim !
–REJANE COSTA/CE–

Uma Trova Potiguar

Foram tantas as carícias,
que uma verdade se encerra:
O meu "Jardim das Delícias",
eu vivi, aqui, na Terra!
–SÉRGIO AUGUSTO SEVERO/RN–

Uma Trova Premiada
2000 - Niterói/RJ

Tema: PARTILHA - M/E.


Pelo pão não-partilhado,
pela miséria voraz,
vai sendo, aos poucos, minado
todo o caminho da paz!...
–JOÃO FREIRE FILHO/RJ–

...E Suas Trovas Ficaram

A saudade, em horas mortas,
sem ver que o tempo passou,
teima em abrir velhas portas
que há muito a vida fechou...
–WALDIR NEVES/RJ–

Simplesmente Poesia


–ZÉ REINALDO/AL–

Nas Asas da Poesia...


Eu quis conhecer o mundo,
mas não saí de onde estava.
Só em sonho viajava
meu coração vagabundo,
que não parou um segundo
na busca do seu roteiro.
E, mesmo sem ter dinheiro,
fiz a grande travessia:
nas asas da poesia
viajei o mundo inteiro.

Estrofe do Dia

Visitei um necrotério,
numa noite escurecida.
Vi que da morte pra vida
existe um certo mistério.
Depois fui ao cemitério,
vi a porta escancarada,
cruz inteira, cruz quebrada,
catacumba, velha e nova.
Tudo isso me dando a prova
de que o pecador é nada!

–JOSÉ VIEIRA DA SILVA/PB–


Soneto do Dia

–ERNANE GUSMÃO/BA–
Assim


Assim como me queres eu te quero,
Completamente, tim-tim por tim-tim;
Isto não é somente um bolero
Para dançarmos juntos, tu em mim.

Eu sei que tal distancia, mui sincero,
Complica esse querer, principio ao fim...
Mas sei também que num amor bem vero
Mesmo a distancia eu estou a fim.

Porque as nossas almas se encontraram
E os nossos corpos se distanciaram?
Não foi pra isso que aqui eu vim.

Desejo estreitar-te no meu peito,
Conduzir-te formosa ao meu leito
Do jeito que queremos, bem assim!…

Fonte:
Textos enviados pelo autor

Thalma Tavares (Trovas que Falam de Mãe)


Nós, homens e mulheres de todos os tempos, de todos os credos religiosos, de todos os rincões da Terra, que aprendemos a usar as palavras, vivemos ansiosamente buscando o verso perfeito, a expressão mais sublime para externar verbalmente a grandeza do amor materno. E ao cabo de muitas buscas concluímos contrafeitos que a expressão que encontramos, quando a encontramos, por mais extraordinária que nos pareça, não tem a força nem o brilho necessário para exprimir o que sentimos em relação a esse amor. No entanto, como o presidiário ante a estreita faixa de luz que lhe cabe na minúscula abertura de sua cela, mas que não reflete totalmente a grandiosidade do Sol, nós nos conformamos com o fruto dessa busca, desde que ele traduza fielmente a essência do nosso carinho, daquilo que há de melhor em nosso coração. E o melhor que há em nós, para nossa mãe, pode estar contido num simples gesto, no respeito que lhe devotamos, na palavra que silenciamos para não magoá-la, na aceitação de suas humanas imperfeições e no esforço que fazemos para que os nossos defeitos não lhe tirem o sono, vincando-lhe prematuramente o rosto amado com as indesejáveis rugas do desgosto. E nesse contexto insére-se muito bem a Trova sincera de LUIZ OTÁVIO, quando suplica:

"Oh, mãe querida, perdoa!
O que sonhaste, não sou...
Tua semente era boa:
a terra é que não prestou."

Muitas vezes, no perfil de mãe que costumam traçar poetas e prosadores, identificamos traços e gestos daquela que nos deu o ser.

Minha mãe foi para a morada eterna quando eu contava apenas sete anos de idade. Guardo ainda em minha lembrança seu rosto suave, seus dulcíssimos olhos que nos fitavam com uma ternura e um sentimento de quem está sempre se despedindo. Ela se foi, é verdade, mas deixou na ternura de sua própria mãe a mãe que se desvelaria por mim e por minhas irmãs. E é desta outra mãe o traço humano e heróico que identifico nestas trovas do saudoso JOSÉ MARIA MACHADO DE ARAUJO e de PEDRO ORNELLAS, respectivamente:

De JOSÉ MARIA:
"Na infância de minha vida,
fui pobre, mas não sabia
porque é que eu tinha comida
e a minha mãe não comia."

De PEDRO ORNELLAS:

"Ser mãe é zombar da fome,
nos olhos mantendo o brilho,
ao ver o pão que não come
matando a fome do filho."

Mas JOSÉ MARIA não parou por aí, traçou nesta bela trova um outro lado do amor de sua genitora, que fez das lágrimas o apelo maior para que o filho se tornasse um homem de bem:

“Minha mãe verteu mais pranto
que a Mãe de Nosso Senhor...
A Virgem chorou um Santo,
Minha mãe – um pecador.

Deus nos premiou generosamente ao colocar no coração de nossas mães e de nossas avós, toda essa inesgotável fonte de ternura que as vicissitudes da vida não nos deixa, às vezes, perceber em toda a sua plenitude, nem retribuir como se deve. Mas as mães não cobram atitudes, não exigem trocas ou recompensas porque não barganham com o amor. E quem nos garante isto é a poeta e trovadora MARILITA POZZOLI, quando nos diz:

"Coração de mãe, canteiro
em perene floração,
onde um Santo Jardineiro
planta as rosas do perdão"

É feliz quem pode ainda hoje olhar fundo nos olhos dessa extraordinária criatura, tomar-lhe carinhosamente as mãos, aconchegá-las ao peito e dizer-lhe enquanto bate mais forte o coração: - Escuta, mãe! Escuta como bate o meu coração! Ele está te dizendo o que as minhas palavras não conseguem...

E aquele a quem ela já não pode tocar fisicamente o peito, porque já não é deste mundo, tem-na constantemente no coração, como estrela inapagável no céu da alma. E esta certeza está comoventemente contida nos versos desta tocante Trova de SARA MARIANY KHANTER:

"Minha mãe partiu, tão linda!
Sorriu no último adeus...
E em minha tristeza infinda
eu tive inveja de Deus."

E são às mães de todos nós filhos presentes e ausentes, que nós dedicamos este trabalho em homenagem ao Dia das Mães, enriquecido pelas jóias da genialidade de nossos irmãos poetas e TROVADORES.

Entre as amorosas mães do mundo inteiro uma existe que não pode ser esquecida; destaca-se por ser, brasileiramente, a mãe dos filhos alheios. Eis como Thalma Tavares, tem-na em sua lembrança:

Foi Mãe Preta alforriada
pelo afeto do Senhor...
De tanto afeto cercada
morreu escrava do amor.

É tocante o lirismo com que o trovador JOSÉ LUCAS DE BARROS evoca a ternura materna:

“Frases de eterna pureza
mamãe sempre me revela;
porém as de mais beleza
eu leio nos olhos dela.”

A.A. DE ASSIS exalta o amor materno nesta sua trova bastante criativa, numa comparação repleta de lirismo:

“Com que suave ternura
tece a canária o seu ninho!
- Mãe é assim, dengosa e pura;
a nossa e a do passarinho...

Mas quem se emociona com os versos que falam de Mãe, não pode esquecer esta jóia da inspiração poética de MARTINS FONTES, engastada neste seu primoroso e delicado Soneto:

MINHA MÃE

Beijo-te a mão que sobre mim se espalma
Para me abençoar e proteger.
Teu puro amor o coração me acalma;
Provo a doçura do teu bem-querer.

Porque a mão te beijei, a minha palma
Olho, analiso, linha a linha, a ver
Se em mim descubro um traço de tua alma,
Se existe em mim a graça do teu ser.

E o M, gravado sobre a mão aberta,
Pela sua clareza me desperta
Um grato enlevo que jamais senti:

Quer dizer Mãe este M tão perfeito,
E, com certeza, em minha mão foi feito
Para, quando eu for bom, pensar em ti.

Ficaríamos aqui, com um prazer imenso reproduzindo incontável número de trovas e poemas que falam de mãe, se o tempo e o espaço não obstassem a nossa intenção. Mas vamos encerrar esta breve homenagem fazendo nosso o desejo de ARCHIMIMO LAPAGESSE, e nossa a gratidão de AGMAR MURGEL DUTRA, nestas duas trovas repletas de singeleza e ternura:

De ARCHIMIMO:
“Se Deus atendesse um dia
minha prece ingênua e doce,
quem fosse mãe não morria,
por mais velhinha que fosse.”

De AGMAR:

“Pelo bem que me fizeste
sem nunca exigires nada;
pela luz que tu me deste,
Minha mãe, muito obrigada.”

E nós aqui desejamos a todos

UM FELIZ DIA DAS MÃES

(Minipalestra proferida pelo autor na UBT- São Paulo, UBT-Amparo, Casa do Poeta e Escritor de Ribeirão Preto, SOS - Cultura de São Simão-SP e C.E. “A Caminho da Libertação”)

Fonte:
Texto enviado por Mifori

Mifori (Mãe - Mais um Dia!)

Pintura de Renoir
Deste assunto eu entendo.
Tenho mãe, já convivi e convivo com muitas mães.
Mães de todos os tipos, de todos os nuances.
Cansei de me omitir. Vou falar para vocês:
Não dá pra se calar diante de tantas propagandas,
Formando uma cultura de massa,
Minando o inconsciente
E conseqüentemente
Massificando o conceito de mãe.
Mãe não é uma Santa, nem uma diaba.
Mãe é gente!
É um ser humano como todos os demais
Criadas por Deus para algo mais,
Para uma missão quase impossível!
Não é a de gerar filhos,
Educar seus filhos ou de outrem.
A missão indescritível
Que as mães realizam com coragem,
Condignamente,
Com muita ou pouca força,
Mas, bravamente...
É a de sobreviver
Aos percalços da convivência,
No dia a dia com estas pessoinhas,
Com seus adolescentes.

Saibam todos... que a mãe nunca erra.
Ela falha. Falha muito e berra
Em nome do amor, por amor.
Por excesso de zelo!
Se procura proteger
É super protetora,
Castradora.
Se fala muito e orienta...
Oh! Deus!... Atormenta!
Se fala pouco ou nada diz
É indiferente, desligada, infeliz!
Parece que não há meio termo.
Pra tudo há. Pra mãe não
Mãe é boa ou é garoa:
Chuva fina que cai... cai...
E vai calando na gente
Até molhar de fato.
Guarda-chuva não há como usar,
Ela é devagar e chata.
Mãe é má ou é destoante:
Não se toca. Obriga o(a) filho(a)
Fazer o que tem que ser feito.
Sem amenizar a dor
Necessária ao seu crescimento.

A mãe faz!...
Nem tudo que faz é suficientemente bom e necessário.
A mãe não faz!...
Tudo o que deixa de fazer não será suficientemente ruim.
É péssimo!
E por acréscimo:
O Slogan...
“Mães são todas iguais. Só mudam de endereço”
Cruz credo!
E eu mereço?...

Fonte:
Texto enviado pela autora

Ialmar Pio Schneider (Crônica Elegíaca à Minha Mãe)


No transcurso desta vida, com certeza, o ser a quem mais amor dediquei foi, sem dúvida, minha mãe, heroína de nossa família e que esteve conosco até meados de 1994, quando partiu já deixando todos os filhos criados, seis ao todo (depois viria a falecer meu mano Remi, talvez sentindo sua falta com quem convivia nos últimos anos), e hoje somos em cinco irmãos, todos espalhados entre Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná, cada qual levando seu barco a seu jeito.

Faltava escrever uma crônica falando dos versos que lhe compus durante a sua existência. Começo, transcrevendo um soneto, muito influenciado e rebuscado (falha-me a memória de qual poeta), quando eu tinha dezesseis anos, em 1958, e estudava no internato do Ginásio “Cristo Rei”, dos irmãos maristas, em Getúlio Vargas/RS:

“Minha Mãe

Se triste vivo ou se faceiro exulto,
Se em pequeno lugar ou majestoso,
Eu tenho sempre grande amor oculto,
Por minha mãe de afeto carinhoso.

Pra ela sempre presto grande culto,
Pois amo aquela santa e orgulhoso
Fico, ao ver aquele terno vulto,
Que pra mim é tão ledo e tão formoso.

Bem perto ou longe, eu sempre tenho afeto
À minha amada mãe que me deu vida,
Pois ela é a criatura mais querida,

E o seu sagrado seio o mais dileto,
Que tenho no meu peito consagrado,
E que tenho em minh’alma bem gravado”.

Uma cópia batida a máquina foi afixada no mural da escola, no dia das mães do ano de 1958.

Vinte anos depois viria outro soneto, este em versos alexandrinos, que compus em Antônio Prado/RS, quando lá exercia as funções de fiscal da Carteira Agrícola do Banco do Brasil S.A., e que dizia assim:

“Mãe

Mãe!... Palavra sublime, amor inexprimível,
que a gente pronuncia em ritmo de oração...
É tão cálido o afeto e quase que impossível
externá-lo, pois vive em nosso coração !

Se alguma coisa existe, além do que é infalível,
e seja só no mundo e morra em solidão;
creia-me, não verá jamais tão acessível,
de quem nos deu a vida, aceitar a afeição !…

Ela é generosa e sem maldade alguma...
Seus filhos são a maior riqueza que possui,
seu aconchego tem toda a maciez da pluma...

Porém, nunca haverá poeta, cujo verso
descreva o amor de mãe, pois tudo se dilui
ao saber que ela é a dona do Universo !”

Foi publicado no jornal Panorama Pradense nº 45, de Antônio Prado/RS, em maio de 1978.

De volta a Canoas/RS, estava eu sentado na mesa de um bar na rua Gonçalves Dias e de repente, senti saudades de minha genitora, e fiz-lhe os seguintes versos, com o coração aos pulos, em decassílabos:

Versos para a Mãe - à minha mãe Amábile

‘O meu verso maior vai para a mãe
que pelo amor ao filho tudo deixa;
as glórias vãs do mundo, sem pretextos,
envolta em sacrifícios não se queixa...

E quando ela o aninha em seus braços
fazendo-o dormir, embala-o e canta,
não aparenta ser aqui da terra;
é uma imagem dos céus, é uma santa.

Por isto, mãe querida, não te esqueço,
contigo quero estar a qualquer hora,
foste tudo pra mim, foste o começo...
Trazes no coração Nossa Senhora’...”

Estes versos foram publicados na coluna Do Bric-à-Brac da Vida - Nilo Tapecoara - do antigo Correio do Povo, em 04.11.1981.

Finalmente, viria o soneto alexandrino, que a maior tristeza e dor me causou, pois seria o derradeiro, de despedida, e que compus com a alma aos pedaços:

“Soneto Elegíaco ‘In Memoriam’
a minha mãe Amábile Tressino Schneider - falecida às 19,30 hs. do dia 05.06.1994 - Domingo - em Palmas - Paraná

‘Não é dor o que sinto agora... com certeza
é uma vontade de mergulhar no amargor,
de deixar-me levar rumo da correnteza
deste mundo fatal; - é muito mais que dor !

Senhor, fazei-me orar nas horas de tristeza,
porque bem sei que sou um triste pecador,
perambulando num caminho de incerteza
a pedir o perdão... Fazei-me orar, Senhor !

Acolhei minha Mãe na Esplêndida Morada
onde os justos esperam a Ressurreição;
e contemplando a luz que tudo aclara e encanta,

das dores que sofreu seja recompensada...
Estava tão serena dentro do caixão:
parece que sorria a sua imagem santa’...”
Perpétuas Saudades !

Esta é a crônica que eu devia à minha querida genitora, da qual não me canso de lembrar, evocar e dirigir-lhe as mais ardentes preces para que olhe por nós aqui neste vale de lágrimas !...
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Fontes:
Texto Enviado pelo Autor.
Imagem = http://www.dipity.com

quinta-feira, 5 de maio de 2011

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 206)


Uma Trova Nacional

Deus, o divino arquiteto,
legislando com nobreza,
sem qualquer anteprojeto,
fez as leis da natureza!
–HERMOCLYDES S. FRANCO/RJ–

Uma Trova Potiguar

Num mundo de violência
o homem está infiltrado,
onde quem ama a decência
de bobo é classificado.
–ROSA REGIS/RN–

Uma Trova Premiada

2000 > Niterói/RJ Tema > DELÍRIO > M/E.

A saudade, em cantilenas,
como se fosse um ator,
até hoje rouba as cenas
de meus delírios de amor!
–EDUARDO A. O. TOLEDO/MG–

...E Suas Trovas Ficaram

Uberaba, escuto agora,
sinal que do campo vem:
se um boi mugir, não demora,
logo aparece o meu bem.
–EVA REIS/MG–

Simplesmente Poesia

MOTE:
Ponha luz no seu caminho,

pinte a estrada de alegria,
deixe um rastro de carinho,
faça um mundo de poesia!
–DÁGUIMA VERÔNICA/MG–

GLOSA:
Ponha luz no seu caminho,
torne o mundo mais risonho
e em seu peito teça um ninho
para abrigar o meu sonho.

Com um pincel multicor
pinte a estrada de alegria,
no ramo rubro da dor,
ponha a flor da fantasia.

Da rosa retire o espinho,
semeie versos pelo ar,
deixe um rastro de carinho,
por onde você passar.

Cante a vida alheia às dores
constantes no dia a dia
e, dos próprios dissabores,
faça um mundo de poesia!”
–JURACI SIQUEIRA/PA–

Estrofe do Dia

Sem nenhuma segurança,
esse inventor nota mil
fez o céu cor de anil,
fez o mar cor de esperança,
fez a preguiça que é mansa,
fez o guará que é voraz,
os macacos imorais
e o passarinho inocente;
Deus é tão sábio que a gente
não entende o que ele faz.
–RAIMUNDO NONATO/CE–

Soneto do Dia

–EDMAR JAPIASSÚ MAIA/RJ–
Quintana – A Alma do Poeta.

A Lua e as estrelas reluzentes
bordam no espaço o seu tapete imenso...
E os bardos que o pranteiam, reverentes,
têm o aroma das flores por incenso.

Nas alvoradas soam, envolventes,
chilreios que dão vida ao verde extenso...
E “eu passarinho”, a desbravar os poentes,
espreito um verso na amplidão suspenso.

Um verso que me dê o testemunho
de um Ser eterno... e a pena, que eu empunho,
desperta e risca a folha ainda vazia...

A inspiração me envolve... a paz me acalma...
E se poesia é amor presente na alma,
Mário Quintana: – és a alma da poesia!

Fonte:
Colaboração de Ademar Macedo

Homenagem às Mães em Poesias e Trovas


Antonio Manoel Abreu Sardenberg
AMOR DE MÃE


Seu ventre é solo fecundo
Que gera e abriga a vida,
É paixão sem ter medida
De um sonho realizado,
É aconchego do ninho
Que acolhe com carinho
O amor tão esperado.

Com sua voz acalenta
Com um canto delicado...
No seu peito amamenta
E com amor alimenta
O filho tão desejado!

Com a mão acaricia
Em toque meigo e sublime...
Seu brilhante olhar exprime
Na mais ardente paixão
O amor que também pulsa
No pequeno coração.

A sua boca tem beijo
Mais doce do que o mel,
Em sua prece o desejo
De dar para seu rebento
Um pedacinho do céu.

Na alma toda esperança
De um futuro promissor
Para o filho que gerou
De quem tanto quer o bem:
Que em sua caminhada
Consiga vencer também.

Que os anjos digam amém
E em coro com os arcanjos,
No mais harmonioso arranjo,
Cantem com todo fervor
Um hino de puro amor
Para a santa e amada MÃE!

Amilton Maciel Monteiro
EXEMPLO DE MÃE

Não me admiro de sentir saudade
De meus longínquos tempos de criança,
Vividos na escassez, é bem verdade,
Mas com imenso amor e esperança.

A gente era pobre e a cidade
Nem possuía luz ou segurança
De algum Doutor. Mas nessa qualidade
Aquilo é um sonho em minha lembrança...

Pois o importante é que então vivendo
De modo simples, "remendando o pano",
só de carinho a gente ia crescendo...

A grande fé em Deus nos consolava,
Mudava em alegria o desengano...
Tal o exemplo que mamãe nos dava!

José Antonio Jacob
ILUSÃO MATERNA


Ele era criança e pouco compreendia
O que era a dor de ter amor ausente,
Sua rua era tudo o que ele via,
E olhava tudo muito de repente...

Contava estrelas sempre que podia,
E, ao vê-las, toda noite, simplesmente,
Fitava a mãe e com o olhar pedia
Uma dessas estrelas de presente.

E a mãe, com sua doce voz, dizia:
- A estrela é uma alma boa que partiu
Para com Deus, no além, sempre existir.

Hoje, já velho, ao ver a Estrela-Guia,
Ele, iludido, crê no que não viu:
- A sua mãe no céu a lhe sorrir!

Maria Nascimento Santos Carvalho
MÃE MARINA


MAMÃE, quando retorno ao meu passado
tão rico de pobreza e de esperança,
imagino que estou ainda ao teu lado,
e volte a me sentir em segurança...

E projetando tudo na lembrança
vejo que, se houve sonho malogrado,
o amor que recebi desde criança
evitou que eu tivesse fracassado.

És milagrosa, Santa MÃE MARINA,
uma estrela radiosa, a luz divina
que enfeita meus caminhos, e me guia,

pois quando fico triste, em pensamento,
chego aonde estás e abrandas meu tormento,
minha Nossa Senhora da Alegria !

Alda Corrêa Mendes Moreira
PALAVRAS A MINHA MÃE


De ti eu recebi, ó minha mãe querida,
o bem maior que Deus sempre me ofereceu.
Tu foste para mim bela e rara jazida;
só por isto agradeço o dom que Ele me deu.

Em tuas doces mãos, em toda e qualquer lida,
sentia eternamente o amparo do anjo meu
e uma palavra tua era só despedida
para qualquer sofrer deste ser sempre teu.

A vida, infelizmente, a nós causa também
muita tristeza e dor, vindas talvez do Além,
e um dia eu te perdi, imersa em muita dor.

Estou sempre sentindo a falta deste Alguém.
Bem triste é a saudade agora, Mãe, porém,
muita ventura eu tive ao ganhar teu amor!

Maria da Fonseca
Homenagem à Minha Mãe


Talvez não fosse a filha que esperavas
Nem tu a Mãe que desejava ter.
Mas eu te quero muito e tu me amavas,
A Deus e a ti devo todo o meu ser.

Tu, minha Mãe, sabias a verdade,
Sabias a verdade e não contaste.
Ao cumprir tua ultima vontade
Compreendi então porque a ocultaste.

A tua vida foi grande lição
Que eu procurarei sempre recordar.
Quão forte era teu nobre coração
E como foste heróica em teu lutar.

Os teus valores são também os meus.
E essa força que de ti recebi,
Recebeste-a do nosso mesmo Deus.
Só ao perder-te Mãe é que entendi!
=================

TROVAS

Na varanda, um quadro lindo:
a jovem mãe e a criança:
- Era a ternura sorrindo,
amamentando a esperança!
A. A. DE ASSIS - MARINGÁ

Deus, em toda a sua glória,
com tanta grandeza e brilho,
pra completar sua história,
quis ter mãe e quis ser filho!
GISLAINE CANALES – B. CAMBORIÚ

Depois que, mãe tu partiste,
como uma Santa em seu véu,
o céu que eu via tão longe,
ficou mais perto, e mais céu...
ADELMAR TAVARES – PE

“Quem tiver filhos pequenos
por força há de cantar:
quantas vezes as mães cantam
com vontade de chorar.”
LUIZ HÉLIO FRIEDRICH – PR

Mãe, por mais que eu me concentre
na importância do que faço,
não esqueço que o teu ventre
foi o meu primeiro espaço.
ALMERINDA LIPORAGE – RJ

Mamãe, tua idade avança
e eu, triste, não me consolo,
porque sou sempre a criança
que precisa do teu colo!
MARIA NASCIMENTO - RJ

Guarda no olhar a doçura
com que me embalou um dia.
Mãe lembra sempre a figura
e a ternura de Maria.
NILCI GUIMARÃES – RJ

Para você, mãe, a prece
deste filho agradecido
que na terra não se esquece
de tanto amor recebido.
A. M. A. SARDENBERG – RJ

Como de um eixo central,
desde a manhã à noitinha,
a vida toda de um lar
gira em torno da mãezinha.
PEDRO COLTRO – SP

Minha mãe! Quanta saudade
de quem deixou-me, na Terra,
lições de total bondade
e de paz em plena guerra...
CLEVANE PESSOA – MG

Caso a sobremesa fosse
escassa, mamãe dizia:
- Tomem! Não gosto de doce!
... e docemente sorria
VANDA FAGUNDES QUEIROZ - PR

Fontes:

Ialmar Pio Schneider (Mario Quintana, o Poeta Maior)


Hoje, 5 de maio, reverencia-se a data do passamento do nosso poeta maior Mário Quintana, que ocorreu em 1994, portanto, há dezessete anos. Vem-me à memória que um dos primeiros poemas dele, de que tomei conhecimento, na minha adolescência, quando estudava o ginásio no Colégio Cristo Rei de Getúlio Vargas-RS, encontrado em uma revista cujo nome não me ocorre, mas que copiei em um caderno, na minha regular caligrafia cursiva daquela época, foi o seguinte:

NOTURNO

– Não sei por que, sorri de repente
E um gosto de estrela me veio na boca…
Eu penso em ti, em Deus, nas voltas inumeráveis que fazem os caminhos…

Em Deus, em ti, de novo…
Tua ternura tão simples…
Eu queria, não sei por que, sair descalço pela noite imensa.

E o vento da madrugada me encontraria morto [ junto de um arroio,
Com os cabelos e a fronte mergulhados na água límpida…
Mergulhados na água límpida, cantante e fresca de um arroio !”
( Mário Quintana)

. Até hoje guardo o caderno onde retirei este poema Noturno e sei que outros poemas com o mesmo título foram escritos pelo poeta, mas este, repito, foi o primeiro de que tive conhecimento.

Depois leria tantos outros versos e o que me encantaria foi o livro de sonetos “A Rua dos Cata-ventos”, que o poeta dedicou “A meus irmãos Milton e Marietta – Alegrete, Natal de 1938”, e que me inspiraria o SONETO A MÁRIO QUINTANA

Leio Mário Quintana e “A rua dos cata-ventos”
me leva à infância de menino sonhador,
quando inda não pensava em mágoas e tormentos
que havia de sofrer ao procurar o amor…

Vejo os dias sem sol, frios e nevoentos,
tal a “Londres longínqua” envolvida em palor.
...”(tudo esquecer talvez !)”... os bons e maus momentos,
as horas de alegria e também as de dor.

“A ruazinha” é tão calma e “sossegada”: agora
minha imaginação ouve “canções de outrora”,
e os “lindos pregões da madrugada”, me acordam…

Olho ao alto girar um cata-vento triste,
parece ser assim o último que persiste
de todos que, os de minha infância, hoje recordam !
– 23-9-1983.

Depois os anos foram passando e eu sempre lia os seus poemas em diversos livros, quase vinte, até o Baú de Espantos de 1986 e publicações em jornais no Caderno H. Hoje aí está a Casa de Cultura Mário Quintana, atestando que foi o poeta maior de nosso Estado e um dos mais importantes do País.

Quando do seu falecimento em 5 de maio de 1994, compus os seguintes versos, reverenciando sua passagem por aqui – VERSOS “IN MEMORIAM” AO MÁRIO QUINTANA-*30-7-1906-+5-5-1994 –

Evaporou-se a poesia,
num momento de ansiedade,
mas permanece a magia
no templo da Eternidade…

A vida não foi vazia,
cantando amor e saudade,
e buscou na fantasia
transformar a realidade !

E sempre viveu sozinho:
o poeta passarinho !...

– Canoas-RS, 7-5-1994.

Quis escrever estas palavras de escriba de província, para mais uma vez rememorar o magnânimo bardo gaúcho que partiu há nove anos, mas que continua vivo nas obras que deixou e na Casa de Cultura que leva seu nome. Que a chama de sua poesia inebriante brilhe sempre para nós, seus admiradores !

SONETO
em 20.06.2010 - Porto Alegre - RS

Hoje não fiz poesia, apenas li
alguns poemas de Mário Quintana.
Mas, o que faço agora, se escrevi
estas linhas, pensando na cigana

que leu a minha mão e soberana,
na sua ciência, que nunca entendi,
me confirmou que não seria insana
a história que ora vivo e que vivi?!

Penso, então, que não tinha que saber
estes desígnios de minha existência,
se fosse só para depois sofrer...

Fora sensato andar pelos caminhos,
ouvindo a voz silente da consciência,
que sempre faz-se ouvir pelos sozinhos...

Fonte:
Texto enviado por Ialmar Pio Schneider
Imagem = http://www.brasilescola.com

Monteiro Lobato (Histórias de Tia Nastácia) XXVII – O Pulo do Gato


A onça pediu ao gato que lhe ensinasse a pular, porque o maior mestre de pulos que há no mundo é o gato. O gato ensinou uma, duas, três, dez, vinte qualidades de pulos. A onça aprendeu todos com a maior rapidez e depois convidou o gato para irem juntos ao bebedouro, isto é, ao lugar no rio onde os animais descem para beber.

Lá viram um lagarto dormindo em cima duma pedra.

— Compadre gato — disse a onça — vamos ver quem dum pulo pega aquele lagarto.

— Pois vamos — respondeu o gato.

— Então comece.

O gato saltou em cima do lagarto e a onça saltou em cima do gato — mas este deu um pulo de banda e se livrou da onça.

A onça ficou muito desapontada.

— Como é isso, compadre gato? Esse pulo você não me ensinou...

— Ah, ah, ah! — fez o gato de longe.

— Isto é cá segredo meu que não ensino a ninguém. Chama-se o "pulo do gato" — meu, só meu. Os mestres que ensinam tudo quanto sabem não passam duns tolos. Adeus, comadre! — e lá se foi.
=============
— Ah! — exclamou Pedrinho. — Agora estou compreendendo por que se fala tanto no "pulo do gato"...

— Mas pulam mesmo assim ou é história da história? — perguntou a menina.

— Não há pulo que os gatos não dêem — disse dona Benta. — É um bichinho maravilhoso. Já vi o Romão cair dum telhado altíssimo. Outro bicho qualquer se espatifaria. Romão, porém, deu uma volta no ar e caiu sobre as quatro patas — e lá se foi, ventando, sem que nada lhe acontecesse.

— Mas se o gato é da mesma família da onça — observou a menina — tudo o que o gato faz a onça também deve fazer.

— Sim, mas o gato é pequeno e portanto tem agilidade muito maior que a da onça. Quanto pesa um gato? Um quilo, apenas. E uma onça? Cem vezes mais. Natural, portanto, que por causa do peso maior a onça não seja capaz de fazer o que o gato faz.

— É verdade, vovó — perguntou Pedrinho — que os políticos espertos usam o pulo do gato?

Dona Benta suspirou.
— Os políticos matreiros, meus filhos, são os gatos da humanidade. Dão toda sorte de pulos — e sabem muito bem essa história de cair de pé. Há alguns entre nós que podem dar lições a todos os gatos do mundo...
–––––––––––––
Continua… XXVIII – O Doutor Botelho
–––––––––––––-
Fonte:
LOBATO, Monteiro. Histórias de Tia Nastácia. SP: Brasiliense, 1995.
Este livro foi digitalizado e distribuído GRATUITAMENTE pela equipe Digital Sourc
e

Caldeirão Poético I


Evaldo da Veiga
ESSE SOU EU


Já caminhei tanto
Jamais pensei viver tantos caminhos
Sinto que a linha de chegada está perto
Muitas coisas em vacilo, mas em outras
Tenho convicção que vivi tudo que podia

Vivi a vida que se ofereceu e um pouco mais
Esquivei-me do fim várias vezes
Muitas vezes não escolhi os caminhos
Segui por coincidência

Por instinto, um farol que indicava
E até mais do que isso, um empurrão
Que não sabia vindo de onde
Eu fiz como podia, segundo aprendi

Tudo bem ao meu modo
Muitas vezes não sendo o que eu queria
Consciência leve,
Não fiz melhor porque não pude

Em especial fiz melhor quando amei
Os momentos de rancor produziram pouco valor
Minha colheita melhor
Foi quando plantei o bem

E mesmo assim poderia
Ter feito bem melhor
Mas se soubesse o que sei hoje
Na época eu fiz o que sabia fazer

Busquei ver tudo até o detrás dos escombros
Até em noites escuras de incerteza
Busquei manter-me calmo
Planejando um amanhecer de luz e amor

Esses foram meus melhores momentos
Se fui afoito em alguns instantes
Em outros tive cuidado
Principalmente quando envolvia vida
Que não era a minha
Era bom cuidar além de mim, ser protetor

Fiz sempre assim ao meu modo
Houve dias de amargura, chorar por dentro
Na maioria só eu sabia da dor
A dor da gente nem sempre é notada

Quando dói mesmo não tem testemunhas
Às vezes o erro foi porque fui puro
Outras vezes não esperei o sinal
Quando eu quis abraçar o mundo com as mãos...

Mas nada disso já importa
O que vale é que,
se não posso alterar o início
Posso criar um novo começo, agora

Antônio Fonseca
MEU PORTO SEGURO


Cai a chuva com seus lamentos.
Encontra os meus e me inunda:
Medos, temores, desconfianças, síndromes e escuridão.
É necessária,
Mas rasga meu peito no espocar dos trovões
E cega-me os flashes intermitentes.
Agarro-me no que tenho:
Nau errante desgovernada.
Só Deus sabe a que distância está meu porto seguro!
Resta-me lavar a saudade
Nas águas vertentes dos olhos
Dos céus,
E meus!...
Em contrapartida existe o sonho
Que expulsa a lentidão desse telescópio
Nos erros grosseiros dos astrônomos,
E coloca-me lado a lado com Maria...
Com Maria (que me rege).
Assim; pode cair temporal!

Maria Rosana Temoteo da Silva
DESPEDIDA


Os versos que nunca te ofereci
surgem no momento de maior dor,
jamais pensei que omitirias
o sentimento que batizastes de amor.

Agora tu és o meu passado
e eu, um dia, tua namorada.
Ao me perguntarem hoje, o que sou tua
direi então: - "Simplesmente nada".

Talvez um dia ainda seremos
cúmplices no amor e na arte.
Aí então, depois de passada a mágoa,
te amarei novamente por toda a eternidade!

Delasnieve Daspet
SOMBRAS


Tantas saudades...
Começo a renovação,
Mas as sombras
Pesam-me nos ombros.

Cesar Moura
ABADIA


Prior regente do amor
Perdeu-se em ironia
Vencido pela dor,
Ao ver por arcaico modo
O destino da paixão.

Vencido pelo cansaço
O abade pois os pés no chão,
Quisera acreditar nesta fantasia
Que vestira a ilusão...

Precisou pintar de lorde
Nesta côrte o menestrel,
Não foi preciso desafiar à espada um dragão
Pela mão de uma princesa,
Bastou somente a realeza em vestes pompa
Para consagrar esta fábula na união!

Mas na abadia desfilou toda a congregação
No tapete vermelho da alta moda
Só por caviar e ostentação.

Vi no olhar do pobre súdito
Que desejava o confessor à confessar o seu amor
Por esta nata de toda nobreza,
Que ao pensar no desprezo que tem pela ralé,
Que só de doer já é pecar.

Conceição Pazzola
ECOS BANAIS


Sobrepondo-se ao cair da água
O choro da moça menina
Abala as paredes do banheiro
Testemunhas impotentes

Acima e abaixo do coração
Chora em silêncio lá fora
A mulher que tudo ouve
Impotente mãe, ora

Filha é também por instantes
Em seu mergulho interior
Conhece os porquês de ser
De tantas lágrimas inúteis

Depois do leite derramado
De tantas palavras ocas
Caídas no vazio do tempo
Ecos banais tão repetidos.

Roldão Aires
COINCIDÊNCIA


Sinto a tua ausência,
Aperta-me, a saudade.
Não sei se te mando
Rosas, para veres
Que meu amor, é verdade.
Quando, a estes versos
Escrevia,
Ouço baterem à porta.
Levantei-me para abri-lá
Eras tu com um ramalhete.
Pensastes como eu pensei,
Sentistes a mesma dor,
Que só quem ama sente.
Viestes com rosas.
Prá mim bastava,
Só um bilhete.

Marisa Cajado
VERSOS NA MADRUGADA


Há pouco foste embora...
Pouco tempo pra tanta demora
Em te encontrar novamente.
Deixastes impregnado levemente
Teu cheiro, tua lembrança
No quarto, na cama, no travesseiro
Na gama da química do amor.

Deitei-me no leito de forro marinho
E cobri-me com o lençol branco
O mesmo que nos cobriu e se fez ninho
Nestes dias de amar aberto e franco.
E tenho que calar no peito este afeto
Que teima em explodir, enquanto calas
O que por certo, não quer dizer teu ser inquieto.

E eu diria: _ Por que não falas?
Por que o silêncio que te distancia
Mais que os quilômetros que nos separam?
Dúvidas, anseios, que no ser resvalam
Em meio as recordações que já passaram
Tiram-me o sono, em nascente de poesia.
Pelas doces impressões que aqui ficaram

Como entender a química do sentimento
Que se expressa de modo tão diverso
Deixando adverso o pensamento
Sem resposta na tônica do meu verso?
Talvez o inverso deste verso que componho
Seja o teu verso, o teu testemunho
Deste querer que não trazes imerso,
Por não ser eu, a musa do teu sonho.

Fonte:
Colaboração de Poetas del Mundo

Marcelo Spalding (Literatura é Coisa para Jovem?)


Permitam-me um pouco de biografismo: 2008 me tem sido um bom ano literário. Finalmente consegui uma editora que editará meus livros e investirá no meu trabalho, consegui criar um formato de palestra que deu certo e com ela já fui do Rio de Janeiro à Ijuí, cidade a 450 Km de Porto Alegre. E foi justamente o tema proposto por essa cidade que provocou este artigo: literatura é coisa para jovem?

A questão parece retórica, mas quem circula por escolas sabe que o interesse pela leitura decresce ao longo dos anos escolares, apesar do esforço das instituições para que os alunos se interessem por literatura: quando se pergunta numa turma de Eduação Infantil quem gosta de lê, todos levantam a mão rapidamente; no Ensino Fundamental, metade levanta a mão com certa timidez; no Ensino Médio, é raro alguém se manifestar. Partindo do pressuposto de que a literatura é, como qualquer arte, “coisa” para qualquer idade, qualquer classe social, qualquer lugar, porque é algo que nos ajuda a compreender o mundo e a nós mesmos, somos obrigados a nos perguntar os motivos desse desinteresse. E nesse ponto, algumas perguntas se impõem:

1. A literatura é valorizada na mídia, na publicidade?

Em outras palavras: quantas vezes num filme juvenil aparece um personagem leitor? Qual o espaço que a literatura ocupa nas publicações para jovens, desde a Revista Recreio até a Capricho? Quando um personagem da Malhação manifestou interesse por literatura, pela escrita? Este parece um ponto central para compreendermos porque a sociedade como um todo não percebe valor na leitura, e isso responde um pouco também a questão 2.

2. A literatura é presente em casa? E na escola? A criança vê o pai ou o professor com um livro debaixo do braço?

Não sejamos ingênuos: o problema da leitura pode começar na escola, mas prossegue ou se intensifica ao longo da vida e hoje são poucos os leitores de fato, aqueles que por puro prazer entram numa livraria e compram livros. E não apenas entre os pais, que têm lá suas ocupações e compromissos, mas também entre os professores, soterrados por cargas horárias elevadíssimas e salários que não permitem a compra de, digamos, um bom livro por mês.

Assim, a criança e o adolescente não têm o exemplo, a referência, e ainda que isso não signifique necessariamente um afastamento da leitura, pode desmotivar aqueles jovens propensos a ler. Jovens, aliás, logo estigmatizados como nerds ou algo do gênero.

3. Também não será verdade que há uma parcela de leitores entre nossos alunos?

Como esboçado acima, não podemos negar que há algumas crianças e adolescentes propensos a ler, mais interessados na literatura, nas artes. É natural, aliás, que numa turma de 40 alunos uns 10 identifiquem-se mais com a matemática, outros com as ciências, outros com as humanas, incluída aí a literatura. É uma ilusão o professor pensar que toda sua classe irá reagir bem à Hora do Conto ou a um trabalho de literatura, talvez seja o caso de valorizar aqueles que lêem a fim de que os demais percebam valor nisso. E aí vem a questão seguinte.

Que tipo de livros esses alunos procuram? E que tipo de livros nós gostaríamos que eles procurassem e por quê?

Já foi dito que necessariamente haverá, numa classe de 40 alunos, uns 20% que gostam de ler, têm prazer em pegar um bom livro ou uma boa revista. O problema é quando o que eles consideram bom não é do gosto do professor, seja por um motivo ou outro. Exemplos temos vários, desde o menino fissurado por história em quadrinhos, que conhece todos os heróis e lê os gibis do pai para conhecer a história do gênero, até a menina ingênua encantada com Polyana ou agora fã de Meg Cabot. Passando, é claro, por alguns que descobrem que a literatura não precisa ser politicamente correta e procuram nela sexo ou violência, para pavor do professor, ainda que talvez seja este seu gênero preferido.

É nesse sentido que entra também o já batido debate sobre a leitura dos clássicos em sala de aula. Se percebemos uma perda de interesse pela leitura ao longo dos anos, não podemos negar que ela está relacionada à obrigatoriedade: quanto mais avançam na escola, mais os alunos são obrigados a determinadas leituras e, por não estarem de acordo com seus gostos e hábitos pessoais, rejeitam-nas, são censurados pelo professor, obrigados a ler tais títulos até que terminam por rejeitar a leitura como um todo, não preservando sequer aquele eventual gosto por gibi ou contos de fadas ou histórias policiais.

Também é verdade que a escola e o professor não podem se omitir diante da indústria cultural, são eles, e talvez só eles que um dia falarão sobre Homero, Machado de Assis, Luís de Camões, Gustave Flaubert, Edgar Allan Poe, ou mesmo Pablo Picasso, Wolfgang Mozart, Aleijadinho. É a escola a responsável por apresentar ao adolescente toda uma história cultural que forjou nossa civilização, mesmo que depois o aluno renegue esse aprendizado e torne-se um Homer Simpsons diante da tevê.

Difícil dilema, que para mim só se resolve com equilíbrio e adequação. Mas não vou me furtar de uma idéia de solução, ou de intermediação: um olhar mais atento para a literatura contemporânea.

Porque entre o clássico Flaubert e a popular Meg Cabot temos o contemporâneo, o Milton Hatoum, o Chico Buarque, a Jane Tutikian, a Ana Maria Machado, o Luis Fernando Veríssimo, o Renato Russo, o Vinícius de Moraes. Antes de ensinarmos a história da literatura, apresentarmos os clássicos, é preciso mostrá-los porque a literatura nos ajuda a compreender o mundo e a nós mesmos, tornando-se um prazer solitário e permanente. Isso não será feito com um texto de cem anos atrás que representa outra época, outro mundo, e sim com algo próximo a eles e escolhido pelo professor.

Sim, porque como mencionei acima, o professor e a escola não podem se omitir. Eles precisam saber indicar à turma ou ao aluno o tipo de livro mais adequado ao seu perfil, ao seu nível de aprendizado e interesse. Há hoje uma enorme oferta de títulos, muitos especialmente feitos para crianças e/ou adolescentes, de qualidades e intenções variadas, de preços e procedências variadas. Tendo o professor como filtro dessa produção, o aluno poderá manter o prazer pela leitura, mas tornar-se-á mais exigente e, em conseqüência, um leitor melhor.

Daniel Pennac, em “Os direitos imprescindíveis do leitor”, defende, entre outros, o direito de ler qualquer coisa, e conclui dizendo que “uma das grandes alegrias do educador é – toda leitura sendo autorizada – a de ver um aluno bater sozinho à porta da fábrica Best-seller para subir e respirar na casa do amigo Balzac”.

Aí sim, aí está criado o ambiente propício para o professor passar aos clássicos, porque este deve ser, sempre, o objetivo final de uma disciplina de literatura (não o inicial, note-se bem). Ítalo Calvino tem um texto formidável sobre o tema, “Por que ler os clássicos?”. Para ele, “os clássicos não são lidos por dever ou por respeito mas só por amor. Exceto na escola: a escola deve fazer com que você conheça bem ou mal um certo número de clássicos dentre os quais (ou em relação aos quais) você poderá depois reconhecer os ‘seus’ clássicos. A escola é obrigada a dar-lhe instrumentos para efetuar uma opção: mas as escolhas que contam são aquelas que ocorrem fora e depois de cada escola.”

Não é tarefa fácil, sem dúvidas. Mas depois de refletir sobre tudo isso me parece cada vez mais claro que o desafio é fazer da literatura não só coisa para jovens, mas coisa para pais e professores também. O que só se faz exatamente com bons professores ou quixotescos entusiastas, e você pode ter certeza que é um deles se chegou ao final deste artigo.

03/09/2008
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Fontes:
Artistas Gaúchos
Imagem = http://rociorodi.blogspot.com

Trovadores da Seção Bragança Paulista da UBT (Amor é…) final


NORBERTO DE MORAES ALVES

Poesia é o perfume
que se desprende da flor,
é o ansioso queixume
por um só beijo de amor.

Namoro muito agarrado
de gente de meia-idade
é como beijo roubado
que perdeu a validade.

Esbelta, de seio obeso
apertado em laçarote,
alguém queria estar preso
no xadrez desse decote.

THEREZINHA RAMOS DE ÁVILA

É um segredo de amor
numa valise guardado;
pode trazer muita dor
se um dia for encontrado.

Quisera ser trovador
para poder lhe mostrar
todo carinho e amor
que hoje eu quero lhe dar.

O meu destino eu lhe dei
e também meu coração.
Foi por amor, eu bem sei;
se eu errei, peço perdão.

VLADIMIR INOKOV

Nesta rede da varanda
sonho esperando te ver;
só falta pois, minha Amanda,
por aqui aparecer.

VOLPONE DE SOUZA

A mulher da Criação
plantada como uma flor,
regada com coração,
cultivada com amor.

WADAD NAIEF KATTAR

Hoje o frio me incomoda
muito mais que antigamente
pois já não mais me acomoda
o seu peito confidente.

Na jornada desta vida
já amei, sofri, chorei.
Hoje assopro a ferida,
disso tudo me cansei

Viva ame e sobreviva
mas aprenda a lição:
sempre a conquista afetiva
embaralha sua razão.

FÁBIO SIQUEIRA DO AMARAL - Atibaia

Um amor ou outro eu tive...
Conto-os nos dedos da mão;
me foram joias de ourives
que perdi por precaução.

Enrugado e impopular
como fole de sanfona,
corre o risco de ficar
quem o amor só coleciona.

O sincero sentimento
faz cantar nova canção,
sopra à vida o vivo alento,
quando o amor cala a razão.

E do amor tanto se fala,
se escreve e nada se sente;
esta trova não se cala
e haverá quem a desmente?!

Somos todos criaturas
pelo amor de Deus gerados;
Ele nos vê das alturas
e nos faz apaixonados...

Há nos céus menos estrelas
do que os versos que eu cantei;
nosso amor vai surpreendê-las
com os beijos que lhe dei...

MYRTHES N. S. DE MORAES -Atibaia

Foste o amor de minha vida,
e com ternura te amei.
Sem ti, fiquei sem guarida...
Sem teus beijos morrerei.

Se amor e felicidade
não fizessem bem à vida,
não teríamos saudade
de nossa infância querida.

O amor também traz surpresa
quando menos esperamos.
No início é tudo beleza,
muda depois que casamos.

Buscando alegre viver,
sempre feliz a cantar,
conseguirás te esquecer
de quem deixou de te amar.

Virgem Santa poderosa,
Mãe de Deus, o Salvador.
És a mulher mais bondosa,
só nos transmites amor!

A mulher apaixonada
quando recebe uma flor,
fica toda deslumbrada
e logo pensa que é amor.

UBT DE ATIBAIA

Com o amor no coração,
qualquer pessoa é feliz;
quando mostra sua ação,
quase todos pedem bis.
IRIZA

O casal é um inteiro,
vivendo pela metade.
Esse é o amor verdadeiro,
eis uma grande verdade!
VÂNIA

Deus é pleno e puro Amor,
em todos nós Ele habita.
Cria, sustenta, é ardor;
sua lei controla, dita.
SCHIRLEY

Por amor tudo se faz
até mesmo os sofrimentos.
Hoje existe pouca paz
entre muitos casamentos.
TEREZINHA

Alice me pede prova
do quanto amor lhe dedico.
Confesso aqui nesta trova:
sem essa mulher não fico!
NELSON

Ah! O amor e o verbo amar,
onde estão? No coração.
Sentimentos a criar...
Um é conceito, outro ação.
IRMA

CLÁUDIA L. DE MORAES – Socorro SP

Teus olhos são estrelinhas
num par de brilho constante...
ou será que são pedrinhas
redondinhas de brilhante?

O azul do céu tão bonito,
dia de inverno encantado,
garças rumando o infinito
e o meu amor ao meu lado.

Fonte:
Colaboração de Lola Prata com o livro "Amor é..." - Trovadores da Seção Bragança Paulista da União Brasileira de Trovadores - UBT - Novembro de 2010
Imagem = Imagens por favor

Sérgio Napp (Da Arte da Palavra ao Prazer da Leitura) Parte 2


Dos sessenta e nove anos que carrego, com certa facilidade, sessenta deles, por certo, dediquei, entre milhares de outras coisas, à arte de catar palavras. Parece-me que trabalho com as palavras desde sempre ou, pelo menos, desde o primeiro ano do primeiro grau (naquele tempo, primário). E não julgo que tenha sido em vão.

O primeiro jogo de cartas a dinheiro; a perda do mesmo e o medo em contar para o pai. A primeira dança com a menina que, mais tarde, voltaria a encontrar em outras circunstâncias. As brincadeiras com os amigos conquistados na ocasião, as correrias pelos caminhos desvendados. Enfim, um pedaço da infância que se perdeu no tempo. E daquele território, livre de qualquer restrição, a primeira palavra descoberta que lembro. Digo a primeira porque é a que a memória registra neste momento em que cato as palavras para escrever esta crônica.

Disbordar. Isso mesmo, disbordar era a palavra encantada que me trazia um som diferente e um sentido que não percebia muito bem. Claro que a empreguei na primeira redação daquele ano que se iniciava. E causou espanto. Por este espanto, dediquei-me a outras. E outras. Procurar palavras desconhecidas ou cujo sentido fosse, ao menos, estranho passou a ser meu secreto desejo.

Dou-me conta disso tudo ao falar para um grupo de estudantes noite dessas. Dou-me conta, agora conscientemente, que em grande parte da minha vida fui um trabalhador da palavra. Um palavrador. E tem sido uma experiência incrível!

Surgem, as palavras, nas horas mais estranhas. Numa fria madrugada me acordam, me sacodem e dizem: Levanta-te e anda! E que faço senão obedecê-las? Tiritando, saio atrás de caneta e papel para registrá-las. No ônibus, na fila do Detran, na corrida no parque. Quando menos prevenido me encontro elas me encontram. Numa reunião com amigos, no momento em que me preparo para um comentário qualquer, ela surge. Suspendo o gesto para recebê-la e brindo intimamente sua aparição. Os amigos não entendem. Que pode uma palavra, uma simples palavra, para perturbar um discurso? Ah, os amigos nunca entenderão, mas ela pode tudo.

Em outros momentos eu a procuro em desatino e ela não se revela. Busco a palavra certa para completar a frase perfeita e ela se esconde. Então não durmo, quase não converso, me disperso entre dicionários e pesquisas na internet, que o objetivo é um só: a tal da palavra. E ela, feito mulher bonita e desejada, se enche de brios, se faz de gostosa, de difícil, e não cede. Sofrer por ela é quase como sofrer por um amor impossível.

Eu, palavrador, tenho feito delas uma companhia de muitas e muitas horas, entre um cálice de vinho e um concerto de Bach. Tenho, com elas, uma luta cotidiana. Com várias derrotas e algumas vitórias. Que as palavras, caros leitores, não se rendem por qualquer elogio. Não se entregam a um simples toque de dedos. São orgulhosas, as palavras. Conhecem o seu valor. Maravilhosamente carinhosas, as palavras, quando sabemos conquistá-las.

Elas se divertem com os escritores que pensam que as têm em seu poder. Riem daqueles que imaginam que elas estão a sua disposição em qualquer circunstância. Mas se deliciam com os que entendem que uma palavra não é feita tão somente de símbolos e caracteres, mas que elas contêm segredos e artimanhas. Uma palavra, caros amigos, possui alma. Perversa com quem a desdenha; generosa com quem desvenda sua intimidade.

Eu, no meu ofício a respeito. Essa que se entrega e se deixa burilar, diamantemente esplendida e luminosa, por tantos escritores, o que me causa inveja. Essa que, de vez em quando, pousa em mim cheia de encantamento.

Fonte:
Artistas Gaúchos